Uma Epopeia Moderna 80anos

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COMISSO DE ELABORAO DA HISTRIA DOS 80 ANOS DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL

UMA EPOPIA MODERNA 80 Anos da Imigrao Japonesa no Brasil

EDITORA HUCITEC SOCIEDADE BRASILEIRA DE CULTURA JAPONESA SO PAULO, 1992

1992 Direitos reservados pela Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa Capa: Shinji Tanaka

D a d o s Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP) ( C m a r a Brasileira do Livro, SP, Brasil) Uma epopia moderna: 80 anos da imigrao japonesa no Brasil/ Comisso de Elaborao da Histria dos 80 anos da Imigrao Japonesa no Brasil. So Paulo: HUCITEC: Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, 1992. Bibliografia. ISBN 85-271-0186-6 1. Agricultura Brasil Histria 2. Brasil Emigrao e imigrao Japo 3. Brasil Indstria Histria 4. Japo Emigrao e imigrao Brasil 5. Japoneses Brasil Histria I. Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa. Comisso de Elaborao da Histria dos 80 Anos da Imigrao Japonesa no Brasil. II. Ttulo: 80 Anos da imigrao japonesa no Brasil. 92-1207 CDD - 304.8981052 ndices p a r a catlogo sistemtico: 1. Brasil: Imigrantes japoneses: Sociologia 304.8981052 2. Imigrao japonesa: Brasil: Sociologia 304.8981052 3. Japoneses no Brasil: Sociologia 304.8981052

SUMRIO

Prefcio A saga nipo-brasileira


PARTE I

9 11

Captulo Captulo Captulo Captulo

A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO PERODO EM BRANCO NA CORRENTE IMIGRATRIA E OS DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA Captulo 5. PERODO DO PS-GUERRA Captulo 6. O FIM DA ERA DE IMIGRAO E A CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

1. 2. 3. 4.

15 63 137

247 381 417

PARTE II

CONTRIBUIES DOS IMIGRANTES JAPONESES NO BRASIL Captulo 1. PAPEL DESEMPENHADO NA AGRICULTURA JAPONESA Captulo 2. PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO Captulo 3. PARTICIPAO NA INDSTRIA Captulo 4. EDUCAO, CULTURA, RELIGIO Captulo 5. VIDA RELIGIOSA DOS JAPONESES E SEUS DESCENDENTES RESIDENTES NO BRASIL E RELIGIES DE ORIGEM JAPONESA Posfcio

461 531 541 547

559 603

PREFCIO

ESTE final de sculo, a Organizao Internacional do Trabalho (OIT) prev grande fluxo migratrio internacional, de pases pobres para pases ricos. o que se verifica no Brasil de hoje, quando milhares de brasileiros esto seguindo para o exterior, em busca da felicidade e bem-estar pessoal. interessante observar que, pelas mesmas razes, durante todo o sculo XIX, cerca de 40 milhes de pessoas deixaram a Europa em direo a novos continentes descobertos desde Colombo. E at a deflagrao da II Guerra Mundial, no final dos anos 30 deste sculo, estima-se que 70 milhes de europeus devem ter deixado os seus pases de origem. No final do sculo XIX, mais precisamente em 1880, comeou a ocorrer tambm a emigrao japonesa, primeiro para o Hava, depois para os Estados Unidos, Peru, Mxico e, a partir de 1908, para o Brasil. Nos primordios da imigrao no Hava, a situao de pobreza no Japo era dramtica e o prprio governo esperava que esse movimento migratrio contribusse para melhorar a balana comercial do seu pas. No Brasil, por ocasio do 80. Aniversrio da Emigrao Japonesa, em 1988, um censo especfico verificou que os japoneses e seus descendentes j so cerca de 1,2 milho, todos eles totalmente integrados na vida nacional, tanto social, profissional como etnicamente. A comisso dos festejos do 80. Aniversrio entendeu que, ao ensejo dessa comemorao, se deveria fazer um abrangente registro desse processo migratrio para a posteridade, com texto em portugus e japons. O trabalho de pesquisa e redao consumiu mais de dois anos.

10 PREFCIO

A Histria dos 80 anos da Imigrao Japonesa no Brasil, que ora publicamos em portugus, trata com clareza do panorama social da poca, a situao internacional ingente, e em particular do Japo e do Brasil, e o porqu da vinda dos nossos pais e avs ao Brasil. Relata, tambm, as dificuldades que eles enfrentaram, no perodo da II Guerra Mundial, e os fatos relacionados com a comunidade nipo-brasileira, no perodo ps-guerra, incluindo um assunto considerado tabu Shindo Renmei , baseado exclusivamente em depoimentos constantes dos autos. Ainda assim, dada a extenso do tema, possvel que a pesquisa no esteja completa. Mas com grande satisfao que entregamos esta obra aos interessados no assunto, na certeza de que todos se sentiro recompensados com a sua leitura. Por ltimo, gostaramos de manifestar os nossos sinceros agradecimentos a todos que colaboraram na feitura desta obra. So Paulo, fevereiro de 1992. Atushi Yamauchi Presidente da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa

A SAGA NIPO-BRASILEIRA

AGA realmente o nome que convm, tanto a realizao deste livro, como histria que nele se conta, porque no todo dia que os homens se lanam a empreendimentos como esses, que demandam tanta coragem, consomem tanto trabalho e a cada dia reservam novas e inesperadas surpresas. So contudo as sagas que realmente escrevem a histria humana no que ela tem de significativo e permanente. A deciso de escrever este livro foi tomada como parte dos feitos comemorativos do 80. Aniversrio da Imigrao Japonesa para o Brasil. Sob os auspcios da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, foi desde logo formada uma comisso redatorial incumbida de promover os levantamentos e pesquisas e de redigir a histria do que foi essa imigrao, dos seus primrdios aos nossos dias. Como sempre sucede em tarefas dessa natureza, o tema foi se ramificando em amplitude e profundidade e estourando os prazos propostos, at que finalmente a verso do livro em lngua japonesa veio luz em outubro de 1991, com 452 pginas, sob o ttulo Nippon Imin Hachiju Nen-shi.

Os trabalhos no estavam contudo encerrados. Tratava-se agora de promover a edio do livro em portugus. E, medida que a comisso de trabalhos se dedicava a essa nova tarefa, a simples traduo veio a se transformar em uma verso muito mais ampla da obra, dada a necessidade sentida de se desenvolver e explicitar aspectos apenas aflorados pela edio japonesa. Completou-se afinal a jornada e o que o leitor tem em mos um novo livro, de 608 pginas, um livro que assinala como marco definitivo a rica e portentosa histria dos 80 anos da imigrao japonesa no Brasil.

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Marco definitivo, dizemos, porque doravante ele constituir ponto de partida obrigatrio de quantos novos estudos se venham afazer sobre o assunto. Sem dvida, antes dele muitos trabalhos foram produzidos por japoneses, nipobrasileiros e brasileiros, monografias ou obras de grande flego, e sem eles este livro no teria sido possvel. Entretanto, esta no simples obra de compilao, o que de si representaria sntese de grande valor. Mais do que um levantamento e utilizao quase exaustivas das fontes precedentes, que rene os fatos e dados fundamentais dessa imigrao, ela envereda por pesquisas originais, abre novas pistas e questes para os estudiosos futuros e, como nenhuma outra at ento, apresenta uma viso global e coerente das relaes entre os imigrantes nipnicos com a terra e o povo brasileiros e as impressionantes contribuies que da resultaram para nosso desenvolvimento em todos os setores da cultura e em todos os campos de atividade. Esta uma histria que, como toda histria de homens, no se fez sem desentendimentos recprocos, sem conflitos e sofrimentos individuais e coletivos, sem decepes, amarguras e tragdias como todas as sagas devem ser mas foi a sensibilidade dos seus autores em penetrar e transmitir esse lado humano e dramtico deforma viva, mas serena e equnime, que transformou um simples livro de histria na narrativa de uma saga aventurosa e dramtica. Neste caso, uma saga que tem um fim feliz para todas as partes envolvidas: o que se narra aqui, afinal, como poisos geograficamente antpodas e culturalmente to dessemelhantes podem se transformar em irmos e parceiros na construo comum de uma nao jovem, ao mesmo tempo to spera e to amistosa. Foi esse humanismo intrnseco e comum entre os brasileiros e japoneses, to diverso em suas manifestaes, mas reciprocamente compartilhado, que veio permitir o xito invulgar que a imigrao nipnica alcanou em nosso pas, exponenciando sua contribuio para nosso desenvolvimento e a plena integrao dos nikkei na brasilidade. Sob esse aspecto, a experincia nipo-brasileira mais do que um simples episdio histrico-cultural: assinala um caminho transcendente para um entendimento eficaz e feliz entre os povos, desbaratando quantas teorias se formularam sobre as incompatibilidades entre povos e culturas e a supremacia de uns sobre outros. E se as sagas falam sempre de novos caminhos e noivos mundos para o homem, esta viso do que foi a imigrao japonesa no Brasil aponta caminhos futuros para maior e melhor integrao futura da humanidade. Seria pretensioso, descabido e invivel sumariar em rpida apresentao o que se descreve em tantas pginas de uma histria to rica, tumultuosa e diversificada quanto o foi a da integrao dos imigrantes japoneses no Brasil. Nos seus traos mais gerais e esquemticos ela pode ser contudo dividida em duas eras ou fases, intermediadas pelos decisivos e traumticos acontecimentos provocados pela II Guerra Mundial. A primeira se inicia com a chegada dos imigrantes do Kasato-Maru em 1908 e vai, grosseiramente, at 1945 e o rescaldo

A SAGA NIPO-BRASILEIRA 13

psico-tnico-social-cultural subseqente. A segunda vem de ento aos nossos dias. No h como negar que, dentro do clima mental e histrico reinante na ocasio, e de acordo com tendncias que se acentuariam e agravariam a partir da I Guerra Mundial, a rivalidade entre os povos, o etnocentrismo, o nacionalismo, o militarismo, o expansionismo e o imperialismo prevalecentes no mundo, constituam um obstculo quase intransponvel plena integrao dos japoneses na comunidade brasileira. Atuava tambm como obstculo dessa integrao a extrema diferena existente entre os imigrantes e o povo brasileiro, seus desnveis de cultura, de hbitos, de linguagem, de modo de viver, para nada se falar da diversidade do entorno geogrfico em que os imigrantes se viam colocados. E, finalmente, no plano individual, cada imigrante, saindo de seu bero e ninho natal, trazia para a nova terra a eterna esperana-dos imigrantes de todos os tempos de a eles voltar o mais rapidamente e o mais rico possvel. Esta uma fase penosa de desentendimentos em todos os nveis e planos, talvez apenas amenizada pela diversa mas profunda cordialidade que aproximava japoneses e brasileiros. Deve-se acrescentar que tanto a situao econmica e demogrfica do pas nas primeiras dcadas do sculo XX como as peculiaridades da vida social dos nipnicos agravavam intensamente as suspeitas e dificuldades de entrosamento entre os colonos e a populao brasileira e seus dirigentes. Era uma realidade preocupante na qual desamparados pelas condies primitivas do Brasil de ento, eles fossem levados, pela sua experincia de vida comunitria, a constituir grupos, comunidades e associaes com caractersticas e tendncias autrquicas, quando no "colonizadoras" e enquistantes. Contudo, e simultaneamente, se integravam no irresistvel movimento de desbravamenlo, dilatao de fronteiras econmicas e urbanizao, que tem caracterizado todo o sculo XX brasileiro, deixando-se arrastar, irresistivelmente, pelo fascnio da conquista do espao e pela obra gigantesca e apaixonante da modernizao nacional. De aldeo sedentrio h sculos no Japo, no Brasil o imigrante adere ao "momentum" da nossa histria, convertendo-se em bandeirante desbravador de terras e em pioneiro introdutor de novas tecnologias. Deva-se repetir aqui que desde o comeo, ultrapassado o primeiro espanto provocado pela diversidade de costumes, o trato interpessoal entre nipnicos e brasileiros se afinava por uma simpatia recproca que removia montanhas de incompreenso. Talvez em nenhum outro caso de contatos tnicos e culturais se casaram to bem a famosa cordialidade brasileira com a insupervel polidez nipnica para aproximar os indivduos em uma convivncia a um tempo respeitosa, desarmante e jovial. Ser necessria, contudo, a tragdia da derrota japonesa na guerra para evidenciar e pr em confronto a profunda divergncia existente entre as tendncias que levavam o japons a se integrar definitivamente no Brasil, adotando nova terra e nova nacionalidade, e as que tendiam a mant-lo como sdito irredutvel

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e inassimilvel de um pas antpoda sob tantos aspectos. Isso se exprime de forma dramtica e at sangrenta no episdio extremo e de traos terroristas representado pela Shindo-Renmei, to ampla, equanime e pormenorizadamente analisada na presente obra. E com o merecido destaque, posto que foi a partir de ento que as opes se tornaram claras e foram feitas deforma irreversvel. E neste ponto que se d o grande divisor de guas entre o antigo imigrante nipnico e a nova figura do nipo-brasileiro, brasileiro tanto e mais quanto qualquer brasileiro. O episdio histrico, uma dolorosa ruptura dentro da comunidade nipnica do Brasil, apenas pe em relevo e torna vitorioso o processo maior de aproximao, integrao e colaborao interpessoal que vinha se operando desde as primeiras horas entre brasileiros e japoneses. Processo esse que demonstrava que indivduos de um povo de cultura multimilenar eram suficientemente plsticos para se adaptarem a uma nova realidade, para rejuvenescerem e se transformarem em cidados de uma nao em construo, e que a terra jovem e seu povo sem preconceitos eram suficientemente atraentes e generosos para aceit-los com todas as suas diferenas, no s se encantando com elas, mas at copiando-a. Como j dissemos, foi esse ntimo e recproco sentimento de confraternidade que fermentou a fuso tnico-cultural nipo-brasileira. Fica entendido que o abrasileiramento no implicou o abandono das tradicionais virtudes nipnicas de apreo pela educao, letras e artes, de senso hierrquico e capacidade de ao comunitria, de pacincia, constncia e estima pelo trabalho. Foram essas virtudes a razo principal do seu xito na terra brasileira, da singular contribuio que deram ao nosso desenvolvimento e o maior patrimnio que os imigrantes legaram aos seus descendentes. H na historiografia da imigrao japonesa no Brasil certa tendncia a enfatizar as dificuldades e frustraes sofridas pelos imigrantes. Faltaria complementar o quadro com uma viso mais ampla do progresso que aqui alcanaram e promoveram, comparativamente ao que teriam tido no Japo de ento e tambm em comparao com o de outras imigraes. Este livro levanta cortinas e abre pistas para essa viso maior e mais correta: afinal, como todos sabemos, a imigrao japonesa no Brasil uma saga de xito. Sua luta no foi v: a histria conhecida, a histria que vivemos, ado crescente reconhecimento do valor de sua cooperao e de nossa estima e cooperao crescentes. Benedicto Ferri de Barros

CAPTULO 1

A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO


1. AS GRANDES MIGRAES DA EUROPA NOS SCULOS XIX E XX 2. A ABERTURA DOS PORTOS E A IMIGRAO NO BRASIL DO SCULO XIX 3. JAPO: FIM DO ISOLAMENTO E INCIO DO MOVIMENTO EMIGRATRIO 4. ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 5. ALGUNS EPISDIOS HISTRICOS

1. AS GRANDES MIGRAES DA EUROPA NOS SCULOS XIX E XX

HISTRIA da humanidade mostra que ela viveu, desde o seu aparecimento na face da Terra at hoje, repetidos movimentos de migrao e de fixao em vrias regies do globo. O homem sempre se movimentou, por instinto, desejo de conhecer o desconhecido ou impulsionado por problemas polticos, econmicos, sociais, religiosos, etc, ou da combinao de dois ou mais desses fatores. No decorrer dos sculos aconteceram muitos movimentos migratrios de propores diferentes, sendo alguns de grandes dimenses, que influram poderosamente na evoluo histrica do gnero humano. Aqui nos limitaremos a examinar sucintamente o maior dos deslocamentos em massa ocorridos na histria, abarcando o sculo XIX e XX, dentro do qual se situa a emigrao japonesa para o Brasil. Sabemos que a emigrao de europeus para o Novo Continente comeou logo aps a sua descoberta por Cristvo Colombo, em 1492. Nos primeiros tempos seu nmero era pequeno, atingindo contingentes substanciais somente a partir do sculo XVII. A Inglaterra, que comeara a colonizar (ao lado dos franceses e holandeses), enviou cerca de 250 mil emigrantes no sculo XVII aos Estados Unidos. J no sculo XVIII esse nmero alcanava 1,5 milho. Portugal e Espanha registram nmeros bem inferiores, apesar de sua presena pioneira nas Amricas. Isso porque os territrios por eles descobertos ou conquistados estavam fechados para outros povos e os prprios portugueses e espanhis no tinham liberdade de emigrar para

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as colnias. Estima-se que em mais de trs sculos (at fins do XVIII) emigraram para o Novo Continente cerca de 700 mil pessoas. S a partir de 1830 o movimento emigratrio dos ibricos teve um grande incremento. Quase 200 milhes de almas a estimativa da populao da Europa nos princpios do sculo XIX. Desde ento, no perodo de uma centria, mais de 40 milhes emigraram para terras de alm-mar. A frica contribuiu tambm com grande nmero de emigrantes para as Amricas. A utilizao da mo-de-obra escrava durou cerca de quatro sculos, do XVI ao XIX inclusive, perodo em que 12 a 15 milhes de africanos (os nmeros variam conforme as fontes) vieram aumentar a populao desta parte do mundo. Dessa migrao resultou a forte presena racial e cultural africana alm da sua grande contribuio ao desenvolvimento econmico que se observa nas Amricas do Norte, Central e do Sul. A emigrao em massa iniciada na Europa no sculo XIX teve como causa a combinao de vrios fatores econmicos e sociais. Na realidade, nessa poca verifica-se uma profunda mudana na mentalidade popular na Europa, influenciada pela Revoluo Francesa (1789). As idias de liberdade e igualdade foram se alastrando a pases at ento dominados por monarquias absolutistas e senhores feudais. Mesmo pessoas de classe pobre, at ento submetidas aos grilhes do absolutismo, sonham em emigrar para pases livres. Na Inglaterra, em particular, onde a revoluo industrial introduz profundas mudanas econmicas e sociais, verifica-se a passagem da poltica mercantilista para a de livre comrcio. E a emigrao passa a ser estimulada e no contida como at ento. Todos esses fatores, mais o crescimento demogrfico acentuado, contribuem para incentivar o movimento emigratrio. A expanso populacional da Europa seguiu a seguinte marcha, quase triplicando em dois sculos e meio (em milhes): 1750 144; 1850 274; 1900 423. nessa situao que extensas reas de terras so colocadas disposio de imigrantes nas Amricas, Austrlia, Nova Zelndia, frica do Sul, etc. A independncia dos Estados Unidos (1776) constituiu um fator decisivo para intensificar o movimento emigratrio da Europa. Logo, outros pases americanos tambm se libertam do domnio das metrpoles. Nas primeiras dcadas do sculo XIX quase todos os pases do Novo Continente proclamam sua independncia e adotam a poltica da porta aberta em relao aos imigrantes. Mesmo pases no independentes

AS GRANDES MIGRAES DA EUROPA NOS SCULOS XIX E XX 17

como o Canad, abrem suas portas para receber imigrantes a fim de povoar, explorar e desenvolver seus territrios. Mas, entre todos, os Estados Unidos so os que mais atraem imigrantes europeus. Eles organizam um novo e revolucionrio sistema de governo "do povo, pelo povo e para o povo". Para muitos povos europeus ainda sob o jugo de monarquias absolutistas, a Amrica representava, com seu imenso territrio inexplorado e a nova forma de governo, um verdadeiro pas do sonho, cheio de promessas de liberdade e realizaes. Por volta de 1850 estoura o gold-rush na Califrnia, na costa do Pacfico. Em 1863 decretada a abolio da escravatura, at ento muito criticada e condenada na Europa. E no decorrer da Guerra da Secesso (1861-65), que consolidou a poltica de libertao da escravido, o governo de Washington instituiu uma lei segundo a qual qualquer cidado adulto poderia receber gratuitamente um terreno de 160 acres (aproximadamente 65 hectares). Essa generosa legislao atraiu mais ainda o interesse dos europeus pela Amrica. Na poca das grandes migraes de que estamos tratando, os pases que mais receberam imigrantes foram os Estados Unidos, Argentina, Canad e Brasil. Os imigrantes que entraram entre 1821 e 1932 nesses pases foram (em milhes de pessoas): Estados Unidos 34,2; Argentina 6,4; Canad 5,2; Brasil 4,4. Verifica-se pois que os Estados Unidos da Amrica superaram, de longe, os demais pases como receptor de imigrantes. bom esclarecer que a transferncia dessa enorme massa de gente em tempo relativamente curto foi possibilitada pelo desenvolvimento dos meios de transporte, em especial da navegao a vapor e de estradas de ferro. A segunda metade do sculo XVIII representa a fase de maior trfico de escravos africanos, a ele se dedicando muitos comerciantes europeus. Consta que ento a capacidade de navios negreiros na rota da frica para as Amricas atingia 82 mil homens/ano. Porm, a partir de fins desse sculo intensificam-se as crticas contra o vergonhoso comrcio. A Inglaterra adota (1807) a lei que probe o trfico de escravos. Desde ento diminui rapidamente o nmero dos que se dedicam a essa atividade, liberando embarcaes, at ento empregadas no trfico negreiro, para o transporte de emigrantes. Depois da Inglaterra, a Alemanha ocupa lugar de destaque como pas fornecedor de emigrantes. Outro grande pas de emigrantes a Itlia, que, entretanto, comea com algum atraso. A unificao italiana (1870)

18 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

ocorre quase na mesma poca que a da Alemanha (1871), mas a emigrao de italianos s cresceu, chegando a alcanar 25 mil/ano no qinqnio 1871-75. Esse nmero era bem inferior ao da mdia anual inglesa (193 mil) e germnica (79 mil) do mesmo perodo. No entanto, entre 1886 e 1890 cresce para 150 mil/ano. A essa altura cai a emigrao de ingleses e alemes, tornando-se a Itlia a grande fornecedora europia de emigrantes. O movimento das grandes migraes continuou at a I Grande Guerra (1914-18). Entre 1906 e 1910 atingiu o elevado nmero de 1,43 milho por ano. Depois da guerra prosseguiu, mas j com intensidade menor, no ultrapassando a mdia anual de 650 mil. Tambm aps a II Grande Guerra (1939-45) registraram-se movimentos migratrios de vulto, porm de carter diferente em sua maioria: como uma soluo para problemas de refugiados criados pela conflagrao. O deslocamento de to grandes massas humanas teve conseqncias para a prpria histria da humanidade e dos povos envolvidos. Muito embora seja difcil apreender todo o seu significado e alcance, basta constatar que, levando excedentes populacionais da Europa para regies desabitadas e inexploradas e que necessitavam de mo-de-obra competente para o seu desenvolvimento, promoveu-se ampla redistribuio populacional no globo. Dos pases receptores de imigrantes, os Estados Unidos so o maior. Em conseqncia, sua populao sofre uma grande expanso. O nmero de habitantes, de 8,5 milhes em 1816, se eleva para 75,9 milhes em 1900. O ingresso em massa de migrantes de bom nvel de educao e munidos de forte vontade de trabalhar e progredir e a paralela introduo dos resultados da revoluo industrial fizeram a economia americana se desenvolver com muito vigor e rapidez. O movimento migratrio para as Amricas, que no sofria nenhuma limitao, comea a encontrar obstculos a partir da segunda metade do sculo XIX. As restries vinham tanto da parte dos pases de emigrao como dos seus receptores. Diversas so as causas. Fundamentalmente comeou nos Estados Unidos, que praticamente haviam chegado ao fim do desbravamento de novas fronteiras em seu territrio. Por isso tomaram a iniciativa de selecionar os imigrantes. Essa mudana na poltica imigratria americana se refletiu, com o tempo, nos demais pases de imigrao. A primeira vtima da nova poltica imigratria dos Estados Unidos foi o chins. A emigrao chinesa para aquele pas teve incio na poca do

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gold-rush da Califrnia, dcada de 1850. Os chineses participaram ativamente desse movimento, cata de ouro e enriquecimento rpido. Mas j em 1860, o Congresso do Estado da Califrnia aprovou uma lei proibindo a entrada de imigrantes chineses. A China encontrava-se no final da dinastia Ching (1616-1911), apresentando grave deteriorao na sua vida poltica e social. Para os chineses pobres, a Amrica, que oferecia estabilidade poltica e salrios altos, representava um verdadeiro paraso. Por isso no cessava a corrente migratria para a terra do Tio Sam. Naquela poca a Califrnia ainda se defrontava com o problema de escassez de mo-de-obra. No entanto os chineses no eram bem recebidos. A causa dessa m vontade residia no fato de esses imigrantes trabalharem com salrios muito baixos, suportando qualquer dificuldade e sofrimento. Mais ainda: eles se contentavam em viver nos cortios que formavam nas cidades, a fim de aumentar suas poupanas, conservando ainda os hbitos e costumes da velha China. Esse modo de viver provocava reao desfavorvel dos descendentes de europeus. Os operrios americanos viram nos chineses seus mais fortes concorrentes no mercado de trabalho. E a fora dos sindicatos operrios dos Estados Unidos j era poderosa, como se pode inferir pela organizao da AFL American Federation of Labor (Federao Americana do Trabalho), em 1886. A presso sindical contribuiu para a aprovao da lei de 1860. Mas essa legislao, que vedava a entrada de imigrantes chineses, no entrou em vigor, porque contrariava dispositivos da Constituio dos Estados Unidos. O movimento antichins continuou crescendo, at que em 1882 conseguiu fazer aprovar uma lei que proibia a entrada de imigrantes chineses no pas. A partir de meados do sculo XIX, no s nos Estados Unidos como em outros pases de imigrao, os chineses sofrem restries. O Canad limita a imigrao chinesa a partir de 1885. Igualmente pases latino-americanos como o Equador (1889), Peru (1909), Panam, Uruguai, Paraguai, Costa Rica, Guatemala (1914), etc. probem a entrada de imigrantes chineses. As medidas tomadas contra os chineses so ampliadas e aplicadas a outras nacionalidades. Assim, no caso dos Estados Unidos, a reforma da lei de cotas de imigrantes de 1924 atinge mais os italianos. A imigrao japonesa proibida em seguida chinesa nos Estados Unidos e outros pases. BIBLIOGRAFIA Encyclopaedia Britannica, ed. 1963. Hayashi, Kentaro. Sekai no Ayumi (A Marcha do Mundo). 2 vols. 1949.

20 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO Kennedy, Paul. Taikoku no Kb (Ascenso e Queda das Grandes Potncias). 2 vols. Trad. japonesa de Chikara Suzuki, 1988. Trad. brasileira de Waltensir Dutra. Ed. Campus, 1989. Okasaki, Fuminori. Kokusai Ij Mondai (Problemas de Migrao Internacional), 1955.

2. A ABERTURA DOS PORTOS E A IMIGRAO NO BRASIL DO SCULO XIX A maioria dos pases da Amrica Latina conquista sua independncia entre 1810 e 1830. Com exceo do Brasil, os demais Estados tinham sido colnias espanholas. Quando Napoleo Bonaparte (1769-1821) invadiu a pennsula ibrica no comeo do sculo XIX, provocou a instabilizao poltica na Espanha. Nessas circunstncias, Madrid relaxou seu controle sobre as colnias, facilitando a independncia delas. Aps a independncia, muitos pases latino-americanos comearam a introduzir imigrantes para povoar e explorar economicamente seus territrios. O Brasil foi o nico que adotou a orientao de receber imigrantes estrangeiros, antes mesmo de sua separao da metrpole. Isso porque, por ocasio da invaso das foras de Napoleo, a corte real lusitana (dinastia dos Bragana) se transferiu para o Rio de Janeiro (1808). Ainda na Bahia, antes de se dirigir para o Rio de Janeiro, o regente D. Joo VI decretou a abertura dos portos e a liberdade de indstria e comrcio para todo o territrio brasileiro (at ento monoplios de Portugal). Quando a corte lusitana chegou ao Rio de Janeiro, a populao brasileira no passava de 3,6 milhes (dos quais 1,91 milho de escravos). Uma populao escassa, dispersa por alguns pontos do litoral, muito pequena para o desenvolvimento do vasto territrio e at para a defesa de suas fronteiras. Por isso, foram adotadas pela nova administrao, instalada no Rio, providncias para a introduo de imigrantes estrangeiros, alm de estmulos aos portugueses que desejassem emigrar para o Brasil. Mas os primeiros planos, mal traados, malograram, alguns nem chegaram a ser postos em prtica. Ao iniciar-se o sculo XIX, na Europa, as questes do trfico africano e da abolio da escravido constituram assuntos de discusso nos congressos internacionais. Em 1807, a Inglaterra pioneira da campanha abolicionista decidiu acabar com o comrcio de escravos. Outros pases seguiram o exemplo. No Brasil, a dinastia Bragana, prosseguindo a poltica de abertura para o exterior, incluiu pela primeira vez, em 1818, no oramento nacional, dispndios relacionados com a imigrao. Para comear, abriu trs colnias localizadas nas provncias do Rio de Janeiro e da Bahia, com

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imigrantes alemes e suos. Mas todas fracassaram. No caso da colnia de Nova Friburgo (RJ), foram introduzidos 1.682 suos, considerado um nmero grande de estrangeiros na poca. O malogro foi atribudo irresponsabilidade de funcionrios encarregados da imigrao e de maus agentes de recrutamento de imigrantes na Europa, alm da falta de um planejamento adequado. A respeito da poltica imigratria da corte portuguesa, temporariamente instalada no Rio, Caio Prado Jnior comenta em sua clssica Histria Econmica do Brasil: "Sua contribuio, durante a permanncia da Corte no Brasil, no passar do estabelecimento de um punhado de ncleos coloniais formados com imigrantes alemes, suos, aorianos, e distribudos no Esprito Santo, no Rio de Janeiro e em menor escala em Santa Catarina. Para a histria, tero mais importncia as intenes que os resultados numericamente mnimos". Entre os planos ento elaborados figurava um que previa ,a introduo de 2 mil chineses. Naquela poca o comrcio de ch preto se encontrava em grande expanso na Europa. Por isso, o motivo oficialmente anunciado para a importao de to grande nmero de chineses era o desenvolvimento da cultura de ch no pas. Havia preocupao da parte de autoridades da corte quanto ao futuro do trfico de escravos e por isso planejava-se atrair cules chineses para um eventual preenchimento do vazio que poderia ser criado com a abolio do trfico negreiro. A introduo de escravos no perodo de 1811 a 1820 alcanava a expressiva cifra de 328 mil. Por outro lado, a cafeicultura se expandia e prosperava a olhos vistos, o que fez a corte do Rio deixar de lado o projeto do cultivo de ch. A imigrao chinesa ficou limitada vinda, em carter experimental, de 400 pessoas. Com a independncia proclamada em 1822, o governo brasileiro pde dedicar seus esforos soluo de problemas nacionais. Em 1824 foi promulgada a Constituio do Imprio do Brasil. Nela figuravam dispositivos relativos imigrao de estrangeiros. Pela nova Carta, que estabelecia a liberdade de culto, os imigrantes estrangeiros no eram obrigados a ser todos catlicos como at ento. Com a nova legislao, os planos de colonizao adquirem carter mais prtico e realista. Em 1824 funda-se o ncleo colonial de So Leopoldo, prximo a Porto Alegre, RS. Nele foram introduzidos inicialmente imigrantes alemes. O governo brasileiro custeava o transporte martimo at Porto Alegre, o transporte terrestre at a colnia e doava lotes de terra (de 15 a 75 hectares por famlia) e ainda fornecia animais domsticos e o custo de manuteno da lavoura durante dois anos. O colono gozava ainda da iseno do servio militar e do pagamento de tributos. Mas a terra distribuda no podia ser vendida durante dez anos.

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Nos termos contratuais constava ainda a instalao de moradias, igreja, escola, etc, porm muitas delas nunca foram postas em prtica. Como os europeus em geral e os protestantes em particular detestavam a escravido, foi proibido o emprego de servos na colnia. A colnia de So Leopoldo, embora tivesse de superar muitos problemas e dificuldades, tida como a primeira a ter xito no Brasil. Meio sculo depois, ela se tornava municpio, com 22.729 habitantes. O sucesso de So Leopoldo animou o governo imperial a prosseguir na poltica de fundao de ncleos coloniais. Ainda na primeira metade do sculo XIX instalou um total de quinze colnias, em sua maioria nas provncias meridionais (Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran), pouco povoadas. Mas quase todas acabaram em malogro. Em parte, o fracasso pode ser atribudo prpria instabilidade poltica que marcou o perodo da Regncia (1831-40), quando se verificaram muitas revoltas e revolues, sendo a mais notvel a dos Farrapos (1835-45), tendo como palco o Rio Grande do Sul. Dentro das turbulncias que abalaram diversas regies do pas, recm-libertado de Portugal, difcil se tornava conseguir sucesso na poltica imigratria. Nos primeiros 50 anos do sculo XIX entraram apenas 17 mil imigrantes. Outro fator, provavelmente mais decisivo, que impediu o ingresso de maior nmero de imigrantes, foi a continuao da entrada de escravos. Depois de 1808, os nicos pases escravocratas importantes no Novo Continente eram o Brasil e Cuba. Com a reduo de pases importadores, aumentou grandemente a vinda de navios negreiros ao Brasil. At 1854, ano em que o Brasil suspendeu a importao de escravos, o seu nmero no pas somava cerca de 2,5 milhes. Os imigrantes europeus no gostavam de escravido, evitavam pases escravocratas. O Brasil, que contava com o ingresso de abundante mo-de-obra escrava, no sentia necessidade imediata de recorrer aos imigrantes europeus. Todavia, o governo imperial prosseguiu no seu esforo de aperfeioar a legislao relativa imigrao e colonizao. Assim, a partir de 1839, a introduo de imigrantes e a fundao de ncleos coloniais passaram da alada do poder central para governos provinciais. Outra lei determinava que os servios de imigrao e colonizao podiam ser realizados por pessoas fsicas ou jurdicas privadas brasileiras ou estrangeiras. As terras eram cedidas sem nus para os colonos. Como resultado dessas medidas, sucederam-se planos de imigrao e colonizao na segunda metade do sculo. Entre 1847 e 1875, registraram-se 129 planos de colonizao. Se contarmos desde a chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, contam-se 144, dos quais 31 organizados pelo governo da corte, 20 por governos provinciais e 93 por particulares. Contudo, apesar da multiplicao de colnias, no se pode afirmar

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que elas foram todas bem-sucedidas. Um levantamento oficial de 1875, sobre as 144 colnias, mostra o seguinte resultado: SITUAO DAS COLNIAS (1875) Independeiites(*) Colnias Corte Prov. Partic. Total 10 4 1 15 Pop. 36.860 8.816 329 46.005 Extintas(**) Colnias 9 1 67 77 Em operao Colnias 12 15 25 52 Pop. 23.701 6.876 17.906 48.483 31 20 93 144 Total

(*) Independentes so colnias que obtiveram sucesso e foram incorporadas ou se transformaram em unidades administrativas oficiais (municpios), etc. (**) Extintas, com a revogao da autorizao, por terem sido consideradas fracassadas.

As principais causas do fracasso de muitos planos de colonizao so: Excessivas e rpidas mudanas de leis e regulamentos, cuja aplicao se tornava difcil e mesmo impossvel. Havia muitos dispositivos legais que no eram ou no podiam ser cumpridos. Inadequada localizao das colnias e falhas na poltica de colonizao. Existncia de maus agenciadores de emigrantes. At meados do sculo XIX, o "imigrante" era, quase sempre, aquele que buscava possuir uma pequena lavoura de sua propriedade e gesto. Depois aparece uma nova figura de imigrante: o "trabalhador contratado para fazenda de caf". Conforme j vimos, na primeira metade do sculo XIX o Brasil recebia em mdia cerca de 34 mil escravos por ano. Ao mesmo tempo, aumenta a presso internacional a favor da abolio do trfico negreiro. Por isso, surgem homens que pensam ser necessrio Introduzir imigrantes brancos para substituir os escravos, cujo ingresso no podia durar muito. Um dos primeiros a pensar assim foi o senador por So Paulo, Nicolau de Campos Vergueiro. J em 1847 ele introduz na Fazenda Ibicaba, situada em Limeira, SP, imigrantes portugueses, alemes, suos e belgas, somando at 1857 um total de 177 famlias. O governo imperial pagava as despesas de viagem desses imigrantes.

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Essa imigrao foi a primeira experincia de introduo de trabalhadores contratados para uma fazenda de caf. A remunerao do trabalho era paga em porcentagem da produo. O exemplo foi seguido por muitos fazendeiros. O sistema de pagamento muda posteriormente para salrio mais porcentagem de produo. Todavia, este sistema de remunerao de trabalho recebeu reprovao generalizada na Europa. que o clculo da remunerao era feito pela fazenda e, alm disso, o trabalho ao lado de escravos constitua um sacrifcio insuportvel para os colonos, no familiarizados com o esforo fsico exigido. Alegando ser o trabalho dos colonos muito penoso e insatisfatrias as condies de vida, o governo da Prssia proibiu em 1859 a emigrao para o Brasil. E s a partir de 1896 permitiu a emigrao de autnomos para os trs estados meridionais do Brasil: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran. Pelos mesmos motivos, tambm a Frana impediu a emigrao para o Brasil de 1875 a 1908; a Itlia suspendeu-a durante dois anos, de 1889 a 1890. Essas medidas impeditivas atingiam os imigrantes cujas viagens eram subsidiadas pelo governo brasileiro. Os que viajavam por conta prpria no sofriam nenhuma restrio; continuavam a chegar ao Brasil. Abrangendo as duas categorias referidas, o nmero de entradas no Brasil, no perodo de 110 anos, de 1820 a 1929, est no quadro seguinte. Trata-se de cifras aproximadas, porquanto na questo de imigrao os nmeros variam conforme as fontes. Por exemplo, as estatsticas sobre emigrantes japoneses fornecidas pelo Ministrio dos Negcios Estrangeiros de Tokyo no coincidem com os nmeros de fontes brasileiras. ENTRADA DE IMIGRANTES (1820-1929)
Ano/Pas 1820-29 1830-39 1840-49 1850-59 1860-69 1870-79 1880-89 1890-99 1900-09 1910-19 1920-29 Total Portugal Itlia Alemanha 1.984 207 2.139 15.806 16.514 14.627 19.201 17.034 13.848 61.902 75.801 Espanha

Japo

Outros 7.112 2.021 2.347 28.843 34.398 60.609 23.997 115.929 82.145 136.374 221.881 715.656

Total 9.096 2.669 4.992 108.126 110.079 193.885 453.079 1.183.018 635.438 863.714 846.645 4.410.741

261 491 63.272 53.618 67.609 104.491 215.354 195.586 318.481 301.913

180 5 24 4.916 47.100 276.724 670.508 221.394 137.868 106.835

10 181 633 3.940 29.066 164.193 861 121.604 181.696 27.732 81.931 58.284 583.254 86.577

1.321.076 1.465.554 239.063

Fonte: Mirador Internacional: Migrao.

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Pelo quadro verifica-se que da dcada de 1850 at a de 70 predominam os portugueses. A populao lusa crescia rpido e, do lado de c, o caf brasileiro estava numa boa fase de expanso, necessitando de crescentes quantidades de mo-de-obra. Contudo, muitos imigrantes portugueses preferiam fixar-se nas cidades litorneas. A entrada de imigrantes italianos em grande nmero altera o quadro geral da imigrao no pas. Inicialmente eles ingressavam nos ncleos coloniais do Sul, mas j na dcada de 1880 os trabalhadores contratados pelas fazendas de caf de So Paulo formavam o grosso. A produo de caf de So Paulo em 1885 representava 34% do total do pas; j em 1900 alcanava 69%. So Paulo at ento tinha uma populao pequena, necessitando introduzir trabalhadores estrangeiros para sua cafeicultura em expanso. Com a proibio da importao de escravos em 1854, a populao cativa caiu de 1.510.000 em 1872 para 1.368.000 em 1880. Diante da reduo dessa fora de trabalho, j em 1871 a provncia de So Paulo incluiu no seu oramento uma previso de gastos com a admisso de imigrantes. Mesmo assim, dos 193 mil imigrantes que entraram no Brasil na dcada de 1870, So Paulo s recebeu 11 mil. Antnio de Queirs Teles, proprietrio de fazendas de caf e governador da provncia, visitou em 1878 diversos pases europeus, interessando-se especialmente pela Itlia, que ento se defrontava com o problema da superpopulao. Em 1884 foi baixada nova lei de imigrao pelo governo provincial, definindo a introduo de trabalhadores contratados para as fazendas de caf. Pela nova legislao, o governo provincial arcava com toda a despesa de transporte martimo. Ao mesmo tempo decidiu-se construir uma ampla e confortvel hospedaria de imigrantes na capital, So Paulo. J em 1887, a hospedaria estava em condies de funcionar parcialmente. Mediante entendimentos com grandes fazendeiros de caf, o governador fundou, em 1886, a Sociedade Promotora de Imigrao. E promoveu uma intensa campanha de divulgao da excelente situao da cafeicultura paulista. O resultado no se fez esperar. So Paulo, que de 1880 a 84 havia recebido apenas 15 mil imigrantes, passou a introduzir 9.500 no ano de 1886,32 mil em 1887 e 88 mil em 1888. Isso representou o comeo do ingresso em massa de trabalhadores contratados nas fazendas paulistas. No h estatsticas precisas sobre o nmero de imigrantes contratados, mas acredita-se que de 1877 a 1914 tenha alcanado 1.780.000 aproximadamente.

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A notcia de que o governo imperial do Brasil havia abolido a escravido em 1888 repercutiu favoravelmente na Europa, estimulando a emigrao. O quadro estatstico da pgina anterior mostra o crescente afluxo de imigrantes de pases latinos da Europa: Itlia, Portugal e Espanha a partir da dcada de 1880. Mas existiram outros fatores importantes para o incremento do movimento emigratrio europeu para o Brasil: adoo pelos Estados Unidos de medidas restritivas imigrao, especialmente a asitica; o desenvolvimento econmico do Brasil, com a expanso das plantaes de caf, principalmente. Ainda pelo quadro referido, nota-se a relativa diminuio dos imigrantes alemes e outros do centro e norte da Europa. Os italianos emigraram em massa porque havia perturbaes polticas e sociais em seu pas. Alm disso, como observa Caio Prado Jnior, "o italiano um trabalhador mais rstico e menos exigente: aceitar de mais boa-vontade as duras tarefas da lavoura brasileira". Em dez anos, a contar de 1890, o Brasil recebeu 1.180.000 italianos, nmero recorde para uma nacionalidade. A mudana de Monarquia para Repblica, em 1889, no alterou fundamentalmente a poltica imigratria brasileira. Como at ento, numerosas leis foram baixadas, com alteraes freqentes dos regulamentos e dos rgos encarregados do setor. Pouco depois introduzia-se o conceito de "imigrao interna", aplicado principalmente s populaes necessitadas do Nordeste. Essa regio, que foi ocupada e explorada nos sculos XVI, XVII e XVIII, atravs da pecuria e indstria de acar, havia formado uma grande populao carente, como conseqncia do regime de grandes propriedades e a decadncia recente da indstria aucareira. Mas no regime escravocrata reinava a noo de que s aos escravos cabia realizar o trabalho fsico, braal. Abolida a escravido e com a escassez de mo-de-obra nas regies cafeicultoras do Sul, gastavam-se grandes somas para atrair e trazer imigrantes estrangeiros. Diante dessa situao, surgiu naturalmente a idia de "imigrante interno" como poltica de socorro s populaes pobres do Nordeste. Desde a proclamao da Repblica em 1889, at 1911, o governo criou 22 colnias oficiais para imigrantes, num perodo em que a corrente maior de imigrantes e constitua de trabalhadores contratados para cafezais. Num levantamento feito em 1922, do total de 53.145 colonos, 44%, ou seja, 23.479 eram imigrantes internos.

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Em poucas palavras, sob o regime republicano cresce paulatinamente o peso da migrao interna. A Constituio de 1934 introduz a limitao do nmero de imigrantes estrangeiros. Ento, sim, acontece uma grande mudana na orientao poltica relativa ao problema imigratrio. BIBLIOGRAFIA Estatsticas Histricas do Brasil. Vol. 3. Rio de Janeiro, IBGE, 1980. Enciclopdia Mirador Internacional (Migrao). Prado Jnior, Caio. Histria econmica do Brasil. 3.a ed. So Paulo, Editora Brasiliense, 1953. Okasaki, Fumnori. Kokusai Ij Mondai (Problemas de migrao internacional).

3. JAPO: FIM DO ISOLAMENTO E INCIO DO MOVIMENTO EMIGRATRIO

O Japo ingressou na histria das emigraes com visvel atraso em relao aos principais pases emigratrios da segunda metade do sculo passado. Somente a partir da dcada de 1880, os nipnicos comearam a sair de sua terra, em nmero digno de nota, para trabalhar no exterior (veja Quadro 1). Cabe aqui um pequeno parntese, para lembrar os sculos XVI e XVII, quando japoneses, expandindo seu comrcio exterior, se estabeleceram em muitos portos das Filipinas, Aname, Camboja, Indonsia, Sio (Tailndia), Macau, etc. Acredita-se que o nmero de habitantes dos chamados "bairros japoneses" formados nesses pases tenha chegado a mais de 10 mil. Com a decretao do fechamento do pas pelo xogunato Tokugawa em 1639, alguns milhares deles no puderam retornar ptria depois daquela data, porque as medidas draconianas do regime feudal proibiam at mesmo a volta dos que haviam sado para o exterior. O isolamento do Japo (com exceo da feitoria holandesa de Dejima, Nagasaki, que virtualmente monopolizou o comrcio europeu no Japo) em relao ao mundo ocidental durou at 1854, quando, sob a presso dos navios do comodoro Perry, Edo abre os portos nipnicos para o comrcio internacional. Durante esse perodo a China e a Coria mantiveram intercmbio comercial limitado com o Japo. Na fase final do xogunato Tokugawa, a populao nipnica somava cerca de 3Q milhes, dos quais 84% constituam a classe de lavradores e 7% a de samurais; os restantes 9% representavam as demais classes. Com a abolio da classe samurai, decretada pelo governo Meiji logo aps a

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Restaurao (1868), muitos dos antigos guerreiros contribuem para avolumar a massa de desempregados que havia se criado em conseqncia da crise econmica que sacudira os alicerces do antigo regime. Na verdade, nesse perodo de transio o Japo enfrentava o problema da superpopulao e do desemprego real e potencial, situao essa agravada com a baixa produtividade agrcola e industrial uma das conseqncias negativas do longo isolamento nacional. Por outro lado, o governo da Restaurao tinha pressa em levar avante as medidas de modernizao (ocidentalizao) do pas. J em 1872 baixou a lei de ensino obrigatrio em todo o territrio nacional. Os municpios, vilas e aldeias ficavam responsveis pela construo e manuteno da escola e a remunerao dos professores. No ano seguinte (1873) foi decretado o servio militar obrigatrio. As duas medidas provocaram reao e at levantes populares em diversos pontos do pas. At ento a renda per capita no passava de 21 yens/ano e a cobrana de 50 sens (meio yen) como mensalidade dos alunos do curso primrio, mais o recrutamento de jovens para o servio das armas, representavam uma grave sangria na economia rural. Da as manifestaes contrrias e at revoltas, em particular nas zonas rurais mais pobres. A situao nipnica dessa fase pode ser, grosso modo, comparada da Itlia, que, depois de sua unificao em 1870, se transformou num grande pas de emigrao. Mas o Japo s comeou a despachar emigrantes em quantidade substancial, com anos de atraso. Havia, porm, da parte do povo, a vontade de "ir trabalhar onde houvesse emprego". Assim, j em junho de 1868 ano em que se proclama oficialmente a Restaurao Meiji 42 pessoas emigram para a ilha de Guam, como trabalhadores contratados em plantaes de "arroz-d'gua". Pouco antes, em maio, 148 japoneses haviam seguido para o Hava, como trabalhadores de canaviais, por intermediao de um cidado americano. Em ambos os casos, no houve autorizao nem qualquer outra interferncia governamental. As despesas de viagem e de subsistncia ficavam por conta das fazendas empregadoras. Parece no h prova documental que nos dois casos o salrio mensal ficava em torno de 4 dlares. Em 1869, um grupo de 40 naturais do daimiato de Aizu (atual provncia de Fukushima) partiu, acompanhado por um holands, para o Estado da Califrnia, onde fundaram o ncleo colonial Wakamatsu. Como se viu, os casos das primeiras levas de emigrantes representavam empreendimentos da iniciativa particular. O governo de Tokyo manteve-se ausente, ou por estar ainda ocupado com outros problemas vitais nessa fase de transio histrica, ou por falta de compreenso a

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respeito do problema migratrio, como conseqncia do longo perodo de isolamento nacional. Um documento que mostra a opinio da elite administrativa sobre a migrao o relatrio da clebre Misso Iwakura. Essa delegao foi a primeira, e a maior, enviada ao exterior pelo governo imperial naquele momento em que o Nippon se preparava para o grande salto de sua modernizao. Ela percorreu durante dois anos (de outubro de 1871 a setembro de 1873) a Europa e os Estados Unidos em viagem de observao e estudos. Participavam dela cinco dos principais dirigentes do novo governo Meiji: Tomomi Iwakura 1 , Takayoshi Kido, Toshimichi Okubo, Naoyoshi Yamaguchi e Hirobumi Ito, acompanhados por chefes de departamentos e outros altos funcionrios de diversos ministrios, num total de 50 membros. De volta ao Japo, essa misso traz importantes informaes sobre a organizao poltica, poderes executivo, legislativo e judicirio, Foras Armadas, armamentos, Casa da Moeda, instituies financeiras, bolsas de valores, seguros, indstrias, sistema educacional (inclusive escola de surdos-mudos), hospitais, bibliotecas, museus, observatrios astronmicos, instalaes porturias, estradas de ferro, guas e esgotos, corpo de bombeiros, etc, das naes visitadas. A delegao observou e estudou com especial ateno os Estados Unidos da Amrica, onde percorreu muitos centros vitais de sua ento ascendente economia. Ao regressar, no seu relatrio observou, entre outras coisas, que a histria do Japo cem vezes mais longa do que a dos Estados Unidos, mas seu territrio no passa de 3% do americano. No entanto o Japo ainda tinha muito a aprender e desenvolver. Aduz que sem aplicao de fora humana bem preparada no pode haver desenvolvimento nacional. Na poca de sua independncia acrescenta os Estados Unidos possuam uma populao de 5 milhes; em cem anos aumentou sete vezes, graas introduo de imigrantes estrangeiros. Em 50 anos de 1820 a 1870 entraram 7,5 milhes de imigrantes no territrio americano. Comenta que na Europa reis e nobres enriqueciam atravs da posse exclusiva de terras, enquanto homens cheios de iniciativa e esprito independente ficavam inibidos de promover seu prprio desenvolvimento. Muitos deles, trabalhadores, se dirigiram para os Estados Unidos e ajudaram a construir a prosperidade americana. No obstante essa referncia favorvel aos imigrantes europeus, a misso no estabeleceu contato com os prprios japoneses. Ela visitou,
'Tomomi Iwakura (1825-83) pertenceu tradicional nobreza palaciana, participou ativamente do movimento restaurador da monarquia, de que resultou a Restaurao Meiji. Ocupou postos importantssimos no governo. Foi o chefe da misso como embaixador plenipotencirio. Todos os demais membros da misso ocuparam cargos de maior relevncia no governo.

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em julho de 1871, uma indstria de tecelagem de l em San Francisco e no seu relatrio registrava que havia cem operrios brancos, 240 chineses e dois nipnicos. E observa que os chineses, graas sua operosidade, ganhavam muito dinheiro e que sua remessa anual para a China superava 10 milhes de dlares. possvel que os homens do governo de Tokyo, ocupados com problemas maiores e mais prementes, no tivessem, naquele momento, tempo nem disposio para tratar do problema da emigrao. Ocorre tambm que aqueles emigrantes japoneses que se dirigiram pioneiramente ilha de Guam e ao Hava, sem autorizao oficial, provocaram atritos e incidentes nos locais de trabalho, forando as autoridades de Tokyo a se ocupar dos casos. Essa circunstncia pode ter dado a idia de que a emigrao representava uma fonte de preocupaes e aborrecimentos para o governo. Todavia, pouco depois, a situao interna do Japo exigiu das autoridades governamentais um estudo do problema da emigrao. A causa principal dessa mudana de orientao foi a crise econmico-social do pas que se refletia negativamente nas finanas do governo. Para enfrentar a crise, o governo Meiji tomou providncias de profundidade em muitas reas administrativas. Uma delas foi a reforma agrria, pela qual os camponeses obtiveram o direito propriedade de terras, acompanhada da nova lei de imposto territorial rural (1873). Entretanto a rebelio de Seinan2, exigindo enormes gastos militares, forou o governo a emitir grande volume de papel-moeda, o que provocou inflao. E teve ainda de aumentar tributos regionais e indiretos. Em 1881 adotou o governo uma poltica deflacionria, provocando com isso violenta queda de preos de produtos agrcolas, agravando a situao j crtica das reas rurais. Em face dos sinais de inquietao em vrias regies, o governo procurou adotar providncias destinadas a preservar a ordem pblica, como a reorganizao da polcia e das Foras Armadas, alm de baixar leis sobre a segurana pblica, imprensa, reunio, etc, visando maior controle sobre essas reas. Todavia, por causa da crescente misria no campo, a partir de 1879 estouram revoltas agrrias em diversas regies do pas. Diante dessa situao, o governo de Tokyo mudou de orientao
Takamori Saigo (1827-77), um dos lderes da Restaurao, desentendendo-se com colegas de governo a respeito da questo coreana, abandonou o governo regressando sua terra natal, Satsuma (atual Kagoshima). Fundou uma escola para filhos de samurais e manteve o sistema de dominao samuraica, como antes da mudana do regime. Reagindo contra a poltica modernizadora do governo e a abolio da classe samurai, chefiou uma revolta armada com o apoio decidido de seus alunos e partidrios. Depois de sitiar o castelo de Kumamoto, base das foras governamentais, foi derrotado pelo novo exrcito composto de recrutas, no-samurais em sua maioria.
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com respeito ao problema da emigrao, passando a reconhec-la como necessria para reduzir as tenses sociais agravadas com o aumento demogrfico, sobretudo nas zonas rurais. A primeira emigrao oficial aconteceu em 1883, com a ida de 37 trabalhadores para a pesca de prolas na Austrlia. Mas, somente a partir da emigrao para o Hava, em 1885, o movimento emigratrio nipnico adquire importncia. O reino do Hava procurou receber imigrantes nipnicos por vrias vezes desde a primeira leva (de 1868), j citada. Em 1886 foi firmado um acordo de emigrao entre os dois governos. a chamada emigrao oficial, iniciada na prtica no ano anterior. Devido crise econmico-social que assolava o Japo, para um nmero estabelecido pelo acordo de 600 emigrantes no primeiro ano, apresentaram-se 28 mil candidatos. No ano seguinte seguiram 1.930 emigrantes. Segundo o contrato relativo a esses emigrantes oficiais, as despesas de viagem corriam por conta do governo havaiano; eram devidos 25 dias de trabalho por ms, sendo o trabalho dirio de 10 horas para servio a cu aberto e 12 horas para servio interno. Salrios: homens 12,5 dlares e mulheres 7,5 dlares mensais. O cmbio na poca era de um dlar por yen, aproximadamente. A maioria dos emigrantes originrios de zonas rurais pobres visava ganhar dinheiro e remeter o mximo possvel para as famlias que ficaram na terra natal. Eram os dekasegi (decassegui), palavra atualmente muito usada no Brasil, devido leva de descendentes de nipnicos que seguem para o Japo com a finalidade de trabalhar, ganhar dinheiro e retornar ao Brasil, sua ptria. Segundo estimativas, somente os emigrantes oficiais do Hava teriam remetido para o Japo cerca de 2.650.000 dlares, em dez anos. Esse valor aumenta cada vez mais e em 1915 chegava a 2,5 milhes de dlares por ano. Na mesma poca um trabalhador rural no Japo ganhava apenas 15 sens por dia. Por isso o envio de vultosas somas de dinheiro pelos emigrantes terra natal representava a concretizao de um dos objetivos do governo: reduzir a tenso social nas regies agrcolas. No havia, ento, uma orientao oficial no sentido de fixar os emigrantes na terra que os recebia e para a qual contribuam para o progresso socioeconmico local. A mudana da atitude governamental com relao emigrao, aludida h pouco, repercutiu nos meios populares. Em 1887, Sanji Muto (1867-1934), empresrio e poltico, escreveu Beikoku Ij-ron (Sobre a emigrao para os Estados Unidos). Em seguida surgem muitos livros e comentrios na imprensa, focalizando o assunto da emigrao para o

32 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

alm-mar. Em 1891, Tooru Hoshi (1850-1901), jornalista, polemista e poltico, fundou a Kaigai Ij Doshi-kai (Associao dos Partidrios da Emigrao). Seguiram-se outras entidades semelhantes como a Shokumin Kyokai (Sociedade de Colonizao), de Takeaki Enomoto; Nihon Rikkokai (que posteriormente atuou no Brasil); Shinano Kaigai Kyokai (Associao de Alm-Mar de Shinano 3 e outras. Outro aspecto a considerar a proliferao dos chamados agentes ou companhias de emigrao. At a publicao da "Lei de Proteo de Emigrantes" (abril de 1896) inexistia qualquer restrio legal para essa atividade. De maneira que havia pessoas jurdicas e fsicas dedicadas aliciao de emigrantes. Suas atividades, regra geral, tinham curta durao. Muitas firmas mudavam de administradores e de nome. A multiplicao de agenciadores era ajudada pela facilidade com que se organizavam, ento, as sociedades annimas no Japo. No temos dados exatos, mas a poca das "empresas de emigrao" durou pouco. Consta que Kichisa Imin Goshi Kaisha (Kichisa Companhia de Emigrao Ltda.), fundada em dezembro de 1891, teria sido a primeira. Em 1898 havia dez, e em 1905 o nmero subia para 29, representando o pico. Quatro anos depois caa para dez. Em 1917 restavam apenas cinco. Delas, quatro, Nanbei Shokumin, Toyo Imin, Nippon Shokumin e Nitt Shokumin, se fundiram para formar a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia de Fomento Industrial do Ultramar S.A.), conhecida mais pelo nome abreviado de Kaik. A Morioka, que resistira fuso, acaba sendo absorvida pela Kaik em 1920. Havia companhias de emigrao de carter duvidoso. Depois da entrada em vigor da lei de proteo ao emigrante, a maioria dessas empresas dispunha de um capital social entre 10 mil e 100 mil yens. Informa-se que em 1905, quando se atingiu o maior nmero de companhias do gnero, algumas delas ostentavam capital de mais de 200 mil yens. A multiplicao de companhias de emigrao parece indicar que elas proporcionavam bons lucros. O Quadro 1 mostra que a partir da dcada de 1890 cresce muito o nmero de pessoas que deixam o Japo procura de novos horizontes em outros pases.

Shinano corresponde atual provncia de Nagano.

JAPO: FIM DO ISOLAMENTO E INCIO DO MOVIMENTO EMIGRATRIO 33 QUADRO 1 ESTATSTICA DE EMIGRAO AT A II GRANDE GUERRA

Perodo

EUA e outros

Amrica Central e do Sul

Sudeste da sia

Plano de Colonizao da Manchria

Total

1868-1880 1881-1890 1891-1900 1901-1910 1911-1920 1921-1930 1930-1940 1941-1950 Total

901 20.450 114.617 116.159 105.302 48.171 5.609 411.409

792 19.597 40.774 85.326 96.129 1.551 244.172

1.314 11.173 21.199 26.336 27.636 520 81.768

144.760 125.247 270.007

901 20.450 116.723 146.429 167.273 160.036 274.134 127.318 1.013.764

Fontes: Waga Kokumin no Kaigai Hatten (Expanso do Nosso Povo no Alm-Mar). (Volume de Estatsticas). Tokyo, Ministrio do Exterior, Seo Consular de Emigrao, 1971. Obs.: Desconhece-se o nmero de emigrantes colonizadores enviados China continental e Manchria, porque viajavam sem passaporte. Divulgamos apenas o nmero dos emigrantes lavradores abrangidos no Plano de Colonizao da Manchria, devidamente registrados a partir de 1932.

QUADRO 2 ENTRADA DE IMIGRANTES JAPONESES EM PASES DA AMRICA CENTRAL E DO SUL (de 1899 a 1941)
Mxico Panam Cuba Brasil Peru Argentina Chile Colmbia Bolvia Venezuela Uruguai Paraguai Outros Total 14.476 415 686 188.986 33.070 5.398 519 229 202 12 18 521 4 244.536

Fonte: Waga Kokumin no Kagai Hatten (Expanso do Nosso Povo no Alm-Mar). (Volume de Estatsticas). Tokyo, Ministrio do Exterior, Seo Consular de Emigrao, 1971.

Os dois quadros no esclarecem, mas desde o incio da Era Meiji at

34 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

pouco antes do comeo da II Grande Guerra, 35 pases receberam imigrantes japoneses. Como se v no Quadro 2, s na Amrica Central e do Sul 14 pases receberam imigrantes nipnicos. Comparando a emigrao japonesa com a dos grandes pases de emigrao, verifica-se que ela teve uma durao curta e o total de emigrados foi pequeno. Nos 79 anos, contados desde o comeo da Era Meiji at a II Grande Guerra, o total de emigrantes nipnicos somou 1.013.000 pessoas. Deduzindo-se porm dessa cifra os 270 mil emigrantes colonizadores da Manchria, sobram apenas 750 mil, nmero este inferior ao de emigrantes da Noruega (cuja populao atual de 4,2 milhes) no mesmo perodo. No mesmo espao de tempo, os emigrantes italianos somaram mais de 10 milhes. As causas principais dessa inferioridade numrica da emigrao nipnica residem, em primeiro lugar, no atraso do seu comeo, e em segundo, nas restries impostas aos nipnicos em muitos pases receptores. Essas so tambm as razes que explicam por que, apesar de seu reduzido nmero, os imigrantes se espalharam por numerosos pases. Conforme j visto, a campanha contrria imigrao japonesa teve incio na Califrnia. Convm aqui fazer um rpido paralelo entre o antijaponismo e as restries feitas aos imigrantes chineses. Os japoneses ingressaram nos Estados Unidos em regies onde pouco antes os chineses haviam entrado e sido hostilizados. Para os europeus e americanos, ainda no familiarizados com os orientais, estes davam a impresso de serem todos iguais. E o imigrante nipnico procedia de um pas que estivera isolado por dois sculos do resto do mundo. Havia nascido e vivido dentro de um ambiente social e cultural exclusivamente nipnico. Era natural, portanto, que a diferena marcante de aspectos somticos, somada ao fosso cultural quase intransponvel, a comear pelo idioma, produzisse um choque profundo e complexo que no cabe ser analisado aqui. Todas essas diferenas e mais a competio no campo de trabalho com os chineses acabaram produzindo campanhas contra os imigrantes nipnicos, justamente nos primeiros pases que os receberam: Hava, Estados Unidos, Austrlia, Canad, etc. A Austrlia adotou, j em 1901, uma lei restritiva da imigrao, comeando por proibir a entrada dos japoneses. A emigrao japonesa para aquele pas dava-se em escala reduzida. O forte atrativo do salrio elevado, de 15 dlares/ms, mais a possibilidade de os pescadores de prola independentes obterem lucros de quase 5 mil yens/ano, haviam aberto perspectivas de um aumento substancial da corrente imigratria nipnica. Como pas receptor mais antigo de imigrantes japoneses, o Hava

ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 35

exercia forte fascnio e ainda se constitua num ponto de reemigrao para os Estados Unidos e Canad. Emigraram 165 mil japoneses para as ilhas. Por volta de 1898, os japoneses representavam 40% da populao do Hava. Todavia, depois de sua anexao 4 aos Estados Unidos em 1898, os imigrantes nipnicos passaram a receber o mesmo tratamento, tanto no continente como nas ilhas. Pelo Gentlemen's Agreement de 1907, firmado entre Tokyo e Washington, tornou-se impossvel a entrada de novos imigrantes japoneses no Hava. E com a nova lei de imigrao adotada em 1924 pelos Estados Unidos, as portas do Hava, bem como as americanas, foram fechadas. O Canad, igualmente, tomou providncias restritivas imigrao japonesa, a partir de 1895. E de 1907 em diante os nipnicos se tornaram alvo, ao lado dos chineses, da campanha antioriental. Como conseqncia desses movimentos, Japo e Canad assinaram um acordo, pelo qual Tokyo limitaria espontaneamente a sada de emigrantes para o Canad. Depois de 1928, o nmero de emigrantes japoneses ficou reduzido a apenas 150 por ano, o que na prtica eqivalia a uma proibio. Devido a essas circunstncias, depois de 1907 comea a aumentar a emigrao de japoneses para pases sul-americanos e para o continente asitico. Como vimos na observao relativa ao Quadro 1, os emigrantes japoneses destinados China e Manchria (exceto os que participavam do Plano de Colonizao da Manchria) viajavam sem passaporte, razo por que no so conhecidos os seus nmeros. Todavia, os repatriados civis japoneses do imediato ps-guerra somaram mais de 2,17 milhes. Esse nmero demonstra que, depois do fechamento das portas de quase todos os pases receptores (salvo os da Amrica do Sul), um considervel contingente de nipnicos havia emigrado para o continente asitico. (Tetsuya Tajiri/Jos Yamashiro)

4. ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL

Muito embora 18 de junho de 1908 seja oficialmente considerada a data inicial da imigrao japonesa no Brasil, visto que foi naquele dia e ano que aportou em Santos o Kasato-Maru, trazendo a bordo a primeira leva
O Hava era um reino independente, composto de oito ilhas principais e outras pequenas. Em 1881, o rei visitou o Japo, onde tratou da ida de trabalhadores para os canaviais havaianos. Como resultado desse acordo, aumentou a corrente emigratria de japoneses. Em 1959 o Hava passou a ser 50. Estado americano. Com a anexao americana, os assuntos de imigrao passaram a ser tratados por Washington.
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36 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

de imigrantes daquela procedncia, na verdade h todo um perodo anterior em que ocorreram tentativas, se bem que infrutferas, de introduo de japoneses entre ns. O conhecimento das tramitaes que antecederam ao movimento imigratrio importante na medida em que fornece os elementos fundamentais que, se no explicam inteiramente, auxiliam, e muito, no esclarecimento de alguns problemas e obstculos que foram posteriormente enfrentados por aqueles que se aventuraram a atravessar os mares em busca de novas oportunidades de vida em nosso pas. Da o porqu da incluso de um captulo versando sobre os antecedentes da imigrao japonesa no Brasil nesta obra, que pretende abarcar os 80 anos da sua presena em territrio brasileiro. No sculo XIX ocorreu uma srie de movimentos populacionais de ordem internacional. As Amricas foram um dos principais plos de atrao, tendo o Brasil, a partir das trs ltimas dcadas do sculo, desempenhado um papel muito importante como pas receptor. Maria Thereza Schorer Petrone atribui o aquecimento verificado na movimentao da populao europia a duas conquistas da Revoluo Francesa para o indivduo: o direito de migrar e o de mudar de residncia. Essa liberdade de locomoo, ao lado de modificaes ocorridas no nvel das estruturas at ento vigentes, que, segundo Petrone, explicaria o fenmeno. Da afirmar: "os liames feudais entram em decomposio, a posse da terra revolucionada e, o que talvez seja mais significativo, desenvolve-se a ruptura da solidariedade entre os componentes de uma comunidade e de uma famlia, tornando-se o elemento livre para se dirigir para onde mais facilmente pudesse encontrar solues para seus problemas de sobrevivncia" (1). Dentre os fenmenos demogrficos, Hania Zlotnick considera, com razo, os movimentos migratrios um dos mais complexos. Os outros dois nascimento e morte , diz ela, s ocorrem uma vez, por indivduo, o que facilita sua anlise e dimensionamento. Isso raramente ocorre com os movimentos migratrios, o que torna o seu estudo mais difcil(2), afora uma srie de fatores que os envolvem. Na histria do Brasil um dos problemas mais constantes tem sido justamente de ordem demogrfica. A falta de povoamento tornou-se patente desde o seu descobrimento no s em relao ocupao como explorao do solo. Como reflexo dessa situao, percebem-se duas tendncias ntidas na poltica imigratria brasileira. Enquanto uma visava, sobretudo, ao povoamento do solo, ao desenvolvimento da produo e regenerao da raa, a outra objetivava, antes de mais nada, o fornecimento de braos para a lavoura. Acompanhando essas tendncias, enquanto no nvel federal a preo-

ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 37

cupao primeira era multiplicar os ncleos coloniais a fim de fixar o imigrante como pequeno proprietrio, o Estado de So Paulo, por exemplo, defendia a vinda do imigrante assalariado para a lavoura cafeeira, visto ser o caf, na poca, o produto em torno do qual girava toda a economia nacional. Embora os membros da Seo de Colonizao e Estatstica da Sociedade Auxiliadora da Indstria Nacional reconhecessem que o povoamento era mais importante e interessante para o pas como um todo, em 1870 eles j sabiam que o fornecimento de braos para a lavoura tornava-se cada dia mais urgente, dada a escassez cada vez maior de ofertas, sobretudo em razo das sucessivas medidas que vinham sendo tomadas visando a abolio da escravido em terras brasileiras(3). Se a princpio a liberdade de migrar foi praticamente total, em nvel internacional, com um mnimo ou mesmo sem qualquer tentativa de controle por parte dos governos envolvidos, aos poucos essa situao foi se alterando. Tanto os pases fornecedores quanto os receptores de imigrantes foram paulatinamente tomando conscincia dos perigos a que ficariam expostos diante de uma movimentao macia como a verificada a partir da segunda metade do sculo XIX. Alis, nesse particular a I Guerra Mundial pode ser considerada um marco na medida em que foi sobretudo a partir dela que, sucessivamente, foram sendo adotadas, com mais freqncia, medidas restritivas tanto por parte dos pases fornecedores quanto dos receptores de imigrantes. Na verdade, entretanto, ao longo da histria da humanidade ocorreram restries, em diferentes ocasies e por motivos os mais variados, ao direito de migrar. O Brasil, por exemplo, durante muitos anos permaneceu fechado entrada de estrangeiros. Somente com a abertura dos portos, em janeiro de 1808, e a liberao da concesso de terras a estrangeiros em novembro do mesmo ano, que foi facilitada a entrada de forasteiros no pas, o que, teoricamente, havia sido vedado, at ento, pelo alvar de 18 de maro de 1605(4). O governo brasileiro procurou desde o incio resolver o problema da falta de pessoas com a introduo de europeus. Todavia, por sugesto do Conde de Linhares (D. Rodrigo Domingos de Sousa Coutinho Teixeira de Andrade Barbosa), enquanto o Brasil era ainda colnia de Portugal, foi feita uma tentativa de introduo de asiticos. A idia era trazer chineses para desenvolver o cultivo do ch tanto no Jardim Botnico quanto na Fazenda Imperial de Santa Cruz, no Rio de Janeiro. Dos 2 mil chineses aguardados em 1819 vieram apenas 400. Os resultados no foram animadores(5). A esta experincia seguiram-se outras mas, igualmente, sem sucesso (6).

38 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

Muitos dos que mais tarde se colocaram numa posio contrria vinda de asiticos para o pas lanaram mo dessas experincias malsucedidas com os chineses e alegaram que os asiticos em geral, por extenso, eram inconvenientes como mo-de-obra em nosso pas. No foram poucas as vezes, entretanto, que se aventou a hiptese do emprego do asitico como trabalhador temporrio. Em 1870, ao ser discutida pelos membros da Seo de Colonizao e Estatstica da Sociedade Auxiliadora da Indstria Nacional, sob a presidncia de Jos Maria da Silva Paranhos, a convenincia ou no para o pas da introduo de chins, a opinio geral foi a seguinte: "No carter, pois, de trabalhadores destinados a suprir a escassez de braos nas fazendas e outros estabelecimentos, onde se emprega hoje o trabalho escravo; a seco considera no s de utilidade como de urgente necessidade a introduo dos chins. Mas s e simplesmente nesse carter de meros elementos de trabalho que a seco entende conveniente a sua aquisio temporria; e no como verdadeiros colonos que se venho fixar no solo; fazer parte irmmente de nossa sociedade; e concorrer pela fuzo com a populao indgena do paiz e immigrantes de outras origens, para constituir nossa nacionalidade futura". Nesse segundo caso a escolha recaa sempre sobre os europeus, pois s eles, diziam, teriam capacidade para "estimular e levantar a vitalidade do povo Brasileiro" (7). Durante o Imprio o assunto foi duramente questionado, tambm, pelos membros da Sociedade Central de Imigrao(8). Por toda parte as restries ao asitico iam muito alm de uma simples preferncia pelo europeu em razo de uma maior proximidade de culturas. O asitico era, em muitos sentidos, considerado um ser inferior. Oliveira Martins, escritor e poltico portugus, fez uso, em uma publicao de 1880, de expresses como as que seguem: "Naturalmente estril a fonte de trabalho indgena, secada pela lei a fonte de trabalho escravo negro, a perigosa tentao de ir buscar braos a outro viveiro de raas inferiores prolficas embriaga muitos espritos". "A imigrao chinesa trouxe consigo a crise da Califrnia, agora mesmo no perodo agudo: porque iria o Brasil para aumentar a riqueza de seus fazendeiros, buscar os elementos de futuras crises constitucionais?" Ou: "No basta a independncia poltica para constituir uma nao; a este termo corresponde a idia de uma autonomia tnica, moral, intelectual e econmica". "O chins no emigra, viaja. No muda os penates, aluga temporariamente o brao. No uma populao que se fixa [...] A onda que vem,

ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 39

chega nua e faminta; a onda que vai, regressa cheia e vestida. As economias do trabalho no se consolidam numa terra que para o chins no ptria adotiva, mas sim estao temporria apenas, e os metaes, espcie em que leva consigo as suas economias, escasseiam desde logo, e aparecem as crises de numerrio". Na verdade Oliveira Martins defendia "um Brasil europeu e no asitico, uma nao e no uma colnia, eis a o seguro porvir da Antiga Amrica portuguesa" (9). Foi ele um dos que se revelaram frontalmente contrrios vinda de chineses para o Brasil. Como ele, havia muitos. Comparadas as restries (que ao longo dos anos foram sendo feitas aos japoneses) com as crticas de Oliveira Martins aos chineses no sculo passado, observa-se uma srie de pontos em comum. Enquanto para uns a introduo do japons significaria, de certa forma, a retomada da escravido, para outros o japons e o chins eram tidos como inferiores aos prprios escravos. O temor no era, muitas vezes, do asitico como tal, mas das conseqncias que, suspeitava-se, poderiam advir ao pas se viessem para c. Antnio Olyntho, por exemplo, membro da Comisso de Obras e Colonizao da Cmara dos Deputados, acreditava que a sua simples presena causaria a completa paralisao da corrente imigratria europia para o Brasil(10), em vista do que vinha ocorrendo em outros locais que os haviam recebido. Muitas discusses em torno do assunto foram alimentadas pelo Decreto n. 528, de 28 de junho de 1890(11), baixado, portanto, sete meses aps o incio do perodo republicano. O referido dispositivo legal, embora permitisse a entrada no pas a todas as pessoas vlidas e capacitadas para o trabalho, desde que no estivessem respondendo a processo criminal em seu pas de origem, fazia exceo aos originrios da frica e da sia. Para eles foi imposta uma autorizao expressa do Congresso Nacional para poderem entrar em territrio brasileiro. A fim de assegurar a obedincia ao que ento foi estabelecido, os agentes diplomticos e consulares foram incumbidos de impedir a sada dos elementos que se enquadrassem nesse decreto, e a polcia dos portos, por seu turno, de no permitir o seu desembarque no Brasil. Fechando ainda mais o cerco, foi estabelecida multa aos comandantes das embarcaes que fizessem o transporte de elementos originrios desses continentes. Se o Decreto teve simpatizantes, houve tambm os que se opuseram a ele, fazendo uso para tanto da imprensa e das tribunas da Cmara e do Senado para suas manifestaes. Nas duas esferas do Poder Legislativo foram apresentados projetos

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visando a revogao seno total, ao menos parcial, do que fora estabelecido. Assim, a 30 de maio de 1892, o senador Monteiro de Barros encaminhava um projeto no qual defendia a entrada no pas no do asitico em geral, mas do chins e do japons. A nica exigncia que no se tratasse de indigentes, mendigos, piratas ou que estivessem incursos em processo de ao criminal. Ao fundamentar a sua opinio, declarou estar convencido de que a maioria de seus colegas daquela Casa via o asitico de uma forma preconceituosa. Embora confessasse sua preferncia pelo europeu, o elemento povoador por excelncia, no via razo para no ser empregado o chins como "elemento transitrio" de trabalho(12). A transitoriedade aludida demonstra que a aceitao do asitico, mesmo entre os que defendiam sua introduo, era parcial e no plena. Na Cmara dos Deputados, igualmente, no foram poucas as vozes que se levantaram contra o Decreto. Costa Machado, por exemplo, declarou querer "enterrar esse cadver para no continuar a infeccionar o ambiente republicano". Assim pensando, apresentou um projeto segundo o qual seria conferida aos estados a liberdade de escolher os imigrantes que desejassem, sem qualquer restrio(13). Paralelamente ao que ocorria nas duas Casas do Congresso, a imprensa esquentava os debates ao divulgar sucessivas matrias cuja tnica eram os problemas enfrentados pelos lavradores com a falta de braos. A maioria dos envolvidos com o problema estava convencida de que no era suficiente apenas introduzi-los; era necessrio, sobretudo, fix-los nas propriedades agrcolas e no pas, o que no vinha ocorrendo com os europeus. Acontece que como nada prendia o imigrante terra e como a meta de quase todos era amealhar o suficiente para poderem tornar-se economicamente independentes e, se possvel, retornar terra natal, no titubeavam em mudar de uma para outra propriedade, desde que com isso, evidentemente, tivessem alguma vantagem que lhes assegurasse maior rendimento. Dentro desse contexto, entende-se ter sido o assunto imigrao dos mais discutidos. E, dentro dele, a validade ou no do emprego do asitico chegou a apaixonar a muitos. Entre julho e agosto de 1892 o Correio Paulistano (14) publicava uma srie de artigos do espanhol Francisco Cepeda, jornalista que viveu em Cuba durante alguns anos. Em seus escritos procurou alertar os brasileiros sobre os problemas a que ficariam expostos caso os asiticos fossem introduzidos no pas. Em sua estada naquela ilha, dizia, pudera observar que os mesmos no se adaptavam, conservavam os seus costumes, a sua religio e a lngua materna. Criticava-os, ainda, pelo uso freqente de pio e a propenso demonstrada para a prtica do suicdio. Afora todos

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esses pontos negativos, a tendncia demonstrada em permanecerem unidos na defesa de seus interesses podia representar um perigo na medida em que no foram raros os casos em que chegaram ao extremo de matar seus prprios patres. Impresses negativas como estas, veiculadas pela imprensa, contriburam, inegavelmente, para a formao de um esteretipo do oriental em geral. Sobre eles se dizia: "se a escria da Europa no nos convm, menos nos convir a da China e do Japo''; a introduo de "elemento tnico inferior" sempre um perigo; ou, em caso de opo, "no h dvida que eu preferiria o europeu, porque teramos [...] os dois elementos: o colonizador, e portanto o povoador do solo, e o trabalhador"; "o chim bom, obediente, ganha muito pouco, trabalha muito, apanha quando necessrio, e quando tem saudades da ptria enforcase ou vai embora" (15). Sem dvida, ao lado dessa preocupao em defender o elemento nacional como um todo, havia tambm a presena de um nacionalismo latente que se far presente anos depois. Interessante observar que todos esses cuidados como que caam por terra sempre que a falta de trabalhadores se fazia sentir mais intensamente. Em tais ocasies o zelo na escolha do elemento a ser introduzido tornava-se menos exigente, aceitando-se a fora de trabalho viesse ela de onde viesse. Foi o que ocorreu, a nosso ver, com os japoneses, como procuraremos demonstrar. No final do sculo passado eram os cafeicultores os maiores interessados na soluo do problema da falta de mo-de-obra, uma constante na lavoura paulista. Embora no fosse pequeno o nmero de entradas, no o era tambm o de sadas pelo porto santista, a ponto de ter havido anos, no incio deste sculo, em que o nmero destas superou o daquelas. Alm disso, o europeu no vinha apresentando um bom ndice de fixao na lavoura cafeeira. Quando no retornava terra natal ou reemigrava para pases vizinhos, dedicava-se a outras atividades. O fato que no permaneciam por muito tempo como assalariados nas fazendas. Ao trmino do ano agrcola, a movimentao de trabalhadores tornava-se intensa e a falta de braos se fazia sentir mais agudamente. Diante dessa situao, os cafeicultores no se satisfaziam apenas em clamar por braos e mais braos pela imprensa. Reuniam-se para, em grupo, pressionar o governo a fim de solucionar o problema. Foi o que fizeram, por exemplo, os proprietrios rurais do municpio de Pedreira, comarca de Amparo. A 3 de agosto de 1892 solicitaram aos deputados

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permisso para introduzir chineses em suas lavouras, pois, diziam, temiam que com a "repatriao dos colonos italianos" a lavoura paulista ficasse ainda mais desfalcada de braos(16). Isto posto, entende-se que a bancada paulista na Cmara dos Deputados tenha, por exemplo, se posicionado a favor do projeto de Monteiro de Barros. No chegou a se declarar inteiramente concorde com o emprego dos asiticos como fora de trabalho, mas se mostrou simptica a uma maior liberdade de imigrao. A dificuldade encontrada pelo Nordeste brasileiro em atrair imigrantes explica por que seus representantes tiveram um comportamento semelhante ao dos paulistas, isto , por que foram favorveis adoo da mo-de-obra asitica. Aps muita discusso, a 24 de setembro de 1892 foi aprovado o projeto de Monteiro de Barros. Isso quer dizer que ficava liberada a entrada no pas, no para o asitico indiscriminadamente, mas para os chineses e japoneses, desde que no estivessem incursos em ao criminal no seu pas de origem(17). Tal preocupao deu origem Lei n. 97, sancionada a 5 de outubro(18). A partir dessa data o Brasil se comprometeu no s a manter relaes diplomticas com a China e o Japo como tambm a enviar agentes diplomticos encarregados, entre outras coisas, de fiscalizar o movimento emigratrio com destino ao nosso pas. O projeto de Monteiro de Barros previa uma certa subveno do governo s companhias introdutoras desde que seus acionistas e organizadores fossem na maioria lavradores ou proprietrios rurais a fim de evitar a formao de sociedades com objetivos unicamente especulativos. A Lei n. 97, traduzindo o pensamento da Comisso de Finana e Colonizao do Senado, no estabeleceu qualquer subveno. O raciocnio dos legisladores foi o seguinte: se por um lado o Brasil no tinha o direito de impedir a vinda de asiticos, por outro, no havia razo que o obrigasse a empatar capital com a introduo desses imigrantes. O fato que aquele dispositivo legal vinha ao encontro das expectativas de vrios segmentos da sociedade, esperanosos de resolver com o imigrante asitico o problema da falta de trabalhadores. Prova disso que, uma vez sancionada a referida lei, comearam a ser divulgados pela imprensa os termos de estatutos e de prospectos de vrias companhias interessadas em introduzi-los no Brasil. A impresso que se tem que as mesmas j estavam organizadas ou em vias de s-lo, aguardando apenas a liberao da entrada de asiticos para comearem a agir. No mesmo ms de outubro, quando foi sancionada a lei, a imprensa divulgava os termos dos estatutos e de um panfleto lanado pela companhia Mutualidade Agrcola(19), cuja sede ficava no Rio de Janeiro, mas

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que tinha uma filial em So Paulo. Entre outras, seguiram-se a ela a Sindicato Paulista(20), a Prado & Jordo(21), ambas na cidade de So Paulo, e a Associao Promotora da Imigrao Asitica(22), na cidade do Rio de Janeiro. Produto da iniciativa particular, todas elas comungavam um objetivo comum: a introduo da mo-de-obra asitica, isto , chinesa e japonesa, no Brasil. A exceo ficava por conta da Prado & Jordo, organizada com o propsito de introduzir unicamente japoneses. Na expectativa de conseguir o maior nmero possvel de associados, tais companhias procuravam atrair interessados, quer fazendo promessas quanto qualidade do trabalhador a ser introduzido, quer oferecendo vantagens quanto forma de pagamento. Na disputa por eles, entretanto, muitos excessos foram cometidos. Embora nem todas se propusessem a introduzir trabalhadores para a indstria, o comrcio e para os servios domsticos, todas objetivavam introduzir agricultores. Alis, caso se efetivassem todas as metas formuladas por essas companhias, os fazendeiros veriam resolvidos, seno todos, pelo menos parte dos problemas que os atormentavam. As intenes eram mltiplas e amplas: introduzir bons trabalhadores, aptos a desempenhar suas funes; fornecer ao imigrante certificado de sua procedncia; manter agentes ou representantes credenciados na China e no Japo para procederem ao recrutamento e fiscalizao do emigrante; garantir a estabilidade da mo-de-obra e despesas no excessivas; auxiliar o proprietrio a efetuar os pagamentos em moeda metlica uma das exigncias dos chineses , e no em espcie, como vinha ocorrendo cornos europeus; evitar a especulao por parte dos agentes; fiscalizar os contratos; sustentar os imigrantes at encontrar-lhes nova colocao, caso houvesse problema na propriedade para a qual fossem destinados; entregar a mo-de-obra no porto de Santos ou outro a combinar; possibilitar ao proprietrio reaver a quantia empregada mediante o desconto no salrio do imigrante; providenciar a presena de intrprete para facilitar as comunicaes, e assim por diante(23). Frente a tantas promessas, caberia aos interessados decidirem-se por esta ou aquela companhia que lhes parecesse mais vantajosa. Apesar de figurarem chineses e japoneses nos estatutos dessas companhias, ao analisarmos mais detidamente a documentao da poca percebemos claramente terem os chineses recebido um tratamento diferenciado. Esse procedimento nada mais foi do que o reflexo da opinio ento corrente, segundo a qual os chineses embora tambm alvo de crticas eram de qualquer forma "superiores" aos japoneses. Essa distino ocorria mesmo durante as discusses no Senado, quando se debatia sobre a convenincia ou no da introduo de asiticos no pas. O

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prprio senador pelo Paran, Ubaldino do Amaral, observou: "costumamos falar somente da China, embora os projetos refiram-se tambm ao Japo"(24). Essa maneira de encarar o japons s comeou a ser paulatinamente modificada quando o Japo saiu vencedor das guerras sino-japonesa de 1894-95 e russo-japonesa do incio deste sculo. O preo cobrado por imigrante a ser introduzido e as condies de pagamento diferiam de uma companhia para outra. Enquanto a Mutualidade Agrcola estipulou o seu em 22 libras (528$000 ris) para os contratados de cinco anos e 16 libras (360$000 ris) para os de dois anos, a Sindicato Paulista pedia 18 libras (384$000) e a Associao Promotora da Imigrao Asitica, 22 dlares (110$000 ris)(25). A disparidade desses valores s pode ser explicada pela nsia, j mencionada, em conseguir o maior nmero possvel de interessados. Com isso, as companhias no atentavam para a prpria exeqibilidade dos planos. Resultado: muitas, no conseguindo manter suas promessas, viram-se obrigadas a desistir de seus propsitos. Foi o que ocorreu, por exemplo, com o Sindicato Paulista, desfeito em 1893. Em sua efmera vida, cerca de dois meses, seus dirigentes mantiveram um verdadeiro dilogo pela imprensa com os representantes da Mutualidade Agrcola, com a publicao de artigos cuja tnica foram as mtuas acusaes(26). Um dos aspectos mais abordados e discutidos foi at que ponto a obteno de mo-de-obra asitica eficiente estaria ou no condicionada garantia, a ser dada ao imigrante pela companhia, de retorno terra natal, vivo ou morto. Isto porque, na poca, o asitico em geral se declarava avesso a emigrar. S o fazia quando pressionado por razes muito fortes. Assim mesmo, ao sair, levava consigo o firme propsito de retornar um dia sua terra natal. Da afirmar-se que a companhia que ignorasse tal fato poderia ser considerada, de antemo, inidnea. Acusaes recprocas tiveram a propriedade de tornar os fazendeiros cada vez mais inseguros quanto escolha a fazer. Diante das inmeras vantagens oferecidas, a incerteza era maior. Muitos proprietrios lanaram mo da imprensa para colocar suas crticas, suas dvidas ou mesmo para solicitar esclarecimentos. As censuras mais comuns referiam-se finalidade lucrativa das companhias, ao fato de os proprietrios no contarem com garantias suficientes e de os imigrantes no terem direito de escolha da propriedade para a qual prestariam seus servios. Quem responderia pelo capital adiantado caso a imigrao no se concretizasse? E no caso de um imigrante se recusar a trabalhar numa determinada propriedade? Eram indagaes freqentes.

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Dois outros pontos foram igualmente questionados. Primeiro, a alegada facilidade em angariar interessados em emigrar. Segundo, at que ponto havia garantia quanto qualidade do elemento a ser introduzido(27). Tais receios tinham sua razo de ser. Os alertas eram mltiplos e de fontes diversificadas. O presidente da Sociedade Promotora de Imigrao, por exemplo, foi informado, telegraficamente, que estavam sendo realizados na China contratos "com extrema curiosidade e em estado de febre", pondo em risco at mesmo a qualidade da mo-de-obra a ser introduzida no Brasil. Para o informante havia o risco de a imigrao chinesa no passar de um negcio lucrativo para as companhias, sem maior interesse para o pas. Assim sendo, era sugerido que fossem tomadas as medidas cabveis no sentido de impedir que agentes inescrupulosos continuassem a agir(28). Sem dvida, a seleo do imigrante era um dos pontos problemticos e que vinha apresentando dificuldades, at com relao aos europeus(29). Diante dessa realidade, muitos se perguntavam o que no aconteceria quando da seleo do asitico. Outros aspectos eram, igualmente, preocupantes. Por exemplo, as condies segundo as quais a Associao Promotora de Imigrao Asitica pretendia introduzir os imigrantes. Henrique R. Lisboa procurou em carta dirigida de Roma ao redator do jornal O Paiz advertir os fazendeiros sobre as providncias a serem tomadas com o intuito de evitar um desastre. Seu principal argumento era a impraticabilidade da introduo de asiticos pela quantia estipulada de 22 dlares. Certamente, dizia, haveria a necessidade de uma complementao. Como, no caso, o governo brasileiro resolvera no dar qualquer subveno, acreditava que a diferena correria por conta do governo chins, interessado em se ver livre de "anarquistas, piratas, malfeitores ou vagabundos"(30). O fator preo, realmente, tinha de ser considerado com cuidado. Tanto que os proprietrios de uma companhia londrina de agenciamento e transporte de imigrantes que mantinha em Hong Kong a linha de vapores Gibb Une declararam que: "se o governo brasileiro reduzir a imigrao chinesa a uma questo de preo andar mal. Nada h mais fcil que obter chins a baixo preo. Os nossos amigos em Hong Kong receberam a (sic) pouco uma oferta do Canto de dois mil sentenciados ao cr-cere daquela cidade como imigrantes para o Brazil ao preo de 2 dlares cada um. Mas se assim for, ns e nossos amigos nos retiramos do negcio, pois o desastre ser certo e nossas casas tem (sic) credito a zelar"(31). Num lado da balana, digamos assim, posicionavam-se as pessoas

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que, preocupadas com o futuro do pas, s admitiam a entrada de asiticos se fossem tomadas precaues mnimas a fim de evitar problemas como os que vinham ocorrendo em outros pases, como, por exemplo, o Peru(32). No outro lado, os lavradores clamando por braos. No porque fosse deficitrio o movimento no porto santista, como ocorreria anos mais tarde, mas porque havia interesse em introduzir um nmero grande de imigrantes a fim de manter o mercado de ofertas de braos num nvel bom e, assim, procurar estabilizar os salrios, ento, com ntida tendncia alta. A vinda do asitico, portanto, estava sendo encarada sob os mais diferentes prismas. Numa representao da Cmara Municipal da cidade de So Jos do Rio Preto ao Congresso paulista foi deixado claro que a vinda do asitico seria importante, entre outras coisas, para que fosse obtida a "organizao e normalizao do trabalho entre ns"(33). Tanto a China como o Japo, diretamente interessados num movimento emigratrio em direo ao nosso pas, com o intuito de se posicionar melhor, acharam por bem enviar pessoas especialmente encarregadas de verificar a real situao do Brasil e, mais particularmente, a da lavoura, pois era para ela que seriam encaminhados os futuros emigrantes. Em 1893, da parte do governo japons, visitou o nosso pas Sho Nemoto. Na qualidade de comissrio do Ministrio das Relaes Exteriores do Japo ele conheceu os estados de Pernambuco, Bahia, Minas Gerais e So Paulo, onde teve a oportunidade de conhecer a Hospedaria de Imigrantes da capital e algumas fazendas do interior. O seu relatrio reflete a boa impresso que lhe causou aquilo que viu, a ponto de ter prognosticado que no Estado de So Paulo seria possvel ao emigrante japons se estabelecer para sempre, como podemos ver neste trecho: "Poderemos melhorar o nvel de vida, obter propriedades, dar educao a nossos filhos e viver com alegria sem que nada nos falte"(34). Desde 1890 vinham se multiplicando no Japo companhias de cunho particular organizadas com o objetivo de reunir e encaminhar emigrantes para o Hava. Em 1898 o seu nmero j era de uma dezena(35). Pois bem, em 1894 uma daquelas companhias, a Kichisa lmin Kaisha, ao que consta, teria entrado em contato com a companhia paulista Prado & Jordo a fim de combinar a vinda da mo-de-obra japonesa para So Paulo. Desconhecemos maiores detalhes dessa tentativa. Segundo Hiroshi Saito, a inexistncia de relaes oficiais entre os dois pases, o que s ocorreu a partir de 5 de novembro de 1895 com a assinatura do Tratado

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de Amizade Brasil/Japo(36), explicaria o no-prosseguimento das negociaes (37). Certamente no foi este o nico empecilho. Justamente nessa ocasio, ou mais precisamente a 29 de agosto de 1895, surpreendentemente por ser, dos estados, aquele em que os lavradores mais clamavam por braos, foi baixada uma lei em So Paulo, a de n. 356, que limitava a vinda de seus imigrantes aos procedentes dos continentes europeu, americano e africano(38). Segundo esse dispositivo legal, s seriam admitidos da Europa os italianos, suecos, alemes, noruegueses, suos, holandeses, dinamarqueses, ingleses, austracos, portugueses e espanhis, estes ltimos restritos aos procedentes da Galcia, Navarra e Vascongadas. Das Amricas, os canadenses da provncia de Quebec e os naturais da ilha de Porto Rico. Da frica, apenas os canarinos. Minas Gerais, ao contrrio, ao criar, em 1893, a partir do Decreto n. 612, a infra-estrutura necessria implementao do movimento imigratrio para o seu estado, admitiu a entrada de asiticos. Nos artigos de nmeros 14,25 e 37 estabeleceu em que condies o faria, a saber: seria de 25 o nmero mximo de trabalhadores subsidiados pelo governo por propriedade agrcola; manteria superintendentes e emissrios na sia de acordo com as necessidades e uma hospedaria especial para os asiticos, onde o prazo de permanncia dos mesmos seria igual ao que gozavam os europeus, isto , de trs dias, salvo situaes de carter excepcional(39). Naquele mesmo ano, no Estado do Rio de Janeiro, estudava-se a possibilidade de introduo de 500 asiticos(40). So Paulo no acompanhou os seus vizinhos neste particular. O interesse crescente das companhias japonesas em colocar a mode-obra nipnica em nosso pas fazia com que enviassem representantes seus ao Brasil. Foi o que fez a Kichisa Imin Kaisha em 1897. Em contato com a Prado & Jordo, ficou acertada a vinda de trabalhadores japoneses para a lavoura paulista. Reorganizada a companhia japonesa, a ela sucedeu a Toyo Imin Goshi Kaisha, que foi o nome que constou no contrato ento assinado. Segundo o mesmo, os japoneses viriam pelo prazo de cinco anos, a contar da data da chegada ao local de trabalho. Seriam agricultores com idade entre 20 e 35 anos. O salrio mensal previsto foi de 30 shillings (47$100 ris), quantia esta cuja metade seria paga no Brasil e a outra no Japo. Desta ltima 50% seriam depositados na companhia e o restante enviado para o emigrante no Brasil(41). Uma vez na fazenda, o imigrante teria direito a duas mudas anuais de roupa e moradia com banheiro japons. Caberia Prado & Jordo responder pelas passagens de ida e volta e pela alimentao a bordo.

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Do imigrante era cobrado pela companhia japonesa, a ttulo de comisso, 18 yens (11 $398 ris) e de cautela, 40 yens (25$331 ris), quantias essas que, somadas, representavam cerca de 78% do salrio mensal do imigrante. Tratava-se, portanto, de uma imigrao temporria nos moldes do que j vinha ocorrendo em outros pases sul-americanos. Segundo Hiroshi Sai to, o recrutamento de 1.500 pessoas previstas para comporem a primeira leva chegou a ser efetuado(42). No temos elementos para comprovar esse nmero. Todavia encontramos na documentao do Ministrio das Relaes Exteriores do Japo indcios de que, na ocasio, emigrantes com destino ao Hava teriam desistido de faz-lo em favor do Brasil. Por outro lado, o chefe do Departamento de Comrcio Exterior do referido Ministrio encaminhou solicitao aos governadores de diferentes provncias japonesas no sentido de que fossem abrandadas, em carter excepcional, as exigncias que usualmente eram impostas aos imigrantes para obterem autorizao de viagem e passaporte, para aqueles que estivessem de partida para o Brasil(43). No h portanto dvida quanto existncia de negociaes na ocasio. E no foram as nicas. Conhecem-se os termos da resenha de um contrato para a introduo de nipnicos, que foram at considerados duros por um elemento ligado a A. Fiorita, uma das companhias especializadas na introduo de imigrantes(44). Cruzando informaes, acreditamos, embora no possamos afirmar, por falta de provas mais concretas, que as partes envolvidas nesse contrato foram a prpria A. Fiorita e a Nippon Imin Kaisha(A5). Tratava-se, tambm, de uma imigrao temporria. Os imigrantes viriam por um perodo mnimo de trs anos, sendo que apenas um quarto deles viria acompanhado das respectivas famlias. O salrio fixado para os homens foi de 4 libras (125$600 ris) e as horas extras pagas razo de 4 pences ($523 ris). No caso das mulheres, o pagamento seria com base em trs quartas partes desses valores. Qualquer deduo nos vencimentos s seria permitida por falta no justificada ao servio ou por motivo de sade. Ao imigrante foi assegurado descanso na primeira semana aps a chegada, bem como nos dias santificados, aos domingos, no Natal e no dia 3 de novembro, data natalcia do Imperador. Ao contratante caberia responder pelas despesas com o transporte dos imigrantes, e mais: fornecer moradia, lenha, gua e assistncia mdica em caso de doena; indenizar, nos casos de morte e invalidez, razo de 50 libras (1:570$000 ris); pagar 40 libras (1:256$000 ris) ao inspetor; providenciar a vinda de intrpretes e apontadores para cada

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grupo de 200 imigrantes introduzidos; e remunerar a companhia japonesa em 3 libras (94$200 ris) por imigrante para cobrir as despesas com o angariamento. Assim sendo, ficava por conta do imigrante apenas o provimento de sua alimentao e vestimenta. A companhia japonesa, por seu turno, caberia providenciar o exame mdico dos emigrantes, antes do embarque; a devoluo, ao contratante, da importncia por ele adiantada caso algum elemento fosse considerado no apto a desempenhar suas funes ao chegar ao Brasil; o reembolso das despesas proporcionais aos dias de trabalho, nos casos de abandono do servio por parte do trabalhador, durante a vigncia do prazo contratual; e, enfim, a nomeao de um inspetor que, alm do japons, falasse o portugus ou o francs para facilitar a comunicao entre as partes(46). A 12 de dezembro de 1897 o Dirio Oficial do Estado de So Paulo publicava um despacho da Secretaria da Agricultura em resposta a uma consulta da companhia A. Fiorita sobre os direitos dos japoneses. De acordo com a Secretaria, os nipnicos teriam direito a passagem gratuita do porto de Santos ao local de destino e, tambm, a agasalho na Hospedaria da capital, como de resto ocorria com os demais imigrantes (47). Era esta a situao, quando ocorreu a brusca queda na cotao do caf no mercado internacional. O Brasil, em conseqncia, passou por uma sria crise de superproduo, que foi, em ltima instncia, a responsvel pela suspenso das negociaes. Nessa ocasio foi considerada, tambm, a possibilidade de introduo do nipnico nos estados do Amazonas e do Par para os servios de coleta da borracha. O ministro-residente japons, Chinda, manifestou-se, em 1898, contrrio a uma eventual emigrao de seus patrcios para essa regio. Mesmo assim a companhia A. Fiorita tentou, junto Toyo Imin Goshi Kaisha, combinar os detalhes de um movimento emigratrio que do Japo fosse para esses estados. O sucessor de Chinda, Narinori Ohkoshi, em 1900, ao externar sua opinio sobre o assunto ao ministro das Relaes Exteriores do Japo, Visconde Shuzo Aoki, destacou esses estados como a "pior regio do Brasil". A seu ver os imigrantes ficariam expostos constante ao de ares malficos, convivncia com numerosos alagadios e submetidos ao calor escaldante do sol equatorial, fatores todos inteiramente inadequados ao bem-estar dos nipnicos. Alm do mais, completava, as condies de trabalho a que ficariam expostos seriam extremamente desgastantes a ponto de os prprios ndios da regio apresentarem altas taxas de mortalidade ou ficarem com sua sade seriamente comprometida aps alguns anos de trabalho.

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Isto tudo, ao lado de condies precrias de habitao, fazia com que ele no acreditasse na possibilidade de qualquer sucesso no empreendimento. Concluso: aconselhava que no fosse dada autorizao para a emigrao em questo(48). Nessa ocasio o Inspetor Geral de Polcia recebeu do Chefe do Departamento de Comrcio Exterior uma solicitao no sentido de que o responsvel pela companhia Toyo Imin Goshi Kaisha deveria ser colocado a par da situao e aconselhado a desistir do seu intento (49). Acontece que essa companhia, a 9 de agosto havia solicitado orientao junto ao Ministrio das Relaes Exteriores de seu pas, e como no lhe fora colocado nenhum problema, a no ser a recomendao da tomada de certos cuidados como, por exemplo, o estabelecimento de um fundo de garantia e a incluso de clusulas bem-def inidas de arbitramento em caso de litgio, a Toyo Imin Goshi Kaisha prosseguira em suas negociaes. Da, em sua resposta, o responsvel pela companhia haver esclarecido que, diante da autorizao recebida anteriormente, despesas haviam sido feitas. Uma interrupo nas negociaes quela altura, dizia, seria muito prejudicial para a administrao da Companhia. Diante disso, solicitava licena para dar continuidade s negociaes(50), mas no foi ainda nessa ocasio que teve incio o to esperado movimento emigratrio Japo/Brasil. Apesar do empenho das companhias, tanto japonesas como brasileiras, nenhuma delas conseguiu levar avante o empreendimento, mesmo porque as autoridades japonesas, cientes da situao econmica do Brasil, passaram a desaconselhar a sada de seus sditos para o nosso pas. No Brasil, ao contrrio, vrios segmentos da sociedade continuavam a pressionar o governo. A Sociedade Paulista de Agricultura, por exemplo, sugeriu ao secretrio da Agricultura, Antnio Cndido Rodrigues, que o governo mandasse vir nipnicos(51) para equilibrar a oferta de braos no mercado. Enquanto pde, o governo de So Paulo procurou abster-se de participar ativamente do movimento imigratrio em questo. Todavia, a presso constante, sobretudo dos cafeicultores, uma realidade preocupante, que era a existncia de milhares de cafeeiros necessitando de trato, a dificuldade crescente em obter trabalhadores na Europa e o baixo ndice de fixao dos imigrantes na lavoura, tudo isso o levou a capitular. Aps anos de recusa, o governo do Estado de So Paulo, em mos de Francisco de Paula Rodrigues Alves, resolveu subvencionar a vinda de japoneses desde que fossem, evidentemente, respeitadas determinadas condies. Entre elas, as famlias deveriam ser compostas no mnimo por trs elementos aptos para o trabalho, isto , com idade entre 12 e 50 anos; o

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contratante no poderia prometer tratamento, salrio, direitos e obrigaes diferentes daqueles de que gozavam os europeus; e dois intrpretes deveriam acompanhar os imigrantes quando de sua vinda e aqui permanecerem at o trmino do contrato a fim de possibilitar o dilogo entre as partes. Estes e outros pormenores ficaram perfeitamente claros no contrato que a 26 de setembro de 1900 foi assinado entre o governo do Estado de So Paulo e o concessionrio Marciel Sanz de Elorz(52). Elorz ficou encarregado de trazer at Santos, em um ano e meio, 600 famlias nipnicas; responder pelas despesas de bordo durante as 30 primeiras horas, caso houvesse impedimento por ocasio do desembarque; e repatriar em 90 dias todo imigrante que, no Brasil, fosse considerado "vagabundo ou desordeiro". O governo do Estado comprometeu-se a arcar com as despesas de transporte do imigrante de Santos at a Hospedaria da capital e agasalhlo ali durante oito dias como, alis, ocorria com os demais imigrantes. E mais: pagar por imigrante entre 12 e 50 anos a importncia de 7 libras (178$605 ris); 3 libras e 6 shillings (84$199 ris) para os de 7 a 12 anos e 1 libra e 3 shillings (15$309 ris) para os de 3 a 7 anos. O pagamento deveria ser efetuado, ao cmbio do dia, em moeda corrente e no prazo de 15 dias aps a chegada Hospedaria. A cada pagamento era retida no Tesouro Nacional a importncia correspondente a 5% do total, a ttulo de cauo. Tal quantia s era devolvida ao introdutor aps 90 dias do desembarque dos imigrantes. E era dessa quantia que o Estado faria uso caso o introdutor no repatriasse os elementos no aprovados no Brasil. Ao lado das obrigaes, ficaram bem definidos, tambm, os direitos das partes. Assim, aos imigrantes foram garantidos, por um lado, a liberdade de escolha da propriedade para a qual prestariam seus servios e, por outro lado, o gozo de regalias iguais aos demais imigrantes. Ao introdutor, o direito de cobrana de uma taxa, a ttulo de indenizao das despesas a que ficava obrigado, de todos os lavradores interessados em contar com o concurso daquele brao em suas propriedades. Enfim, a clusula de n.ll previa, em situaes especiais, a dilata do prazo estabelecido para a introduo dos nipnicos. Elorz foi obrigado a lanar mo dela mais de uma vez em razo das dificuldades que encontrou, no Japo, para colocar em prtica os seus propsitos. Elas foram de tal ordem que Elorz chegou a solicitar alterao nos termos contratuais no que dizia respeito ao nmero de pessoas a introduzir e ao preo por pessoa(53). Tais solicitaes foram prontamente atendidas pelo governo. Assim,

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a partir de 26 de abril de 1900(54) o prazo de 18 meses foi mantido, mas com a contagem a partir dessa data. Portanto, foi dilatado. O nmero de elementos a introduzir passou a ser de 350 famlias de agricultores e 400 homens ss ou, ento, somente 450 famlias. A solicitao de reduo de 3 para 2 elementos em idade entre 12 e 50 anos, por famlia, foi aceita. Enfim, a subveno foi alterada de 7 para 10 libras (213$040 ris) para os imigrantes com idade entre 12 e 50 anos; 5 libras (106$520 ris) para os de 7 a 12 anos e de 2 libras e 3 shillings (53$260 ris) para os de 3 a 7 anos. Apesar de ter conseguido todas essas alteraes, as dificuldades continuaram grandes. Tanto que, em maro de 1902, o responsvel pela Legao Brasileira de Tokyo informava a Olinto Magalhes, Ministro das Relaes Exteriores, ter a certeza de que o governo nipnico no estava disposto a concordar com a vinda de seus sditos para o Brasil. Em contato com o Baro Komura, ministro das Relaes Exteriores do Japo, aquela autoridade fora taxativa: o governo japons no pretendia, sob qualquer hiptese, autorizar a sada de emigrantes para o Brasil, em razo da distncia entre os dois pases, da falta de comunicao regular entre eles e pelo fato de no disporem as companhias dos meios pecunirios necessrios para responder pelo repatriamento, caso a experincia no desse os resultados esperados(55). Naquele mesmo ms o inspetor geral de Polcia do Japo e os governadores das provncias de Kanagawa, Hyogo, Hiroxima, Kumamoto, Wakayama, Okayama e Chiba foram alertados pelo ministro das Relaes Exteriores do Japo no sentido de que no deveriam conceder licena de emigrao para o nosso pas(56). Portanto, o Japo no pretendia mesmo, quela altura, liberar a sada de seus sditos para o nosso pas. Baldadas foram as reiteradas tentativas de Sanz de Elorz. Em uma detalhada carta, datada de 10 de abril de 1902, endereada ao secretrio da Agricultura, Antnio Cndido Rodrigues, ele historiou a situao difcil em que se encontrava para dar cumprimento ao que se comprometera em contrato. A seu ver, grande parte de seu insucesso era fruto da divergncia de opinio entre a emigrao proposta pelo ministro do Japo no Brasil, Narinori Ohkoshi, e o que pretendia o governo paulista. Enquanto o primeiro propunha a vinda do japons como pequeno proprietrio, a poltica imigratria brasileira visava, com aquele movimento, fornecer para a lavoura trabalhadores assalariados. Para Sanz de Elorz nessa divergncia que residia "o porqu da guerra aberta que nos foi feita". Continuando, informava que ao longo de seis anos pronunciara conferncias nas cmaras de comrcio japonesas e escrevera artigos em

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peridicos locais procurando contrapor os informes negativos que circulavam sobre o Brasil. Em vo tinham sido seus esforos, pelo menos at ento. Em razo do exposto, props a substituio de japoneses por chins. O despacho de 31 de maio de 1902 foi negativo em razo de o chim ser considerado um elemento "altamente inconveniente e prejudicial" ao pas(57). Apesar de cientificado a 21 de junho desse ano da resoluo do governo japons de no permitir a referida emigrao por razes de "economia domstica", Sanz de Elorz, mesmo assim, no desistiu. Continuou tentando, at mesmo junto ao governo do Estado de So Paulo, encaminhando solicitaes de alteraes nos termos contratuais ou, ento, ampliao nos prazos estabelecidos. A. Fiorita, por seu turno, sugeriu a substituio dos japoneses por espanhis ou italianos. Alegava, entre outras vantagens, o fator preo, pois enquanto para a vinda de um japons adulto as despesas eram da ordem de 10 libras (202$370 ris), as mesmas no ultrapassavam 5 libras e 15 shillings (116$362 ris) se se tratasse de um espanhol adulto. Com o indeferimento, a 9 de outubro de 1903, de mais um pedido de Sanz de Elorz feito no primeiro dia desse ms, foi colocado um ponto final nessas negociaes(58). Trs anos apenas aps essa data, em 1906, percebe-se pelo volume da correspondncia e seu teor, que houve um reaquecimento no interesse dos sditos daquele imprio em emigrar para o Brasil. Dentre essa multiplicidade de fatores que podem explicar tal fenmeno vale destacar: uma maior estabilidade na situao econmicofinanceira do Brasil; o fato de o grande xodo rural-urbano do Japo no ter encontrado uma indstria suficientemente desenvolvida a ponto de poder absorver a mo-de-obra excedente do campo, resultando da um grande nmero de desempregados nos centros urbanos; as crescentes dificuldades de colocao dos emigrantes em pases como os Estados Unidos, por exemplo, tradicionalmente receptores do brao nipnico; e assim por diante. Afora tais aspectos, h um outro que no pode ser menosprezado: o surgimento de opinies favorveis ao movimento entre autoridades japonesas de destaque. Um exemplo a opinio do ministro Plenipotencirio do Japo, Sugimura, para quem: "Proibida a entrada na Austrlia, discriminados nos Estados Unidos, perseguidos no Canad e, agora, limitados tambm no Hava e ilhas do Pacfico, os nossos trabalhadores encontraro no Estado de So Paulo uma rara felicidade, um verdadeiro paraso" (59). Uma consulta encaminhada ao Ministrio das Relaes Exteriores do Japo pela Cmara de Comrcio de gaki(60) e outra do chefe da vila

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de Shirosatoi, da Provncia de Gunma(61), deixam transparecer a curiosidade e o interesse que havia no s em relao s exigncias feitas queles que quisessem emigrar como tambm em relao s condies de trabalho e de vida oferecidas pelo Brasil. Se, a princpio, So Paulo pensou em colocar o nipnico como assalariado nas fazendas de caf, o Rio de Janeiro teve a inteno de empreg-lo no cultivo do arroz, o Amazonas e o Par tentaram o seu emprego na coleta da borracha, Minas Gerais cogitou da sua participao nos servios de minerao. Por volta de 1906 a direo da mina de ouro Morro Velho manifestou-se favorvel ao emprego de nipnicos em suas dependncias. Desde 1834 em mos de ingleses(62), respondia pela superintendncia da mesma George Chalmers quando a mina foi visitada por Shun Sugimura, Ministro-Residente no Brasil, encarregado de verificar as condies de trabalho a que seriam submetidos os sditos do Imprio. Diante do que lhe foi dado observar, Sugimura acreditava que no haveria explorao desumana dos imigrantes, mesmo porque a inteno inicial era empreg-los mais no beneficiamento do minrio do que no interior da mina. Como a temperatura interior poderia se constituir num srio problema, sua sugesto foi no sentido de o japons ser colocado, inicialmente, em servios externos e s paulatinamente conduzido para dentro da mina. Mesmo assim, pessoalmente, era mais pela colocao do japons na lavoura do que nos servios de minerao. De qualquer forma, encaminhava a relao de pontos positivos e negativos que pudera observar a fim de que fossem submetidos a estudos pelos rgos competentes. E mais: como a Toyo Imin Goshi Knislm possua representao na capital inglesa, poderia manter contato direto com os responsveis por aquela companhia mineradora(63). Se, por parte do governo nipnico, houve interesse em conhecer as condies oferecidas pelo Brasil aos seus sditos, o governo do Estado de So Paulo tambm ho permaneceu indiferente. Carlos Botelho, ento secretrio da Agricultura, diante das dificuldades crescentes em obter o brao europeu ainda mais agravadas com a proibio, em 1902, da vinda de imigrantes italianos com a passagem subsidiada resolveu enviar Edmundo Fonseca, Comissrio de Imigrao, em visita -a alguns pases que haviam recebido aquela mo-deobra(64). Na Argentina, no Chile ou mesmo nos Estados Unidos, que teve a oportunidade de visitar, no ouviu qualquer crtica desabonadora a respeito do carter, da ndole ou das ambies dos japoneses. As crticas mais generalizadas que se faziam a eles eram j sobejamente conhecidas,

ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 55

isto , o fato de no se fixarem e no se assimilarem, formando um grupo parte(65). Diante dos resultados positivos dessa inspeo, segundo Carlos Botelho, foi que o governo paulista resolveu concordar com a introduo de 3 mil japoneses em carter experimental. Para tanto foi assinado um contrato entre o governo do Estado de So Paulo e a Empire Emigration Company, a 6 de novembro de 1907(66). A propsito desse acordo, Carlos Botelho afirmou em seu relatrio anual: "o pensamento que levou este Secretrio a propor-vos o ensaio desta nova fonte de imigrao foi exclusivamente, como j aludi a princpio, a preocupao de fornecimento de braos para a lavoura cafeeira,,(67). No era esta, entretanto, a nica razo. Havia outras. Entre elas, a esperana de conseguir, tambm, com o desenvolvimento das relaes comerciais entre os dois pases, a conquista de um novo mercado para o nosso principal produto de exportao, o caf(68), uma das metas do governo paulista a partir do Convnio de Taubat de 1906(69). Foi em razo do referido contrato que a 18 de junho de 1908 atracou no porto santista o Kasato-Maru, dando incio, oficialmente, imigrao japonesa em nosso pas. A imigrao teve, como procuramos demonstrar, de vencer uma srie de obstculos, no Brasil e no Japo, impostos pela opinio pblica, pela imprensa e pelos rgos governamentais que se manifestaram muitas vezes contrrios a esse movimento por razes as mais diversas. Isto tudo afora as limitaes impostas por leis e decretos promulgados tanto no nvel federal quanto estadual. Apesar de todos esses percalos, o imigrante aqui chegado em 1908 debaixo de tantas apreenses passados 80 anos aqui permanece, na figura de seus descendentes, brasileiros natos, prestando uma colaborao inestimvel ao pas nos mais diversos setores de atividades, como ser analisado nos captulos que seguem. (Arlinda Rocha Nogueira) 1 (Prof. Dra. do Instituto de Estudos Brasileiros da USP). NOTAS BIBLIOGRFICAS (1) Petrone, MariaTherezaSchorer. "Imigrao". In: Fausto, Boris. ed. (Histria Geral da Civilizao Brasileira). Rio de Janeiro, Difel, 3 (2):97,1977 (III. O Brasil Republicano, 2. Sociedade e Instituies (1889-1930). (2) Zlotnick, Hania. Measuring international migration: theory and practice. IMR (International Migration Review). New York, 21:5,1987. (3) O Auxiliador da Indstria Nacional. Rio de Janeiro, 38:319,1870. (4) Digues Jr., Manuel. Imigrao, urbanizao e industrializao: estudo sobre

56 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO alguns aspectos da contribuio do imigrante no Brasil. Rio de Janeiro, Ministrio da Educao e Cultura, 1964, p. 15 (Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, Srie 6, Sociedade e Educao, 5). Nessa estada, entre outras, deixaram a tcnica de mergulhia. (O Auxiliador da Indstria Nacional, cit., 8:256, ago. 1843. Sobre o assunto vide: Elias, Maria Jos. Introduo ao estudo da imigrao chinesa. Anais do Museu Paulista. So Paulo, 24:55-93,1970. O Auxiliador da Indstria Nacional, cit., 38:326, 1870. Hall, Michael M. Reformadores da classe mdia no Imprio brasileiro: a Sociedade Central de Imigrao. Revista de Histria, So Paulo, 53(105):160, jan./mar. 1976. Martins, Oliveira. O Brazil e as colnias portuguezas. Lisboa, Bertrand, 1880, p. 151-4. Brasil. Congresso Nacional. Annaes da Cmara dos Deputados. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1892, v. 5, p. 194. Sobre o assunto vide: Nogueira, Arlinda Rocha. Companhias interessadas na introduo de asiticos em So Paulo nos primeiros anos da Repblica. So Paulo, Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1979, p. 2-3. Decretos do Governo Provisrio da Repblica dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1890, p. 1.424. Brasil. Congresso Nacional. Annaes do Senado Federal. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1892, v. 1, p. 136,157. Brasil. Congresso Nacional. Annaes da Cmara dos Deputados. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1892, v. 2, p. 11. Cepeda, Francisco. Lo que son los Chinos. Correio Paulistano. So Paulo, 19, 21, 22, 24, 26, 28, 31/7 e 4/8,1892. Nogueira, Arlinda Rocha. Companhias interessadas na introduo de asiticos em So Paulo nos primeiros anos da Repblica, cit., p. 8-9. Brasil. Congresso Nacional. Annaes da Cmara dos Deputados, cit., 1892, v. 5, p. 207. Ibid., p. 534. Colleco das Leis da Repblica dos Estados Unidos do Brasil de 1892. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1893, p. 104. Correio Paulistano. So Paulo, 19/11/1892. Ibid., 15/12/1892. O Estado de S. Paulo, So Paulo, 1.711/1894. Ibid., 4/3/1893. Nogueira, Arlinda Rocha. Companhias interessadas na introduo de asiticos em So Paulo nos primeiros anos da Repblica, cit. Brasil. Congresso Nacional. Annaes do Senado Federal, cit., 1892, v. 3, p. 160. Correio Paulistano, So Paulo, 19/11,15/12/1892. Nogueira, Arlinda Rocha. Companhias interessadas na introduo de asiticos em So Paulo nos primeiros anos da Repblica, cit., p. 23-6. Correio Paulistano, So Paulo, 1892/3. O Estado de S. Paulo, So Paulo, 1892/3. Correio Paulistano, So Paulo, 11/2/1893. Barrozo, Zzimo. Emigrao italiana. O Estado de S. Paulo, So Paulo, 29/7/ 1891. O Estado de S. Paulo, cit., 11/4/1893.

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ANTECEDENTES DA IMIGRAO JAPONESA NO BRASIL 57 So Paulo. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Requerimentos Diversos (1878-1904). Mao 1A-07218. Pastor, Humberto Rodrigues. La rebelin de los rostos-pintados. Peru, Instituto de Estudos Andinos, 1979. Correio Paulistano. So Paulo, 25/4/1893. Kowyama, Rokuro. Quarenta anos de imigrao. (Transi. Imin 40 nen shi). So Paulo, 1949, p. 6. Saito, Hiroshi. O japons no Brasil. Estudo de mobilidade e fixao. So Paulo, Fundao Escola de Sociologia e Poltica, 1961, p. 26. Anurio das Relaes Exteriores. (Transi. Nihon Gaiko Ncnpy). Tokyo, Nihon Gaimusho (Ministrio das Relaes Exteriores do Japo), 1955, p. 121. Saito, Hiroshi. op. cit., p. 26, 27. Coleco das Leis e Decretos do Estado de So Paulo (1895-96). So Paulo, 1896, p. 41 (Atos do Poder Legislativo). Minas Gerais. Leis, decretos etc. Coleo das Leis e Decretos do Estado de Minas Gerais em 1893. Ouro Preto, 1893, p. 277-89. Mensagem eninada Assemblia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro pelo primeiro vice-presidente Manoel Martins Torres, na 2." sesso ordinria 2." de agosto de 1893. Rio de Janeiro, 1893, p. 12. Saito, Hiroshi. O japons no Brasil, cit., p. 27. Idjbid., p. 27. Instituto de Estudos Brasileiros da USP, (IEB) MIC 73.1, fls. 12-21. Trad. Katsunori Wakisaka. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Requerimentos Diversos. Lata 115. Saito, Hiroshi. O japons no Brasil, cit., p. 27. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Requerimentos Diversos. Lata 115. Dirio Oficial do Estado de S. Paulo, So Paulo, 12/12/1897. IEB. MIC. 73.1, fls. 37-42. Trad. Katsunori Wakisaka. Ibid., fls. 43-5. Md., fls. 47-51. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1906. Mao s/n.. Assunto: memorial a respeito da imigrao japonesa dirigido Sociedade Paulista de Agricultura, p. 1. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1906. Mao s/n.. Assunto: contrato para a introduo de imigrantes. So Paulo. Tip. do Dirio Oficial, 1901, p. 1-8. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1901. Mao s/n.. Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1906, Mao s/n., p. 9,10. Assunto: contrato para a introduo de imigrantes. So Paulo, Tip. do Dirio Oficial, 1901. . Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1901. Mao s/n.. IEB. MIC. 73.1, fls. 88-90. Trad. Katsunori Wakisaka. (57) Arquivo do Estado de So Paulo. Secretaria da Agricultura. Ano 1901, Mao s/n..

58 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO (58) (59) (60) (61) (62) (63) Ibid. Saito, Hiroshi. O japons no Brasil, cit., p. 29. IEB. MIC. 73.1, fls. 92-4. Trad. Katsunori Wakisaka. Ibid. fls. 97-9. Hollowood, Bernard. A histria de Morro Velho. Trad. Lcia Machado de Almeida. Londres, The St. John d'El Rey Mining Company, 1955. IEB. MIC. 73.1, fls. 104-13. Trad. Katsunori Wakisaka. A propsito do assunto vide: Nogueira, Arlinda Rocha. Contribuio para o estudo da imigrao japonesa em Minas Gerais (1889/30). In: V Seminrio de Estudos Mineiros. A repblica velha em Minas. Belo Horizonte, UFMG/PROED, 1982, p. 215-57 (Faculdade de Filosofia e Cincias Humanas. Centro de Estudos Mineiros). Relatrio apresentado ao dr. Jorge Tibiri, Presidente do Estado, pelo dr. Carlos Botelho, Secretrio da Agricultura, referente ao ano de 1907. So Paulo, Secretaria da Agricultura, 1908, p. 23, 24. Arquivo do Estado de So Paulo. Processos da Secretaria da Agricultura. Ano 1907. Mao s/n.. Pasta 1.259. Interessado: Edmundo da Fonseca. Relatrio apresentado ao dr. Jorge Tibiri, Presidente do Estado, pelo dr. Carlos Botelho, Secretrio da' Agricultura, relativo ao ano de 1901, cit., p. 138-42. Naquele mesmo ano foi assinado um contrato para a fundao de ncleos coloniais de japoneses na baixada fluminense (Ascoli, Nestor. A imigrao japoneza para a Baixada do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Ed. Revista da Lngua Portuguesa, 1924, p. 11). Ibid., p. 137. Anaes da Seo Extraordinria e Ordinria de 1906. So Paulo, Cmara dos Deputados do Estado de So Paulo, 1907, p. 480. Minas e o bicentenrio do cafeeiro no Brasil (1727-1927). Belo Horizonte, Secretaria da Agricultura de Minas Gerais, 1929, p. 62.

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5. ALGUNS EPISDIOS HISTRICOS Situados nos antpodas, Brasil e Japo p e r m a n e c e r a m m u t u a m e n t e desconhecidos at a s e g u n d a m e t a d e do sculo XIX. Pode-se inferir, p o r m , q u e os brasileiros tivessem a l g u m conhecimento do Japo antes de este adquirir noes de geografia mundial, o que se d e u aps a reabertura de seus portos (1854). Eis por que: Marco Polo (1254-1324) foi o primeiro ocidental a falar n u m pas chamado Cipangu ou Zipang (Japo), no seu famoso livro de viagens escrito d e p o i s d a volta d e u m a estada d e q u a s e d u a s d c a d a s n a China. Lus Vaz de C a m e s (1524-1580) cita o Japo no C a n t o X, d o s Lusadas. Pouco depois do descobrimento do Brasil, p o r t u g u e s e s c h e g a r a m ao Japo (1543) e o p a d r e jesuta Francisco Xavier iniciou em 1549 u m a p r o m i s s o r a obra missionria. No Brasil, igualmente, os jesutas foram os primeiros missionrios a pregar o Evangelho. No comeo do sculo XVII havia a l g u m a s centenas de escravos

A L G U N S EPISDIOS HISTRICOS

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japoneses em Lisboa. Diante desses fatos, lcito supor que intelectuais brasileiros tivessem tomado conhecimento da existncia de um pas chamado Japo, bem antes de os nipnicos terem alguma informao a respeito do Brasil. No Japo, o primeiro livro de geografia que cita o Brasil Sekai Kokumei Shoran (Relao Completa de Nomes de Pases do Mundo), de Yukichi Fukuzawa 1 . At ento o Brasil era completamente desconhecido dos japoneses. E a primeira referncia ao Brasil relacionada com o caf apareceu em 1878, num boletim que falava da Europa e das Amricas. Alguns acontecimentos que relacionam os dois pases: Em 1773, o barco a vela Wakamiya-Maru, que sara do porto de Ishinomaki, na atual provncia de Miyagi, naufragou no Mar do Japo. Salva por uma embarcao russa, a tripulao foi conduzida a So Petersburgo, via Sibria. Em 1803, aps 30 anos de permanncia na Rssia, quatro sobreviventes foram repatriados, em dois navios de guerra russos. A viagem foi feita via Oceano Atlntico. Ao navegar rumo sul, um dos navios sofreu avaria e ambos aportaram em Desterro (atual Florianpolis), onde permaneceram durante dois meses para reparos. Os quatro nipnicos desceram a terra e entraram em contato com os homens e a natureza de Santa Catarina. Os navios chegaram ao Pacfico pelo estreito de Magalhes, subiram at a pennsula de Kamchatka, de onde os japoneses, embarcados em outro navio, foram levados a Nagasaki. Desembarcaram nesse porto em 1805. Foram os primeiros japoneses que conheceram uma cidade brasileira. E tambm foram os primeiros nipnicos a realizar a viagem ao redor do mundo. O navio a vapor Kaiy-Maru, construdo na Holanda por encomenda do xogunato Tokugawa, zarpou do porto de Vlissingen em dezembro de 1866 rumo ao Japo. A bordo viajavam quatro jovens que haviam ido estudar naquele pas: Takeaki Enomoto (1836-1908), Tsunejiro Uchida, Tarozaemon Sawa, Shunpey Taguchi, e mais cinco tcnicos. Cruzando o Atlntico, o navio chegou ao Rio de Janeiro no dia 21 de janeiro de 1867. Os nove passageiros desceram a terra e visitaram a cidade. Enomoto, que comandou a resistncia xogunal em Hakodate (Hokkaido), posteriormente aderiu ao governo Meiji, realizando brilhante carreira poltica. Ocupou vrios postos ministeriais e foi um incentivador pioneiro da emigrao. Sho Nemoto, citado no artigo da Prof.a Arlinda Rocha Nogueira, foi enviado ao Brasil pela Sociedade de
1 Yukichi Fukuzawa (1835-1901): um dos lderes do movimento de introduo e esclarecimento da cultura ocidental no Japo, que, reabrindo seus portos, se preparava para uma completa remodelao da estrutura poltica e social da nao. Atuando sempre na rea privada, fundou a Universidade de Kei e escreveu livros de carter didtico e de divulgao das coisas ocidentais.

60 A ABERTURA DA EMIGRAO NO JAPO

No comeo da Era Meiji, o Japo mandou guardas-marinhas Inglaterra para aperfeioamento junto a marinha daquele pas. Em 1870, Jurozaemon Maeda, de Kagoshima, um dos dois jovens oficiais que a bordo de um vaso de guerra ingls visitava Salvador, BA, praticou seppuku (haraquiri), por motivos ignorados. No ano de 1874, o Japo se tornou o centro de observao da passagem do planeta Vnus pelo disco solar. O cientista brasileiro Francisco Antnio de Almeida, que fazia parte do grupo francs de observadores, esteve na terra dos samurais nessa ocasio. O nome de Wasaburo Otake merece um destaque especial. A bordo do navio de guerra brasileiro Almirante Barroso, que visitou o Japo em 1889, encontrava-se o neto do imperador D. Pedro II, prncipe Augusto Leopoldo. Com anuncia do prncipe, o estudante ginasiano Wasaburo Otake embarcou no Barroso e veio ter ao Brasil. Permaneceu no pas por sete anos, tendo estudado na Escola Naval do Rio de Janeiro. Regressou ao Japo em 1896. No ano seguinte, ao se instalar a primeira legao do Japo no Brasil, veio servir como intrprete e tradutor oficial da representao diplomtica. Nessas funes, contribuiu ativamente para a introduo e desenvolvimento da imigrao nipnica. Enquanto exercia com dedicao o seu ofcio, Otake preparou, em longos anos de pacientes estudos e pesquisas, o Dicionrio Portugus-Japons (1918) e, a seguir, o Dicionrio Japons-Portugus (1925). So os primeiros dicionrios do gnero escritos por um japons. Todos que aprenderam ou aprendem japons no Brasil devem muito a essas duas obras pioneiras. A movimentao no sentido do estabelecimento de relaes diplomticas entre o Brasil e o Japo comeou quando o contra-almirante Artur Silveira da Mota, ao regressar da sua misso de concluir o tratado de intercmbio comercial com a China, em 1880, passou pelo Japo. Entabulou conversaes com o Ministrio do Exterior nipnico sobre um tratado de comrcio. A China era ento a grande potncia asitica e por isso as relaes diplomticas com esse pas e o nosso foram estabelecidas antes do que com o governo de Tokyo. Em 1882, Eduardo Calado, ministro plenipotencirio brasileiro em Pequim, passando por Tokyo, conversou sobre o mesmo assunto com autoridades nipnicas. Finalmente, o Tratado de Amizade, Comrcio e Navegao entre o Brasil e o Japo foi assinado em Paris, a 5 de novembro de 1895, pelo plenipotencirio brasileiro Gabriel de Toledo Piza e Almeida e Arasuke Sone, do Japo. Com o estabelecimento das relaes diplomticas, comearam a

ALGUNS EPISDIOS HISTRICOS 61

chegar japoneses ao Brasil. Os primeiros foram os diplomatas da legao, ento instalada em Petrpolis. Na rea privada, podemos registrar: A instalao em 1906 da primeira casa comercial japonesa, O Japo em So Paulo, pertencente firma Fujisaki, de Sendai, provncia de Miyagi. A casa comercial tinha como seus funcionrios Shinjiro Noma, Takeo Goto, Jukichi Sakuma, Ryosaku Tanaka e outros. Um grupo de emigrantes livres (espontneos) veio em 1906: Rioichi Yassuda, Umekichi Akeho, Saburo Kumabe e outros. (Tetsuya Tajiri/Jos Yamashiro)

BIBLIOGRAFIA Ando, Zenpati. Burajiru-shi (Histria do Brasil). Tokyo, Iwanami, 1983. Barros, Benedito Ferri. Japo, a Harmonia dos Contrrios Uma Experincia Humana Singular. So Paulo, T. A. Queiroz, Ed., 1988. Takayanagi, Mitsutoshi e Takeuchi, Rizo. Nippon-shi jiten (Dicionrio da Histria do Japo) 2.a ed. Tokyo, 1984.

CAPTULO 2

DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920


1. OS IMIGRANTES DO KASATO-MARU 2. EM BUSCA DA INDEPENDNCIA ECONMICA 3. A POCA DA "MARCHA PARA OESTE" 4. A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920 5. O IMIGRANTE JAPONS, O CAF E O ALGODO 6. O IMIGRANTE E A EDUCAO DOS FILHOS

1. OS IMIGRANTES DO KASATO-MARU

a) Comeo do relacionamento Brasil-Japo no nvel de povo comum

RANSPORTANDO a bordo 7811 imigrantes lavradores contratados (165 famlias com 733 membros e mais 48 avulsos) pela Companhia Imperial de Colonizao Ltda. (presidida, por Ryu Mizuno), o vapor Kasato-Maru chegou s 9,30 horas do dia 18 de junho de 1908 ao porto de Santos. Era o comeo da imigrao contratada para as fazendas de caf do Estado de So Paulo. Por isso, o nome Kasato-Maru passa a constituir um smbolo do relacionamento entre o Brasil e o Japo, que j dura oito dcadas. Falar em Kasato-Maru lembrar o princpio das relaes profundas que se estabeleceram, desde ento, entre os povos dos dois pases. Foi um relacionamento nem sempre fcil ou sem incidentes, tanto no nvel popular como entre os respectivos governos. O fato inconteste que os imigrantes chegados a bordo do KasatoMaru inauguraram a histria do relacionamento no nvel popular e humano entre os dois pases.

Sobre o nmero de imigrantes e de famlias que viajaram no Kasato-Maru, foram consultadas as seguintes publicaes: 1) Zaihaku Nihon Ishokumin 25 Shunen Kinen-kan (Anurio Comemorativo dos 25 anos da Imigrao e Colonizao no Brasil), edio do jornal Seishu Shinpo(Semanrio de S.Paulo). Diretor-proprietrio: Rokuro Kowyama. 2) Burajiru Nenkan (Anurio do Brasil), 1933, editado pelo jornal Burajiru Jih (Notcias do Brasil). Diretor-proprietrio: Seisaku Kuroishi. Tambm comemorativo dos 25 anos da imigrao nipnica. 3) Burajiru ni Okeru Nihon-jin Hatten-shi (Histria da Expanso' dos Japoneses no Brasil). Editor responsvel: Ikutaro Aoyagi, fundador da Colnia de Iguape. 4) Imigrao Japonesa na Histria Contempornea do Brasil, de Arlinda Rocha Nogueira. Na citao no texto, a fonte 1) ser abreviada para Seilio (abreviao de Seishu Shinpo) e 2) como Jihe 3) como Hattenshi.

64 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920

Os imigrantes passaram a noite do dia 18 abordo do Kasato-Maru. No dia seguinte deixaram o cais do porto em trem especial que subiu a Serra do Mar na direo de So Paulo, em cuja Hospedaria de Imigrantes foram abrigados. Exatamente no momento em que pisou o solo no porto de Santos, o imigrante comeava a sua vida no Brasil. No existe nada escrito sobre as impresses, sensaes e pensamentos de cada um naquele momento histrico. possvel imaginar que provavelmente todos sentiram, ao lado da grande esperana de comear uma nova vida em pas novo" e desconhecido, um turbilho de inquietaes e incertezas quanto ao futuro. Na hospedaria, os imigrantes assinaram os contratos contendo as condies de trabalho nas fazendas para onde iam ser encaminhados. Entre os dias 25 de junho e 6 de julho foram distribudos s seguintes fazendas: Dumont, Cana, So Martinho, Guatapar, Floresta e Sobrado, localizadas ao longo das Estradas de Ferro Mogiana, Paulista, Sorocabana e Ituense, todas no interior do Estado de So Paulo. Eis o nmero de famlias e pessoas distribudas em cada fazenda:
Fazenda D u m o n t (Mogiana) Floresta (Ituense) (*) Cana (Mogiana) So Martinho (Paulista) Guatapar (Paulista) Sobrado (Sorocabana) Famlias 51 24 24 27 23 15 Membros 210 173 151 101 88 49 Avulsos 18 3 1 13 4 1

(*) A E.F. Ituense, que ligava a cidade de Itu a Campinas, foi incorporada Sorocabana antes da chegada dos imigrantes, mas manteve o seu nome por fora do hbito.

O total soma 772 pessoas, inferior aos 781 desembarcados em Santos. A diferena representa imigrantes autnomos que ficaram em So Paulo, onde iriam arranjar emprego. Qual foi a impresso dos brasileiros com relao aos primeiros imigrantes lavradores contratados que chegaram ao Brasil a bordo do KasatoMaru? Em trabalho freqentemente citado em livros relacionados ao acontecimento, J. Amndio Sobral, inspetor da Secretaria de Agricultura rgo que dirigia a poltica imigratria do governo do Estado , escreveu um extenso artigo no Correio Paulistano do dia 26 de junho de 1908. Tratase de uma reportagem bastante objetiva, informativa e esclarecedora do comportamento, atitudes, grau de educao e alfabetizao, alguns usos e costumes dos novos imigrantes seres estranhos e completamente

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desconhecidos poca pela populao brasileira , que o autor trata com um calor humano caracteristicamente brasileiro. Aspecto esse que os imigrantes levaro longos anos at compreenderem ser parte da ndole do povo brasileiro. Transcrevemos o artigo na ntegra, respeitando inclusive a sua ortografia. "Os japonezes em S.Paulo Est S.Paulo com os primeiros immigrantes japonezes. Chegaram no dia 18, pelo vapor Kassato Mar, depois de 52 dias de viagem do Japo a Santos, tendo tocado s em dois portos: o de Singapura na sia e o da cidade do Cabo na extremidade austral da frica. Deste ltimo porto, o navio veio diretamente a Santos, tendo feito com uma regularidade digna de nota sua derrota do porto de procedncia, Kbe (Japo), ao porto de destino (Santos). O vapor Kassato Mar trouxe para o Estado de S.Paulo, 781 japonezes, que constituem a primeira leva da quantidade que deve trazer a Companhia Japonesa de Imigrao e Colonizao, que contractou com o Estado de S.Paulo a introduo de 3.000 famlias. Estes 781 japonezes agora introduzidos agrupam-se em 164 famlias, sendo cada famlia constituda, em mdia, por 4,5 indivduos. So poucos os indivduos que vieram avulsos (37), isto , no fazendo parte de famlias. O nmero de crianas insignificante, e o de velhos nullo. Crianas de menos de trs anos vieram 8: de trs a sete annos vieram 4; de sete a doze annos, 4, e de mais de doze annos 765. Todo o indivduo de mais de doze annos traz j as mos callejadas, signal evidente de trabalho habitual. Com estes japonezes introduzidos pela companhia acima referida, vieram tambm 11 de mais de doze anos e 1 de trs a sete anos, espontneos isto , com passagem pago sua custa. Dos introduzidos pela companhia (781) 532 sabem ler e escrever, isto , 68 porcento, sendo necessrio notar que, dos 249 tidos como analphabetos, empregando esta palavra na sua accepo literal, no chegam a 100, o que eleva muito aquela porcentagem. Os imigrantes japoneses vieram de onze provncias diferentes, que so as seguintes: Tokio, Fukuchima, Cagochima, Cumamto, Okinawa, Ekim(*), Yamaguchi, Hirochima, Cochi, Niigata e Yamanachi. Destas onze provncias, as que forneceram maior soma de imigrantes foram as de Okinawa, Cagochima e Yamaguchi.

(*)Houve troca de h pr k, pois o nome correto Ehime.

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Pelas cifras supra, v-se que, das 781, s 16 pessoas no so do trabalho, sendo, portanto, 2 por cento os no trabalhadores e esta insignificante porcentagem no constituda por velhos ou pessoas invalidas, mas por crianas que amanh sero optimos elementos de trabalho. Vieram para S.Paulo no dia 19, desembarcando nesse mesmo dia do vapor que os trouxe. As suas cmaras e mais acomodaes apresentavam uma limpeza inexcedivel. preciso notar que se trata de gente de humilde camada social do Japo. Pois houve em Santos quem afirmasse que o navio japons apresentava na sua 3a. classe mais asseio e limpeza que qualquer transatlntico europeu na Ia. classe. Isto no hyperbolico, como adeante se ver. Ao desembarcarem na Hospedaria de imigrantes saram todos dos vages na maior ordem e, depois de deixarem estes, no se viu no pavimento um s cuspo, uma casca de fruta, em suma, uma coisa qualquer que denotasse falta de asseio por parte de quem neles veiu. Sahiram na maior ordem e, depois de quatro horas de viagem em trem especial de Santos a S.Paulo (no sei qual a razo por que se no ha de fazer o trajeto dos trens de imigrantes em menos tempo), e foram recolhidos no amplo salo do refeitrio da hospedaria, ocupando todas as mesas, e ainda sobrou gente, que ficou nos corredores. Estavam todos, homens e mulheres vestidos europea; eles de chapu ou bonet, e ellas de saia e camizeta pegada saia, apertada na cintura por um cinto, e de chapu de senhora, um chapu simples, o mais simples que se pode conceber, preso na cabea por um elstico e ornado com um grampo. Os penteados fazem lembrar-nos os que temos visto em pinturas japonezas, mas sem os grampos colossaes que as mesmas pinturas nos apresentam. Homens e mulheres trazem calado (botinas, borzeguins e sapatos) barato, com protetores de ferro na sola, e todos usam meias. Alguns dos homens foram soldados na ultima guerra (russo-japoneza), e traziam no peito as suas condecoraes. Um delles trazia trs medalhas, uma das quais de ouro, por actos de herosmo. Muitos traziam bandeiras pequenas de seda, numa pequena haste de bambu pintado e lana de metal amarelo. Essas bandeiras foram trazidas aos pares: uma branca com um circulo vermelho no meio, e a outra auri-verde: a do Japo e a do Brasil. Esta primeira leva de imigrantes japonezes entrou em nossa terra com bandeiras brasileiras de seda, feitas no Japo, e trazidas de propsito para nos serem amveis. Delicadeza fina, reveladora de uma educao aprecivel. As suas roupas europeus foram todas adquiridas no Japo e ali confeccionadas nas grandes fabricas japonezas. A vestimenta europa conquista terreno no imprio do Sol nascente. Foram os prprios imigran-

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tes que compraram as suas roupas, adquiridas com seu dinheiro, e s trouxeram roupa limpa, nova, causando uma impresso agradvel. As mulheres calavam luvas brancas de algodo. Depois de estarem uma hora no salo do refeitrio, tiveram de abandonal-o, para saberem quais eram as suas camas e os quartos, e surpreendeu a todos o estado de limpeza absoluta em que ficou o salo: nem uma ponta de cigarro, nem um cuspo, perfeito contraste com as cuspinheiras repugnantes e pontas de cigarro esmagadas com os ps dos outros imigrantes. Tm feito as suas refeies sempre na melhor ordem e, apesar de os ltimos as fazerem duas horas depois dos primeiros, sem um grito de gaiatice, um sinal de impacincia ou uma voz de protesto. No dia seguinte ao da sua chegada, foram todos vacinados em duas horas, apresentando todos, homens e mulheres, os braos vacinao, sem reluctancia alguma nem pudores piegas. Nunca se vaccinou alli tanta gente, com tanta ordem, tanto silncio e tanta espontaneidade, no mesmo tempo. Muitssimos tinham sido j vaccinados e muitos revaccinados. Tm recebido bem a nossa alimentao, feita nossa moda e com os nossos temperos, e nem um s caso de doena intestinal se manifestou at agora. S dois leves casos de grippe e algumas dores de cabea (de ligeiras constipaes) em menos de duas dezenas de pessoas. Todos os japonezes vindos so geralmente baixos: cabea grande, troncos grandes e reforados, mas pernas curtas. Um japonez de 14 annos no mais alto que uma criana de 8 annos de idade. A estatura mdia japoneza inferior nossa estatura baixa. Mas vieram alguns homens mais altos, regulando sua estatura pela nossa mdia. O que, sobretudo, attre a nossa atteno a robustez, o reforado dos corpos masculinos, de msculos pouco volumosos (admira, mas verdade!) mas fortes e de esqueleto largo, peito amplo. Os seus cabellos negros, que parecem negrejar mais nos volumosos penteados das mulheres, so cortados, nos homens, de maneira a permitir uma marrafa, que quasi todos usam, uns do lado e outros ao alto da cabea, penteada com cuidado, perfeitamente em harmonia com a gravata que todos usam e sem incompatibilidade com os calos que todos trazem nas mos. So muito dceis e sociaveis, tendo manifestado uma grande vontade de aprender a nossa lingua, e no refeitrio no deixam cahir um gro de arroz ou uma colher de caldo. Depois de cada refeio (que dura de uma e meia a duas horas), o pavimento do salo est como antes delia. Os dormitrios quasi no precisam ser varridos, mal se encontrando de longe em longe um pedacinho de papel ou um phosphoro queimado, que algumas vezes so dos serventes da hospedaria.

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Tm nas suas mulheres a maior confiana, a ponto de, para no interromperem uma lio adventicia de portuguez, lhes confiarem a troca de seu dinheiro japonez em moeda portugueza, pois todos trazem dinheiro: 10 yens, 20, 30, 40, 50, ou mais yens, mas todos trazem um pouco. So do maior asseio com seu corpo, tomando repetidos banhos e trazendo sempre roupas limpas. Todos tm uma caixa de ps dentifricios, escova para dentes, raspadeira para a lngua, pente para o cabello e navalha de barba. Barbeiam-se sem sabo, s com gua. As suas bagagens so pequenas: para menos de oitocentas pessoas, mil e cem malas, na sua maior parte de vime branco e algumas de lona pintada. No parece bagagem de gente pobre, contrastando flagrantemente com os bahus de folha e trouxas dos nossos operrios. Nestas suas bagagens trazem as roupas indispensveis e objectos de uso dirio, como pasta para dentes, um frasco de conservas, um de molho para temperar comida, uma ou outra raiz medicinal, as indispensveis e exquisitas travesseiras, pequeninas e altas, de madeira forrada de veludo ou de bambu fino, flexvel; cobertores acolchoados, casaces contra o frio, ferramentas pequenas (por signal que as de carpinteiro so muito differentes das nossas), um ou dois livros (cheios de garatujas, direi eu), uma caixa de papel para cartas, nankim para escrever, pausinhos (que podem ser de alumnio), para comer arroz, colheres pequenas, mas largas e chatas, para as refeies e muitas outras miudezas que lhes so necessrias. De roupas japonezas, s vi um kimoninho pintalgado numa criana de collo. Nas mil e cem malas que trouxeram, a alfndega no encontrou um nico objecto nas condies de pagar imposto, embora a conferncia tenha sido feita com todo o rigor e durado quase dois dias inteiros. Os empregados da alfndega declaram que nunca viram gente que tenha, com tanta ordem e com tanta calma, assistido conferncia de suas bagagens, e nem uma s vez foram apanhados em mentira. Si esta gente, que toda de trabalho, for neste o que no asseio, (nunca veio pela imigrao gente to asseada), na ordem e na docilidade, a riqueza paulista ter no japonez um elemento de produo que nada deixar a desejar. A raa muito differente, mas no inferior. No faamos, antes do tempo, juizos temerrios a respeito da aco do japonez no trabalho nacional." Depois de todos os elogios s qualidades do imigrante japons por ele verificadas, J. Amndio Sobral encerra o seu trabalho com uma viso

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quase proftica sobre a possibilidade da contribuio do imigrante japons na produo paulista. E ao mesmo tempo adverte contra juzos temerrios a respeito da "aco do japonez no trabalho nacional". Mas no faltaram tambm opinies contrrias aos imigrantes que comeavam a chegar com o Kasato-Maru. O jornal santista A Tribuna, em sua edio de 19 de junho (ou seja, no dia seguinte chegada do KasatoMaru), manifestava a sua preocupao com a introduo daqueles que chama "os amarelos", segundo registra Tomoo Handa em sua Burajiru Nihon Imin-shi-Nenpy (Cronologia da Histria da Imigrao Japonesa no Brasil), doravante citada como Cronologia Handa. Handa informa ainda que no mesmo dia o Dirio Popular de So Paulo noticiava um homicdio que teria ocorrido a bordo do Kasato-Maru. b) A vida no cafezal: grande diferena entre a propaganda e a realidade Temos um documento interessante. Foi publicado na Edio Comemorativa dos Dez Anos da Primeira Leva de Imigrantes, do jornal Notcias do Brasil. Trata-se de um relato bem longo descrevendo as impresses colhidas numa visita Fazenda Dumont, realizada antes da chegada dos imigrantes do Kasato-Maru a Santos. Quanto ao autor do trabalho, menciona-se apenas Issei (Primeira Gerao), no se esclarecendo quem seja realmente. Todavia, o nico nome que figura como colaborador dessa edio Umekichi Akeho, que chegou ao Brasil antes do Kasato-Maru e residia na cidade de So Paulo. possvel que seja ele o autor. Akeho tornou-se, anos depois, diretor do Departamento de Imigrao da Kaik e por isso manteve muitos e freqentes contatos com imigrantes das sucessivas levas. Vamos reproduzir alguns trechos do artigo "Fazenda Dumont": " Eu recebi ordem de visitar a Fazenda Dumont, antes da chegada dos imigrantes. A primeira coisa que me decepcionou foi a quase completa falta de frutificao do caf. Na verdade, a m colheita era geral este ano. Em particular, os cafezais velhos de 50 a 60 anos mostravam-se cansados, com elevado nmero de cafeeiros sem frutos. A colheita de uma famlia de quatro pessoas no passava de 3 sacos e meio a 4 sacos. Existe uma enorme diferena comparada fcil colheita de 3 sacos por pessoa, nove por famlia de trs membros, propalada pela empresa de emigrao do Japo [...] Fiquei preocupado com a possibilidade de acontecerem problemas difceis da para diante, mas pensei, agora era tarde para reclamar. Apresentei meu relatrio da visita e minha opinio a respeito da fazenda, ao intrprete oficial da Legao Japonesa, sr. Arajiro Miura, ento em visita a So Paulo. Para minha surpresa, o sr. Miura no se mostrou impressionado e disse:' s acostumarem que colhero trs sacos, sem

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dificuldade'. Era um otimista de gabinete [...] Fiquei preocupado com a possibilidade de alguma reao impensada por parte dos imigrantes nipnicos que sonhavam ganhar cinco yens e 50 sens, colhendo nove sacos por dia. Mas eles ainda se encontravam em viagem de navio". Efetivamente, os imigrantes chegaram cheios de esperanas s seis fazendas. No entanto, antes mesmo de transcorrer um ms, j irrompiam profundos atritos entre eles e a administrao das fazendas. E justamente o primeiro caso a se tornar pblico foi o da Fazenda Dumont. Outras fazendas igualmente apresentaram problemas, embora com algumas diferenas em sua natureza e grau de gravidade. Fugas e at abandono coletivo ocorreram. Quanto s causas dos atritos e conflitos, variavam conforme as fazendas. Podemos porm encontrar os seguintes denominadores comuns a todas: 1.) Ms condies de habitao e alimentao, que os imigrantes no podiam sequer imaginar. 2.) Dificuldade de entendimento entre os imigrantes e a administrao da fazenda, por causa da barreira da lngua e da total diferena de usos e costumes. 3.) Cafeeiros velhos, de reduzida produtividade, redundavam em colheita escassa e rendimento muito abaixo do prometido aos imigrantes pelos agentes de emigrao. 4.) Demolio do complexo de superioridade de imigrantes. Desinformados sobre a realidade brasileira e, ao serem atirados num ambiente de pssimas condies de vida, esse sentimento feneceu diante das tremendas dificuldades (Eles se julgavam sditos de uma potncia de primeira categoria, depois das vitrias do Japo nas guerras contra a China (1894-95) e contra a Rssia (1904-5)). 5.) Soma-se a tudo isso o descontentamento em relao companhia de emigrao, que os iludira com falsa propaganda sobre a facilidade de ganhar dinheiro no Brasil. " Na lavoura, os problemas no se resumiam ao trabalho em si, mas nas exigncias quanto ao horrio, nas proibies, nas limitaes e, o que era pior, no fato de trabalharem sob fiscalizao. A situao tornavase ainda mais dramtica quando o fiscal era de outra nacionalidade", observa Arlinda Rocha Nogueira, em seu livro Imigrao Japonesa na Histria Contempornea do Brasil. De todas as causas, a citada no item 3. era a mais grave. No contrato trocado com as fazendas, na parte referente remunerao do trabalho consta: 1) trato de mil ps de cafeeiro, 70 a 100 mil ris por ano; 2) colheita de caf, saco de 50 litros, 450 a 500 ris; 3) diria de trabalho extra, 2 a 2,5 mil ris.

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Os imigrantes tinham se aventurado a viajar at o longnquo Brasil acreditando na propaganda dos agentes de emigrao. Estes afirmavam: "No Brasil existe a rvore que d ouro que o cafeeiro. s colher com as mos". O mil ris ento valia 60 sens (Hatten-shi). Se tudo corresse como propalavam os agentes de emigrao, se cada colono colhesse 4 a 5 sacos de caf, trs colheriam 15 sacos; a 500 ris (30 sens) por saco colhido, teriam 4 yens e 50 sens; num ms de 30 dias perceberiam a fabulosa soma de 135 yens. Como na realidade era difcil colher at mesmo 1 a 2 sacos por trs pessoas de uma famlia (Hatten-shi), tinham toda razo para explodir de descontentamento e revolta. A propsito, na poca, no Japo um carpinteiro ganhava diria de 40 sens, refeio por conta prpria; um trabalhador rural diarista, 20 sens com refeio; o salrio mensal de professora primria era de 8 yens; policial, pouco menos de 10 yens (De Kasato-Maru, publicao comemorativa dos 50 anos da imigrao japonesa no Brasil). Na clusula 3 do anncio de recrutamento do primeiro grupo de emigrantes para o Brasil, feito pela Companhia Imperial de Emigrao sob a sugestiva epgrafe "Como conseguir lucros", se diz o seguinte: "Estabelecemos a hiptese de que o emigrante ganhar pelo menos 1 yen e 20 sens por dia/pessoa. O clculo o seguinte: a) O contrato firmado entre esta Companhia e o Governo do Estado de So Paulo estipula na sua clusula 9: "O emigrante ser colocado numa fazenda de caf ou num ncleo colonial', e na clusula 2, 'A remunerao de colheita de caf ser de 450 ris e 500 ris por 50 litros e no caso de trabalho extra sero pagos 2 mil ris a 2 mil e 500 ris ao dia. Explicando melhor: ser paga uma remunerao de 30 sens ao colher gros de caf suficientes para encher um saco com capacidade de cerca de 2 to (to, unidade de volume vale cerca de 18 litros) e 8 sh (sh vale 1,8 litros). O trabalho extra de diarista ser remunerado razo de 1 yen 20 sens a 1 yen 50 sens. Normalmente uma pessoa pode colher 5 a 6 sacos por dia. Por isso, a receita diria normal corresponder a 1 yen 50 sens a 1 yen 80 sens por pessoa. Sem incluir o trabalho extra'. b) Conforme o exposto, o emigrante poder ganhar pelo menos 1 yen 50 sens a 1 yen 80 sens por dia. E as despesas por pessoa no ultrapassam 30 sens/dia, de modo que a receita lquida ficar entre 1 yen 20 sens e 1 yen 50 sens. c) Como verificamos, o ganho lquido normal de 1 yen 50 sens por dia em mdia. Razo porque na clusula anterior registramos como receita lquida 1 yen 20 sens, com base no valor mnimo".

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O imigrante que trabalhava do clarear do dia at o anoitecer na fazenda tinha uma preocupao imediata e que representava ao mesmo tempo uma questo de honra para com os parentes e amigos deixados na terra natal: partira com a promessa de regressar em poucos anos com muito dinheiro! E aqueles que tiveram necessidade de contrair dvidas para custear a viagem sentiram urgncia de resgatar o emprstimo feito. E os gastos no armazm da fazenda na aquisio de gneros de primeira necessidade tambm constituem dvidas crescentes... Quando representantes da companhia de emigrao chegavam fazenda para mediar os conflitos, os imigrantes chegaram a receb-los armados de lanas feitas de bambu, enxadas e foices. "Ao anoitecer, do terceiro dia, o intrprete oficial Miura e o representante da Companhia Imperial de Colonizao Uetsuka compareceram ao cafezal guiados pelo intrprete Kato. O descontentamento dos imigrantes explodiu contra eles. Por interferncia do intrprete oficial (da Legao Japonesa) Miura, a fazenda entregou aos imigrantes um setor mais produtivo do cafezal. Mesmo assim, a produo no passava de um saco por famlia de 3 membros. Aconselhando os imigrantes que tivessem pacincia, Miura e Uetsuka se dirigiram Fazenda So Marinho" (Seiho). Esta uma lacnica descrio da disputa entre imigrantes e a fazenda, no caso da Fazenda Dumont. Vejamos agora as ms condies de habitao e alimentao. Comecemos pela casa. Os imigrantes receberam a casa de tijolos erguida h dezenas de anos na colnia (rea habitacional da fazenda). Ali sentia-se um forte mau cheiro como que resultado da sedimentao de todos os odores corporais das pessoas que nela haviam residido no decorrer dos decnios. O pior era a falta de limpeza, que agravava a m impresso. No havia moblia. Nem cama. "To logo os imigrantes se estabeleciam na colnia eles se davam conta, claramente, de que no passavam de colonos sob contrato a servio da fazenda. O fazendeiro e o administrador faziam-se entender atravs de fiscais e intrpretes. Eram conduzidos escura colnia, iluminada apenas pela luz de velas. A maioria das casas era de cho batido. Raras as assoalhadas. As pavimentadas com tijolos eram luxo. No se podia exigir que houvesse camas. Os que ganharam leitos de madeira improvisados deviam ter dado graas a Deus. O comum era cada um procurar fabricar sua prpria cama. O grupo chegado ao anoitecer, que no teve tempo para tanto, estendeu os acolchoados trazidos do Japo onde melhor pareceu a cada um, dormindo sobre eles. Houve um grupo que teve de deitar-se no cho sobre capim seco ou palha de milho. Naquela noite, ao pensar em seu destino de imigrantes, todos tero

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sentido que no era exatamente essa a vida com que haviam sonhado" (Tomoo Handa. O Imigrante Japons Histria de sua vida no Brasil). O que se podia comprar no armazm da fazenda se limitava a arroz de sequeiro, que, cozido, ficava solto (os japoneses no gostam); feijo, bacalhau seco, carne-seca, sardinha salgada, pouca coisa mais. Itens alimentcios que as mulheres levariam muito tempo para aprender a preparar corretamente. E no havia como adquirir verduras, elemento importante na alimentao dos japoneses. Improvisava-se, ento, sopa com ingredientes encontrados no mato ou campo como pico, caruru, maxixe; e o mamo verde salgado substitua os tradicionais tsukemono (picles japoneses). Como conseqncia da m alimentao houve uma subnutrio generalizada, advindo da o desenvolvimento defeituoso e a morte de crianas, a diarria provocada pela ameba, e at a malria grassava entre os imigrantes. Por mais estranho que fosse o ambiente onde foram parar, e mesmo sofrendo a mais profunda depresso moral, a mulher tinha de preparar as refeies da famlia (alm de trabalhar no cafezal ao lado dos outros membros da famlia). Outro motivo de preocupao e at apreenso da mulher residia na falta de instalao sanitria, tanto na colnia como na casa. As necessidades tinham de ser satisfeitas no matagal prximo da casa, atrs de bananeiras ou sombra dos cafeeiros, etc. E havia ainda o bicho-de-p, completamente desconhecido dos japoneses. A fmea penetra entre a unha e a carne do dedo da mo ou artelho do p, seja de adulto ou de criana. E ali seu corpo fecundado incha de ovos. Desde o momento da penetrao provoca um prurido insuportvel. Enquanto no se acostumava com o terrvel parasita, o imigrante tinha verdadeiro pavor dele. De fato, ocorreram infeces perigosas depois da extrao do bicho-de-p com agulha de costura e at casos de ttano. Para a famlia que tinha filhos em idade escolar, imediatamente vinha a preocupao a respeito da sua educao. Em resumo, os sofrimentos e agonias fsicas e espirituais caram de modo implacvel sobre a cabea dos imigrantes. Yzare-ya kokage ni naite khii mogi (Anoitecer: sombra d'rvore choro colhendo caf) Yo nige seshi imin omou-ya kareno hoshi (Penso no migrante que fugiu; estrela luz em prado seco) Hykotsu (Traduo sem preocupao com a forma potica.)

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Estes haicais so da lavra de Shuhei Uetsuka (cujo nome de haicasta era Hykotsu), representante da Companhia Imperial de Colonizao no Brasil, que viajara comandando os imigrantes do Kasato-Maru, ao lado de Ryu Mizuno, presidente da empresa. Uetsuka foi homem que sempre compartilhou das agruras e sofrimentos dos imigrantes. Anos depois veio a falecer enquanto formava um ncleo colonial em Promisso, na E. F. Noroeste do Brasil. A fuga, ou mais precisamente a fuga noturna (yo-nige), implicava muitos riscos e perigos, porquanto a fazenda dispunha de capangas (poderiam ser chamados guarda-costas) contratados, que, armados de espingarda, vigiavam permanentemente os trabalhadores, a fim de impedir qualquer movimento suspeito de sua parte. A cafeicultura do Estado de So Paulo comeara nas margens do rio Paraba. A mata virgem que revestia a regio deu solos magnficos. "O vale do Paraba tornou-se assim um grande centro condensador de lavouras e de populao; em meados do sculo XIX reune-se a a maior parcela da riqueza brasileira", informa Caio Prado Jnior em obra j referida. Mas a prosperidade do Vale do Paraba no dura muito, depois de atingir o auge pouco depois da metade do sculo passado. Vem o esgotamento do solo e a decadncia econmico-social da regio, inclusive de muitas cidades surgidas com a expanso da cafeicultura. Surge ento a nova regio cafeeira do oeste e norte do Estado, tendo como centro a cidade de Campinas. Da as fazendas avanam na direo norte, at Ribeiro Preto, regio pouco povoada at fins do sculo XVIII. "Assinalam-se culturas cafeeiras em Campinas e suas proximidades, j antes de 1880; mas coisa de pouca importncia e que ser assim at meados do sculo", segundo ainda Caio Prado Jnior. A partir dessa poca a cafeicultura avana a passos largos, favorecida pela topografia mais uniforme do que na regio do Vale do Paraba e sobretudo pela existncia de "terra roxa", excelente para a cultura da rubicea. Em fins do sculo surgem cafezais imensos, com mais de um milho de ps. A Fazenda So Martinho, com mais de 3 milhes de ps, a maior do Brasil no comeo do sculo XX. As ferrovias representam fator importantssimo no desbravamento e desenvolvimento do interior. A sua implantao significava progresso acelerado das regies por elas servidas. difcil precisar quando comearam as culturas de caf nas regies onde foram distribudos os imigrantes nipnicos. Podemos porm verificar a data de abertura das estradas de ferro, que seguiam a formao de cafezais. Por a podemos ter uma idia aproximada da idade dos cafezais

OS IMIGRANTES DO KASATO-MARU 75 onde trabalharam os imigrantes. Campinas, 1872; Sorocaba, 1875; Ribeiro Preto, 1883. A informao de que ''os cafeeiros da Fazenda Dumont tinham 50 a 60 anos" serve como uma referncia. No mapa de distribuio geogrfica do caf no Estado de So Paulo relativo ao ano de 1854, citado no livro Histria do Caf no Brasil, de autoria de Yosei Horibe, a quantidade de produo da chamada regio mogiana em 1854 no passava de 2 a 4% do total da produo estadual. Isso mostra que a regio comeava a produzir nessa poca. S nos decnios recentes se difundiu a tcnica de cultivo atualmente praticada. No tempo em que chegaram os primeiros imigrantes nipnicos, adotava-se uma tcnica primitiva de explorao predatria da terra. No se renovava e praticamente no se aplicava fertilizante. Pode-se imaginar como era a condio de produo nas chamadas grandes fazendas, onde foram introduzidos os imigrantes japoneses. Existem indcios de que as companhias de emigrao do Japo usaram na sua propaganda dados extrados do perodo de prosperidade da cafeicultura, que antecedeu chegada do Kasato-Maru. Na realidade, a crise da cafeicultura havia se manifestado de forma sria por volta de 1896. A grande causa da crise foi a expanso desordenada no plantio, que resultou na superproduo de carter crnico desde ento. No podemos nos deter aqui na anlise das causas da crise cafeeira, mas o fato que os imigrantes nipnicos chegaram s fazendas quando a fase de grande prosperidade j havia passado. As disputas entre colonos e fazendeiros acalmaram-se por volta de outubro de 1908, mas ainda estavam longe de uma soluo satisfatria. Verificaram-se fugas, transferncia para outras fazendas, retirada coletiva forada, etc. Mesmo deixando de lado o caso da Fazenda Dumont, onde aconteceu a sada total dos imigrantes, a permanncia continuada deles nas fazendas para onde foram distribudos acabou sendo em nmero reduzido. O intrprete da Legao Japonesa, Amari, que percorreu as seis fazendas entre dezembro de 1908 e janeiro do ano seguinte, apresenta o seguinte quadro da situao de permanncia dos imigrantes nas fazendas. Fazenda Dumont Floresta Cana SoMartinho Guatapar Sobrado Colonos distribudos 201 170 161 98 90 62 Segundo a Hatten-shi 210 173 151 101 88 49 Nmero atual 0 61 139 56 64 39

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Conforme observa o livro Hatten-shi, parece que o relatrio Amari contm muitos erros quanto ao nmero de imigrantes distribudos s fazendas e tambm apresenta impreciso nos nmeros dos que abandonaram as fazendas. Contudo, acreditamos que se pode ter uma idia da situao geral. Nove meses depois, ou seja, em setembro de 1909, quando o intrprete oficial da Legao Ryoji Noda visitou as fazendas referidas, o total de imigrantes que permaneciam nelas no passava de 191. A respeito do destino dos 590 imigrantes que deixaram as fazendas, o relatrio Noda informa (segundo Hatten-shi): 1) Trabalhavam em outras fazendas do Estado de So Paulo, 40; 2) Encontravam-se na cidade de So Paulo, 102; 3) Cidade de Santos, 110; 4) Trabalhadores na construo da E. F. Noroeste do Brasil, 120; 5) Residentes nos Estados do Rio e de Minas, 38; 6) Reemigraram para a Argentina, 160; 7) Falecidos, 6. Temos a uma soma de 576, faltando 14 para completar os 590. Consta que, na fuga coletiva, os naturais da provncia de Okinawa da Fazenda Cana, receosos do aumento da despesa de viagem, caminharam a p, da cidade de So Paulo at Santos, pelo leito da estrada de ferro. Cabe aqui uma observao. Pode-se dizer que aqueles "fracassados" na vida da fazenda, e que se "refugiaram" na cidade, tiveram o mrito de ser os pioneiros na diversificao das frentes de emprego ao se dedicarem a diferentes ocupaes. So parcos os dados precisos sobre as profisses encontradas pelos imigrantes que se mudavam para a cidade. Sabe-se porm que em So Paulo empregaram-se como serviais domsticos, jardineiros, carpinteiros, ajudantes de pequenas oficinas mecnicas ou indstrias de reduzido porte. Em Santos, a maioria se empregou como estivador das docas. O relatrio Noda explica: "Comparando-se as importncias em dinheiro remetidas para o Japo entre os colonos das fazendas de caf com as dos trabalhadores citadinos de So Paulo e Santos, devemos considerar que as primeiras so inferiores s dos segundos. Eis a grande causa de nossos imigrantes abandonarem os cafezais e buscarem outras profisses". Sobre a remessa de dinheiro mencionada no relatrio, no se sabe se est falando do envio aos parentes ou se se refere ao pagamento do dinheiro do subsdio. Seja como for, o fato que j existiam imigrantes em condies de remeter numerrio terra natal. Os pssimos resultados apresentados pelos imigrantes da primeira leva trazidos pelo Kasato-Maru causaram grande prejuzo Companhia

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Imperial de Colonizao. E a atitude dos brasileiros em relao aos imigrantes nipnicos sofreu naturalmente sria modificao. E o prprio governo japons chegou a adotar uma orientao drstica: no mais autorizar aquela empresa a cuidar do envio de emigrantes. Destarte, somente dois anos depois do Kasato-Maru, isto , a 28 de junho de 1910, chegam, viajando no Ryojun-Maru, os 906 imigrantes contratados (e mais 3 autnomos) da segunda leva. Vinham atravs da Takemura Shokumin Shokan (Companhia Takemura de Colonizao). O condutor dos imigrantes era de novo Ryu Mizuno. Os imigrantes do Ryojun-Maru igualmente tiveram disputas e atritos nas fazendas Jatai, Santa Maria, Santana e outras. As causas foram as mesmas do pessoal do Kasato-Maru. Informou-se que, no caso da Fazenda Jatai, a insolncia do fazendeiro e a explorao dos colonos por intermdio do armazm provocaram a revolta dos imigrantes. Entretanto, as amargas experincias dos imigrantes do Kasato-Maru levaram a um progresso, tanto do lado dos agentes de emigrao como do lado receptor, no que se refere ao trabalho de recrutamento e tratamento dispensado aos imigrantes. Embora tambm no caso dos imigrantes do Ryojun-Maru houvessem ocorrido graves incidentes, como o da aludida Fazenda Jatai, em relao permanncia nas fazendas houve melhoria acentuada. Desde ento diminuem os desagradveis incidentes e atritos, elevando-se a porcentagem de fixao de imigrantes nas fazendas. Embora defrontando-se com muitos problemas, a imigrao japonesa no Brasil segue marcha ascensional, at o auge de sua expanso. Segundo Hatten-shi, vrias vezes mencionado, em 14 anos, de 1926 a 1940, o nmero de imigrantes nipnicos que chegaram ao Brasil alcanou a cifra de 132.729 pessoas, representando mais do que o triplo dos 41.269 imigrantes nos 18 anos anteriores.

2. EM BUSCA DA INDEPENDNCIA ECONMICA

a) As agruras da vida na fazenda apressam o movimento No est bem claro o processo de evoluo dos primeiros imigrantes, da condio de colono contratado da fazenda de caf para a fase de lavrador autnomo ou independente. Sobre o assunto no se encontra nada escrito pelos prprios interessados. Como no havia precedentes a seguir ou modelo a copiar, tudo tinha de ser feito por iniciativa prpria, s apalpadelas, no escuro, at descobrir o caminho certo. Apesar da vida de sofrimento no cafezal ou talvez por isso mesmo

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no transcorrer de um ou dois anos o colono comea, paulatinamente, a aprender alguma coisa sobre a situao brasileira e a prtica agrcola. Pode-se supor que a idia da independncia econmica tenha nascido e evoludo no decorrer de dois ou trs anos de vida na fazenda. Abandonando aos poucos aquela leviana esperana de que poderia ficar rico facilmente, apanhando com as mos a "riqueza" pendurada diante dos olhos, agora j estava mais realista e amadurecido, convencido de que s seria possvel conquistar a prosperidade mediante a lavoura independente que ele prprio dirigiria. Na verdade, acontece uma grande e profunda transformao na vontade do imigrante. Paradoxalmente, a dura vida de trabalhador contratado fez com que o imigrante visse nascer no seu ntimo o ardente desejo de independncia econmica. Se, porventura, a situao das fazendas fosse to maravilhosa como fazia crer a propaganda das empresas de emigrao e seus agentes, dentro de poucos anos quase todos os imigrantes teriam retornado ptria, com dezenas ou centenas de milhares de yens no bolso, j que praticamente 100% deles haviam viajado com o esprito dekasegi. Em outras palavras, se na fase de colonos das fazendas eles tivessem conseguido sucesso e a maioria tivesse regressado terra natal, teria sido improvvel a estruturao no correr de oito dcadas da atual comunidade nipo-brasileira, chamada Colnia Japonesa(*). E mesmo que ela tivesse se formado, teria uma estrutura bem diferente da atual. Podese afirmar, portanto, que as duras condies de vida e de trabalho nos cafezais, impostas aos primeiros imigrantes, constituram a matriz geradora da atual colnia japonesa. A experincia das pssimas condies de vida e de trabalho em ambiente hostil, vivida na fazenda, quando os colonos virtualmente perderam a esperana de realizar seu sonho de "xito", gerou neles a energia necessria para suportar as tremendas dificuldades e lutas que iro provar na fase seguinte, de lavoura autnoma e de explorao de terras virgens. Da ento agentarem trabalhos pesados de "vomitar o sangue", segundo uma expresso nipnica. Na realidade, porm, essa fase inicial de posse da terra no significava ainda a radicaao definitiva do imigrante no pas(**). Para a maioria constitua uma estratgia para ganhar dinheiro e ento regressar ptria com as glrias de vencedor, conforme o plano original. No seu ntimo, todo imigrante acalentava o sonho de voltar terra
(*) Colnia Nikkei (Nikkei Kornia), ou seja, Colnia de Origem Japonesa, a denominao atualmente usada na comunidade nipnica. (**) A mudana radical da mentalidade dos japoneses no sentido da integrao sociedade brasileira acontece no ps-guerra, conforme se ver no Captulo 4.

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de origem o mais rapidamente possvel. Essa pressa contribuiu para que o imigrante, no estgio em que se entregou lavoura independente e explorao de terras novas sem o devido preparo , sofresse muitos fracassos e amargas experincias como, por exemplo, cometer erros grosseiros na escolha de culturas adequadas, ao solo, cair vtima de molstias endmicas, etc. Por outro lado, a movimentao do imigrante nipnico no sentido de sua independncia coincidia com a fase de expanso da economia do Estado de So Paulo na direo da hinterlndia. Consta que os primeiros imigrantes japoneses a possuir terras prprias foram as famlias que ingressaram em 1911 no ncleo colonial federal Primeira Mono, que existiu na rea servida pela estao Cerqueira Csar, E. F. Sorocabana. Sobre o seu nmero h diferenas, conforme as fontes. A Cronologia Handa registra: " O Anurio da Noroeste d a relao de seis famlias com seus nomes e nomes dos que ingressaram depois". Seja como for, as informaes disponveis indicam que trs anos depois da chegada do Kasato-Maru j havia imigrantes com dinheiro suficiente para comprar terras. Provavelmente o pagamento das terras teria sido feito em suaves prestaes, como iria acontecer, anos depois, nas zonas interioranas. Ou, ainda, como se tratava de terras de uma colnia federal, possvel at que elas fossem cedidas gratuitamente aos imigrantes. Convm lembrar porm que independncia no significa necessariamente compra de terra. Na verdade, nessa poca ainda era diminuto o nmero de proprietrios entre os imigrantes nipnicos. Numa fase anterior posse de terra, pensa-se na lavoura em terra arrendada. E existe uma lavoura que no praticada nem em terra comprada nem em terra arrendada. Com o aumento do ingresso de imigrantes em nmero cada vez maior de fazendas, acontecia o seguinte: em certas fazendas, onde os colonos cumpriam risca os termos do contrato, os fazendeiros costumavam ceder de graa, ou mediante um pagamento simblico, parte das terras ainda inexploradas aos colonos para que eles as cultivassem. Eles cultivavam arroz, feijo, milho, etc, com o que acumulavam experincia na prtica agrcola do pas, chegando at, ocasionalmente, a auferir um lucro inesperado. Quando a constituio da famlia era boa (com bons trabalhadores), os lucros eram melhores. Houve casos em que o rendimento dessas culturas serviu como capital para a compra de terra. Tudo indica que a lavoura em terra arrendada comeava quando o imigrante ainda no dispunha de reserva financeira suficiente para a aquisio de um terreno, mas acreditava ter a capacidade de lavrar a terra.

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Para quem no dispunha de dinheiro para essa iniciativa, havia a forma de parceria agrcola. Nesse sistema, as despesas at a colheita corriam por conta do proprietrio. O resultado da venda do produto era dividido entre o dono da terra e o lavrador arrendatrio que fornecia a mo-deobra. Em Seiho encontramos um artigo intitulado "Fase inicial da transferncia da vida de colonos para a de ncleo colonial". Diz o trabalho: "Uma coisa que o imigrante japons da primeira leva pensou depois de passar cerca de um ano como colono de fazenda de caf foi passar para a vida de pequeno lavrador independente. Na poca o pequeno lavrador independente no era como o de hoje (primeiros anos da dcada de 30, quando foi editado o Seiho) que ao mesmo tempo proprietrio e desbravador de terras novas. Ento aproveitava-se terra inexplorada dentro da fazenda, arrendando uma rea de um ou dois alqueires do fazendeiro, cultivando-a independentemente ou com pouca ligao com a fazenda de caf. Isso acontecia com colonos italianos, espanhis ou portugueses, com todos os colonos veteranos, pois, tal como no caso daqueles que se tornaram independentes, constitua o primeiro passo para a melhoria de vida como lavrador. Havia ainda, como uma etapa para a independncia, a lavra de terra por empreitada. Consistia em, por ordem do fazendeiro, cultivar cana de acar por empreitada, num canto das terras da fazenda; podia fazer o mesmo com mandioca ou mesmo caf. Mas este ltimo caso era muito raro ento, porque s quem dispusesse de algum capital podia executar a tarefa. Ento no havia ainda pequenas plantaes de caf de dez mil, vinte mil ou cinqenta mil ps. Tornar-se logo um lavrador independente, era o sonho dos colonos nipnicos da poca". Parece justo considerar que a regio da Mogiana em torno de Ribeiro Preto, onde muitos imigrantes japoneses dos primeiros tempos comearam a sua vida no Brasil, na condio de trabalhador contratado, foi tambm o bero do movimento pela lavoura independente. A entrada de japoneses na Primeira Colnia Mono, h pouco citada, deu-se com imigrantes procedentes da zona da Mogiana. Na Cronologia Handa referente a maio de 1912, encontramos: "Tendo como intrprete Kaito Usui, o primeiro grupo de japoneses ingressou na Fazenda So Geraldo, da estao Igarapava da Linha Mogiana. So os precursores da plantao de arroz nas margens do rio Grande e no Tringulo Mineiro". Na zona da Mogiana existe uma ampla faixa da chamada "terra roxa", muito frtil, apropriada para a rizicultura. Pode-se supor que, por

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essa razo, muitos imigrantes escolheram a cultura de arroz como um meio de se tornar independentes, depois de terminar o prazo contratual nas fazendas de caf. J bem depois, em outubro de 1919, foi fundada a Cooperativa Agrcola Nipo-Brasileira, em Uberaba, Tringulo Mineiro. Ela instalou uma filial em Conquista, na mesma zona, para atender os rizicultores locais. O cultivo do arroz por japoneses prosseguiu na sua marcha para o norte, alcanando Araguari, Tapaciguara, Itumbiara e Catalo, as duas ltimas em Gois, formando um grande centro produtor de arroz. O Hatten-shi, em suas pginas 419 e 421 relata: "Jinkichi Takizawa, chegado ao Brasil em outubro de 1913, teve sua ateno voltada para o fato de o Tringulo Mineiro (incluindo as margens do rio Grande) oferecer excelentes perspectivas para a cultura do arroz. A notcia circulou e em conseqncia aumentou o nmero dos que se transferiam das fazendas de caf para a rizicultura". Segundo um relato feito em maio de 1918 por Takashi Watanabe (posteriormente diretor da Cooperativa Agrcola de Mogi das Cruzes) havia 97 famlias exclusivamente dedicadas cultura de arroz; lavradores que faziam cultura intercalar de arroz no cafezal, 89 famlias produzindo um total respeitvel de 26 mil sacos. S no primeiro semestre de 1919 houve aumento de 200 famlias, somando um total de 410 famlias, rea de cerca de 3.600 hectares. A produo alcanou 100 mil sacos. Existem trs formas de cultivo de arroz: empreitada sob contrato com proprietrio da terra brasileiro; terra arrendada de empreiteiro; e terra arrendada por proprietrio. "Mas, logo em seguida ocorreu a crise econmica mundial do ps I Grande Guerra. Somou-se a ela o rpido desgaste do solo e o fato de todo o cultivo ser feito em terras arrendadas. De tudo isso resultou na debandada geral dos rizicultores nipnicos"[...]. Conforme est registrado em Hatten-shi, a fase de grande prosperidade da rizicultura dos japoneses teve curta durao. Todavia, isso no quer dizer que a cultura de arroz tivesse desaparecido por completo. Aqueles que conseguiram reunir capital com essa atividade arrendaram reas maiores, prosseguindo na produo at a dcada de 1930.0 nmero de produtores sofreu grande diminuio, porm os lavradores remanescentes na rizicultura aumentaram a produo. Muitos adotaram mquinas agrcolas de grande porte para a poca: arado rotativo tirado por trs a cinco cabeas de boi, plantadeiras mecnicas, etc. No entanto, por outro lado, o palco de atuao dos japoneses j estava se deslocando para o interior do Estado de So Paulo. Como veremos mais tarde, da segunda metade da dcada de 10 dcada de 20 as matas virgens do interior paulista so celeremente derrubadas e

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exploradas. Aproveitando essa tendncia, imigrantes que j dispunham de algum capital e haviam acumulado experincias na agricultura do pas, alcanam a sonhada posio de proprietrio de terra mediante a compra de lotes de mata virgem. A maioria se tornava proprietria de lotes de 10 a 20 alqueires, havendo porm alguns grandes sitiantes ou fazendeiros com centenas de alqueires para desbravar. Quem tinha pressa em conseguir xito na atividade, ou quando a rea de terra era superior capacidade de trabalho da famlia para o cultivo, recorria a imigrantes recm-chegados. Estes eram contratados por quatro ou seis anos, chamados "colonos com contrato de quatro ou seis anos", para formao de cafezais com o arroteamento de terras incultas. No caso de contrato por seis anos (que constitua a maioria) as despesas de desmatamento e preparo da terra corriam em grande parte por conta do colono, e em troca ele podia ficar com todas as rendas das demais culturas feitas no cafezal e a receita da venda do caf, a comear do quarto ano. No contrato de quatro anos, o colono no tinha nenhuma possibilidade de usufruir lucro da venda de caf. Por isso, as despesas de derrubada da mata e de arroteamento da terra (em certos casos, at uma parte do custo de vida do colono) corriam por conta do proprietrio. Na verdade, esse sistema de contrato de quatro ou seis anos desempenhou significativo papel no processo de independncia econmica do imigrante nipnico. Com a pecnia acumulada em quatro ou seis anos de trabalho, o colono, por sua vez, adquiria terra, tornando-se novo proprietrio. O jornal Notcias do Brasil lanou diversas edies especiais, como a Edio Especial de Introduo ao Brasil, datada de 3 de outubro de 1919, e a Edio Especial sobre a Situao de Cafezais, em 16 de abril de 1920. Na primeira figuram relatrios de uma dezena de imigrantes que ainda viviam como colonos de fazendas de caf. Trata-se de uma fase um pouco posterior ao incio da movimentao no sentido da independncia dos primeiros imigrantes. Todavia, interessante como amostra de dados sobre o estgio de transio para a lavoura independente. Alguns exemplos: 1) Jusaburo Iwase, natural da provncia de Aichi, chegou ao Brasil em junho de 1917. Famlia: homens 2, mulher 1, criana: menino 1, menina 1. Fazenda Lageado, estao Conquista, Linha Mogiana. "Sofri muito por causa da inexperincia no primeiro ano, mas agora j me acostumei com o clima; a receita aumenta, vivendo por isso com muita alegria. A partir deste ano pretendo iniciar o cultivo de arroz.

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Receitas (em mil ris): trato de 6 mil ps de caf, 720; colheita de caf, 109 sacos, 301; venda de produtos de culturas intercaladas, 130; feijo, 15 sacos, 224; arroz em casca, 75 sacos, 1.652; milho, 6 carros de boi, 600; venda de leito, 19 cabeas, 480; trabalhos avulsos na fazenda, 60; total 3.863 mil ris. Despesas: alimentao 960; vesturio 150; implementos agrcolas 110; despesas diversas 250; total 1.470 mil ris. Saldo: 2.393 mil ris. Em moeda japonesa: 1.196 yens. Tenho ainda 7 cabeas de porco e 20 galinhas." 2) Kumajiro Inage, natural da provncia de Fukuoka. Chegou ao Brasil em fevereiro de 1912. Famlia: homens 3; mulheres 2, crianas: meninos 2, menina 1. Fazenda Santa Gabriela, estao Sertozinho, Linha Mogiana. "Quando chegamos fazenda, tivemos casos de doena na famlia, razo porque sofremos muito. Mas depois no tivemos nenhum doente, achando-se todos trabalhando a todo vapor. No comeo, eu mesmo fiquei pessimista, cheguei a cogitar at em mudar de fazenda, porm, refletindo bem considerei melhor ser perseverante, desisti da idia. Segui o princpio de trabalhar com a famlia unida, o que afasta a pobreza. Valeu a pena, pois com o passar dos anos o trabalho se tornou interessante. Esta fazenda possui terras extremamente frteis, sendo possvel colher bons lucros de culturas intercaladas. E no momento, gozo da confiana do fazendeiro que me proporciona muitas facilidades. Este ano, por exemplo, estamos todos auferindo rendimentos melhores do que os esperados. Estamos certos de que possvel vencer tudo com pacincia e esforo." Receitas: trato de caf, 12 mil ps, 1.200; colheita, 5 sacos, 5; venda de produtos de culturas intercaladas: feijo, 205 sacos, 3.010; arroz em casca, 4 sacos, 80; milho 40 carros de boi, 2.400; venda de porcos, 13 cabeas, 1.200; galinha, 5 cabeas, 10; colheita de algodo, 300; servios diversos na fazenda, 600; total 8.805 mil ris. Despesas: alimentao, 2.000; vesturio, 250; implementos agrcolas, 80; despesas diversas, 100, total 2.430 mil ris. Saldo: 6.375 mil ris (3.187 yens). Kumajiro Inage informou ainda sobre a sua situao na edio especial sobre a Situao de Cafezais, que veio a lume no ano seguinte. Em seu relato ele diz que auferiu um lucro lquido de 5.925 mil ris ou 2.963 yens. Ainda dessa edio de Situao dos Cafezais extramos mais um relato. 3) Kikuma Murakami, natural da provncia de Kumamoto, chegou ao Brasil em maio de 1912. Fazenda Floresta, estao Eng. Brodowsky, Linha Mogiana. Receitas e despesas de 1919. Receitas: trato de caf 5.500 ps, 715; colheita de caf, 500 sacos, 650; receita da venda de produtos de culturas intercaladas: feijo, 25 sacos,

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250; arroz, 150 sacos, 3.000; venda de porcos, 4 cabeas, 320; galinhas, 30 cabeas, 45; servios diversos na fazenda, 90; total 5.070. Despesas: alimentao, 480; vesturio, 540; implementos agrcolas, 48; despesas diversas 50. Total, 1.188. Saldo (lucro lquido): 3.953 mil ris (cerca de 1.976 yens). Obs.: nos trs casos citados h diferena considervel na remunerao da colheita de caf (por saco). Tambm se verifica diferena com a poca da chegada do Kasato-Maru, uma dcada antes. Percebe-se uma evoluo positiva no relacionamento entre a fazenda e os colonos. b) Comeo da mobilidade profissional A tendncia para uma busca de vida independente no constitua naturalmente um fenmeno verificado somente na rea agrcola. Hoje muito difcil descobrir a rota trilhada pelos imigrantes em sua procura de novos empregos, o que representava, em outras palavras, novos horizontes de vida. O que se pode supor que nas cidades (regra geral pequenas) do interior comearam por instalar um botequim, por exemplo, para iniciar uma nova atividade, completamente diferente da lavoura. Depois, acumulando capital e experincia comercial, passam fase de armazm de secos e molhados, no qual se vendem gneros alimentcios e outros artigos de uso cotidiano, pequenos implementos agrcolas, etc. Prosseguindo na sua expanso, poder passar a intermediar produtos agrcolas. A seguir passar tambm a se ocupar do servio de transporte de carga. Mas ainda no de caminho e sim de carroa, tirada por burros. Supe-se que o vendedor ambulante (mascate) tenha surgido logo nos primeiros anos. Percorre as casas das concentraes de imigrantes japoneses com uma ou duas malas cheias de miudezas, artigos de uso pessoal de homem e mulher, adultos e crianas. Tinha a vantagem de poder comear a trabalhar com um minsculo capital. Por isso mesmo um empreendimento simples para comear. E h tambm o fotgrafo ambulante, que fazia percursos semelhantes aos feitos pelo mascate. No livro Burajiru no Nihonjin (Os Japoneses no Brasil), do Prof. Hiroshi Saito, encontramos o seguinte trecho, bastante elucidativo, sobre a mobilidade profissional dos imigrantes japoneses: "Vamos tocar na mobilidade profissional antes de 1930, destacando a formao do setor comercial e industrial. Entre os primeiros imigrantes houve aqueles que se transferiram do emprego de colono, de baixo salrio, nas fazendas, para trabalhador em construo de estradas de ferro ou estivador nas docas. Entre os que permaneceram nos cafezais e que tinham sido (no Japo) carpinteiros ou ferreiros, voltavam a exercer

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a profisso anterior, na primeira oportunidade que surgisse na fazenda. Isso porque o salrio era melhor. Nas zonas de grandes fazendas no havia oportunidade para eles se transformarem em carpinteiros e ferreiros independentes. Essa possibilidade s surgiu quando os imigrantescolonos passaram a lavradores arrendatrios ou proprietrios, verificando-se ento uma diviso profissional dentro dos ncleos coloniais. A mesma tendncia se verificou igualmente no comrcio. Por volta de 1915, aparecem pela primeira vez, na zona cafeeira da Mogiana, vendedores ambulantes japoneses que comearam a vender miudezas para os colonos. J por volta de 1920, alguns desses mascates se estabeleceram com lojas na rea da rua Conde de Sarzedas. O imigrantecolono costumava hospedar-se em alguma casa dessa zona, quando a caminho de mudana para outra localidade ou viagem de observao e estudos. Depois da pequena loja de comrcio que vendia uma ampla gama de artigos, surgem hotis e penses. E assim se formou a 'Rua Conde', sinnimo de bairro japons" (Hoje sofreu uma grande ampliao para o bairro da Liberdade e mais conhecido como Bairro Oriental, devido presena no s de nipnicos e seus descendentes como de chineses e coreanos). c) Formao de ncleos coloniais Comeou nos primeiros anos da dcada de 1910 a formao de ncleos coloniais (mais comumente conhecidos como "colnias") japoneses. No caso especfico de nipnicos, a formao de ncleos coloniais apresenta os cinco tipos seguintes: 1) Imigrantes constituem em determinada rea um pequeno agrupamento em forma de "gerao espontnea". Aumenta o nmero dos que adquirem terra nessa rea e acabam por formar uma concentrao de propores considerveis chamadas ncleos coloniais ou colnias (no confundir com a "colnia" da fazenda e tambm com a "colnia", designao geral de comunidades estrangeiras estabelecidas no Brasil). Exemplos de colnias japonesas que ainda existem nas proximidades de So Paulo: Mairipor (antiga Juqueri), Suzano, Mogi das Cruzes, Cotia. Na poca havia ainda colnias nipnicas chamadas Taipas, Freguesia do O, Morumbi, Barueri, Cachoeira, etc. Ainda do tipo "gerao espontnea", porm de aspecto diferente, temos o caso da concentrao de naturais da provncia de Okinawa, no litoral sul do Estado de So Paulo, ao longo da Estrada de Ferro Santos Juqui(*) hoje incorporada E. F. Sorocabana. Os primeiros okinawanos
(*) A estrada de ferro, construda por capital ingls, chamava-se originariamente "SouthenSo Paulo Railway".

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ingressaram nas proximidades da estao Ana Dias, onde chegaram (partindo de Santos) como operrios das obras de construo da ferrovia (construo no perodo de 1912 a 14). Com a abertura da estrada, chegaram mais co-provincianos, regra geral procedentes de Santos, aonde haviam chegado, provenientes das fazendas de caf do interior. Formaram-se assim mais colnias alm de Ana Dias: Cedro, Itariri, Alecrim (atual Pedro de Toledo), Bigu, Prainha (atual Miracatu), Raposo Tavares, etc. No decorrer das dcadas seguintes consolidaram-se as bases dos okinawanos da regio, principalmente com a produo de banana para exportao. Igualmente necessrio destacar a concentrao de okinawanos em torno de Campo Grande, Estado do Mato Grosso do Sul. Pelos anos de 1910 a 1914, naturais da provncia de Okinawa que trabalharam na construo da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil (trecho Trs Lagos a Porto Esperana) comearam a fixar residncia na cidade de Campo Grande e arredores. Como a ferrovia ainda estava em construo, dos primeiros imigrantes japoneses a alcanar Campo Grande, muitos procediam da Argentina, para onde haviam reemigrado do Brasil. Alguns procediam do Peru, onde a imigrao nipnica comeou em 1899. O primeiro grupo que seguiu direto de Santos para o ento Estado do Mato Grosso era formado de 75 imigrantes, composto principalmente de okinawanos oriundos da Fazenda Floresta, conta Tomoo Handa em sua obra O Imigrante Japons Histria de sita Vida no Brasil. Em Santos receberam a informao de que nas obras ferrovirias da Noroeste se ganhava muito dinheiro. "Partiram todos num pequeno navio... rumaram para o sul pelo Oceano Atlntico, at chegar ao esturio do rio da Prata. De l seguiram rio acima, percorrendo parte do territrio argentino, at a confluncia do rio Paraguai, pelo qual seguiram at o seu destino, Porto Esperana." Uma verdadeira odissia. Desta maneira, aquela regio do atual Estado do Mato Grosso do Sul manteve durante muito tempo a caracterstica de reunir imigrantes naturais da provncia de Okinawa. Entre as colnias okinawanas iniciadas na dcada de 1910 nesse Estado figuram a Colnia Segredo (1917) e Bandeira (1918). 2) Aproveitando a onda de interiorizao do desenvolvimento do Estado de So Paulo e norte do Paran, foi iniciado o sistema de venda de lotes em matas virgens de grandes propriedades. Na prtica, formavamse colnias por meio de compra de lotes resultantes da diviso de extensas reas de terras. Desse movimento participavam elementos pioneiros ou pessoas previdentes e ambiciosas capazes de perceber as futuras possibilidades de terras novas. A ento surgiam imigrantes das primeiras

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levas que estavam em condies de servir de intermedirio nos negcios imobilirios. Ou eles prprios adquiriam (a prazo) grandes reas para revend-las em loteamentos. O tamanho de cada lote variava muito, mas, regra geral, mediam cerca de 10 alqueires. Todavia, conforme a capacidade de capital do comprador, este podia adquirir terrenos de 50 a 100 alqueires, ou maiores ainda. No Estado de So Paulo e norte do Paran, esta era a forma mais aplicada para a formao de colnias (shokuminchi). Ainda na segunda metade da dcada de 10 formaram-se, entre outras, as colnias de Hirano, Tokyo, Brejo, Vai-Bem e outras. Na dcada seguinte fundaram-se numerosas colnias. 3) Capital privado do Japo adquire terras ou recebe concesso sem nus de terras devolutas e as loteia, colonizando-as com imigrantes residentes no pas ou vindos diretamente do Japo. Exemplos: a j citada Colnia de Iguape (Registro e outras), da Kaik; Bastos, Tiet, Trs Barras, Nova Aliana e outras fundadas pela Burajiru Takushoku Kumiai (Companhia Colonizadora do Brasil, mais conhecida por Bratac). Entidades filiadas Bratac tambm fundam colnias: a Associao de Emigrao da Provncia de Kumamoto fundou a Colnia Vila Nova; a Associao Ultramarina de Shinano colonizou a Primeira Aliana; a Associao Ultramarina da Provncia de Tottori fundou a Segunda Aliana e a Associao Ultramarina da Provncia de Toyama a Terceira Aliana, etc. No caso 3, geralmente os colonos adquirem o terreno no Japo, emigrando depois. Assim sendo, procurou-se diferenciar os ncleos por eles colonizados daqueles formados por antigos imigrantes, trabalhadores contratados das fazendas de caf. J vimos que os segundos chamam-se shokuminchi (colnias). Os primeiros receberam o nome de ij-chi (terra que recebeu os imigrantes; terra para onde se emigrou). Havia certa diferena no s na denominao como tambm at certo ponto na mentalidade dos moradores de 3 em relao aos de 2. Num pas onde havia muita tradio de natureza feudal, persistia a tendncia de se respeitar mais tudo o que tivesse carter oficial, governamental. As ijchi, embora de capital privado, tinham o apoio do governo de Tokyo. Por isso, os imigrantes das ij-chi sentiam-se de certa forma diferentes dos patrcios das colnias. Comeava pela diferena de mentalidade em relao emigrao: quase todos os imigrantes de ij-chi que vinham como proprietrios das suas terras estavam decididos a radicar-se definitivamente no Brasil. 4) Outra forma, que talvez no se possa chamar de colnias, acontecia em poca de grande prosperidade na cotonicultura. Numa certa zona concentravam-se japoneses arrendatrios para cultivar algodo, forman-

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do um agrupamento homogneo. Originavam-se como nas outras colnias e ij-chi associaes japonesas, associaes de moos, chegando a manter escolas. Entretanto, como no havia a propriedade da terra, sua existncia era efmera, desaparecia por causas diversas: queda no preo do algodo, rpido esgotamento do solo, etc. Exemplos dessas concentraes nipnicas existiram principalmente nas regies da Mdia Sorocabana, Paulista, Araraquara, Douradense (estas duas ferrovias foram extintas). 5) Formao de colnias japonesas nos ncleos coloniais oficiais do governo federal ou estadual. Antes da II Grande Guerra existiam as colnias de Primeira e Segunda Mono, na estao Cerqueira Csar, na Sorocabana. No ps-guerra citam-se as colnias de Una, Itaberaba e Juscelino Kubitscheck, no Estado da Bahia; Dourados, em Mato Grosso. Na regio amaznica: Bela Vista (antiga Manacapuru), Acre, Amap, Eugnio Sales, Guam, Monte Alegre, etc. d) Colnias formadas na dcada de 1910 Iguape (Via Linha SantosJuqui). Cronologicamente, a primeira (na realidade um conjunto de trs colnias) formada por japoneses no Brasil. Ikutaro Aoyagi, representante da Tokyo Syndicate, recebeu, conforme acordo estabelecido com o governo paulista, terras de propriedade do Estado, sem nus, fundando as trs colnias de Registro, Katsura (Gipovura) e Sete Barras, iniciando a sua explorao no ano de 1913. Como todas ficavam s margens do rio Ribeira de Iguape, o conjunto ficou conhecido pelo nome de Colnia Iguape. E tambm a nmero 1 entre as colnias fundadas por capital privado nipnico. A Tokyo Syndicate era uma sociedade empresarial organizada por Aoyagi, junto com alguns capitalistas, com a finalidade de promover o desenvolvimento de japoneses no alm-mar. Juqueri (arredores de So Paulo). Comeou em maio de 1913, com a entrada de 10 famlias lideradas por Nagatoshi Akimura que haviam terminado o perodo contratual na Fazenda Guatapar. Eles compraram terras na ento Vila Juqueri, subrbio de So Paulo, e para l se transferiram. Seguiram-se outros interessados, que adquiriram terras ao redor de Vila Juqueri para onde se mudaram. Em cerca de dez anos, havia sido completada a estrutura de uma colnia (shokuminchi). Em 1923, organizava-se a associao japonesa com o nome de Juqueri Doshikai (Associao dos Companheiros de Juqueri). Trata-se da primeira colnia organizada pelos prprios imigrantes. Pertence categoria 1 (gerao espontnea), citada anteriormente. Cotia (arredores de So Paulo). Japoneses comeam a chegar a partir

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do segundo semestre de 1914, acabando por formar uma considervel concentrao. Desde o incio a bataticultura foi a principal atividade dos colonos. A terra que gerou em 1927 a Cooperativa Agrcola de Cotia, organizada por produtores de batata, ocupa posio especial na histria da imigrao nipnica no Brasil. Tambm pertence categoria 1. Tokyo (linha tronco da E. F. Paulista). Fundada em maro de 1915. Os colonos desde logo plantaram caf e cultivaram algodo, arroz, milho e tambm se dedicaram criao de bicho-da-seda. Segundo a publicao Jih, os colonos chegaram literalmente com as mos vazias, mas "conseguiram construir as bases atuais, vencendo a luta contra doenas e dvidas". A figura central era Sunao Baba. Hirano (Linha Noroeste). Unpei Hirano, um dos cinco intrpretes dos imigrantes do Kasato-Maru e que permanecera na Fazenda Guatapar, teve a idia de organizar uma colnia. Convidou chefes de famlias e solteiros para participar do seu plano. Comeou a desbravar a mata em agosto de 1915. Eram 1.200 alqueires, situados a 13 quilmetros da estao Presidente Pena (atual Cafelndia). Foi a primeira colnia fundada por imigrantes nipnicos na zona Noroeste. No entanto, a partir de janeiro e fevereiro de 1916, comeou a grassar uma epidemia de malria que logo atingiu virtualmente todos os colonos. Por causa da penria, os colonos no se alimentavam adequadamente, a debilidade fsica facilitava o avano da doena. E no havia qualquer meio de recorrer ao tratamento mdico. Transformou-se na maior tragdia da histria da formao de colnias como da prpria histria das oito dcadas da imigrao japonesa no Brasil. "Acontecimento trgico com sacrifcio de mais de oitenta vidas", informa Seiho. "Dezenas de dias de cremao na mata", noticia Jih. O infortnio dos colonos no acabou a. Em novembro de 1918, verificou-se uma terrvel invaso de gafanhotos, que chegaram a paralisar trens da Noroeste. Em duas ou trs horas, todas as culturas agrcolas foram devoradas. Um acontecimento realmente gravssimo. E tem mais: em 1919, uma tremenda seca reduziu as colheitas metade! Nas histrias de desbravamento e explorao de mata virgem, formao de colnias, existe um denominador comum a todos os seus participantes: extremos sofrimentos fsicos e morais a que so submetidos os imigrantes. A pressa, a precipitao ou mesmo afobao em conseguir resultados ganhar dinheiro faziam com que eles no cuidassem nem do mnimo de conforto na habitao, e a alimentao deixava muito a desejar. Mas a amplitude e profundidade da tragdia da Colnia Hirano ultrapassam qualquer padro que se possa estabelecer. Cacatu (sul do Paran). Japoneses comeam a ingressar, por volta de 1916, nessa localidade situada nas proximidades do porto de Antonina,

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Estado do Paran, formando ali uma pequena colnia. Adquiriram terras, plantaram arroz, banana, cana-de-acar e produziram principalmente pinga. Organizaram uma associao de japoneses e havia uma escola primria. Informa-se (no temos dados exatos) que na poca contava pouco mais de dez famlias japonesas. Vai-Bem (E. F. Sorocabana). Fundada em julho de 1916. Ken-ichiro Hoshina, o primeiro imigrante nipnico a fundar um jornal (Nanbei O Amrica do Sul), serviu de intermedirio na venda de terras. Da estao Indiana, ento a ltima da Sorocabana, os colonos andaram a p, carregando moblias, alimentos e outros pertences, atravessando mata virgem para chegar colnia. Anos depois, essa aventura foi contada um sem-nmero de vezes pelos pioneiros fundadores da Colnia Vai-Bem. O jornal Nanbei publicou muitos anncios de venda de terras na colnia, ao lado de propagandas de outro loteamento, a Colnia Brejo. Crticos diziam que o jornal fora editado para vender as terras. Brejo (Sorocabana). Localizada na estao Alvares Machado, na linha Sorocabana, 30 quilmetros mais perto de So Paulo do que VaiBem. Fundada pelo mesmo Ken-ichiro Hoshina, tinha uma rea bem maior do que a outra, contando por isso um nmero tambm maior de colonos. No auge da colonizao teria alcanado cerca de 500 famlias, somando 3 mil pessoas. A Colnia Brejo deixou, como a Hirano, uma histria trgica. Muitas vidas se perderam em conseqncia de subnutrio, esgotamento por trabalho excessivo, do que resultaram doenas ento incurveis, como a tuberculose pulmonar e outras. Brejo conserva at hoje o nico cemitrio japons do Brasil. No livro de registro do cemitrio consta a relao nominal dos mortos, inclusive numerosas crianas. E entre os adultos avultam moos de 20 a 30 anos de idade, o que prova a dureza da luta pela vida dos imigrantes na fase inicial da Colnia Brejo. O livro Takukon (Esprito Desbravador), que conta a histria dos 50 anos da imigrao japonesa em Alvares Machado, narra o seguinte: "Existe at a verso de que nati-mortos eram enterrados num canto da roa. Diante do problema da falta de um cemitrio numa conjuntura em que os bitos se sucediam, o sr. Naoe Ogasawara (que trabalhou na formao das colnias Vai-Bem e Brejo ao lado de Hoshina) se dirigiu at a localidade de Conceio, em Paraguau Paulista, em cuja prefeitura obteve permisso para a abertura de um cemitrio. Na poca, fazia-se o registro de nascimento e bito no cartrio de Conceio. Ogasawara, pessoalmente, se encarregou da construo do cemitrio, derrubando a mata de uma parte dos cinco alqueires do terreno da escola. Logo aps a queima das rvores derrubadas, faleceram sucessivamente o sr. Hannan Ogasawara e filho; Tsunekichi, irmo mais novo de

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Hannan; sra. Toyama, de parto e seu filhinho recm-nascido; sr. Mankichi Kawano, pai e filho. Lpides foram sendo colocadas uma aps outras, com muita rapidez. Muitos bebs morreram antes mesmo de receberem nomes. Essa era a situao por volta de novembro de 1919. [...] No comeo, as lpides eram colocadas desordenadamente, mas com o tempo filas mais ou menos ordenadas se formaram. Em fevereiro ou maro de 1921 j apresentava um aspecto de cemitrio mais ou menos organizado". Itacolomi (Estao Promisso, E. F. Noroeste do Brasil). A 5 quilmetros ao sul da estao, Shuhei Uetsuka, que viajou com os imigrantes do Kasato-Maru como representante da Companhia Colonizadora Imperial no Brasil, adquiriu uma gleba de 1.400 alqueires. Segundo Seiho, isso aconteceu em maro de 1918. Uetsuka considerado um lder que sempre acompanhou os imigrantes, nos bons e maus momentos, compartilhando at dos seus padecimentos. Tomado por um ardente desejo de formar ali uma colnia ideal, suportou estoicamente as mesmas agruras da vida dos colonos. Atrados pela sua personalidade, muitos jovens promissores teriam se juntado a ele na obra de colonizao. Segundo parece, Itacolomi tinha boas condies de sade, no se registrando as trgicas ocorrncias verificadas em outras localidades. E na dcada de 20, quando a zona Noroeste entra numa era de grande expanso na explorao de matas virgens, Promisso se torna, durante algum tempo, uma espcie de centro de toda a regio. Um ou dois anos antes da entrada do grupo de Uetsuka, j havia muitas famlias japonesas entregues ao trabalho de desmatamento e explorao das terras virgens. Pode-se considerar que, decorrido um decnio, desde a chegada do Kasato-Maru, os imigrantes de antigas zonas cafeeiras j haviam acumulado algum dinheiro para comear uma nova fase em suas atividades econmicas. Os cafezais antigos da Mogiana e outras regies constituram uma espcie de cabea-de-ponte para os imigrantes nipnicos que de l promoveram a sua "marcha para oeste", com a explorao de novas regies, principalmente o interior paulista e o norte do Paran. Observe-se que, entre as colnias fundadas na dcada de 10, as de Vai-Bem, Brejo, Cacatu, Tokyo, Sete Barras, Katsura e outras atualmente no apresentam mais as caractersticas nem a funo de "colnias": ou desapareceram ou integram unidades administrativas locais. e) Colnias e aldeia rural (mura) Quando certo nmero de famlias japonesas se concentra numa rea, configura-se uma "colnia". No demora muito e organiza-se uma associao de japoneses com o objetivo de estreitar as relaes entre os

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patrcios e cuidar de assuntos coletivos. Quanto ao nome das colnias pode acontecer de conservar o topnimo preexistente, ou escolher outro, representando o consenso. Vai-Bem, Brejo, Birigi, Cotia, Juqueri, etc, estavam no primeiro caso, e muitos nomes japoneses como Akebono (Alvorada), Kib (Esperana), Asahi (Sol Nascente), Ty (Oriente), Showa, etc. pertencem ao segundo. A Associao Japonesa adotava o nome da localidade. Uma vez organizada a associao de japoneses, os "assuntos pblicos" ou de "interesse coletivo" da colnia passam a ser tratados e administrados por ordenao e regulamentos de carter idntico ao daqueles da mura (aldeia rural) do Japo. O presidente eleito na assemblia geral anual se torna uma figura comparvel ao prefeito da mura (sonch). Abaixo dele so eleitos outros diretores para setores de "servio pblico" da colnia. Os cargos considerados mais importantes so o de tesoureiro, assuntos educacionais, assuntos agrcolas, sade e higiene, obras (administrao, reparao de-estradas, pontes, etc. da colnia). Levando-se em conta condies geogrficas locais, pode-se instituir o cargo de chefe de bairro ou distrito, em nmero varivel. Todos os assuntos de interesse coletivo ou "assuntos pblicos", como eram chamados, tais como festas de aniversrio, casamentos ou cerimnias fnebres, seguiam o modelo adotado pela mura no Japo. Graas a esse relacionamento do tipo aldeo (mura), estabelecia-se uma ordem social entre os colonos. E, por isso, quando surgia algum que perturbasse a ordem alde, desobedecendo s normas e regulamentos estabelecidos pela associao, havia punio como no Japo. Era o chamado mura-hachibu (ostracismo de aldeia). Uma das penalidades era a excluso do "infrator" do quadro social da associao d japoneses. No raro publicava-se anncio de "expulso" de um deles em jornais da comunidade. Num trecho do livro Os Japoneses no Brasil, de Hiroshi Sai to, temos a seguinte explicao sobre colnia e mura: "Ao lado da escola existe o prdio-sede da associao que serve para as reunies dos moradores do distrito, projeo de filmes de cinema ou representao teatral. Enfim, encontramos formas idnticas de organizao de 'mura' ou 'buraku' (p. 214)... Mesmo no caso do tipo de aglomerao espontnea, a transio da reorganizao social dos imigrantes parte da reproduo da organizao de buraku (povoado, aldeia) ou mura (aldeia) do tipo japons. Mura aqui no um rgo executivo, mas sim um agrupamento espontneo".

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f) Publicao de jornais A publicao de jornais em lngua japonesa ainda no decorrer da dcada de 10 tem um significado muito grande na evoluo histrica da comunidade japonesa do Brasil. Como j vimos, o primeiro foi o Nanbei, semanal, lanado em janeiro de 1916 por Ken-ichiro Hoshina, o fundador das colnias Vai-Bem e Brejo. Em agosto do mesmo ano, Akisaburo Kaneko e Shungoro Wako comeavam a publicao do Nippak Shinbun (Jornal Nipo-Brasileiro). E um ano depois, em agosto de 1917, foi lanado o Burajiru Jih (Notcias do Brasil), tendo como diretor-proprietrio Seisaku Kuroishi. Este jornal apresentava caracterstica de rgo oficial da Ij Kumiai (Cooperativa de Emigrao) (*), da qual Kuroishi havia sido chefe da Seo de Educao, nos Estados Unidos. O Nanbei tinha mais formato de revista do que de jornal, era escrito a mo e impresso em litografia. Tambm o Nippak Shinbun e o Seishu Shinpo (Notcias de So Paulo, publicado na dcada de 20 em Bauru) eram inicialmente escritos a mo. Apesar da pobreza do aspecto grfico, os jornais tiveram boa penetrao entre os imigrantes sedentos de notcias. A publicao de jornais significava que o nmero de imigrantes aumentara e que se criara uma base econmica capaz de sustentar sua edio. Por outro lado, o nascimento da imprensa possibilitou a ligao horizontal entre os imigrantes, importante passo na estruturao de uma "sociedade" ou "comunidade" dos japoneses no Brasil. Tomando conhecimento da situao em que se achavam uns em relao aos outros, os imigrantes tinham no jornal as informaes necessrias para formar um juzo comum sobre sua situao e problemas coletivos. E verdade que existiu o caso do Nanbei, cujo proprietrio usou o jornal como instrumento para promover a venda das terras de sua propriedade. Mas a imprensa nipnica chamemos assim por comodidade de exposio desempenhou uma funo informativa e orientadora dos imigrantes patrcios, principalmente no tocante ao movimento da marcha para oeste, que se inicia na segunda metade da dcada de 10, poca em que surgem os primeiros e mais importantes jornais. Esses rgos de imprensa, lanados durante a I Grande Guerra, apresentavam acentuado carter "pessoal" dos seus proprietrios, que eram tambm os diretores. No raro serviam como instrumento de ataque ou mesmo agresso verbal aos que no seguiam a mesma cartilha do dono do jornal. Todavia, todos os proprietrios de jornal tinham a
(*) O seu nome por extenso era Burajiru Takushoku Kabushiki Kaisha (Companhia de Colonizao do Brasil S. A.). Depois se funde com a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia de Fomento Industrial no Ultramar), a famosa K.K.K.K. ou Kaik, nome mais conhecido na comunidade nipo-brasileira.

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noo da responsabilidade social da imprensa. Assumiam atitude e orientao destinadas a mostrar ao "agrupamento social" composto pelos imigrantes o caminho que acreditavam certo. Os jornais procuravam divulgar desde logo informaes sobre a situao do Brasil, ao lado de notcias da comunidade e do Japo. E tambm se esforaram em divulgar noes de tcnica agrcola e administrao da lavoura. E foi grande a contribuio da imprensa nipnica na gerao e desenvolvimento das artes, letras e esportes, na comunidade.

3. POCA DA "MARCHA PARA OESTE" a) Comea ao longo da linha Noroeste

Os imigrantes nipnicos que fizeram das antigas fazendas de caf sua cabea-de-ponte, iniciam na dcada de 20 um vigoroso movimento de "marcha para oeste". J vimos que na segunda metade da dcada de 10 formaram-se diversas colnias como uma espcie de alpondras. Depois de algumas tentativas de pequenos grupos formados de imigrantes distribudos na mesma fazenda nas linhas Araraquara e Douradense, o grosso do movimento se realiza nas novas terras ao longo da E. F. Noroeste do Brasil. A regio Noroeste foi preferida pelos imigrantes japoneses por causa da existncia de terras novas que podiam adquirir ou arrendar, pela facilidade de transporte oferecida pela prpria ferrovia e pelas distncias relativamente pequenas das zonas servidas pelas estradas de ferro Mogiana, Paulista e Sorocabana, onde se localizavam as fazendas de caf nas quais haviam trabalhado como colonos contratados. Outro fator teria sido o fato de a Noroeste ter sido aberta antes da Alta Sorocabana e Alta Paulista. A E. F. Noroeste alcanou o rio Paran, divisa com o Estado do Mato Grosso em 1910 (at Araatuba em 1908). O Notcias do Brasil editou em data de 28 de novembro de 1920 a Edio Informativa sobre o Brasil, em comemorao visita de navios de treinamento da marinha de guerra do Japo. Nessa edio publica o seguinte sob o ttulo "A Situao da Agricultura dos Japoneses no Brasil": "Trabalhadores em fazendas de caf: cerca de 2.500 famlias; lavradores semi-independentes, cerca de 3.300 famlias; independentes, cerca de 2.200 famlias. Total 8.000 famlias. Noventa por cento dos imigrantes nipnicos se dedicam agricultura no Estado de So Paulo e nas regies limtrofes dos estados de Paran, Minas, etc." Principais culturas dos lavradores semi-independentes e o nmero de famlias:

POCA DA "MARCHA PARA OESTE" 95 Cultura Principal Cafezal novo Rizicultura Cotonicultura Bataticultura Total Famlias 900 1.500 700 200 3.300 21.000 chobu (1 chobu: cerca de 9.920 m2) rea cultivada

O jornal no revela o mtodo empregado na pesquisa nem o nome dos pesquisadores, mas so dados interessantes que parecem apresentar um retrato aproximado da realidade. Tambm data da dcada de 20 a divulgao de anncios de venda de terras e de procura de colonos para formao de cafezais, com contratos de 4 a 6 anos, nos trs jornais semanais de ento (Nippak Shinbun, Notcias do Brasil e Notcias de So Paulo). 1) Anncio de venda de terras. "Ncleo colonial. Distncia da estao menos de 6 quilmetros. Em frente colnia Itacolomi. Vendemos zona de jangada brava e pa d'alho, em trs prestaes. Vejam este ncleo depois de visitar toda a Noroeste. Podem comprar, se gostarem. Quem chegar rpido ter um lucro proporcional ao tempo gasto. Estao Heitor Legl. Tratar com Teijiro Suzuki." 2) "Procura-se trabalhador contratado. Colnia Dourado. Localizao: Estao Albuquerque Lins (ou Chave 144). Terra: zona de pau d'alho e figueira(*). Local seco e sem perigo de geada. Remunerao para trato de cafeeiro: 100 mil ris por mil ps novos. Culturas intercaladas: para metade de cafeeiros empreitados se permite cultura de algodo, para os demais, cultura livre de arroz, milho, etc. S quanto ao algodo, entregar um quarto da colheita ao proprietrio da terra. No caso de aparecimento de pragas, fornecemos os produtos necessrios ao seu combate. Para cultura marginal: arrendamos 1 alqueire contra 5 mil ps de cafeeiro. Fazemos ainda um contrato especial como parceria ou empreitada para caf de quatro anos ou parceria de vrios anos. Favor o interessado decidir depois de visitar pessoalmente a terra. Tratar com Kojiro Kaneko." 3) "Fazenda Barbosa. Prazo de contrato, seis anos. No ter remunerao o trato do cafezal at o fim do contrato. Mas o gro de caf pertencer ao contratante. O corte de rvores e a residncia ficam por conta dos interessados, mas conforme a convenincia da fazenda, poder derrubar rvores razo de 130 mil ris por alqueire, entregando a casa
(*) Considera-se frtil a terra em que existem essas rvores.

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construda por 300 mil ris. A metade do custo do corte de madeira ser paga no momento de entrar na fazenda. O custo da moradia e a metade do custo de corte de madeira sero pagos um ano depois. Para sua informao: colheram-se 200 arrobas de gros de caf por mil ps, antes da geada. Os interessados devem visitar o quanto antes a fazenda. Para consultas em japons escrever para Isamu Hisatani." Esses anncios de venda de terra e procura de lavradores contratados exerciam forte fascnio sobre os imigrantes que buscavam a sua independncia econmica. E serviam ao mesmo tempo de estmulo. Essa publicidade incitava os imigrantes no sentido de participar da grande aventura de desbravar e explorar as terras virgens da hinterlndia paulista. Com a venda de lotes de matas virgens de milhares de alqueires, supondo cerca de 10 alqueires por unidade, rapidamente se formava uma colnia de centenas de famlias. Dessa maneira, numerosas colnias japonesas foram se constituindo no decorrer da dcada de 20.
b) A Noroeste, centro da comunidade japonesa

Dissemos que as terras situadas ao longo da Linha Noroeste foram as primeiras reas a receber a marcha de desbravamento encetada pelos imigrantes nipnicos. A respeito do assunto, o jornal Notcias de So Paulo, em seu artigo de fundo intitulado "A Fase de Plena Prosperidade da Linha Noroeste", edio do dia 20 de maro de 1923, escreve: "J transcorreram mais de dez anos desde que se iniciou em 1908 a imigrao japonesa no Brasil, e os imigrantes hoje so 40 mil. Examinando a distribuio por regies, verificamos a existncia de trs principais, ao longo das estradas de ferro: l. a Paulista, Mogiana e Araraquara; 2.a Juqui (inclui Iguape) e Sorocabana; 3. a Noroeste que, tendo como ponto de partida Bauru, passa por Campo Grande no Estado de Mato Grosso e chega a Aquidauana, a ltima estao onde residem compatriotas. Temos a as trs grandes regies de distribuio de patrcios, com igual populao para cada uma, aproximadamente. E um tero desse total de proprietrios de terra. De qualquer maneira, temos um tero de toda a populao japonesa no Brasil distribudo ao longo da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil. Essa a situao. E no entanto, a histria da imigrao da Noroeste comeou em 1915, portanto h apenas oito anos. E j alcanou aquela situao h pouco referida. [...]. Somos de opinio de que, quando, daqui a cinco anos, os

POCA DA "MARCHA PARA OESTE" 97

cinco milhes de cafeeiros atualmente possudos pelos patrcios frutificarem, a regio atingir sua fase de plena prosperidade. Se considerarmos como primeira linha as terras de propriedade de japoneses situadas at a distncia de dez quilmetros das duas margens da ferrovia, ela j est praticamente toda explorada. Daqui para frente, ser necessrio abrir uma segunda e terceira frentes. A margem direita tem a desvantagem de se aproximar do rio Tiet, mas quando se ouvir o som do machado dos compatriotas nas centenas de milhares de alqueires das cabeceiras do rio Aguapei e o rio do Peixe, ou seja na poca em que os cafeeiros de propriedade dos japoneses frutificarem, a zona Noroeste entrar no perodo de seu mximo desenvolvimento, segundo nossa observao".
c) Fundao de associao de japoneses e escolas

Falando de modo esquemtico, na evoluo da comunidade japonesa dos primrdios de sua formao, temos: formao de agrupamento de imigrantes que recebe o nome de "Colnia tal..." (shokuminchi); organiza-se a Nihonjin-kai (Associao de Japoneses), seguida de associao feminina e de moos; com a finalidade de ensinar a lngua japonesa, constri-se uma escola. Quando no h escola brasileira, a comunidade japonesa constri uma escola, e a oferece ao governo do Estado, que em troca manda uma professora, fazendo funcionar uma escola elementar. O ensino de japons pde funcionar junto com a escola brasileira. Existem indcios de que a primeira organizao entrosando as associaes de japoneses de uma regio ocorreu na zona Noroeste. O Notcias de So Paulo, do dia 23 de maro de 1923, publica o anncio "Encerramento das contribuies construo de uma escola municipal de artes industriais de Bauru". O anunciante Shuhei Uetsuka, presidente da Associao de Japoneses da Noroeste, comprovando a existncia de uma entidade que serve como rgo de ligao e integrao das associaes de japoneses de vrias localidades. Na edio de 10 de maio de 1924, tambm em nome de Shuhei Uetsuka, da Associao de Japoneses da Noroeste, o mesmo jornal publica o seguinte anncio: "Desejando erguer um hospital (pode ser um empreendimento conjunto de japoneses e brasileiros), solicitamos a colaborao das diversas localidades quanto ao modo de concretizar a idia. Desejamos a seguir discutir o assunto numa reunio com todos os senhores representantes locais". O anncio parece indicar que j a essa altura comeava a se difundir a idia de "comunidade japonesa".

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Entretanto, posteriormente foi divulgado novo anncio, declarando que a construo do hospital fora adiada por causa da revoluo de 24 (a revolta chefiada pelo general Isidoro Dias Lopes, em So Paulo). possvel que esse projeto ou proposta a favor da construo de um hospital para os imigrantes tenha alguma relao com a construo, no final da dcada de 30, do Hospital Japons (atual Santa Cruz). d) O estmulo do boom do caf Uma grande fora propulsora do desbravamento da hinterlndia paulista foi a volta, em 1922, da boa cotao do caf no mercado internacional. O caf, que teve sua grande crise em 1896, por causa da superproduo, e que posteriormente enfrentou outras fases de depresso, volta a ter na dcada de 1920 novo ciclo de grande expanso e prosperidade, graas a medidas protecionistas (compras macias pelo Estado para forar a alta de cotao) adotadas pelo governo de So Paulo. Essa poltica coincidiu com o movimento de marcha para oeste dos imigrantes japoneses. Todavia, a nova fase de boom cafeeiro terminou com a crise econmica mundial deflagrada com o crack da bolsa de Nova York em outubro de 1929. No perodo de grande crescimento da produo cafeeira os imigrantes japoneses se espalharam por todo o interior paulista, desbravando as matas virgens, deixando intactas apenas as regies prximas dos rios Paran e Paranapanema. De acordo com Kornia Sangy Chizu (Mapa das Atividades Econmicas da Colnia), publicado em 1962, por volta de 1923 os cafeeiros de propriedade dos imigrantes nipnicos alcanavam 25 milhes de ps e em 1928 cerca de 40 milhes. Na poca das queimadas, que naturalmente coincidia com a estao da seca, as nuvens de fumaa resultantes da queima das matas enchiam diariamente o cu, chegando a obscurecer a luz solar. Naturalmente no foram somente os imigrantes japoneses que se engajaram no trabalho de desbravamento das florestas primitivas do interior do Estado de So Paulo ou do norte do Paran, mas no h dvida de que foram eles colonizadores dos mais ativos e mais numerosos. A tendncia de concentrao em grupos constitudos s de nipnicos e a "devastao" de matas por eles praticada chamaram a ateno de alguns observadores brasileiros, que consideravam os japoneses formadores de "quistos" raciais e provocadores do empobrecimento do solo, por sua explorao apressada e avassaladora. Essas crticas avolumaram-se com o tempo, acabando por integrar a intensa campanha antinipnica que se desenrolaria na dcada de 30.

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Paralelamente a essa forte corrente de explorao de terras novas, nos centros urbanos, principalmente em So Paulo, verifica-se o fenmeno da grande mobilidade e diversificao profissional de japoneses. Tal tendncia se pode inferir de notcias e anncios publicados nos trs jornais j referidos. Entre as novas atividades profissionais que surgem contamos: hotelaria, farmcia, bar, bilhar, botequim, peixaria, armazm de secos e molhados, atacadista de cereais, beneficiamento de arroz, transportadora, empreiteiro de construo, ferreiro, carpinteiro, fbrica de shoyu, fotgrafo, mdico, dentista, acupuntura, alfaiate, lavanderia. No preciso dizer que existem tambm os vendedores de imveis (terras, principalmente). O quadro mostra que os imigrantes japoneses, ao desafiarem o "desconhecido" (adotando profisses que nunca haviam sequer sonhado em exercer), transcendiam os limites das atividades agrcolas. Dessas diferentes atividades profissionais, surgem anos depois os chamados empresrios da colnia (do comrcio, indstria, etc.)
e) A educao de filhos nos primrdios da colonizao

J vimos que a primeira coisa que os imigrantes japoneses fazem ao constiturem um aglomerado (colnia) a organizao de uma associao de japoneses (Nihonjin-kai). Seu objetivo o de promover a confraternizao e cooperao entre os associados e enfrentar problemas comuns pela unio de foras. Mas o objetivo maior era a educao dos filhos, que vieram acompanhando os pais ou que haviam nascido no Brasil. O maior desejo do imigrante era educar os filhos como filhos de sditos nipnicos; ensinar-lhes a lngua nipnica e ministrar-lhes ensinamentos sobre a cultura e o esprito japoneses. "Para que quando regressassem ao Japo no passassem vexame" por no saber falar o idioma dos ancestrais. Por isso, dois ou trs anos depois da formao de uma colnia, iniciava-se, com certeza, uma escola japonesa. Para comear, encarregase algum em condies de dar aulas de linguagem e clculos s crianas. Um curso primrio bastante simples, que lembrava o tera-koya (temploescola) que existia no Japo antes da Restaurao Meiji. No organograma da diretoria da associao de japoneses inclua-se um diretor de assuntos de educao. No cabe aqui descrever em detalhe o sistema de ensino japons adotado nas colnias. A propsito, o Nippak Shinbun, em sua edio de 31 de julho de 1925, traz o seguinte editorial: "Escola primria de japoneses e o ensino da lngua japonesa. No existe ningum entre os imigrantes estrangeiros mais preocupado do que o japons em relao educao dos filhos. Pessoas que at h pouco, vivendo no meio de mata virgem, na nsia

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de ganhar dinheiro, no se incomodavam em sacrificar mulher e filhos, uma vez conquistada certa margem de segurana em sua vida, tm de enfrentar o problema da educao da prole. E decidem ento construir uma escola primria. Trata-se de uma caracterstica peculiar dos japoneses, que quase no se observa em outros imigrantes. E uma atitude que merece apoio. Mas necessrio que os responsveis tenham muito cuidado no rumo a seguir". E aduz que os interessados acreditam que, ao construir a escola, ela deva ser dedicada ao ensino japons, tratando o ensino brasileiro como algo secundrio. No de se estranhar, em se tratando de imigrantes dekasegi, que tm por objetivo ganhar dinheiro e voltar para o Japo. Existe a uma confuso entre o ensino do idioma nipnico e a educao japonesa. E acrescenta: "Seja qual for a forma da emigrao, a maioria ter que morrer na terra para onde emigrou, logo a educao de dainisei (nisei) deve ser a local ou seja brasileira. No h necessidade de impor o esprito de reverncia ao imperador e amor ptria" (japonesa). Ser perfeito se formar cidados conscientes de seus deveres, corajosos e honestos; ento teremos uma segunda gerao (filhos de japoneses) dos quais no precisamos nos envergonhar. S uma coisa: preciso ensinar bem a lngua japonesa. Alertamos para que no se confunda essa orientao com a educao de cidados brasileiros; no se deve colocar o carro diante dos bois". Esta a concluso do editorial. Adverte em suma que no se deve sacrificar o nisei(*) para a auto-satisfao dos pais. Uma opinio bastante avanada e corajosa para a poca. As discusses em torno da educao de filhos (e netos) de imigrantes no cessam em todas as pocas, perdurando de certa forma at os dias atuais. Na edio de 15 de maro de 1927 do Notcias do Brasil encontramos a notcia da fundao da Zaihaku Nihon-jin Kyoiku-kai (Associao Japonesa de Ensino no Brasil), cujos objetivos seriam os seguintes: atividade de ligao entre as escolas; unificao da orientao educacional de filhos de japoneses; melhoria da qualidade e do tratamento do professor; realizao de seminrios e conferncias sobre a educao; aperfeioamento de livros didticos. A nova entidade instalou filiais em So Paulo, Santos, Ribeiro Preto, Promisso, Presidente Prudente, Registro, Catanduva, Penpolis, Araatuba e Ourinhos.

(*) Aqui seguimos a grafia usada por Aurlio, nisei, com um s (l-se nicei). Do japons ni, segunda, e sei, gerao. Filho de pais japoneses nascido no Brasil. Na colnia japonesa do Brasil usouse dainisei at a dcada de 40, exatamente com o mesmo significado.

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Antes de serem tomadas essas iniciativas, surgiram do lado brasileiro movimentos de opinio que causaram inquietao aos nipnicos, com relao ao problema da educao de seus filhos. O Notcias do Brasil de 17 de dezembro de 1920 publicava a notcia de que "projeto de lei que probe o ensino de lngua estrangeira a crianas de menos de 10 anos de idade em escolas particulares foi aprovado na Cmara dos Deputados e enviado ao Senado". Os imigrantes, em geral desinformados sobre leis brasileiras relativas educao, inicialmente mostravam-se quase indiferentes, diante dos movimentos citados. Contribuiu, em parte, para essa atitude, o tnue reflexo prtico das medidas oficiais nas colnias, salvo raras excees. No entanto, no correr dos anos, surgem problemas srios, devido a medidas cada vez mais severas tomadas pelas autoridades de ensino. Assim, j em 1930 ficava vedado o ensino de idioma estrangeiro a menores de 14 anos. Como sabido, na dcada de 30 o Brasil entra num perodo de poltica de intensa nacionalizao. O problema do ensino de lngua estrangeira se torna um beco sem sada para os imigrantes nipnicos. O assunto ser tratado em outro local.
f) O despertar para o movimento cooperativista

No existe um meio de se precisar quando e como surgiu a idia de se organizar uma cooperativa de produtores agrcolas entre os imigrantes nipnicos. Pode-se imaginar entretanto que entre os imigrantes na sua grande maioria lavradores deveria haver quem tivesse experincia de cooperativismo rural no Japo. Pelos dados disponveis em jornais da colnia, a primeira vez que o nome "cooperativa agrcola" aparece em letra de frma num anncio publicado no dia 5 de setembro de 1919 no Notcias do Brasil. Diz: "A finalidade desta cooperativa consiste em apoiar lavradores e outros produtores das extensas e frteis regies dos estados de Minas Gerais, Gois e outros, na pesquisa de terras adequadas s determinadas culturas, elaborao de contratos, financiamento de capital (e sua intermediao), compra e venda coletivas, e t c , todas facilidades, com a finalidade de conseguir um desenvolvimento seguro de nossos compatriotas. Os interessados em nossos estatutos, favor se dirigirem ao endereo seguinte: Syndicato Agrcola Nipo-Brasileiro Cidade de Uberaba". Considera-se esse Syndicato Agrcola como a primeira cooperativa organizada por produtores agrcolas nipnicos. Ele foi organizado pela

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unio de rizicultores do Tringulo Mineiro, sob a liderana de Tsuneshiro Ishibashi. Parece que a entidade se dedicou ao servio de compra e venda, atravs de sua filial instalada na cidade de Conquista, da mesma regio. No dispomos de informao se de fato ela tinha a estrutura de uma cooperativa agrcola. Teve uma durao curta. O referido Tsuneshiro Ishibashi publicou, na edio de 6 de fevereiro de 1920 do mesmo jornal, um artigo intitulado: "Espero a instalao de cooperativas agrcolas em diversas regies e um rgo de integrao das mesmas como um plano de desenvolvimento dos patrcios". Vamos reproduzir aqui um resumo do trabalho: "[...] Atualmente so 35 mil compatriotas no Brasil que se expandem em torno do Estado de S.Paulo, dedicando-se a diversas atividades produtivas. Entre eles encontram-se aqueles possuidores de tcnicas avanadas e experincias preciosas e tambm homens de carter, merecedores de respeito. Todavia, inexistindo um organismo apropriado, o exerccio das tcnicas e o aproveitamento de boas influncias (dos homens de elevado carter), lamentavelmente se processam com muita lentido. Eu tenho por isso um grande desejo de que haja rpido desenvolvimento das cooperativas e que seja criado um rgo unificador dessas cooperativas, para possibilitar amplo desenvolvimento da comunidade japonesa"[...] Parece-nos que este o primeiro apelo no sentido da organizao de cooperativas. E na edio de 23 de abril de 1920, ainda do mesmo jornal, encontramos um anncio em nome da Cooperativa Agrcola de Cerqueira Csar, Sorocabana, aliciando lavradores, dizendo: " impossvel conquistar xito (nas atividades agrcolas) sem a cultura de algodo e de arroz". Por a se percebe que a denominao cooperativa agrcola fora usada entre os imigrantes desde os primeiros tempos da formao de colnias. A data de fundao da atual Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central dezembro de 1927. Entretanto, no Nippak Shinbun de 10 de outubro de 1924, est publicado o seguinte anncio em nome de "Cooperativa Agrcola de Cotia". "Necessitamos comprar 7.500 sacos de farelo de arroz, sacos de 50 quilos. Aos interessados pedimos a fineza de se comunicarem com o seguinte endereo: [...]". Prova de que j existia uma entidade chamada "Cooperativa Agrcola de Cotia". Entretanto, cerca de meio ano depois desse anncio, foi publicado outro, em nome da Associao de Japoneses de Cotia, no Nippak Shinbun (19 de maio de 1925). Depois de anunciar a eleio para a diretoria de nomes como Seiki Murakami, Kameiti Yamashita, Kenkiti Simomoto,

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Susumu Yoshimoto e outros, acrescenta uma observao: "Acrescentamos para devida clareza que esta Associao de Japoneses no tem nenhuma relao em sua organizao, fundao e histrico com a Cooperativa Agrcola de Cotia". Verifica-se porm que os nomes relacionados como diretores da Associao de Japoneses de Cotia so das mesmas figuras centrais da Cooperativa Agrcola de Cotia na ocasio de sua fundao. Entre as cooperativas agrcolas de imigrantes nipnicos fundadas na dcada de 20, uma apresentou caracterstica diferente: a da Colnia Santa Rita, da estao Ibitinga, E. F. Douradense. Extramos o seguinte trecho do artigo de abertura do Nippak Shinbun de 2 de julho de 1926, com o ttulo: "A difcil situao (dos patrcios) da Linha Douradense e a organizao de uma cooperativa agrcola". "Muito embora seja coisa corriqueira em pases antigos, o movimento cooperativista que surgiu recentemente na Linha Douradense algo merecedor de aplausos. Pois trata-se de um plano inteligente, digno de encmios. Por isso a seguir registramos resumidamente o que aconteceu. "[...] Atuao coletiva. Trata-se naturalmente da nica arma dos fracos para viver neste mundo [...] Embora ainda no tenha realizado nada de concreto, a cooperativa agrcola fundada por nossos compatriotas residentes na Linha Douradense uma tentativa bastante significativa. Julgamos que chegar o dia em que compatriotas residentes em outras regies tero que idealizar planos idnticos" [...] O mesmo jornal noticia o seguinte, em sua edio de 19 de agosto de 1927: "Aldeia comunista de Santa Rita. A Colnia de Santa Rita a nica colnia de japoneses da estao Ibitinga da Linha Douradense, contando presentemente com quinze famlias. Todas sofreram os efeitos do preo extremamente baixo do algodo que durou trs anos. Em face dessa amarga experincia, elas sentiram a necessidade impostergvel de organizar uma cooperativa. Graas ao trabalho entusiasta do sr. Kenroku Ogawa, organizou-se em setembro do ano passado, uma cooperativa de carter comunista. As terras de propriedade dos cooperados somam 244 alqueires. Os cem mil ps de cafeeiros foram considerados propriedade coletiva da Cooperativa. [...] Os produtos so todos vendidos atravs da Cooperativa e as compras igualmente so feitas coletivamente. A escola administrada pela Cooperativa, sendo as despesas de sua manuteno pagas com os lucros da Cooperativa, de modo que os pais no precisam pagar mensalidades. E aos sbados, s 15 horas, todos suspendem o trabalho, sendo o domingo um dia completo de repouso. [...] Registrou um excelente resultado, com um lucro de 24 contos de ris por ano, em confronto com o perodo anterior organizao da Cooperativa". [...]

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Pouco mais de um ano depois, a 11 de outubro de 1928, o Nippak Shinbun noticiou da seguinte maneira a dissoluo da colnia comunista de Santa Rita: "Dissoluo da Cooperativa de Santa Rita. Quando em 1925, o preo do algodo sofreu grande queda, os imigrantes da Fazenda Santa Rita, estao Ibitinga na E. F. Douradense, perderam tudo. Depois, com a atuao conjunta dos srs. Kenroku Ogawa, Tokutaro Okada e mais uma dezena de famlias, uniram-se para organizar uma cooperativa. Graas ao intenso trabalho de dois anos, conseguiram pagar a dvida de quarenta contos de ris e reaver as terras. H pouco, apareceu um comprador, venderam a fazenda por cento e setenta contos de ris, dissolvendo a Cooperativa. [...]" Na segunda metade da dcada de 20, alastra-se o movimento cooperativista entre os imigrantes japoneses. A Cooperativa de Santa Rita, de carter coletivista, embora de curta durao, conseguiu alcanar o objetivo essencial da organizao, distribuindo os excedentes (lucros) proporcionalmente ao volume da produo de cada cooperado, dissolvendo-se aps atingir a sua finalidade principal. Pode-se considerar um exemplo da vitria da capacidade de organizao do imigrante nipnico. A organizao de cooperativas agrcolas no se deveu apenas iniciativa dos imigrantes. Merece destaque o papel exercido pelos jornais da colnia, atravs de noticirio e comentrios esclarecedores. E deve-se registrar o apoio do Consulado Geral do Japo atravs da sua Seo de Fomento s Atividades Produtivas, que prestava assistncia tcnica aos lavradores. O Nippak Shinbun, que se apressou em noticiar o caso da Cooperativa de Santa Rita, escreveu o seguinte em seu editorial de 3 de dezembro de 1926, sob o ttulo "Associao de Japoneses e Cooperativa Agrcola": "Em resumo, o desenvolvimento das colnias e o prprio progresso dos imigrantes japoneses em geral, depender de uma organizao alicerada em bases econmicas. Que organizao seria essa? No outra seno a cooperativa agrcola. Em vez de comear com associao de japoneses, se deve iniciar com a organizao de cooperativa agrcola"!...]. E no artigo de abertura da edio de 29 de julho de 1927, intitulado "Ensino do pensamento cooperativista", diz: "Como j viemos sustentando repetidas vezes, sem a cooperativa agrcola no ser possvel esperar um progresso econmico satisfatrio das colnias japonesas. Atualmente existe movimento de fundao de cooperativas em diversas localidades. E motivo de nossa satisfao, fato de na colnia de Cotia j se achem adiantados os preparativos para a criao de uma cooperativa. um fenmeno um tanto estranho, a iniciativa de homens que se dedicavam cultura de caf que o principal esteio da economia

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brasileira, passarem cultura de batata. Na verdade, a organizao que est sendo planejada em Cotia se destina principalmente tarefa de aquisio coletiva de adubos, sendo portanto, a rigor, uma cooperativa de consumo que limita o item de compra a um s artigo. Por conseguinte, de natureza substancialmente diferente da cooperativa da produo por ns preconizada e cujo objetivo a venda da produo. Naturalmente h necessidade da existncia deste tipo de cooperativa de consumo nas reas rurais. Mas deve-se dar prioridade cooperativa agrcola que tem por finalidade principal a venda dos produtos dos cooperados. De maneira que a cooperativa em organizao em Cotia, tambm no deve se limitar a lidar s com o consumo e sim avanar at a formao de cooperativa de produtores, sem o que ser impossvel conseguir um suficiente resultado no desenvolvimento econmico da aldeia de Cotia [...]". A seguir cita o exemplo das cooperativas dos alemes do Estado de Santa Catarina, sustentando a necessidade do ensino sobre cooperativismo entre os niseis, que representam o futuro dos imigrantes/ O Semanrio de So Paulo, publicado em Bauru, como j vimos, em sua edio de 8 de abril de 1927 informa que se realizou um curso de assuntos agrcolas no Consulado Geral do Japo, no qual foi estudada a organizao de cooperativas de compra e venda. E foi no dia 16 de maro de 1928 que o Nippak Shinbun comeou a srie "Como organizar uma cooperativa agrcola", de Hideo Sugiyama, advogado e tradutor pblico, um pioneiro na divulgao de leis brasileiras traduzidas para o japons. Nesse ambiente de entusiasmo pelo coopera ti vismo, fundaram-se, em dezembro de 1927, a Cooperativa Agrcola de Cotia; em maro de 1928, a de Katsura (Iguape) e a Cooperativa de Produtores Agrcolas de Registro; em dezembro de 1929, a Cooperativa de Produo Agrcola de Juqueri. Desde ento, at a primeira metade da dcada de 30, foram criadas numerosas cooperativas agrcolas nos arredores de So Paulo, no interior paulista e no norte do Paran. Da segunda metade da dcada de 20 at o comeo da de 30 tambm foi um perodo frtil, em que se fundaram muitas colnias de categoria 3 (Ij-chi) descrita em "Movimento pela formao de ncleos coloniais": a Primeira Aliana no interior da E. F. Noroeste (1924); Segunda Aliana (1926); Terceira Aliana (1928); Bastos, na linha Sorocabana (atual Alta Paulista, 1928); Tiet, na Noroeste (1928); Trs Barras (norte do Paran, 1932); Vila Nova (Noroeste, 1928) e Nova Aliana (Noroeste, 1932). Essas colnias deixaram marcas significativas no s no setor econmico como tambm na rea cultural da comunidade japonesa ou Nikkei (de origem japonesa). Pelo que foi exposto, a dcada de 20, em especial a sua segunda

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metade, representou uma fase em que os imigrantes nipnicos implantaram suas bases econmicas no Estado de So Paulo, com um moral bastante elevado. Esse estado de esprito de pioneiros que desbravam sertes bravios era enaltecido em "hinos da colnia", "hino de associao de moos", etc. Tais hinos, escritos em estilos grandiloqentes, enalteciam as glrias do Japo, sua histria, o esprito de expanso no ultramar (emigrao). E preconizavam a radicao no solo brasileiro para a construo de uma utopia.
g) Tragdias causadas pela pressa do sucesso

No entanto, h o outro lado da histria. Mesmo no perodo em exame, ou seja, na dcada de 20, quando os imigrantes nipnicos conquistavam espao no s no sentido geogrfico, como tambm no tocante s suas atividades econmicas, continuavam os dramas dos imigrantes recm-chegados e de outros, menos afortunados em suas vidas. A vida continuava dura e ingrata em grande parte das fazendas de caf e no cessavam as fugas de imigrantes contratados. E na vida dos colonizadores (desbravadores de matas virgens em grande parte) reinava a opressiva solido e a feroz agressividade da selva, alm de outras inmeras adversidades a enfrentar. Os trs jornais japoneses da poca trazem notcias dramticas de doentes mentais, suicdio por desespero, incestos, adultrios, brigas por excesso de aguardente (a nica bebida alcolica ao alcance do bolso do trabalhador pobre) que acabam em ferimentos ou mesmo mortes; agresses, roubos, estupros praticados por maus camaradas (empregados diaristas). As moradias nas fazendas (j vimos) e nas colnias recm-formadas no meio da mata virgem, regra geral, no apresentavam o mnimo de conforto. No raro famlias inteiras dormiam num nico compartimento, do que como fcil imaginar resultavam tenses morais e instabilidades emocionais. Nessa situao, aconteciam relaes sexuais ilcitas, atritos e violncias. A mulher vivia, em certas colnias, sexualmente quase indefesa, dentro de casa ou em lugares ermos. No raro as casas ficavam muito distantes umas das outras. possvel ainda conjecturar a vida do colonizador em reas fechadas pela selva, onde tinha de trabalhar a todo vapor, a fim de conseguir ganhar dinheiro, melhorar de vida, ter sucesso, enfim. Ele deveria estar carregado de incertezas e inquietaes tanto de ordem material como espiritual. Da talvez a ocorrncia de freqentes casos de perturbao mental. Na pressa ou mesmo afobao de alcanar xito a todo custo no

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trabalho de desbravamento e explorao da terra que ainda no conhecia era praticamente impossvel desejar alguma folga na vida pessoal e familiar ou algum meio de encontrar um pouco de tranqilidade espiritual. O Nippak Shinbun do dia 26 de agosto de 1927, com o impressionante ttulo "As condies de vida dos patrcios nas colnias so iguais s do campons do Japo h mil anos; assim o dainisei sofrer degenerao", traz a seguinte entrevista do Prof. Dr. Seizo Toda, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Kyoto e membro da Comisso de Planejamento da cidade de Osaka, que visitou o Brasil, na volta de uma viagem de estudos Europa e Estados Unidos. "[...] Visitei colnias de compatriotas da Linha Noroeste. A primeira coisa que me impressionou sobre o estado sanitrio da regio foi a cor feia do rosto de todos os patrcios. [...] Em poucas palavras, a causa reside no estilo no civilizado de vida. [...] Se a noo de higiene das colnias nipnicas se mantiver no baixo nvel atual, uma colonizao na regio amaznica ser impraticvel: podem enviar dezenas de, milhares de colonos que perecero todos em poucos anos. [...] O maior defeito est no estilo de construo de casa. [...] Nesse aspecto, eles vivem ao nvel dos camponeses do Japo de h mil anos. [...] Os dainiseis que crescerem nesse ambiente acabaro se degenerando..." O Prof. Toda comeou a escrever sobre a "Crise de higiene nas colnias japonesas", a partir da edio de 22 de novembro de 1928, do Notcias do Brasil, narrando suas impresses de viagem. O contedo idntico ao da entrevista dada ao Nippak Shinbun. O Prof. Toda visitou a zona de Lins, na Noroeste. Ele destacou principalmente as moradias antihiginicas das colnias. Chegou a dar orientao para a construo de casas melhores do ponto de vista higinico. As observaes do cientista a respeito de Lins poderiam se aplicar a todas as fronteiras de desbravamento abertas pelos imigrantes nipnicos. Alis, a pobreza das moradias (choas primitivas) dos colonos japoneses dos primeiros tempos contrastava com as culturas agrcolas que eles cuidavam com todo esmero. Na poca diziam que se podia reconhecer o stio de um japons pela beleza de suas plantaes e a misria de sua casa... Os seguintes tankas (poemeto japons de 31 slabas) foram escritos por imigrantes da poca:

1) Mizu no gotoki kayu susuri tsutsu shokumin no seik isogu wo omou te kanashi

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Tomando mingau ralo de arroz sinto pesar ao pensar na pressa do colono em alcanar sucesso. (Kach, 1920) 2) Yama koya no yashi no kabe yori nagare komu tsuki no hikari ni waga mi wa hieru A luz do luar entrando pela parede de juara da choa feita no mato refrigera meu corpo. (Shf-ken, 1925) 3) Y batake kuwa wo tomezaru oya no te wo miiru kodomo ni tasogare fukashi O lusco-fusco aprofunda a figura do menino olhando as mos do pai que no larga a enxada. (Bosanjin, 1928) (De Kornia Man-y-sh) (Traduo livre, sem preocupao com a forma potica)
4. A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920

A primeira leva de imigrantes nipnicos para a Amaznia foi o grupo de 43 famlias, 189 pessoas, que chegou ao porto de Belm em setembro de 1929. Muito antes desse grupo vindo diretamente do Japo, houve japoneses procedentes do Peru, que, atravessando a cordilheira dos Andes, se fixaram em alguns pontos da Amaznia, e outros que, partindo do Estado de So Paulo, "subiram" na direo norte, indo parar na vasta regio setentrional do Brasil. Todavia, no temos meios de conhecer o seu nmero e seu paradeiro. Em condies naturais mais desfavorveis e mesmo hostis do que no sul, na Amaznia os imigrantes tiveram de superar e vencer dificuldades e bices ainda maiores at encontrarem um meio de vida apropriado regio. Foram anos e anos de luta contra as adversidades naturais, at que finalmente conseguiram se estabelecer, dedicando-se a atividades propcias s condies climticas e ao solo amazonense. E assim chegaram at os nossos dias.

A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920 109

Em fins da dcada de 20, a distribuio de imigrantes nipnicos no Sul do pas era a seguinte, de acordo com um levantamento realizado pelo Consulado Geral do Japo em So Paulo, divulgado pelo Notcias do Brasil de 22 de junho de 1928. Data: outubro de 1927 1) Jurisdio do Consulado Geral em So Paulo 2) Jurisdio do Consulado de Bauru 3) Jurisdio Filial em Ribeiro Preto 4) Jurisdio Agncia em Santos 5) Jurisdio do Consulado do Rio de Janeiro Total Populao 21.303
19.771 17.421 6.272 314

Famlias 4.595
4.061 3.292 1.376 54

65.081

13.380

Somando-se a esses totais os imigrantes que chegaram entre outubro de 1927 e junho de 1928, temos: Populao: 72.289; Famlias: 14.507 As "jurisdies" dos consulados japoneses da poca eram as seguintes regies: 1) Cidade de So Paulo e subrbios, Central do Brasil e adjacncias, parte da linha Sorocabana, Minas Gerais e os trs Estados meridionais. 2) Cidade de Bauru e subrbios, Linha Noroeste, Paulista e parte da Linha Sorocabana. 3) Cidade de Ribeiro Preto e subrbios, Linha Mogiana, E. F. So PauloMinas, Linha Araraquara, Tringulo Mineiro, Gois, Linha Paulista, E. F. So PauloGois. 4) Cidade de Santos e subrbios. Linha SantosJuqui, Iguape. 5) Cidade do Rio de Janeiro e proximidades. Estas informaes foram veiculadas pelo jornal. Sobre a situao da produo agrcola, o jornal reproduz o resultado da pesquisa feita pela Kaik, acrescido do aumento posterior, como segue: Total da receita anual da produo dos japoneses no Brasil (Unidade de rea: alqueire; valor monetrio: mil ris) Total de famlias japonesas do Brasil 10.794 rea de terras de sua propriedade 59.073 Valor da produo de caf 12.090.000 Valor da produo de arroz 10.828.000 Valor da produo de algodo 5.669.550 Receitas diversas 38.103.400 Total 66.690.950

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A distribuio pelas regies de concentrao de japoneses a seguinte: Zona da Linha Mogiana Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total Tringulo Mineiro Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total Linha Paulista Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total Linha Araraquara e So Paulo-Gois Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total Linha Douradense Famlias rea de terras de sua propriedade

1.742 35 132.000 1.776.400 62.400 5.226.000 7.196.800

313 140 45.000 1.034.000 469.000 1.548.000

650 2.185 390.000 547.000 343.580 1.625.000 2.905.580

730 2.320 858.000 805.600 343.200 1.460.000 3466.800

377 2.137

A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920 111

Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total

510.000 158.000 395.200 754.000 1.817.200

Linha Noroeste (exclusive o Estado do Mato Grosso) Famlias 3.004 rea de terras de sua propriedade 31.075 Valor da produo de caf 8.055.000 Valor da produo de arroz 3.373.600 Valor da produo de algodo 1.151.400 Receitas diversas 3.000.000 Total 15.580.000 Linha Sorocabana (inclusive norte do Paran) Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Valor da produo de arroz Valor da produo de algodo Receitas diversas Total

1.724 7.713 1.875.000 1.257.400 3.373.500 1.700.000 8.205.900

Arredores de So Paulo (inclusive Central do Brasil, exclusive cidade de So Paulo) Famlias 792 rea de terras de sua propriedade 1.780 Valor da produo de arroz 180.000 Receitas diversas 18.750.000 Total 18.930.000 Santos e Arredores Famlias Receitas diversas Linha SantosJuqui Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de arroz Receitas diversas Total

245 1.570.000

414 470 1.696.000 630.000 2.326.000

112 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920

Zona de Iguape Famlias rea de terras de sua propriedade Valor da produo de caf Receitas diversas Total Sul do Paran Famlias rea de terras de sua propriedade Receitas diversas Estado do Mato Grosso Famlias rea de terras de sua propriedade Receitas diversas

519 10.218 225.000 2.000.000 2.225.000

35 700 122.500

249 300 896.400

O Notcias do Brasil acrescenta: "No quadro no est includa a cidade do Rio de Janeiro nem a cidade de So Paulo. No presente momento, o nmero total de famlias est estimado em 14.507. Comparando com as 10.794 famlias da poca da pesquisa, chegamos aos seguintes nmeros estimados: Nmero total de famlias japonesas no Brasil 14.507 rea de terras de sua propriedade 85.656 (Exclusive as terras adquiridas pelas Ij-kumiai e Nanbei Kigy Kumiai). Receita total anual dos japoneses no Brasil 100.000.000." "Comparando prossegue o jornal com o tempo em que chegou a primeira leva de imigrantes, quando estes mal conseguiam ganhar o po de cada dia; e ainda, com a situao de h dez anos, quando a receita anual de 9 mil contos de ris causou admirao, a produo atual da comunidade japonesa provoca assombro pelo seu vulto." No fcil conhecer o volume de produo por meio do valor citado no quadro que apresenta algumas falhas facilmente perceptveis. No entanto, ele representa a situao da produo dos principais produtores agrcolas, rea de terras de propriedade dos imigrantes, etc. Um dos defeitos do quadro a falta de explicao do item "Receitas diversas". E tambm no h referncia s atividades profissionais dos imigrantes das reas urbanas. De qualquer maneira, porm, temos a um retrato aproximado da situao econmica dos imigrantes nipnicos, transcorridos 20 anos da chegada do Kasato-Maru.

A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920 113

O movimento dos imigrantes nipnicos de desbravamento do interior se alastrou rapidamente. Mas, em se tratando de dekasegi, era natural que dificilmente almejassem a construo de uma "utopia", plantando as razes neste pas, conforme exaltavam alguns hinos de entidades juvenis h pouco citados. O objetivo nico poder-se- afirmar da grande maioria deles consistia em conquistar o sucesso material o mais depressa possvel. Havia excees honrosas, que no entanto representavam uma minoria no conjunto da comunidade. Essa concluso pode ser inferida pelas verdadeiras avalanches de japoneses quando vislumbravam novas terras que lhes pareciam promissoras: eles avanavam na direo da nova Cana. No raro esse movimento acontecia antes de decorrer dez anos do desbravamento de uma rea. E Alto Cafezal (atual Marlia) se tornou o principal alvo da nova movimentao de imigrantes em busca de terras frteis onde poderiam enriquecer em poucos anos. Em seu editorial de 22 de maro de 1929, o Semanrio de So Paulo escrevia: "Mobilidade das colnias japonesas. [...] No presente momento, a principal concentrao de japoneses est acontecendo ao longo dos 280 quilmetros da E. F. Noroeste, com uma populao de 40 mil e mais de 40 mil alqueires de terra e 25 milhes de cafeeiros... A concentrao de compatriotas da Linha Sorocabana tambm considervel, mas apresenta uma diferena bastante expressiva. [...] A movimentao dos colonos patrcios da Noroeste avana na direo da Alta Paulista com uma energia formidvel, adquirindo terras de florestas... Pela nossa estimativa, a rea de terras de propriedade de compatriotas em torno de Alto Cafezal, num raio de 50 quilmetros, alcana cerca da metade de toda a rea das propriedades dos japoneses da Noroeste. Um aspecto bastante animador [...]. E acontece que cerca de 60 porcento dos proprietrios dessas terras, venderam suas propriedades situadas em outras reas da Noroeste. [...] Da se pode concluir que o ncleo de concentrao de japoneses da Linha Noroeste est se deslocando para Alto Cafezal". Na sua edio seguinte, o jornal lana uma advertncia contra a "moda" de vender terras j desbravadas e com culturas formadas. No entanto, este fenmeno no era unicamente dos japoneses da Noroeste. A busca de novas terras que lhes pareciam melhores constitua uma aspirao comum a todos os imigrantes. O decnio de 1920 representou uma fase de frentica e desvairada movimentao dos imigrantes nipnicos no sentido de desbravar novas fronteiras. Por outro lado, representou um tempo em que eles foram despertando para a necessidade de uma longa residncia (ainda no a radicao, fixao permanente terra). O sonho de voltar terra natal em

114 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920

poucos anos com muito dinheiro estava se desfazendo com o passar dos anos. E por isso tinham de enfrentar problemas pessoais (que como simples dekasegi no tinham) e tambm da chamada "comunidade japonesa", que estava tomando forma. S para citar alguns: o problema da educao dos filhos e da "cultura da comunidade japonesa". E, paralelamente, embora ainda vagamente, comeavam a enxergar a estrutura do pas chamado Brasil, as raas que o compem, sua geografia, sua sociedade, condies naturais, etc. E pode-se considerar que era de fato um perodo em que o imigrante japons precisava buscar o seu modo de viver neste pas. Ao mesmo tempo, ele comea a tomar conhecimento da profundidade da corrente contrria e mesmo hostil ao imigrante nipnico existente no pas. Essa preocupao ser herdada pelos imigrantes na fase de maior crescimento do movimento emigratrio do Japo para o Brasil, na dcada seguinte, ou seja, de 1930. Encarando a situao deste modo, parece que para o imigrante no houve nenhum perodo de lua-de-mel com o pas para onde migrou, como seria do seu desejo. Todavia, o povo brasileiro como um todo tinha um esprito magnnimo e generoso, praticamente sem preconceito de raa. Com o correr do tempo, os brasileiros que mantinham contato mais ntimo com os japoneses descobriram algumas de suas boas qualidades, como a honestidade, a dedicao ao trabalho, etc. Essas virtudes do povo brasileiro permitiram que o imigrante nipnico que no tinha necessariamente a mesma largueza de esprito desenvolvesse toda a sua potencialidade de trabalho e produo, algo inimaginvel em outros ambientes sociais.
a) Casos de imigrao especial

1) A Toyo Imin Kaisha (Companhia Oriental de Emigrao) enviou, em 1913, 107 emigrantes para as minas de Ouro Velho, perto de Belo Horizonte, MG, para trabalhar como mineiros. Essa emigrao resultou de um contrato com a empresa inglesa So Joo Del Rey Mining Company, proprietria da mina de ouro. O grupo chegou no dia 5 de agosto a Marselha, Frana, pelo navio Mishima-Maru, da Nihon Yusen. L se baldeou para o barco francs France, que chegou ao Rio de Janeiro a 28 de agosto. Mas, dentro de poucos meses comearam as fugas e em maro do ano seguinte no havia mais nem um dos imigrantes na mina. (Hatten-shi, vol. I, p. 422). 2) Em 1923, o Ministrio do Interior japons enviou para o Brasil 110 vtimas do grande terremoto que a 1. de setembro daquele ano devastou

A SITUAO EM FINS DA DCADA DE 1920 115

a regio de Kanto, atingindo com maior violncia as cidades de Tokyo, Yokohama e vizinhanas. Cada emigrante recebeu 200 yens de ajuda do governo japons. 3) Em 1924, o jornal Osaka Mainichi Shinbun patrocinou a emigrao de 200 pessoas para o Brasil, com a ajuda de 300 yens per capita, como empreendimento comemorativo do casamento do ento prncipe herdeiro Hirohito (depois imperador Showa). Na Cronologia Handa constam 267 imigrantes. A passagem foi inteiramente custeada pelo jornal. O grupo chegou ao Brasil a 31 de julho (Hatten-shi, vol. I, p. 323).
5. O IMIGRANTE JAPONS, O CAF E O ALGODO

Para o imigrante, os objetivos de sua emigrao eram escapar da pobreza dominante na terra natal e/ou a recuperao da situao de penria em que se encontrava grande parte das famlias camponesas do Japo na poca primeira dcada do nosso sculo. A idia de fornecimento de mo-de-obra aos pases imigrantistas ou a soluo do problema da superpopulao, consideradas pelo governo de Tokyo, nem passava pela sua cabea. Em outras palavras, para o imigrante, o caf brasileiro representava a promessa de futuro melhor. Alis, foi convencido a pensar assim pela propaganda promocional dos agentes da emigrao. Por isso, tomara a grande deciso de sua vida: sair da aldeia onde seus antepassados viveram durante geraes, desde tempos imemoriais. O caf brasileiro mostra, em 1896, os primeiros sinais de desequilbrio causado pela superproduo, que resultar do estmulo expanso de sua cultura, proporcionado pela boa cotao no mercado internacional. As grandes plantaes efetuadas nos primeiros anos da Repblica comeavam a produzir, resultando na superproduo, com declnio acentuado de preos e formao de estoques de excedentes. Informa Caio Prado Jnior, em obra j citada, que: "Nos primeiros anos da queda de preo a situao ainda se dissimular em parte com a desvalorizao da moeda brasileira; em papel, o preo do caf no oscilar muito. com a estabilizao e revalorizao da moeda depois da restaurao financeira de 1898 que se sentir todo o efeito da depreciao. Esta ser at 1905, em ouro, de mais de 50%. E paralelamente se acumularo estoques cada vez maiores de mercadoria invendvel. Eles sero em 1905, de 11 milhes de sacas de 60 kg que representavam 70% do consumo mundial de um ano" (Prado Jr., Caio. Histria Econmica do Brasil, 3." ed. 1953, p. 234-35). nessa conjuntura extremamente desfavorvel da cafeicultura do Brasil que ingressam os primeiros imigrantes nipnicos, em 1908. O pior

116 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920

que a produo continua aumentando. Na safra de 1906-7 ela chegou a 20.190.000 sacas, sendo 15.390.000 s do Estado de So Paulo. O estoque mundial na poca chega impressionante cifra de 16.380.000 sacas, em grande parte pertencente produo brasileira. (Dados numricos extrados de Histria do Caf Brasileiro, de Horibe.) Pouco antes, o governo do Estado de So Paulo havia adotado medidas restritivas ao plantio do caf, abrandando um pouco a situao, mas isso no chegou a solucionar a crise causada pela superproduo. Nessa situao, o sonho do imigrante japons de ganhar dinheiro no trabalho em fazenda de caf se desfez rapidamente. Isso no queria dizer, contudo, perda de confiana no caf que era tido como o maior e soberano item da economia do Brasil. Uma vez terminado o prazo contratual na fazenda, chegava a fase de se tornar lavrador independente. Ento procurava aplicar sua experincia na cafeicultura para plantar e cultivar a rubicea, a fim de realizar o sonho interrompido na condio de trabalhador contratado. Da tabela publicada no livro de Horibe, registramos algumas variaes do preo do caf, nos 16 anos a contar de 1890 (em mil ris por saca): 1890 37,168 1894 89,505 1895 80,555 1900 52,995 1905 40,005 1906 39,959 Verifica-se que a cotao mais alta foi alcanada em 1894 (89,505) e a mais baixa em 1906 (39,959), menos da metade do preo de 1894. Embora tenham se registrado algumas reaes no decorrer do perodo, a tendncia de baixa se tornou irreversvel. Em libra esterlina a queda se torna mais acentuada: 4,09 em 1893 para apenas 1,98 em 1906, menos da metade. Conforme j foi exposto, a cultura independente de caf por imigrantes nipnicos teve incio nos meados da dcada de 10. De acordo com o livro de Horibe, o nmero de cafeeiros do Estado de So Paulo teve a seguinte evoluo, no perodo de 1920 a 27 (em milhes de ps): 1920 824 1921 844 1922 872 1923 899 1924 949 1925 951 1926 966 1927 1.048 Total do pas 2.250.000.000 de ps em 1927.

O IMIGRANTE JAPONS, O CAF E O ALGODO 117

Por outro lado, o Mapa da Produo da Colnia, editado em 1961 pelo Jornal Paulista, informa que o nmero de cafeeiros cultivados por imigrantes japoneses, por volta de 1923, seria de 25 milhes de ps; em 1928, 40 milhes; 1932, 60 milhes. Pelos dados expostos confirma-se a informao de que os imigrantes nipnicos comearam a chegar ao Brasil numa poca em que o caf se encontrava em situao crtica devido superproduo. Acresce que os cafezais da regio para onde foram encaminhados haviam j ultrapassado a idade de plena produo. Muito ruins eram, por conseguinte, as condies de remunerao do trabalho nas fazendas de caf. Desde que se iniciou a queda do preo do caf por volta de 1896, embora se verificassem algumas flutuaes conforme o ano, a baixa prosseguiu at 1921, quando comeou a surtir efeito outro plano de defesa do caf do Estado de So Paulo. Em poucas palavras, o plano consistia em tomar dinheiro emprestado do exterior para o governo comprar caf, a fim de manter o preo em um nvel considerado razovel. Foi assim que o caf brasileiro teve o seu novo perodo de boom. Segundo ainda a obra de Horibe, entre 1913 e 1927, verificou-se uma alta de 46,103 mil ris para 170,402 mil ris por saca de 60 kg, tendo-se registrado, nesse nterim, baixa para 39,017 em 1914 e 36,368 em 1915. Quanto ao plano de defesa do caf, cuja execuo ficou a cargo do Instituto do Caf do Estado de So Paulo ento criado, teve um grave resultado negativo a mdio prazo: acmulo de estoques de caf retidos. O Instituto tinha direito de reter o produto ilimitadamente, armazenando-o e liberando-o na medida das necessidades do comrcio exportador. O governo tinha ento de financiar at 50% do valor do caf retido nos armazns. Outros estados produtores adotaram medidas semelhantes. Produzindo mais de 60% do consumo mundial, o Brasil saiu ganhando com essa manobra especulativa, destinada a forar a alta dos preos, em especial depois de 1926. Ainda de acordo com Caio Prado Jnior, o resultado foi o acmulo de estoques retidos e que se avolumavam cada vez mais. "Aparentemente a situao na lavoura era prspera: os altos preos do caf prometiam larga margem de lucros. Prometiam apenas, porque efetivamente no se vendia e exportava seno uma parte da produo, [...]. O pior que [...] no havia mais como sair da situao artificial e precria que se criara. na base de preos altos que se tinham contrado as dvidas da lavoura; era preciso pois mant-los. E isto se tornar cada vez mais difcil, exigindo retenes que aumentavam de ano para ano, e portanto novas dvidas para o financiamento de uma produo que no era vendida" (Caio Prado Jnior, op. cit., p. 241). Com o crack da Bolsa de Valores de Nova York, que eclodiu em

118 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920

outubro de 1929 e foi o estopim da grande crise econmica mundial, o preo do caf caiu verticalmente. Como vimos, os imigrantes nipnicos derrubaram matas virgens da hinterlndia paulista e expandiram seus cafezais a partir dos primeiros anos da dcada de 20, quando a cotao do produto seguia uma linha ascensional. E so surpreendidos pela brusca queda de preos, no momento em que comeavam a colher os frutos de anos de trabalho. No s imigrantes japoneses como todos aqueles que, entre 1922 e 28, plantaram cafezais ou expandiram os existentes, sofrem um tremendo golpe com a crise. Para exemplificar: o preo do caf em coco, que em 1928 era de 70 mil ris a saca, caiu para 15 mil ris em 29; em 30 chegou a apenas 8 mil ris. Como conseqncia da grave crise, os cafeicultores japoneses lanaram dois movimentos objetivando a obteno de financiamentos a juros baixos junto ao governo de Tokyo. O primeiro pedido foi de 850 mil yens de financiamento, o qual, aprovado em abril de 1926 pela Dieta (parlamento), teve sua concesso concretizada em seguida. Representaram os interessados da linha Noroeste Shuhei Uetsuka e da Sorocabana Ken-ichiro Hoshina, j nossos conhecidos. Como justificativa da solicitao do financiamento foi apresentada a crise da agricultura provocada pela m safra resultante da seca de 1925. J sabemos que as dificuldades dos lavradores no foram provocadas somente pela estiagem, mas antes de tudo e principalmente pela expanso da cultura de caf, com a ampliao da rea cultivada, embora as primeiras plantaes mal tivessem comeado a produzir. O estmulo para essa aventura veio da boa situao do caf, criada artificialmente, como verificamos linhas atrs, e da alta do preo do algodo. A propsito dos bons tempos de prosperidade observados na colnia, o Nippak Shinbun fez a seguinte advertncia no seu artigo de abertura de 6 de agosto de 1924: "No ser preciso cautela? A situao de rara prosperidade da agricultura deste ano resultante de altos preos do caf, arroz, algodo, feijo, etc, destacando-se o arroz e o feijo com 100 mil ris a saca, a mais alta cotao registrada na histria do Brasil. Famlias que ganharam dezenas de contos de ris(*) so sem conta, o que motivo de contentamento. Mas deve-se acautelar contra a tendncia para o luxo e a leviandade..." Todavia, apenas poucos lavradores do interior, alm de cotonicultores de Presidente Prudente, na Sorocabana, e os cafeicultores da No(*) Conto de ris eqivalia a mil mil-ris.

O IMIGRANTE JAPONS, O CAF E O ALGODO 119

roeste, se beneficiaram do financiamento a juros reduzidos (760 mil yens para a Noroeste e 90 mil yens para a Sorocabana). De maneira que o programa recebeu crticas da maioria da comunidade japonesa. E houve falta de transparncia no tocante ao seu resgate. Em particular, Ken-ichiro Hoshina, representante da Sorocabana, ao pleitear o financiamento, intitulou-se presidente de uma inexistente "Associao Central de Japoneses da Linha Sorocabana", chegando a publicar anncio em jornal, nessa qualidade. O segundo financiamento foi solicitado em 1929. O Nippak Shinbun de 28 de novembro do mesmo ano transcreve os termos do requerimento de financiamento a juros baixos: "Requerimento de financiamento para capital de giro de cafezal. Por causa da repentina suspenso do financiamento do Instituto do Caf, estamos no presente momento, em situao de extrema crise de financiamento e de paralisia de transaes no mercado cafeeiro, causando graves dificuldades na obteno de capital de giro. Todos ns estamos nos esforando ao mximo de nossas energias, porm j nos achamos na penosa condio de no se conseguir emprstimos, mesmo pagando elevados juros de 30 a 50 porcento ao ano. E com profundo constrangimento que nos dirigimos ao Governo no momento que adota orientao de austeridade em sua poltica econmica , mas no encontramos outra alternativa para obter financiamento. Razo porque solicitamos seja levada em considerao esta crtica conjuntura para um financiamento especial razo de um mil ris por p, para um total de 15 milhes de cafeeiros adultos, ou sejam 3.750.000 yens em moeda japonesa. Ns, as 2.500 famlias da zona Noroeste, em resultado de muitos anos de trabalho como empregados das fazendas, conseguimos iniciar uma lavoura independente... Infelizmente, porm, por insuficincia de rgos de financiamento deste Estado, ainda no temos perspectiva de sair da crise. Por isso, solicitamos a fineza de, aps estudar a situao exposta, nos seja concedido o auxlio, atravs de seus bons ofcios, pelo que apresentamos o presente requerimento, devidamente assinado. 15 de novembro do ano 4 da Era Showa (1929). a) Shuhei Uetsuka, representante da Linha Noroeste". Seguem-se as assinaturas dos representantes das estaes de Birigi, Araatuba, Penpolis, Promisso, Guaiara, Lins, Pena (atual Cafelndia), Guarant, Lauro Mller, Tibiri. Com referncia a este movimento, o Nippak Shinbun do mesmo dia 15 de novembro comenta em seu editorial: " verdade que enfrentam dificuldades, mas a causa real foi a especulao". E como exemplo de atividades especulativas cita a compra de terras ou de automvel de passeio, ou ainda de mquinas de beneficiar

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caf, prevendo arbitrariamente um bom preo para ele o que saiu ao contrrio. E acrescenta: "A rigor para cobrir essas perdas que h necessidade de dinheiro. Tambm gastos feitos levianamente em ryriya(*) contriburam para aumentar as contas a pagar no fim do ms", critica o jornal com severidade. Ou por causa da crtica do Nippak Shinbun ou porque o financiamento dos 850 mil yens teve pssima repercusso, o fato que o governo nipnico no atendeu ao pedido, alegando que "o Japo atravessava uma situao financeira difcil e por isso lamentava no poder fornecer um financiamento extra ou socorro aos colonos". A situao transcorria como relatamos de modo sumrio, quando aconteceu a revoluo de 1930, que levou Getlio Vargas ao poder. O novo governo adotou uma drstica poltica cafeeira. Na poca falava-se na existncia de um estoque acumulado de 18.344.000 sacas de caf, quando a produo anual atingia 20 milhes de sacas. Por decreto presidencial de 11 de fevereiro de 1931, o governo provisrio determinou a compra de todo o caf estocado at 30 de junho de 1931, retirando-o do mercado, e ordenou a queima dos produtos inferiores ao tipo 8. Em novembro de 1932 (pouco depois do fim da Revoluo Constitucionalista de So Paulo 9 de julho a 3 de outubro de 1932), foi decretada a proibio do plantio de caf no Estado de So Paulo durante os prximos trs anos. Segundo comunicado do Departamento Nacional do Caf, o governo comprou at junho de 1934 um total de 48.549.300 sacas, das quais 42.919.900 sacas do Estado de So Paulo. At essa data haviam sido queimadas 29.081.700 sacas. As queimas at novembro do mesmo ano somaram 33.838.300 sacas. O Estado do Paran no sofreu restries no seu plantio porque a sua cafeicultura estava no comeo e se expandiria vigorosamente, a partir da metade da dcada de 30. No Estado de So Paulo o caf plantado na primeira metade da dcada de 20 entra em plena produo por volta de 1929, quando a crise econmica se aprofunda. J na segunda metade do decnio de 30, devido ao cultivo sem fertilizantes, a terra se esgota. A diminuio da fertilidade da terra constituiu a maior causa do desaparecimento de colnias nipnicas formadas em grande nmero por todo o interior de So Paulo. Ento comea uma nova movimentao de imigrantes nipnicos em busca de cidades e seus arrabaldes ou de novas fronteiras de desbravamento.

(*) Ryri-ya, um tipo de restaurante japons, onde a comida era servida por jokyi (garonetes, no confundir com gueixas), que ajudavam o fregus a tomar bebidas alcolicas; no jantar, podiam cantar e danar.

O IMIGRANTE JAPONS, O CAF E O ALGODO 121

Por causa das circunstncias expostas, entre os imigrantes japoneses muito poucos conseguiram fazer fortuna exclusivamente com a cafeicultura. Todavia eles tiveram alguns resultados que, vistos hoje, podem ser considerados positivos. Em se tratando de uma cultura permanente, o caf contribuiu para que o lavrador adquirisse terras. E a posse da terra representa a construo de uma base econmica mais estvel. Portanto, mesmo no caso do deslocamento para outra atividade, representa um significativo fator de apoio financeiro. Possuir terra de sua propriedade significou tambm o comeo da radicao definitiva do imigrante. Fossem somente lavradores cultivando terras arrendadas, a construo dos firmes alicerces econmicos dos imigrantes teria sido difcil e levado mais tempo. Muito embora a cafeicultura tivesse causado profundas decepes ao imigrante, ensinou-lhe muito sobre a agricultura do pas. Apesar de raramente comentada no processo de acumulao pecuniria do imigrante nipnico, no se pode esquecer a contribuio da cotonicultura, em especial na dcada de 30. Os imigrantes que primeiro se dedicaram ao cultivo da malvcea foram os da Colnia Primeira Mono, da estao Cerqueira Csar, E. F. Sorocabana. Consta que foi em 1916, mas pode ter se iniciado antes, porquanto l a colonizao comeou em 1911. Falava-se em caf da Noroeste e algodo da Sorocabana, tal a expanso da cotonicultura verificada nessa regio. Segundo um levantamento feito em 1931 (Mapa da Produo da Colnia), a produo de algodo por japoneses, nesse ano, segundo as zonas, era a seguinte: Sorocabana Araraquara (ou Araraquarense) Paulista Douradense Noroeste Alta Paulista Mogiana E. F. So PauloParan Total
Obs.: arroba igual a 15 kg.

764.513 arrobas 394.405 arrobas 227.398 arrobas 221.158 arrobas 145.313 arrobas 77.013 arrobas 15.276 arrobas 2.760 arrobas 1.848.836 arrobas

A cultura de algodo por japoneses aumentou verticalmente depois do decreto de proibio de plantio de caf, j aludido. Vejamos agora as vicissitudes sofridas pelas principais culturas agrcolas praticadas por imigrantes japoneses, de acordo com a Pesquisa

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da Situao da Colnia, realizada em comemorao dos 50 anos da imigrao nipnica no Brasil (1958), dirigida pelo Prof. Teiiti Suzuki. Tipos de culturas a que se dedicavam as famlias de imigrantes nipnicos (em porcentagem):
Ano 1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1958 Caf 92,6 76,8 52,0 62,2 59,0 32,1 24,3 23,6 27,5 28,3 Algodo 1,2 4,5 12,1 11,1 14,0 39,0 39,3 31,2 20,5 8,5 Arroz 2,5 9,5 17,6 10,5 8,3 6,0 4,5 3,8 3,0 3,0 Culturas/tipo s 0,6 4,2 10,2 11,1 13,0 14,5 19,9 27,5 34,1 42,3

Numa rpida anlise do quadro, possvel ver que, at a dcada de 1920, plantadores de arroz ainda aparecem em porcentagem relativamente alta, e, por outro lado, evidente a contrastante expanso de culturas tipo suburbano (verduras e legumes, frutas, avicultura) que abastecem as cidades. O quadro mostra ainda que a partir da dcada de 30, quando o caf entra num perodo de crise praticamente permanente, verifica-se tendncia de aumentar o nmero de cotonicultores. E tambm se observa a expanso da rea cultivada com a malvcea ou do nmero de produtores, no ano seguinte a uma safra de caf prejudicada por geada ou m colheita. Exemplificando: por causa dos prejuzos provocados pela geada nos cafezais em 1923, a produo de algodo no ano seguinte somou 25.371.000 arrobas, aproximadamente o dobro do ano precedente. E pode-se perfeitamente incluir nesse resultado a expanso da safra de algodo de imigrantes nipnicos. A proibio da plantao de novos cafezais no Estado de So Paulo resultou num vertiginoso crescimento da produo de algodo por parte de lavradores japoneses. Em 1933 ela alcanou 10% da produo total do Estado de So Paulo e em 1935, 50%.
6. O IMIGRANTE E A EDUCAO DOS FILHOS a) Escolas japonesas

Descrevemos a vida atribulada dos primeiros colonos japoneses nas fazendas de caf no comeo deste captulo. Seu modo de viver cotidiano e a situao econmica no lhes permitiam uma folga mental para pensar

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na educao dos filhos. Na prtica, havia poucas crianas em idade escolar: aqueles que vieram pequenos com os pais. Anos depois, essas crianas, somadas s que aqui nasceram, engrossam o grupo das crianas que precisam de escolas. Havia fazendas situadas prximas a uma cidade, onde funcionavam estabelecimentos de ensino. Outras possuam escola dentro da prpria fazenda, onde os filhos de imigrantes podiam receber o ensino das primeiras letras. Mas, quanto ao ensino de japons a maior preocupao dos colonos nipnicos , nem pensar. Como em toda zona rural, tambm nas fazendas as crianas de certa idade para cima j ajudavam os pais nos afazeres da casa ou no trabalho do cafezal. Como j sabemos, os imigrantes eram trabalhadores rurais que haviam deixado a terra natal com a finalidade de ganhar dinheiro em poucos anos e regressar ricos ou pelo menos em situao melhor do que quando partiram. Contudo, uma vez submetidos dura realidade da vida de colono numa fazenda de caf, onde observavam menores trabalharem sujos e suarentos no cafezal, matutavam: "Se regressar ao Japo, levando estes filhos que no sabem ler e nem falar o japons, teria que enfrentar o problema de comunicao entre pais e filhos e destes com parentes e amigos. E acima de tudo, seria uma vergonha para um sdito nipnico". Era natural, portanto, que surgisse a ardente aspirao paterna de ministrar aos filhos, de algum modo, o ensino do idioma nipnico, falado e escrito. Est geralmente aceito entre os japoneses que foi a Escola Taisho, instalada em julho de 1915, na rua Conde de Sarzedas, 38, So Paulo, o primeiro estabelecimento de ensino criado e mantido por imigrantes nipnicos no Brasil. Existe, verdade, a verso de que um jovem chamado Jinshiro Tagashira ensinara a lngua japonesa de grau elementar por volta de 1914-15, na mesma rua Conde de Sarzedas. Consta mesmo que a Escola Taisho teria continuado o trabalho do jovem professor. O responsvel pela Escola Taisho foi Shinzo Miyazaki, havendo mais alguns nomes entre os organizadores (Cronologia Handa). J se viu no item "A educao dos filhos nos primrdios da colonizao'' (p. 99) que o ensino do idioma japons no interior do Estado de So Paulo acontece quando se formam as "colnias", como conseqncia do trabalho de des-bravamento de matas virgens. Com a formao de uma concentrao ou colnia de japoneses, dentro de dois ou trs anos constri-se uma escola. Um dos primeiros e principais objetivos da fundao de uma associao de japoneses precisamente a educao dos filhos de imigrantes.

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Superada a fase inicial da imigrao, quando comea um entendimento melhor entre os colonos e o fazendeiro (com o passar do tempo existe maior aproximao e conhecimento recproco), pode acontecer de, em havendo nmero suficiente de crianas em idade escolar, se instalar uma "escola" na prpria fazenda. Regra geral, as aulas eram dadas numa casa da "colnia" (parte residencial da fazenda). Quase sempre o curso era noturno, sendo algum, entre os imigrantes mais instrudos, escolhido para dar as aulas. Igualmente, nas colnias (shokumin-chi), era raro encontrar algum com ttulo de "professor". Por isso, escolhia-se algum mais competente no conhecimento do idioma japons como encarregado das aulas. Como o "professor" era um desbravador como os demais "colonos", seus companheiros o ajudavam com mo-de-obra, quando necessrio, no seu trabalho agrcola, pois, muitas vezes, sua remunerao de mestre-escola era apenas simblica. A nmero 1, entre as escolas de lngua japonesa no interior de So Paulo, foi a da Colnia Hirano (fundada em 1915), da estao Cafelndia (ento chamada Presidente Pena), na linha Noroeste. Essa escola instalou-se em 1917. No mesmo ano comearam a funcionar a Escola Primria de gua Limpa, da Colnia Birigi, tambm na linha Noroeste, e a escola Nova Esperana, de Cotia, nos arredores de So Paulo. As escolas funcionavam em construo simples (excepcionalmente em prdio de alvenaria), tipo barraco. Uma notcia de que havia uma escola de lngua japonesa numa colnia podia provocar mudanas de imigrantes para essa localidade, justamente por causa da possibilidade de educar os filhos em estabelecimento onde se ensinava o idioma dos antepassados. Como norma, um professor ensinava leitura, escrita e aritmtica, como matrias essenciais. Tanto o nmero como a idade dos alunos variava muito. Nas zonas pioneiras, com dez anos de idade, um menino ou menina j eram considerados uma fora de trabalho. Assim, a freqncia s aulas sofria constantes interrupes em poca de trabalho mais intenso na lavoura, como em perodos de colheita. Em localidades onde no havia "escola brasileira", ou ela ficava muito distante da "colnia", esta construa o prdio escolar e o oferecia ao governo do Estado, que ento enviava um professor, regra geral professora, instalando uma escola mista rural (primria), franqueada naturalmente a todas as crianas da rea e no s a filhos de imigrantes nipnicos. Ao mesmo tempo, a colnia requeria ao governo estadual autorizao para o ensino de japons. As despesas desse curso corriam por conta da colnia, e quase sempre eram pagas por sua associao de japoneses.

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mais uma amostra de como eles se preocupavam com a educao da prole.


b) Organizao de associaes educacionais e subveno do governo japons

Como foi exposto, verificou-se, na dcada de 1920, um grande avano na "marcha para oeste" dos imigrantes nipnicos do Estado de So Paulo. Fundaram-se numerosas escolas nas colnias ento criadas. Em "A educao dos filhos nos primrdios da colonizao" registramos, com base na informao do Notcias do Brasil do dia 17 de maro de 1927, que fora organizada a Associao Japonesa de Ensino no Brasil. Quer dizer que ento j havia tantas escolas, e to elevado nmero de alunos, que a educao dos filhos j constitua ou era pensada como problema de toda a comunidade nipnica. Essa organizao, posteriormente denominada Sociedade de Difuso de Ensino de Japoneses do Brasil, ser encarregada de unificar a orientao do sistema de ensino dos filhos de nipnicos no pas. E necessrio focalizar aqui o relacionamento entre o ensino de filhos de japoneses com o rgo representativo do governo japons, o Consulado Geral do Japo em So Paulo. A prpria fundao da Sociedade de Difuso de Ensino de Japoneses do Brasil, h pouco citada, resultou da Reunio de Consulta sobre a Criao de um rgo Central relacionado com a educao, convocada pelo Consulado Geral. No h informao do valor exato, mas a Histria dos 70 anos de Imigrao Japonesa registra (p. 308) que o governo japons subvencionou a construo de escolas e contribuiu com ajuda financeira aos professores, atravs do Consulado Geral.
c) Problemas que vm tona

A respeito da situao do ensino de filhos de imigrantes nos primeiros anos da dcada de 1930, o jornal Jih escreve o seguinte: "Segundo levantamento feito pela Associao de Pais de Alunos de Escolas Primrias Japonesas de So Paulo, em abril de 1932 contavam-se 187 estabelecimentos, como se v no quadro seguinte, e mais vinte, que embora j prontas ainda no haviam feito a devida comunicao aos rgos competentes.

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Zonas de localizao So Paulo e subrbios Santos e SantosJuqui Registro e vizinhanas E. F. Paulista So PauloRailway(*) E. F. Central do Brasil E. F. Mogiana E. F. Araraquara E. F. Douradense E. F. Sorocabana E. F. Noroeste Estado do Paran Estado do Mato Grosso Total
(*) Atual SantosJundia. Obs.: somente filhos de japoneses.

N" de escolas 10 10 10 13 5 3 0 6 2 36 83 8 1 187

N. de alunos 618 364 427 544 120 140 0 181 46 1.760 4.669 226 83 9.178

A seguir o jornal comenta alguns problemas surgidos em relao s escolas particulares pertencentes a estrangeiros: "[...] Entre as escolas particulares administradas por estrangeiros havia tendncia de ensinar a lngua, a geografia e histria do pas de origem, e cultivando o amor ptria dos ancestrais, obedecendo apenas formalmente s leis de ensino do Estado de So Paulo. Tal fato provocou na opinio pblica brasileira uma reao, exigindo-se fiscalizao mais rigorosa dessas escolas. As autoridades estaduais de ensino realizaram uma inspeo geral, constatando-se ento a existncia de muitas irregularidades e contravenes. Esses fatos foram divulgados nos jornais, o que despertou ateno de brasileiros, irritando-os. Mesmo entre escolas primrias administradas por japoneses, duas ou trs foram fechadas. Mas, posteriormente, tendo obedecido s normas legais, tiveram autorizao de funcionar. [...] O mtodo de ensino na seo de idioma nipnico nas escolas, segue geralmente o modelo japons, regime de seis anos, havendo alguns estabelecimentos que mantm cursos acima do primrio. As matrias so vernculo, educao moral, aritmtica, geografia, histria, cincias, ginstica e canes. Os livros escolares estavam baseados nos textos oficiais de ensino primrio do Ministrio da Educao do Japo. De maneira que havia muitas coisas incompreensveis para os alunos, por muito que o professor se esforasse em explic-las. O ensino brasileiro segue naturalmente a orientao das leis de

O IMIGRANTE E A EDUCAO DOS FILHOS 127 ensino do Estado. As classes tm aulas no perodo da manh e aulas tarde. Merece ateno o seguinte fato. Havendo diferenas entre o professor japons e o brasileiro, no tocante aos ideais, disciplina e mtodo de ensino, aquilo que o aluno aprende no perodo da manh pode ser rejeitado na aula da tarde. O aluno fica confuso e da pode surgir um desentendimento entre os dois mestres-escolas[...] As despesas de manuteno so quase inteiramente arcadas pela entidade mantenedora. Em princpio, somente as escolas oficialmente reconhecidas recebem subsdio do governo japons. A receita provm da mensalidade escolar, contribuio social (mensalidade paga Associao de Japoneses pelos scios), doaes espontneas, subsdio oficial, etc. O principal item das despesas a remunerao do professor, mnima de 100 mil ris e mxima de 400 mil ris. [...] Quanto mensalidade escolar, varia conforme a situao dos pais (proprietrio ou arrendatrio) e ainda do nmero de crianas que uma famlia manda escola. Recolhe-se o mnimo de 1 mil ris e o mximo de 18 mil ris, por cabea". Pelo resumo do artigo, possvel imaginar como era, aproximadamente, a situao do ensino de filhos de japoneses, em fins da dcada de 20 e comeo da de 30. Outrossim, segundo o nmero 2 do Boletim da Associao de Pais de Alunos de Escolas Japonesas de So Paulo, publicado em abril de 1934, o nmero de escolas japonesas fundadas entre 1915 e 1926 alcanava a cifra de 61 (Hatten-shi, vol. II, p. 194). Em confronto com as informaes do Notcias do Brasil, pode-se consider-lo um documento comprovador de como foram criadas muitas escolas, a contar de 1926, aproximadamente, e os primeiros anos da dcada de 1930. Nos primeiros tempos do desbravamento do serto (em grande parte da dcada de 20), as colnias nipnicas viviam em estado de quase completo isolamento em relao sociedade brasileira em geral. O contato com gaijin (estrangeiro, aliengena, forasteiro) se limitava ao que mantinham com camaradas diaristas e comerciantes de uma vila prxima, se tanto. Em muitas localidades, a gesto da escola japonesa seguia orientao da Associao de Japoneses, por falta de conhecimento da legislao sobre o ensino por parte dos dirigentes da entidade. Mas, naturalmente, tal situao no poderia perdurar por muito tempo. Na legislao brasileira sobre o ensino estava rigorosamente proibido o ensino do idioma estrangeiro a crianas com menos de dez anos de idade. No entanto, nas concentraes nipnicas, freqentemente essa lei era ignorada. O fato chegou ao conhecimento de autoridades brasileiras da rea e chamou a ateno da fiscalizao do Departamento de Educao do Estado. Impe-se ento a obrigatoriedade de registro como Escola

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Mista Rural para o funcionamento da escola, tornando-se o ensino em portugus o currculo regular e o de japons extracurricular. nomeado(a) um(a) professor(a) formado(a) em escola normal para a escola. E nem sempre era fcil o professor normalista se acostumar com os usos e costumes e o ambiente rstico da colnia. d) Sofrimento e angstia sob o Estado Novo Getlio Vargas, que assumiu a presidncia provisria da Repblica com a vitria da revoluo de 30, foi eleito presidente constitucional pela Assemblia Nacional Constituinte, em julho de 1934. No entanto, em novembro de 1937 deu um golpe de Estado, dissolvendo o Congresso e as assemblias estaduais, estabelecendo um governo discricionrio chamado Estado Novo. Tratava-se de um governo fortemente centralizador e de orientao nacionalista. Com a implantao, em 1930, do governo Vargas, estabeleceu-se uma nova orientao no que tange ao movimento migratrio externo e interno, com forte colorido nacionalista. A escola privada, mantida por imigrantes estrangeiros para educar seus filhos, naturalmente no escapou da sua incluso na meta nacionalizante da nova poltica oficial. Exigiu-se maior vigilncia em relao educao de filhos de estrangeiros. O governo do Estado de So Paulo baixou uma lei estadual em abril de 1933, regulamentando a educao de filhos de estrangeiros. As medidas que mais diretamente afetaram as escolas de lngua nipnica foram: 1) proibio do ensino de lngua estrangeira a crianas de menos de dez anos de idade; 2) o professor de lngua estrangeira deve ser aprovado no exame de habilitao para a matria; 3) os livros de ensino de lngua estrangeira devem ser previamente aprovados pelas autoridades de fiscalizao; 4) probe-se o uso de livros didticos prejudiciais formao do esprito nacional brasileiro. Essas medidas so reforadas em 1938, passando a restrio estabelecida em 1) para 14 anos incompletos. As medidas restritivas tornam praticamente impossvel a manuteno de escolas estrangeiras. Dada a impossibilidade de adequao nova legislao de ensino de idioma estrangeiro, foram fechadas, pelas autoridades de educao do ensino de So Paulo, 219 escolas mantidas por japoneses, 7 alems, 5 italianas, 4 portuguesas, somando 235 estabelecimentos.

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A 25 de dezembro de 1938, todas as escolas de lngua estrangeira (na maioria japonesas, alems e italianas) so fechadas. Naquela data funcionavam no Estado de So Paulo 294 escolas nipnicas, 20 germnicas; 8 italianas, de acordo com a Paurisuta Encho-sen Kyoiku-shi (Histria da Educao da Alta Paulista). Por outro lado, o jornal Notcias do Brasil, em sua edio de 21 de outubro de 1938, revelava a existncia de 476 escolas primrias japonesas, 554 professores (468 homens e 86 mulheres), dos quais 276 devidamente diplomados no Brasil. Nota-se uma considervel diferena entre os dados da Encho-sen Kyoiku-shi e os do Notcias do Brasil, mas supe-se que os primeiros estejam baseados em dados oficiais. Isto , as 294 escolas seriam aquelas oficialmente autorizadas. E difcil saber qual o nmero exato de alunos de escolas de lngua nipnica. Todavia, a Histria dos 70 Anos da Imigrao Japonesa cita um total um pouco inferior a 20 mil. O fato que com a promulgao da Lei de dois teros dos imigrantes estrangeiros, e o reforo das restries ao ensino estrangeiro, etc, a comunidade nipnica do Brasil passa a viver um pesado ambiente de opresso e intranqilidade criado pela conjuntura da poca. A ordem de fechamento sumrio de todas as escolas de idioma nipnico representou um "tiro de misericrdia" (tal a repercusso na comunidade), porquanto as medidas significavam o fim da aspirao de "educar os filhos como japoneses". Havia porm imigrantes que no queriam desistir de ensinar o seu idioma aos filhos. Davam-se aulas em casebres no meio de uma plantao, reunindo crianas em pequenos grupos, ou recorria-se ao ensino particular, de um aluno por professor. Aconteciam muitas intervenes policiais nessas "escolas" ilegais, por denncia de brasileiros, influenciados pelas idias nacionalistas e nacionalizantes do Estado Novo.
e) O papel da Associao de Moos e do esporte

Os imigrantes sofreram tambm ao se defrontar com o problema da educao de filhos adolescentes. Era muito difcil manter um curso ou escola para eles. Na situao de economia apertada em que os imigrantes viviam na poca, os adolescentes que haviam concludo o curso primrio representavam uma fora de trabalho cada vez mais produtiva, medida que cresciam. Por isso no podia se dar "ao luxo" de mant-los na escola, alm do curso primrio. Por essa razo, nas colnias o nico espao onde a juventude podia

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ampliar seus conhecimentos e aprofundar sua cultura, era a Seinen-kai (Associao Juvenil ou, como mais comumente traduzido, Associao de Moos). Uma vez consolidada a Associao de Japoneses, constitui-se a entidade seguinte, que a dos jovens. Em geral, nas colnias havia duas associaes juvenis: a masculina e a feminina. Quase sempre cabia ao professor da escola primria japonesa dar aulas aos adolescentes, em cursos de japons, noturnos ou dominicais, como uma espcie de complementao do curso primrio. Entretanto, nas fases de mais intensa atividade na lavoura, como a colheita, no havia nem descanso dominical, de modo que ento a presena de alunos nos cursos complementares se tornava quase espordica. Na Associao Juvenil funcionava uma Seo de Cultura, qual cabia, alm de promover os cursos noturnos e dominicais, fazer, com seus prprios recursos, assinaturas de revistas japonesas de diversas categorias (assuntos de conhecimento geral, comentrios, diverses, femininas, de moos e moas, de meninos e meninas, etc). As revistas ficavam disposio dos interessados, em sistema de rodzio, para leitura. E eram adquiridas nas livrarias da capital, que as importavam do Japo. de supor que a leitura pelo sistema "ler e passar adiante", de revistas nipnicas, serviu muito para aumentar a capacidade de leitura e entendimento dos jovens. As tendncias ideolgicas divulgadas nas matrias publicadas nas revistas influram poderosamente na formao da mentalidade e dos sentimentos da juventude "nipnica" da poca. Por outro lado, na dcada de 30 acentua-se cada vez mais a atuao de lderes nacionalistas e expansionistas (formao do estado-tampo do Manchukuo, invaso da China, etc), com o crescente fortalecimento e ingerncia de militares direitistas e fascistas na poltica japonesa. Veremos no Captulo 4 o quanto os moos japoneses foram influenciados pelas idias ultranacionalistas e militaristas, e at mesmo a inabalvel crena na invencibilidade do Japo. Considera-se igualmente importante o papel desempenhado pelas seinen-kai na divulgao e promoo de muitas modalidades esportivas entre a juventude. Inicialmente se realizava uma competio interna dentro de uma colnia, reunindo aficionados e eventuais esportistas com experincia no ramo. A seguir, chegava a fase de competio com colnias vizinhas. Paulatinamente o movimento ia se alastrando at abranger uma zona ou uma regio ao longo de uma linha frrea. Pouco depois chegava ao

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mbito estadual e finalmente ao "Zen-Haku" (Todo o Brasil), com a participao de representantes de colnias japonesas de vrios estados. Por intermdio desses certames esportivos, intensificavam-se os contatos pessoais entre jovens de diversas localidades, estreitavamse as relaes entre organizaes juvenis. Tudo isso estimulava e contribua para o desenvolvimento de conhecimentos e de cultura dos moos. Deve-se ainda mencionar a existncia de algumas escolas prticas de agricultura, com a finalidade de complementar os estudos feitos na escola elementar de japons nas colnias ou cidades. Sem possibilidade de precisar a data de sua fundao, temos informaes de que existiram cursos dessa natureza em Registro e em Caxingui, periferia de So Paulo (Histria dos 70 Anos da Imigrao Japonesa, captulo sobre Educao). Um estabelecimento do gnero que merece destaque especial certamente o Instituto Prtico de Agricultura de So Paulo, mais conhecido como Escola Prtica de Agricultura de M'Boy, instalado em 1932 pela Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha, a j nossa conhecida Kaik. Destinavase a formar elementos capazes de ocupar posio de liderana na comunidade japonesa no Brasil. Ministrava ensino de tcnicas agrcolas com aulas tericas e prticas, alm de lngua portuguesa, japonesa, histria e geografia do Brasil, conhecimentos gerais, etc. Todavia, na situao econmica em que se encontravam os jovens rurais na poca, e tambm diante do seu nvel intelectual, uma escola com to ambicioso objetivo parecia uma takane no hana (uma flor situada a uma altitude inacessvel). Registre-se entretanto que entre os jovens que cursaram o M'Boy, dirigido pelo educador Keiichi Matsumoto, no poucos se destacaram em diversos setores de atividades da comunidade nipo-brasileira, conforme informa Hidekazu Masuda, em seu livro Emeboi Jisshj-shi (Histria do Instituto Prtico de Agricultura de M'Boy). Depois da segunda metade da dcada de 20, foram surgindo pensionatos para estudantes em So Paulo e cidades do interior. Embora em nmero reduzido, esses estabelecimentos facilitaram a vida de jovens originrios de reas rurais que prosseguiram nos estudos em cursos secundrios, profissionalizantes e superiores. Outra iniciativa merece anotao: as escolas de corte e costura, para jovens do sexo feminino. Entre elas sobressaem-se as duas primeiras fundadas em So Paulo: a Escola de Corte e Costura Nipo-Brasileira e a Escola de Corte e Costura Akama, ainda hoje em pleno funcionamento.

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Atualmente ambas evoluram para uma espcie de complexo educacional. Algumas jovens formadas nessas escolas, uma vez retornadas sua terra de origem, fundavam por sua vez escolas de corte e costura. Anos depois, em quase todas as colnias japonesas encontravam-se um ou dois estabelecimentos do gnero. A aprendizagem de corte e costura (essas escolas quando bem aparelhadas ensinavam tambm portugus e japons, alm de outras matrias de conhecimento geral) fazia parte das prendas exigidas para um bom casamento. Alis as escolas em tela eram carinhosamente chamadas de "escolas de noivas". Na poca, poucos pais tinham bases econmicas necessrias para mandar filhos estudarem nas grandes cidades. As moas com raras excees tinham de se contentar em aprender corte e costura, pois a economia da coletividade japonesa ainda no havia evoludo o que s acontecer no ps-guerra para que jovens de ambos os sexos fizessem cursos profissionalizantes ou freqentassem universidades.
f) Ideologia da educao

No comeo de sua vida no Brasil, o imigrante japons no tinha idia de qual mtodo adotar na educao dos filhos. No entanto, no tocante orientao educacional parece no ter havido dvidas. Conforme j vimos em "Educao dos filhos", o imigrante preocupava-se principalmente com os filhos pequenos que trouxera. Tinha de educ-los de modo a no terem dificuldades na vida, no ficarem atrs dos outros e, mais ainda, preservarem o esprito e as virtudes do sdito japons para no se envergonharem quando retornassem terra natal. Mas, os anos de permanncia alongavam-se indefinidamente e o imigrante via os filhos crescerem e adaptarem-se ao ambiente social brasileiro. Ao compreender que o regresso ptria no aconteceria em cinco nem em dez anos, ficava perdido quanto orientao de educar a prole. A respeito da vacilao ou desorientao do imigrante sobre a "ideologia da educao", encontra-se uma exposio bem clara e sucinta de Tomoo Handa, no item "Educao" da Histria dos 70 Anos da Imigrao Japonesa no Brasil. Vamos reproduzir algumas passagens do trabalho: "[...] A ideologia da educao de que tratamos aqui algo que est implcito na atitude do imigrante, quando ele vive no pas receptor, inicialmente como dekasegi e depois como um estrangeiro radicado em terra estrangeira. Ele fica perturbado e perplexo, sem saber que caminho escolher para educar os filhos (pois ele se encontrava num estgio de integrao sociedade local). Na realidade, vez que outra, havia algum

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com idias prprias, especiais, mas no geral, o imigrante sofria a influncia da corrente de pensamento predominante na ptria de origem ou as tendncias ideolgicas do pas onde imigrou. Na nossa comunidade japonesa do Brasil, misturavam-se a ideologia de assimilao e desejo de preservao da cultura nacional (do Japo). Em meio a essa confuso de sentimentos, uns corriam para o nacionalismo, outros seguiam a ideologia de assimilao e integrao, da democracia ou ainda fraternidade universal. [...] Recordemos que desde o fim da I Guerra Mundial at 1930 (ano da revoluo de Vargas) e no Japo at o Incidente da Manchria (1931), quando comea a se intensificar o expansionismo militarista, predominavam as ideologias de assimilao e fraternidade universal. No entanto, mesmo nessa poca, os imigrantes dekasegi desejavam a educao nipnica, baseada no Edito Imperial sobre a Educao(*). Era um tempo em que se cultuava a unio familiar pela obedincia ao tradicional sistema familiar. O dualismo ch-k (lealdade ao Imperador e piedade filial) estava em vigor, com maior nfase na piedade filial. [...] De maneira que ao falar em educao, ningum duvidava que consistia em seguir a orientao do Edito Imperial sobre a Educao[...]. [...] Ento a jovem comunidade japonesa do Brasil ainda constitua um agrupamento especial de imigrantes estrangeiros, no chegando por isso a criar atritos e conflitos entre a ideologia expressa no Edito Imperial sobre a Educao com a tese de assimilao. Entretanto, com a ecloso do Incidente Manchu, o nacionalismo nipnico comeou a se infiltrar na comunidade japonesa do Brasil. Na poca em que se tornavam estreitos os contatos entre os professores primrios e o consulado japons, aparecem opinies como 'o nisei tambm japons 7 . Fortalecia-se o pensamento que colocava a educao brasileira em segundo plano, minando-se tambm o sentimento favorvel radicao permanente no pas. Mas mesmo nesse perodo, a questo da assimilao penetrava na mente dos imigrantes. que a tendncia de assimilao at ento encarada como um fato simples, tal como aprender o que h de bom no outro e superar os prprios defeitos, agora acontecia como um fenmeno prprio e natural com todos que tinham contato com a sociedade brasi(*) O Edito Imperial sobre a Educao (Kyoiku Chokugo) orientou todo o sistema educacional do Japo at o fim da II Grande Guerra. Baixado em 1890 pelo Imperador Meiji, estava estribado no pensamento fundamental de nao-famlia, e pregava o princpio da lealdade ao imperador, a dedicao filial aos pais, harmonia entre cnjuges, compreenso entre amigos, busca do saber nos quatro cantos do orbe, etc, em mfidtos pontos virtudes pregadas por Conf cio. O Edito foi distribudo a todos os estabelecimentos de ensino do pas. Era lido em todas as sesses pblicas oficiais. Sua leitura se tornou obrigatria, como uma expresso de apoio moral e patritico ao sistema imperial de governo. Em 1948, a Dieta decretou a sua abolio.

134 DO KASATO-MARU AT A DCADA DE 1920 leira. q u e o abrasileiramento dos filhos aqui nascidos transformava-se em corrente invencvel. Os imigrantes sentiam um perigo. Esse sentimento de perigo levou imigrantes para a ideologia anti-assimilao, defend e n d o a s u p r e m a c i a do esprito nipnico. Por isso, se de um l a d o reconheciam c o m o brasileiro o nisei, p o r outro, a d o t a v a m u m a pattica a t i t u d e contra a assimilao. Por isso, m u i t o e m b o r a s u s t e n t a n d o a opinio de q u e se d e v e dar prioridade ao ensino brasileiro, d e i x a n d o em s e g u n d o p l a n o a educao nipnica, em relao ao nisei q u e perdia as caractersticas de japons e o m o d o de pensar e sentimentos nipnicos, c o m e a v a m a p o n d e r a r a necessidade de 'educao japonesa' e n o a p e n a s o ensino do i d i o m a japons. Em r e s u m o , a ltima ideologia educacional ( d o m i n a n t e na c o m u n i d a d e antes da II G r a n d e Guerra) tendia fortemente para a nipnica. Sentiam m u i t o s imigrantes que as restries feitas ao ensino da lngua japonesa r e p r e s e n t a v a m a p e r d a da cultura do p o v o japons. Por isso, havia m u i t o s q u e a g u a r d a v a m o fim da guerra, e s p e r a n d o p o d e r e m ento regressar ptria, considerando este pas i n a d e q u a d o para a vida de japoneses". A orientao ou ideologia educacional descrita por H a n d a e d o m i n a n t e ento na c o m u n i d a d e japonesa do Brasil tem m u i t o q u e ver c o m a s u a diviso e conflitos internos q u e acontecero a p s o trmino da conflagrao m u n d i a l , conforme est relatado no Captulo 4. (Masuji Kiyotani/Jos Yamashiro) BIBLIOGRAFIA Aoyagi, Ikutaro. Burajiru ni Okeru Nihon-jin Hatten-shi (Histria da Expanso dos Japoneses do Brasil). Comisso de Publicao, 1941. Arubaresu, Mashado. Nihonjin-kai. Takukon (Esprito Desbravador), 1968. Burajiru Nenkan (Anurio do Brasil). Burajiru Jih, 1933. Burajiru Okinawa Imin-shi (Histria da Imigrao de Okinawa no Brasil), 1987. Horibe, Yosei. Burajiru Kohii no Rekishi (Histria do Caf no Brasil), 1976. Jornais de antes da II Grande Guerra: Nippak Shinbun, Burajiru Jih (Notcias do Brasil), Seishu Shinpo (Notcias do Estado de So Paulo). Masuda, Hidekazu. Emeboi Jisshj-shi (Histria do Instituto Prtico de Agricultura de M'Boy), 1981. Nogueira, Arlinda Rocha. Imigrao Japonesa na Histria Contempornea do Brasil. Centro de Estudos Nipo-Brasileiros e Massao Ohno Editor, 1984. Prado Jr, Caio. Histria Econmica do Brasil. 3.a ed. Brasiliense, 1953. Saito, Hiroshi. Burajiru no Nihonjin (Japoneses do Brasil), 1960. Koyama Rokuro Kaiko-roku (Memria de Rokuro Kayama). Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1976.

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CAPTULO 3

EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO


1. CRESCE O NMERO DE EMIGRANTES 2. OS IMIGRANTES PARA A AMAZNIA 3. IMIGRANTES QUE DESEJAM RADICAR-SE 4. A CAMPANHA ANTIJAPONESES 5. OS NISEIS ENTRE DOIS PENHASCOS 6. DO APOGEU AO FIM 7. COMUNIDADE JAPONESA NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO 8. UM PEQUENO JAPO DENTRO DO BRASIL

1. CRESCE O NMERO DE EMIGRANTES

a) A emigrao como poltica de Estado (Kokusaku Imin)

O KASATO-MARU (1908) at o Buenos Aires-Maru, que chegou a Santos em junho de 1941, abarcando um espao de tempo de 33 anos, ingressaram no Brasil 188.309 imigrantes japoneses. Temos no quadro da pgina seguinte a distribuio da chegada dos imigrantes, ano a ano. Como a se verifica, a partir de 1925 se registra crescente aumento e, no prazo de 16 anos, at 1941, entraram dois teros do total. No pico representado pelo qinqnio 1930-35 chegou mais de um tero do conjunto. No ano de 1933, verifica-se o ingresso de 24.484 imigrantes nipnicos, um recorde de toda a histria dos 80 anos. Na poca diminua muito o nmero de imigrantes europeus para o Brasil, e os japoneses daquele ano representavam mais de 50% do total de imigrantes estrangeiros entrados no pas. A causa principal do substancial crescimento de imigrantes japoneses depois de 1925 foi conseqncia de haver o governo nipnico assumido a emigrao para o Brasil como poltica de Estado, levando em conta a situao do mundo, do Japo e do Brasil. Ento a emigrao para o Brasil recebeu o mximo de apoio oficial de Tokyo.

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Na segunda metade dos anos 30, o Brasil adota poltica restritiva em relao imigrao e o Japo intensifica a emigrao para a Manchria e Monglia, fatos que provocaram reduo da entrada de imigrantes. E com o advento da II Grande Guerra se interrompe por completo a corrente imigratria procedente do Japo. O Japo goza um curto perodo de prosperidade durante a I Grande Guerra (1914-18), da qual participou ao lado dos Aliados, porm sem muito desgaste em sua economia. Cessado o conflito, vem a recesso, uma crise aguda que provocou at os chamados tumultos ou motins de arroz (kome sd), em 1918. Por causa da alta excessiva do preo do arroz, quando o salrio no acompanhava a elevao do custo de vida, irromperam quebra-quebras de depsitos de arroz em algumas cidades. A crise se intensifica em 1920, provocando o agravamento da pobreza e penria das reas rurais. A crise assume carter crnico e se aprofunda ainda mais com o violento terremoto de Kanto, de 1923, que destri as cidades de Tokyo e Yokohama. Mortos e desaparecidos so 140 mil, casas destrudas 120 mil, sem contar mais de 450 mil reduzidas a cinzas por incndios. Prejuzos econmicos incalculveis, que foram um fator do pnico financeiro que se abater sobre o pas em 1927. dentro desse quadro de crescentes dificuldades econmicas que aumenta a emigrao de trabalhadores, principalmente rurais. Assim, no ano de 1929, o nmero de imigrantes recebidos pelo Brasil alcana um total superior a 16 mil. A populao do Japo em 1920 somava aproximadamente 77 milhes de almas, das quais 56 milhes somente no Japo metropolitano, isto , com excluso das possesses como Taiwan e Coria. Assim sendo, embora a emigrao no solucionasse o problema da superpopulao, o governo tinha de recorrer a ela como uma porta de sada ou vlvula de escape. E com a intensificao do movimento antijapons nos Estados Unidos, pas de preferncia natural dos emigrantes do mundo inteiro, o Brasil se tornou uma das poucas opes. A emigrao no Japo comeou por meio de empresas privadas. Em 1917, realizou-se a fuso dessas empresas para formar a Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha, conhecida pelo nome abreviado de Kaik na comunidade japonesa. O capital da nova companhia era de 10 milhes de yens. Agora ela se encarregava de todo o servio relacionado com a remessa de emigrantes destinados a pases imigrantistas. E o Brasil representava de longe o maior receptor. A Kaik no cuidava somente da sada de emigrantes e sua distribuio no Brasil. Herdou o contrato da Colnia de Iguape, fundada pela Tokyo Syndicate, porm desde 1913 administrada pela Burajiru Taku-

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shoku Kabushiki Kaisha (Companhia de Colonizao do Brasil). Em outras palavras, a Kaik absorveu a Companhia de Colonizao do Brasil. No Brasil, o consulado geral do Japo de So Paulo foi instalado em julho de 1915; em 1917, a legao do Japo, que at ento funcionava em Petrpolis, se transferiu para o Rio de Janeiro, onde, em 1923, promovida a embaixada. Em 1918, a cidade de Ribeiro Preto regio de muitos imigrantes japoneses na poca v a instalao de uma filial do consulado geral de So Paulo. A seguir, em 1921, Bauru, a capital da Noroeste, fica com um consulado nipnico e em 1924 abre-se uma agncia do consulado geral em Santos. Servios consulares se ampliam medida que se expandia a presena de imigrantes japoneses no Estado. A agncia de Santos passa a consulado em 1936. Mas, por outro lado, em 1921, em plena fase de estruturao da rede consular japonesa, o governo do Estado cancelou o subsdio de 10 libras esterlinas que fornecia at ento ao imigrante com mais de 10 anos de idade. Vrios motivos foram alegados para o cancelamento: baixo ndice de permanncia dos imigrantes japoneses nas fazendas de caf; por isso, as despesas do governo estadual com os imigrantes nipnicos tornavam-se maiores em comparao com as gastas com europeus; alm disso, a diferena de lngua, usos e costumes dificultava o trabalho na fazenda, com prejuzo da rentabilidade do cafezal. E como j era esperado, o governo estadunidense promulgou em 1924 a nova lei de imigrao, pela qual virtualmente vedava a entrada de imigrantes nipnicos. No perodo de 1921 a 24 continuou a agravar-se mais ainda a situao da agricultura japonesa. Os conflitos entre arrendatrios e proprietrios de terra, que em 1920 somavam 408, aumentaram cinco vezes em 1923, ano do grande terremoto que abalou Kanto, centro nevrlgico da economia do pas. Como parte de medidas de socorro s vtimas do sismo, o governo enviou 110 emigrantes para o Brasil, mediante subsdio de 200 yens per capita. E em 1924, o jornal Osaka Mainichi Shinbun subsidiou a viagem de 267 emigrantes, como obra comemorativa do casamento do prncipe herdeiro da Casa Imperial. J no ano seguinte, Tokyo procedeu a uma reforma do servio de emigrao do Ministrio dos Negcios Estrangeiros (Gaimusho), ampliando-o. Em relao ao emigrante para o Brasil, decidiu fornecer, alm dos 200 yens correspondentes passagem de navio, mais a comisso de 35 yens at ento paga empresa de emigrao. As medidas representavam o comeo da emigrao como "poltica de Estado" (Kokusaku imin). Como se pde verificar no Quadro 1, os

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estmulos oficiais contribuem muito para o incremento da corrente emigratria destinada ao Brasil. E o governo de Tokyo prosseguiu na poltica de estmulo nos anos seguintes. Por exemplo, a empresa de navegao Osaka Shosen j havia, desde 1915, aberto a rota comercial da Amrica do Sul. A partir de 1925, o governo indicou essa empresa como transportadora oficial dos emigrantes. At ento a Osaka Shosen transportava emigrantes, mas por meio de contratos feitos com relao a cada grupo de emigrantes transportados. E as instalaes para hospedar imigrantes eram muito deficientes. Por causa da precariedade de instalaes e de condies sanitrias dos navios que transportavam numerosos emigrantes a bordo, no raro ocorriam doenas entre os passageiros. O caso mais trgico aconteceu com o Wakasa-Maru, que zarpou do Japo a 25 de abril de 1918. Irrompeu uma epidemia de meningite crebro-espinhal durante a viagem at Santos, que durou 84 longos dias e ocasionou 60 bitos. Depois de se tornar transportadora oficial, houve grande melhoria nas instalaes internas dos navios da Osaka Shosen. A viagem do Japo ao Brasil agora podia ser feita em cerca de 40 dias. Caiu o nmero de casos de doena a bordo. Mas no significava ainda uma soluo definitiva, pois a bordo do Hawai-Maru, que deixou o porto de Kobe a 17 de maro de 1928, houve surto de clera, com 60 doentes e 19 mortos. Em 1927, pelo decreto imperial n. 229, foi construda unia ampla hospedaria de emigrantes na cidade de Kobe. Um edifcio de concreto armado de cinco andares, com capacidade para 600 pessoas. Em 1930 foi ampliada para hospedar 1.300 pessoas. b) Mais de trs milhes de desempregados Conforme vimos, na poca em que se estruturava melhor o sistema de transporte de emigrantes, o Japo enfrenta primeiro a crise financeira de 1927 e, em 1929, as conseqncias do pnico das finanas internacionais. A partir de ento, diante da crescente crise socioeconmica que o regime democrtico ento dominante no pas no conseguia solucionar, foras direitistas e pr-fascistas crescem a passos largos. adotada uma poltica de militarizao intensiva. Diante das sucessivas crises, a economia japonesa se desorganiza, produzindo centenas de milhares de desempregados. Se se incluir os jovens que nas zonas rurais permaneciam subempregados ou sem emprego, o total dos sem-trabalho chegava a mais de 3 milhes. Na zona rural, os dois principais produtos, arroz e seda, sofreram tremendas baixas de preos. Em 1931, registraram-se graves prejuzos pela onda de frio na regio nordeste (a mais pobre do pas na poca, ao lado de

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Okinawa), resultando em pssima colheita. A penria dos lavradores chegou a tal extremo que no havia palavras para descrev-la. Existe at um clculo segundo o qual as dvidas dos homens do campo em 1932 alcanavam 114% de suas receitas. Em conseqncia tornou-se corriqueira a subnutrio de alunos de escolas primrias por falta de comida. Pais atirados na misria vendiam filhas para prostbulos a fim de resgatar dvidas que cresciam ano aps ano. Muitos vendiam suas pequenas propriedades e no eram raros casos de suicdios de famlias inteiras. Em muitas localidades faltava dinheiro para pagar os funcionrios das prefeituras. Devido a essa situao extremamente grave vivida pela populao rural, com apoio do governo a emigrao para o Brasil se expande a partir de 1928. Mais de 10 mil emigrantes por ano se dirigem para o nosso pas buscando soluo para o beco sem sada em que se encontravam. E a partir de 1932, o governo de Tokyo comea a fornecer, alm da passagem e da comisso, a soma de 50 yens por pessoa para emigrantes com mais de 12 anos de idade. Eliminada assim a preocupao com as despesas de viagem, aumentou o nmero de famlias que viajavam com velhos e crianas. No Brasil, alm das fazendas de caf, agora j havia patrcios chegados antes, que necessitavam de novos imigrantes para trabalhar com eles. Mais um fator para engrossar o fluxo imigratrio no pas. No so poucos os escritos sobre a emigrao japonesa para o Brasil dessa poca. Entre eles figura com destaque Sb (A Populaa) de Tatsuzo Ishikawa, primeiro Prmio Akutagawa de Literatura (fico). O autor veio ao Brasil como assistente do supervisor dos emigrantes do La PlataMaru, que partiu de Kobe no dia 15 de agosto de 1930 (ano seguinte ao do comeo da crise econmica mundial). Ele descreve a vida dos cerca de 900 emigrantes desde a sua entrada na hospedaria de emigrantes daquela cidade. "Vendi minha casa, vendi minha roa. Tudo que eu tinha passei para mos estranhas. E me despedi do tmulo dos antepassados, oferecendo a ltima oferenda." Comentando a posio dos emigrantes que assim falavam, Ishikawa critica: "Por causa de falhas na poltica e economia do Japo, eles abandonam sua terra natal e emigram para um pas estranho". E conclui: "Chamam-nos de emigrantes, porm, na verdade no passam de um povo abandonado (kimin) sua prpria sorte". Que nem todos os imigrantes tinham esse background triste, contaremos adiante. O fato que, por causa dessa realidade da zona rural do pas, cresceu o nmero de emigrantes para o Brasil, a tal ponto que em 1933 alcanava a cifra indita de 25 mil aproximadamente. O deputado Kyoichi Hattori, do Partido Minseito (que, ao lado do Seiyukai, formava um dos

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dois grandes partidos), visitando o Brasil naquele ano, sugeriu ao ministro do Exterior Kosai Uchida: "... Deve-se estimular ainda mais a emigrao para alcanar 50 mil por ano". c) A maioria absoluta de emigrantes-famlias Uma caracterstica dos emigrantes nipnicos de antes da II Grande Guerra consistia no fato de a maioria absoluta ser constituda de famlias, uma grande diferena com a emigrao para o Hava, Estados Unidos e outros pases. Naturalmente figuravam tambm emigrantes solteiros, mas eles representavam menos de 6% do total. Apesar do carter dekasegi como os emigrantes para o Hava e Estados Unidos, havia mais famlias-emigrantes para o Brasil, porque a condio essencial para trabalhar na fazenda de caf era contar com pelo menos trs pessoas capazes de trabalhar. Embora na poca a famlia numerosa fosse norma nas zonas rurais japonesas, nem toda famlia tinha trs pessoas como fora de trabalho. Por isso, em particular no caso de o chefe de famlia ser jovem, formava-se uma famlia "artificial", incluindo um estranho para completar o trio de trabalhadores. Por causa dessa constituio artificial de famlias, embora o nmero mdio por famlia fosse de cinco pessoas, havia 72% de elenientos com mais de 12 anos de idade em cada lar. Outro fato: como existia sempre mais jovens do sexo masculino como componentes artificiais de famlias, produzia-se um desequilbrio entre os sexos no quadro total dos emigrantes: 57 moos e 43 moas. E a diferena se acentuava entre jovens em idade de casar. Por isso, antes da II Guerra Mundial, havia na comunidade muita dificuldade de os rapazes encontrarem moas para casar. Assim, existiu um longo tempo em que se falava em "trs contos de ris por moa casadeira". Significava a necessidade de se dispor de trs contos de ris para oferecer ao pai da jovem (uma espcie de dote). Nos anos em que a emigrao se constitua em poltica de Estado, podiam emigrar tanto velhos como crianas e jovens, de modo que aos poucos foi se diluindo o problema da disparidade entre o nmero de jovens de sexo masculino e sexo feminino. Todavia, o princpio de "trs trabalhadores por famlia" foi mantido. Quanto ao grau de escolaridade, o imigrante japons superava o de outros pases. A Secretaria de Agricultura do Estado de So Paulo realizou um levantamento sobre o grau de conhecimentos dos imigrantes que entraram pelo porto de Santos entre 1908 e 1932. A porcentagem de alfabetizados dos imigrantes nipnicos com idade superior a 12 anos chegava a 89,9%. Tratava-se de um ndice superior ao de imigrantes de outros pases chegados no mesmo perodo: italianos (71,36%), portugue-

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ses (51,7%) e espanhis (46,3%). Poucos, entre os quais alemes (91,1%), superavam os nipnicos. No entanto, nem por isso os imigrantes japoneses mereciam cotao alta no Brasil. J vimos a baixssima porcentagem de permanncia de imigrantes contratados, da fase inicial, nas fazendas de caf. As crticas mais freqentes ouvidas dos fazendeiros em relao aos imigrantes nipnicos eram: 1) no se fixavam e muitos fugiam das fazendas; 2) grande nmero de famlias falsamente constitudas; 3) baixo nvel de padro de vida e maus costumes, como andarem nus. As "famlias falsas" aqui citadas so naturalmente as artificialmente constitudas. E consta ainda que no comeo da emigrao havia emigrante que viajava com passaporte de outra pessoa. Vimos no Captulo II alguns dos problemas que afligiam os imigrantes colocados nas fazendas. Aconteciam freqentes fugas de colonos daquelas primeiras fazendas onde foram parar os imigrantes. Eles tinham pressa de ganhar dinheiro para pagar suas dvidas, inclusive parte das despesas de viagem, sem falar no grande sonho de regressar terra natal com o dinheiro ganho. Mas os cafezais, velhos, no correspondiam nem de longe s expectativas dos colonos. Da o descontentamento, a revolta e a fuga. O comportamento dos imigrantes merecia crtica e reprovao: "Os governantes paulistas, em vista dos problemas surgidos com os primeiros japoneses que aqui vieram ter, no ficaram satisfeitos com os resultados. Antnio Cndido Rodrigues, Secretrio da Agricultura, atribua o insucesso ao grande nmero de solteiros e de elementos pouco habituados ou mesmo estranhos lavoura. Uma prova disso que fora observado que as famlias formadas por verdadeiros agricultores vinham apresentando resultados positivos. Outro aspecto, a seu ver, era a m seleo dos emigrantes no s permitindo a vinda de famlias de no agricultores como a artificialidade em sua organizao a ponto de membros serem por vezes completamente estranhos uns aos outros, sem nenhum grau de parentesco, o que dificultava sobremodo a tutela do chefe de famlia" (Arlinda Rocha Nogueira, op. cit). Estes fatos constituam motivo de dor de cabea para o Ministrio dos Negcios Estrangeiros do Japo, desde o incio da emigrao para o Hava. Por serem considerados os maiores causadores de problemas, os naturais da provncia de Okinawa e Kagoshima foram, a partir de 1913, impedidos de emigrar para o Brasil. Essa proibio foi suspensa em 1916, por causa da diminuio de emigrantes europeus, como conseqncia da I Grande Guerra.

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Com respeito aos okinawanos, entre 1916 e 1918 inclusive, em trs anos emigraram 1.268 famlias, com 4.381 pessoas. Em se tratando de uma fase de poucos emigrantes europeus, deve ter havido certa tolerncia por parte das empresas de emigrao no tocante seleo de trabalhadores rurais, pois levantaram-se de novo reclamaes por parte de fazendeiros. O Gaimusho acabou proibindo de novo a emigrao de naturais da provncia de Okinawa, no perodo de 1920 a 26. A seguir comea a fase em que a emigrao constitui um assunto de poltica do Estado, como j se aludiu. E a proibio se levanta graas tambm ao movimento de okinawanos residentes no Brasil, que para essa finalidade organizaram uma associao, a Kyy-Kykai, de certa forma antecessora da atual Associao Okinawa do Brasil. A entidade procurou orientar os co-provincianos no sentido de superar os supostos defeitos apontados, em muitos pontos comuns aos japoneses em geral, e atuar junto representao diplomtica do Japo no Brasil no sentido de apressar a reabertura do caminho da emigrao de okinawanos. Okinawa, uma provncia no extremo sul do arquiplago japons, era a regio mais carente e de maior densidade demogrfica do pas; portanto a emigrao constitua praticamente a nica sada para solucionar ou pelo menos aliviar seus problemas socioeconmicos. Mas para a liberao da emigrao de okinawanos para o Brasil foram exigidas as seguintes condies pelas autoridades do setor competente: a emigrao somente permitida aos que concluram o curso primrio obrigatrio; ter menos de 40 anos de idade e que fale o idioma japons padro (e no o dialeto, que, embora originrio do japons antigo, incompreensvel aos demais japoneses); o casal deve estar constitudo h mais de trs anos, e no incluir filho adotivo na famlia; a mulher no deve ter tatuagem nas mos (assim como o ohaguro tingir os dentes de preto na mulher do Japo metropolitano, a tatuagem nas mos representava mulher casada em Okinawa). "Gostam de ficar ns, seu dialeto incompreensvel aos naturais de outras provncias o que dificultava o entendimento com eles. Uniam-se muito entre os co-provincianos e provocavam altercaes e brigas com os demais" eram defeitos apontados, entre outros. Objetivamente, porm, os brasileiros no tinham a noo da existncia de diferenciao entre japoneses ou mesmo da discriminao existente entre elementos de provncias diferentes. Como quase sempre, a discriminao era fruto da falta de conhecimento recproco. Devido distncia, Okinawa viveu muitos sculos virtualmente isolada do Japo. Alm da geografia, da

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lngua, de usos e costumes, era a nica provncia de clima subtropical. Da, durante muito tempo, japoneses de outras regies pensarem tratarse de um outro pas ou pelo menos um povo diferente... Hoje, com melhor conhecimento da provncia, em particular depois da guerra quando Okinawa foi palco das mais violentas batalhas da Guerra do Pacfico a situao mudou, acabando com certos preconceitos, resqucios dos tempos feudais. A ttulo de informao sobre a "diferena'' entre japoneses e okinawanos, transcrevemos alguns trechos interessantes do livro Imigrao Japonesa na Histria Contempornea do Brasil, da Prof.a Arlinda Rocha Nogueira. Com relao primeira leva de imigrantes japoneses do KasatoMaru: "A respeito contamos com as observaes feitas pelo Cnsul (do Brasil em Yokohama) M. Santos da Silva. Todavia devemos tomar cuidado em endoss-las, pois trata-se de uma opinio pessoal e isolada, mas interessante para ter-se noo desses primeiros nipnicos que para c vieram. O Cnsul no se mostrou de todo desfavorvel quela introduo, mas considerou-os baixos e feios, deu um destaque maior aos okinawanos, graas sua fora, resistncia e ao fato de estarem mais ligados s atividades agrcolas que os demais. Alis, tais elementos eram vistos pelos japoneses em geral com um certo preconceito. Na verdade falam uma espcie de dialeto a ponto de ser necessria, algumas vezes, a interveno de intrprete para que possam ser compreendidos pelos nipnicos em geral". Em outro trecho: "... Na dcima primeira leva, chegada em 1917, alguns imigrantes decepcionaram uma das autoridades japonesas presentes ao desembarque justamente pela forma como vinham vestidos e pelo seu comportamento, pois davam ntida impresso de que no provinham da zona rural. O que a fez pensar dessa maneira foi o uso por exemplo de chapu, culos de aros dourados, lenos de seda, etc. Apenas os okinawanos, no dizer daquela autoridade, estavam vestidos a contento". E agora um esclarecimento: "Nos casos em que se configura choque cultural, o que se verifica que as atitudes de um grupo, como um todo ou de seus membros, costumam determinar no outro reaes diversas desde a admirao, o escndalo at o antagonismo. Por que? O ser humano costuma julgar os usos, os costumes e as atitudes dos outros em funo dos padres culturais de que portador. Isso explica o impacto que tomaram os trabalhadores da Fazenda

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So Martinho, por exemplo, quando os japoneses foram trabalhar desprovidos de quaisquer vestimentas. este apenas um exemplo da diferena entre padres culturais trazidos pelos imigrantes e aqueles da sociedade agrria paulista do incio do sculo XX. Tal comportamento levou o administrador da fazenda a consider-los "gente supinamente ignorante e atribua o fato m seleo dos mesmos". Na Fazenda So Martinho foram colocados imigrantes originrios da provncia de Kagoshima. Um importante fator de atribuio de defeitos aos okinawanos estava no fato de que, como naturais da provncia mais pobre, eles precisavam trabalhar mais a fim de ganhar dinheiro o mais rapidamente possvel para pagar as dvidas contradas para a viagem e tentar acumular poupana suficiente para retornar logo terra natal. Para isso sacrificavam ao limite extremo moradias, vesturios, etc. Seja como for, o fato que Okinawa era a provncia mais emigrantista de todo o Japo (estima-se em cerca de 10% do total os imigrantes dessa procedncia), seguida de Kumamoto, Fukuoka, Hokkaido, Fukushima, Wakayama, Kagoshima, e outras. Salvo a ilha setentrional de Hokkaido, cuja colonizao s comeou depois da Restaurao Meiji (1867), todas as provncias citadas tinham uma longa tradio regional, com fortes dialetos e costumes prprios. A nudez fora de casa se verifica at a dcada de 30, com relao a gente de outras provncias que no Okinawa. Por conseguinte, a avaliao de "honestos e muito trabalhadores", porm "gente estranha", deve ter sido a impresso generalizada dos brasileiros da poca sobre os japoneses.
2 . OS IMIGRANTES PARA A AMAZNIA

a) Desenvolvimento de regies inexploradas com capital e mo-de-obra japoneses Comeou em 1929, ainda no incio da poltica emigratria nacional do Japo, a imigrao e colonizao de regies cobertas de florestas virgens da Amaznia. Diferente do Estado de So Paulo, que j desenvolvia, alm da cafeicultura, outras lavouras e atividades econmicas que necessitavam da fora de trabalho do imigrante, a imensa regio amaznica permanecia quase completamente inexplorada e sem nenhuma indstria. O extrativismo centrado na borracha, que havia alcanado seu apogeu no comeo do sculo XX, declina a partir de 1912 (quando se exportou 42 mil toneladas), derrotado pela concorrncia da borracha racionalmente cultivada e organizada do Sudeste da sia. "Em 1919, numa produo mundial de 423 mil toneladas o Oriente

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contribuir com 382 mil; ao Brasil no cabe mais que a modesta quota de 34 mil, valendo apenas 105.000 contos (5.586.000 libras)" (Caio Prado Jnior. Histria Econmica do Brasil). De modo que, levando-se igualmente em conta a grande diferena climtica, a emigrao nipnica para a regio amaznica tinha de apresentar outra configurao, diferente daquela de So Paulo. Consta que a primeira solicitao de envio de emigrantes japoneses para a bacia amaznica fora feita em 1895 pela Toyo Imin Boeki Kaisha (Companhia Oriental de Emigrao e Comrcio), porm no se dispe de dados concretos. O que efetivamente existe, segundo a Cronologia Handa, um contrato assinado em 1898, mas no realizado, entre o governo do Estado do Par com o representante da Toyo Imin Boeki Kaisha, Jlio Benavides, para a entrada de 3 mil imigrantes japoneses. Na poca a legao nipnica no Brasil manifestou opinio contrria idia, declarando: "O clima inadequado para japons viver". Ao que parece, por isso, o projeto acabou sendo arquivado. Japoneses procedentes do Peru ingressaram aproximadamente na mesma poca, ou pouco depois, na regio, atrados pela prosperidade causada pela extrao da borracha. Mas no h ou no se conhece nenhum documento confivel sobre seu nmero e movimento. A imigrao japonesa na regio amaznica teve incio concreto com a proposta feita pelo presidente Dionsio Bentes, do Par, em 1925, ao embaixador do Japo no Rio de Janeiro, Shichita Tatsuke para "desenvolvimento de capital e mo-de-obra nipnica", niediante a concesso gratuita de 500 mil hectares de terras para formao de uma colnia de imigrantes japoneses." Ento j chamava a ateno dos japoneses o projeto de lei apresentado pelo deputado Fidelis Reis, em 1923, Cmara dos Deputados, relativo restrio aos imigrantes negros e amarelos. Por isso, o embaixador Tatsuke julgava necessrio no concentrar s no Estado de So Paulo o fluxo imigratrio japons, mas dispers-lo por outros estados. Recebeu de bom grado a proposta do presidente do Estado do Par, transmitindo-a ao Gaimusho em Tokyo. Ao mesmo tempo, sugeria fosse escolhida a empresa ou cooperativa de emigrao para enviar pesquisadores ao Brasil, a fim de verificar a viabilidade do plano. O Ministrio das Relaes Exteriores do Japo consultou o empresariado e, com apoio da empresa Fiao Kanegafuchi, presidida por Sanji Muto, conhecida pela sua campanha a favor da emigrao, enviou em 1926 uma misso de estudos formada de dez membros e chefiada por Hachiro Fukuhara, diretor da Kanegafuchi. Em apoio atuao da misso, o prprio embaixador Tatsuke visitou os estados do Par e Amazonas.

OS IMIGRANTES PARA A AMAZNIA 149

A misso Fukuhara percorreu o interior do Par e descobriu terras que considerou apropriadas para a explorao econmica. Como resultado, o ento primeiro-ministro Giichi Tanaka, que acumulava a pasta do Exterior, depois de consultar o prcer empresarial Eiichi Shibuzawa (1840-1931), tomou a deciso de fundar em 1928 a Nanbei Takushoku Kabushiki Kaisha (Companhia de Colonizao da Amrica do Sul S.A.), com participao do grupo Kanegafuchi e capital de 10 milhes de yens. Com apoio dessa empresa organizou-se em 1929 a Companhia Nipnica de Plantao do Brasil, com capital de 4 mil contos de ris. A empresa recebeu uma concesso do governo paraense medindo um total de 1,3 milho de hectares de terras em cinco locais do Estado do Par, iniciando a seguir o trabalho de desbravamento da selva. A empresa tinha autorizao para promover empreendimentos nos setores de agricultura, minerao, indstria, comrcio, finanas, transportes, etc. e a operao de estradas de ferro, portos, aeroportos, energia eltrica, telecomunicaes, etc. Tratava-se de um ambicioso plano do presidente do Estado Dionsio Bentes de introduzir capital e fora de trabalho, a fim de explorar e desenvolver vastas reas inexploradas do Par. Um nico plano equivalente a este, ento existente, era o projeto da Companhia Ford de Automveis, americana, que planejava plantar e formar um grande seringal no Estado do Amazonas. A Companhia Nipnica de Plantao do Brasil, ou Nanbei Takushoku Kaisha, mais conhecida pelo nome abreviado de Nantaku, tentou utilizar a madeira da floresta virgem, cultura de frutas tropicais diversas, criao do bicho-da-seda, cultura de ch preto e at a explorao de minrios, mas sem xito. E sofreu enorme prejuzo com o cultivo do cacau, que considerava promissor e mais importante para a regio. Juntando-se a esses malogros iniciais a mudana na situao poltica do Japo com seus interesses cada vez mais voltados para a China e outras partes da sia , a companhia foi forada, a partir de 1935, a reduzir seus empreendimentos amazonenses. Entre as obras colonizadoras da empresa, os 600 mil hectares de Acar (atual Tome-Au) eram a mais importante. Ali chegaram, de 1929 (primeira leva) at 1937, um total de 375 famlias e mais 41 solteiros, somando 2.100 pessoas, transportadas em 22 viagens. Tratava-se de uma colnia (ij-chi) como aquelas geridas pela Bratac (como ser exposto adiante), com instalaes de assistncia mdica e educao. Mesmo assim, os primeiros imigrantes sofreram com as molstias endmicas. Acresce que, durante muito tempo, no se encontravam culturas apropriadas ao solo e clima locais. E, ainda, nos primeiros trs anos, os imigrantescolonos no recebiam os lotes de sua propriedade, vivendo num sistema especial de arrendamento, com diviso de lucros com a companhia. Por

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todas essas condies adversas, entre as 202 famlias chegadas at a stima leva, muitas sofreram baixas em seu pessoal, por morte, alm de 61 famlias, que se mudaram para outros estados, principalmente So Paulo. A partir da o sistema foi modificado: o imigrante recebia o seu lote (25 hectares) ao chegar colnia. Independentemente da empresa colonizadora, os colonos fundaram, em 1932, a Cooperativa Agrcola da Colnia de Acar, e diversificaram suas culturas medida que ficavam conhecendo o solo e o clima da regio. Cultivaram mandioca, arroz, verduras, etc. Merece meno especial a pimenta-do-reino, importada do Sudeste da sia, cuja cultura, aumentada no perodo da guerra, teve seu preo bastante elevado, o que serviu para colocar em bases mais slidas a vida dos colonos. No Estado do Par, alm dos imigrantes introduzidos pela Nantaku, existiu o "Grupo de Moos de Colonizao da Amaznia", dirigido por Kimi Gotanda. Em 1929, ele fundou a Associao Ultramarina da YMCA (Associao Crist de Moos), com ajuda da provncia de Osaka e do jornal Osaka Asahi Shinbun, organizando os Amazon Kaitaku Seinen Renshusei (Jovens Praticantes da Colonizao da Amaznia). Em 1931, sob a chefia de Gotanda e tendo como subchefe o agrnomo Renkichi Hiraga, 30 pessoas emigraram. Assim comeou o desbravamento de 100 hectares de selva em Monte Alegre, Estado do Par. O projeto fracassou, mas muitos dos membros do grupo tiveram atuao destacada e positiva em diversas partes do Baixo Amazonas. b) A concesso de um milho de hectares cria problemas Ao tomar conhecimento dos empreendimentos da Nantaku no Estado do Par, o presidente do Estado do Amazonas, Eugnio Sales, tambm entrou em contato com o embaixador Tatsuke, revelando seu desejo de conseguir a vinda de empreendimentos japoneses com capital e mo-de-obra para aplicar no seu Estado. Por coincidncia, um empresrio de Tokyo, Gensaburo Yamanishi, visitou o Estado do Amazonas, em 1927, em companhia de Kinroku Awazu, residente em So Paulo. Eles conseguiram uma concesso de um milho de hectares do governo amazonense. O deputado Tsukasa Uetsuka, que mantinha relaes com os dois empresrios, interessou-se pelo negcio. Realizou duas viagens Amaznia e instalou o Instituto Amaznia, no municpio de Parintins. Posteriormente, este Instituto Amaznia, seguindo o exemplo da Nantaku do Par, se transforma em empresa de interesse nacional, com a colaborao de outros empresrios nipnicos. Inicialmente cria-se a fundao Instituto Industrial Amaznia. E em 1935, funda-se, mediante

OS IMIGRANTES PARA A AMAZNIA 151

bons ofcios do governo de Tokyo, a Amaznia Sangyo Kabushiki Kaisha (Companhia Industrial da Amaznia S. A.), com capital de um milho de yens e participao de grupos econmicos de primeira grandeza, como Mitsui, Mitsubishi, Sumitomo, Yasuda e outros. Correspondentemente, instala-se no Brasil a Cia. Industrial Amazonense S.A. A concesso de um milho de hectares de terras no Estado do Amazonas feria o dispositivo da Constituio de 1934, que, em seu artigo 130, estipulava que a concesso de terras com rea superior a 10 mil hectares devia ser examinada, caso a caso, pelo Senado. Por isso, o governador do Estado apresentou ao Senado o pedido de reconhecimento da concesso feita. O caso motivou grande polmica no mundo poltico. Vivia-se j um ambiente de fortalecimento do nacionalismo brasileiro. Discutiu-se se a concesso de uma to extensa rea (um milho de hectares) a estrangeiros prejudicava ou no os interesses nacionais. Depois de acaloradas discusses no Senado, a idia da concesso acabou sendo rejeitada. Tsukasa Uetsuka criou, em 1930, a Kokushikan Koto Takushoku Gakko (Escola Superior de Colonizao Kokushikan) em Tokyo. Essa escola foi transferida em 1932 para a aldeia rural Ikuta, na provncia de Kanagawa, mudando o nome para Nihon Koto Takushoku Gakko (Escola Superior de Colonizao do Japo). Antes disso, em 1931, a escola mandou alunos nela formados para o Instituto Amaznia de Parintins para que se dedicassem ao trabalho de colonizao. A emigrao de jovens estudantes repetiu-se sete vezes at 1937, somando um total de 248. O Instituto introduziu, alm dos estudantes, mais 150 famlias de imigrantes. O grupo de Uetsuka pensou desde logo em exportar produtos locais como borracha, castanha-do-par e outros. E escolheu como principal cultura a juta. Comeou por trazer sementes de diversas regies da sia, submetendo-as a seguidas experincias. Mas no obteve sucesso, repetindo fracassos sucessivos. Contudo, entre as sementes originrias de Calcut, ndia, plantadas pelo imigrante Ryota Oyama, surgiram dois ps de juta de excelente qualidade. Resultaram de uma mutao. Com muito esforo, Oyama multiplicou as sementes dessa variedade. Em 1937, pela primeira vez as famlias Oyama e Nakauchi, em conjunto, produziram cerca de 10 toneladas de fibras de juta de boa qualidade e as colocaram no mercado. A nova variedade assim criada recebeu depois o nome Oyama. A sua produo evoluiu muito bem e em 1940 chegou a superar as 350 toneladas. Na poca, na exportao de caf e outros produtos empregava-se o saco de juta. Por isso importava-se juta em grande volume. O xito da

152 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

variedade de alta produtividade e qualidade na regio amaznica recebeu comentrios elogiosos dos principais jornais brasileiros, como uma contribuio positiva da imigrao japonesa ao desenvolvimento da Amaznia. E, com o tempo, a produo de juta se transforma na maior indstria da regio. Alm da Companhia Industrial da Amaznia, Kosaku Oishi fundou, em 1928, em Maus, Estado do Amazonas, a Amazon Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia de Fomento Industrial do Amazonas), com finalidade de cultivar o guaran, produto tpico da regio. Em 1929 e 1931 introduziu dezenas de famlias de colonos. Mas, por escassez de capital e outras dificuldades, o empreendimento defrontou com muitas crises. Todavia, em Maus sede da empresa o diretor da Kaigai Shokumin Gakko (Escola de Colonizao Ultramarina, fundada em 1918, no bairro de Setagaya, Tokyo), Hisae Sakiyama adquiriu um terreno para a instalao de uma filial daquela escola. Em 1932, Sakiyama emigrou com a famlia para Maus, o que contribuiu para a vinda de mais famlias nipnicas, criando-se um novo ambiente de animao para os colonos. Todavia, Sakiyama adoeceu antes da construo da planejada escola. E em 1940 a Amazon Kogyo foi incorporada Companhia Industrial da Amaznia S.A. Como verificamos, a imigrao japonesa na imensa bacia amaznica, no obstante a insuficincia de informao sobre o clima, solo e outros fatores importantes para sua vida e suas atividades econmicas, refletia a poca em que a emigrao constitua uma poltica de Estado. Organizavam-se empresas de desenvolvimento e colonizao, com apoio conjunto do governo e do empresariado mais representativo do perodo. Tentouse explorar e desenvolver novas indstrias no meio da selva tropical. Acontece, porm repetimos , que escassos eram ainda os estudos e pesquisas cientficas e tcnicas relativas regio e sobretudo sua agricultura. E o capital japons no vinha em quantia suficiente. Pouco depois de iniciado o trabalho de desbravamento da selva, irrompe a II Grande Guerra, provocando a paralisao de toda a atividade das empresas em apreo at o ps-guerra. Assim, com exceo da cultura da juta no Estado do Amazonas, no se verificou qualquer resultado aprecivel nas atividades das companhias nipnicas. Depois da guerra, conseguiu-se transformar a pimenta-do-reino num grande produto industrial da regio. Registremos que o consulado nipnico de Belm foi instalado antes, em 1934.

IMIGRANTES QUE DESEJAM RADICAR-SE 153 3. IMIGRANTES QUE DESEJAM RADICAR-SE

a) O importante papel da Associao Ultramarina de Shinano A partir do sculo XIX, os imigrantes do mundo todo podem ser, grosso modo, divididos em permanentes e de curto prazo (dekasegi). A histria das migraes indica que, at por volta de 1880, a maioria destinava-se radicao definitiva no pas receptor. Da em diante cresce o contingente dos que procuram ganhar dinheiro e retornar ptria so os dekasegi. Cita-se como emigrante tpico de dekasegi o italiano, mas a emigrao japonesa, que s comeou na segunda metade do sculo passado, apresentava caracterstica de "curto prazo", "no permanente", ou, adotando-se o termo atualmente em voga, dekasegi. Alis, como fica bem claro no decorrer desta narrativa. Considera-se que a emigrao nipnica para o Brasil, do perodo anterior a II Guerra Mundial, era constituda em grande parte por emigrantes que tinham por objetivo ganhar dinheiro e regressar terra natal. Todavia, embora em pequeno nmero, havia imigrantes aqui chegados com a finalidade de fixar-se de modo permanente no pas. Em 1937, Shungoro Wako realizou um levantamento dos residentes japoneses ao longo da linha Noroeste, no qual havia uma pergunta: residncia permanente ou regresso ptria? Das 24 mil respostas, 85% responderam pela volta ao Japo, apenas 10% pela radicao no Brasil e 5%, "no sabe". Aqui h necessidade de uma explicao. Em 1937, as foras militares do Japo provocam uma guerra com a China, criando o chamado Shina Jihen (Incidente da China), nome dado pelos militares japoneses e governo de Tokyo a um conflito que era uma verdadeira guerra. Todo o Japo ficou tomado por um espantoso entusiasmo mavrtico, cuidadosamente conduzido pelo departamento de informao militar, que divulgava as notcias de sucessivas vitrias das foras imperiais nas frentes de combate que iam se ampliando na medida em que tambm a resistncia chinesa se tornava cada vez mais tenaz e decidida. A campanha belicista veiculada pelo noticirio da imprensa colonial a essa altura todo o servio informativo procedente do Japo se achava sob rigoroso controle da censura militar logo influiu na atitude dos imigrantes aqui residentes. Entusiasmados com os feitos hericos e gloriosos dos soldados, promoveram-se campanhas de "contribuio defesa da ptria", com remessa de dinheiro aos ministrios militares. Fervia o ardor patritico e nacionalista dos imigrantes. No Brasil, Getlio Vargas dava o golpe, criando o Estado Novo

154 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

(1937), regime autoritrio. Antes, o nacionalismo orientado pelo governo j havia resultado em limitaes ao ensino da lngua estrangeira aos filhos de imigrantes, alm de outras medidas restritivas. ento que japoneses, descontentes com essa situao, passam a preconizar o "regresso ao Japo" ou a "reemigrao para o Sudeste da sia ou Manchria". Se numa conjuntura como essa havia ainda 10% de japoneses desejosos de se fixar permanentemente no pas, provvel que numa situao normal tivesse havido mais imigrantes favorveis radicao definitiva no Brasil. bem possvel que entre essa minoria figurassem aqueles elementos antimilitaristas ou jovens que fugiram do servio militar obrigatrio do Japo e vieram parar nestas plagas. certo que havia emigrantes que j deixavam a terra natal aspirando a uma fixao permanente no pas receptor e aqui viver para sempre, a fim de promover o progresso e bem-estar pessoal e familiar, em ambiente de paz e tranqilidade. Ikutaro Aoyagi, representante do Tokyo Syndicate e idealizador da fundao (1913) da Colnia de Iguape, ficou muito conhecido como defensor da idia de que o "emigrante deve se fixar no pas para onde vai". Sabe-se que os imigrantes japoneses de Iguape visitaram colnias de Santa Catarina fundadas por europeus no sculo passado, a fim de estudar seu sistema administrativo. Na dcada de 20, temos o exemplo da construo da Colnia Aliana (Ariana Ij-chi) iniciada em 1923 pela Shinano Kaigai Kykai (Associao Ultramarina de Shinano)(*). Os imigrantes vindos por intermdio dessa organizao estavam devidamente orientados no sentido da fixao permanente no Brasil. As associaes de ultramar, ou ultramarinas, das provncias tiveram comeo em 1915 na provncia de Kumamoto, uma das maiores emigrantistas. Tinham por finalidade precpua "a difuso do pensamento emigratrio" entre os provincianos. A seguir foram fundadas em provncias de maior contingente de emigrantes como Hiroxima, Wakayama, etc. Em 1924, o governador da provncia de Nagano, Toshio Honma, defendeu a tese de que "a verdadeira emigrao (usando a palavra ij mudana do local de residncia, ou transmigrao, em vez de imin, migrao, migrante) consiste em estabelecer no alm-mar toda a infraestrutura necessria que proporcione os mesmos benefcios que gozava na terra natal, para que o emigrante possa fixar-se seguramente e procure o seu desenvolvimento e do pas imigrantista". Por isso, tendo a Asso-

(*) Shinano nome tradicional da atual provncia de Nagano.

IMIGRANTES QUE DESEJAM RADICAR-SE 155

ciao Ultramarina de Shinano como entidade promotora, foi implantada a primeira Aliana Ij-chi(*) de 5.500 hectares. pois com o esprito de mudana definitiva e permanente que se chamou essa "colnia" de ij-chi (local ou terra para onde se transmigrou) e no shokuminchi (colnia). A gesto de uma colnia para imigrantes que visavam a permanncia definitiva no pas provocou na poca ma polmica entre seus defensores e adversrios na comunidade japonesa. Contudo, a idia foi encampada tambm pelas associaes ultramarinas de Kumamoto, Tottori e Toyama. Com a participao delas foram implantadas at 1927 a Segunda (5.000 hectares) e a Terceira (7.500 hectares) Alianas. Em 1929 foi criada a Bratac como entidade central unificadora das colnias japonesas em fase de formao. E entre 1931 e 38, as ij-chi Aliana tiveram seus servios administrativos transferidos das associaes ultramarinas citadas para a alada da Bratac. Nas trs Alianas ingressaram, a partir de novembro'de 1924, cerca de 400 famlias. No se pode pensar que todas essas famlias estivessem decididas a radicar-se no Brasil. Havia porm um aspecto que as diferenciava de outros imigrantes. Havia muitos profissionais, alm de lavradores, como, por exemplo, engenheiro ferrovirio, botnico-geneticista, alto funcionrio do Ministrio da Casa Imperial, engenheiro naval, sacerdote, mdico, empresrio, funcionrio de tributao, diretor de escola elementar, etc, todos aspirantes a residncia permanente no Brasil. E havia pessoas que, havendo emigrado para os Estados Unidos, decidiram reemigrar para o Brasil, por causa da crescente tendncia de discriminao racial existente naquele pas. Por isso, a porcentagem de fixao dos imigrantes nessas ij-chi era elevada, de 70%, aps 17 anos de fundao das colnias em questo. A presena relativamente pequena de pessoas com prtica e conhecimentos agrcolas teve certa influncia no desenvolvimento da agricultura. Entretanto, um dos fundadores das ij-chi, Shigeshi Nagata, presidente da Rikkokai (entidade educativa privada que pregava o aperfeioamento humano atravs de constantes esforos individuais), ensinava que o importante era "antes de formar cafezal formar o homem". Considera-se, pois, que as ij-chi Aliana contriburam muito para a mudana de mentalidade da maioria dos imigrantes, at ento dominados pela mentalidade dekasegi.

(*) Ver a diferena entre shokuminchi (colnia) e ij-chi (local para onde se transferiu a residncia em carter permanente), em Formao de Ncleos Coloniais (Captulo 2).

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b) O papel cumprido pela Bratac 1927 lembrado no Japo como o ano de uma grave crise financeira. Mas, no campo da poltica emigratria japonesa, constitui um marco importante: pode-se considerar o ano em que o governo de Tokyo, abandonando a tradicional poltica de dekasegi, passou a pensar na "emigrao para radicao permanente" no pas receptor. Desde os primeiros emigrantes para o Hava, de 1868, j haviam transcorrido 60 anos, e 45 anos desde o comeo da emigrao oficial (kanyaku imin) para aquelas ilhas. No dia 23 de maro de 1927, o governo baixou a Lei de Cooperativas de Emigrao para o Ultramar, ordenando que as provncias organizassem "Cooperativas de Emigrao" (Ij-Kumiai). Em agosto do mesmo ano, dava os primeiros passos a Kaigai Iju Kumiai Rengokai (Confederao das Cooperativas de Emigrao para o Ultramar). Trs nicas provncias que quase no haviam enviado emigrantes no organizaram as respectivas cooperativas de emigrao: Niigata, Tochigi e Miyazaki. Por ocasio da deciso de instalar a ij-chi Aliana, o governador Honma, h pouco mencionado, declarou: "E preciso que o que a Associao Ultramarina de Shinano fizer seja capaz de influir na poltica de todo o Japo". A Confederao de Cooperativas de Emigrao acabou aplicando em mbito nacional o que a Associao Ultramarina de Shinano havia feito nos limites da provncia. O primeiro diretor-presidente da Confederao de Cooperativas de Emigrao foi Shichita Tatsuke, exembaixador do Japo no Brasil, e o diretor-gerente Mitsusada Umetani, que sucedera a Honma no governo da provncia de Nagano e conclura a obra de fundao das ij-chi de Aliana. A primeira orientao da Confederao consistia em fundar uma ijchi (colnia de imigrantes de residncia permanente) por ano. Seria uma das oito projetadas, promovendo a entrada de 200 famlias por ij-chi correspondente a uma provncia. Entretanto, essa diretriz sofreu alterao posterior, para o ingresso de grande nmero de imigrantes em grandes reas. E decidiu-se organizar uma entidade representativa da Confederao no Brasil que se encarregaria da formao e administrao de todas as ij-chi. Como resultado dessa deciso, foi fundada, em 25 de maro de 1929, a Sociedade Colonizadora do Brasil Ltda., que ficou conhecida pelo nome simplificado de Bratac, j citada algumas vezes. Na aquisio de terras, a Bratac impunha as seguintes condies: l.a) a uma distncia de menos de 40 km da estao ferroviria e rea superior a 24 mil hectares; 2.a) para a finalidade de cafeicultura, situar-se a uma altitude superior a 450 metros acima do nvel do mar; a terra deveria apresentar

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fertilidade superior mdia; cada famlia de colonos receberia um lote de 25 hectares com boas condies topogrficas e bem servido de gua; 3.a) deveria oferecer boas condies de salubridade. Foram adquiridas as seguintes reas de terras: Bastos, SP Alianas, SP Tiet, SP Assai, PR Total 29.280 hectares 3.238 hectares 114.680 hectares 30.500 hectares 177.698 hectares

As terras adquiridas foram distribudas em lotes de 25 hectares aos imigrantes que vinham do Japo e tambm a seus patrcios j residentes no Brasil e interessados em participar da obra de colonizao. Existiam diferenas quanto ao preo do lote, segundo a ij-chi e a qualidade do solo. Os imigrantes destinados a Bastos, por exemplo, pagavam 1.440 yens por lote. O ingresso nas ij-chi comeou em 1929 e at as vsperas da Guerra do Pacfico entraram 2.500 famlias, sendo apenas 1.000 vindas diretamente do Japo. (Havia restries no Brasil e o Japo incentivava a emigrao para a Manchria e Monglia.) Os demais foram recrutados entre os imigrantes j residentes no pas. E todos eles estavam dispostos residncia permanente, como seus companheiros da ij-chi Aliana. Com o objetivo de "permitir que o imigrante possa se fixar com segurana e certeza", a Bratac procurou esforar-se no sentido de oferecer, alm de obras de infra-estrutura, as instalaes necessrias s atividades produtivas dos colonos. Bastos, para citar um exemplo, em 1932, quando j contava 660 famlias de colonos estabelecidos, dispunha de mquina de beneficiamento de arroz, mquina de beneficiamento de caf, carda para algodo, serraria, instalao para produo de ovos de bichoda-seda, secador de casulos, fiao, fbrica de leo, fbrica de gelo, olaria, oficina de conserto de mquinas agrcolas, armazns, etc. Alm dessas instalaes indispensveis para as atividades produtivas da colnia, havia ainda nove escolas primrias, um hospital e farmcia. Existindo muitos colonos que ingressaram na ij-chi procedentes de outras localidades, para onde haviam imigrado antes, e levando em considerao que entre eles podia haver pessoas embudas do esprito dekasegi, a Bratac lanou o chamado Movimento Gat (sigla de "Gozar a Terra", no sentido de amar a terra)(*). O Gat desenvolveu esforo no
(*) No original japons Aido, amor terra, amar a terra.

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sentido de orientar os colonos a amar a terra, onde deviam viver para sempre e deixar descendncia. Acrescentaremos mais uma observao. No decorrer das oito dcadas da histria da imigrao japonesa no Brasil foram criadas numerosas colnias, mas muitas delas desapareceram em tempo relativamente curto, ao passo que as ij-chi implantadas pela Bratac continuam a se desenvolver ainda hoje. Parece no haver dvida de que esse resultado se deveu orientao traada pela empresa de introduzir imigrantes resolvidos a se radicar permanentemente no pas. Acontece que a nova Constituio Brasileira, promulgada em 1934, continha o dispositivo que limitava a entrada de imigrantes a 2% (anuais) do total dos ltimos 50 anos. Analisando a nova situao resultante desse dispositivo constitucional, que modificava profundamente a poltica imigratria do Brasil, a Confederao das Cooperativas de Emigrao chegou concluso de que "no bastava desbravar e colonizar para o desenvolvimento no almmar". Em 1937 reformulou a orientao de seus empreendimentos no Brasil, organizando a Nichinan Sangyo Kabushiki Kaisha (Companhia Industrial Japo-Amrica do Sul S. A.), com capital social de 10 milhes de yens. Com a nova organizao empresarial, a Bratac, alm de continuar com as atividades colonizadoras de at ento, passou a fundar novas empresas em setores diferentes, tais como banco (este criado antes, em 1935), comrcio (1938), minerao (1938), algodo (1938), engenharia (1939), etc, como empresas subsidirias. Ampliou suas atividades s reas bancria, comercial e outras. Todavia, o objetivo central da Bratac continuava sendo a abertura de ij-chi para colocar imigrantes. Por isso, numa tentativa de evitar a concentrao de japoneses no Estado de So Paulo, levou dez famlias para a colnia estadual de Santa Rosa, no extremo meridional do Estado do Rio Grande do Sul. E mais cinco famlias se estabeleceram numa fazenda de So Sebastio de Ca, nas proximidades de Porto Alegre. Pouco antes de comear a II Grande Guerra, porm, foi proibida a aquisio de terras agrcolas por estrangeiros nas proximidades da fronteira nacional, razo por que os colonos japoneses de Santa Rosa se transferiram para outras localidades. E quando irrompeu a guerra no Pacfico, interrompeu-se o movimento imigratrio. Sem se tratar de imigrao propriamente dita, houve casos de

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colonizao de famlias japonesas em outros estados, por solicitao dos respectivos governos. Exemplos: em 1938, a Cooperativa Agrcola de Cotia levou 40 famlias para a Colnia Santa Cruz, Estado do Rio; em 1937, foram introduzidas cinco famlias nos subrbios de Salvador, BA. Depois da entrada em vigor da chamada "Lei dos dois por cento", a Bratac tratou de abrir colnias em outros pases sul-americanos. Em 1936 adquiriu um terreno de 10.850 hectares em La Colmena, no Paraguai, enviando para l inicialmente oito famlias como pioneiras orientadoras. E at 1941 um total de 125 famlias (740 pessoas) foram instaladas naquela colnia. Elas so as primeiras famlias de imigrantes nipnicos do Paraguai. (Katsuo Uchiyama/Tetsuya Tajiri/Jos Yamashiro)
4. A CAMPANHA ANTIJAPONESES

a) Entre a bigorna e o martelo Ao escrever a epopia dos 80 anos da imigrao japonesa no Brasil, torna-se imperioso salientar dois importantes fatos, pela profunda repercusso, preocupao e sofrimento causados vida dos imigrantes: 1.) O fortalecimento do nacionalismo brasileiro, sob o governo Getlio Vargas (1930-45), e do nipnico, orientado por governos ultranacionalistas, dominados por militares ambiciosos favorveis conquista territorial na China e Sudeste Asitico. 2.) A chamada campanha antijaponeses (hainichi und), basicamente inspirada na teoria da superioridade da raa branca e pela crena na inassimilabilidade do elemento "amarelo", acrescidas do temor do militarismo expansionista japons. Tal campanha torna-se mais opressiva comunidade nipnica aqui radicada, com as complicaes da poltica internacional, sobremaneira agravadas pela ao militar de Tokyo na sia Oriental (fins da dcada de 20 e todo o decnio seguinte) e subseqente confrontao direta com os Estados Unidos e seus aliados. O esforo nacionalista brasileiro abarcou toda a vida nacional: poltica, econmica e cultural. Em suma, representou uma mobilizao dirigida pelo governo, visando construo de uma sociedade brasileira coesa, na qual todos os cidados, inclusive filhos de imigrantes das mais diferentes procedncias, se conscientizassem da sua cidadania brasileira.

160 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

Convm lembrar que, aps a grande depresso econmica de fins dos anos 20, o mundo estava violentamente sacudido, do Extremo Oriente Europa, por verdadeiros furaces ameaadores da paz e estabilidade internacionais: a poltica militarista agressiva do Japo no continente asitico e o crescente poderio militar do nazi-fascismo na Europa. As medidas nacionalizadoras do governo Vargas representavam, de certa forma, um reflexo dessa inquietante conjuntura internacional. Pensadores como Alberto Torres 1 e Oliveira Viana2 j haviam propugnado a necessidade de uma poltica nacional destinada a fortalecer o esprito da unidade do povo brasileiro. Entre 1938 e 39, o regime Vargas j sob a gide do Estado Novo baixou uma srie de decretos-leis, a fim de regulamentar as atividades de organizaes de estrangeiros residentes no pas, fiscalizao de impressos em lngua estrangeira e outras medidas legais, com a finalidade de acelerar a assimilao de brasileiros filhos de estrangeiros. Duas medidas, em particular, tiveram tremendos efeitos na colnia japonesa: a proibio do ensino da lngua nipnica nas escolas e o fechamento de jornais editados em idioma estrangeiro. perfeitamente compreensvel o choque psicolgico sofrido pelos imigrantes: a maioria ainda se apoiava, em sua vida espiritual, na orientao da me-ptria, de cunho nacionalista, conforme observa Tomoo Handa 3 . Certas crenas tradicionais, como o Yamato damashii (esprito japons), o carter divino da Famlia Imperial, a invencibilidade da nao nipnica, etc, inculcadas em sua alma desde a infncia, os mantinham umbilicalmente ligados terra natal. A campanha ultranacionalista, cada vez mais intensa, irradiada de Tokyo, reforava essa tendncia na mente dos imigrantes. Com o aumento da represso em especial no perodo da guerra revigorou-se o sentimento direcionado para o Japo, criando-se ambiente propcio a movimentos de resistncia, como o dos "vitoristas". Em resumo: prensados entre dois nacionalismos, os imigrantes foram colocados entre a bigorna e o martelo.

Alberto de Seixas Martins Torres (1865-1917). Advogado, socilogo e poltico. Ministro da Justia no governo Prudente de Morais (1894-98). Escreveu, entre outras obras, O Problema Nacional Brasileiro e A Organizao Nacional. 2 Francisco Jos de Oliveira Viana (1883-1951). Professor de direito. Autor de Populaes Meridionais do Brasil e Instituies Polticas Brasileiras, entre outras obras. 3 Tomoo Handa. O Imigrante Japons Histria de sua Vida no Brasil (p. 597). So Paulo, T.A. Queiroz Editora, Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1987. 828 p.

A CAMPANHA ANTI JAPONESES 161

b) Os primeiros ataques A imigrao nipnica sofreu muitos ataques e crticas por se considerar o japons inassimilvel, formando verdadeiros quistos raciais, constituindo um grupo isolado dentro da sociedade brasileira. Vivaldo Coaracy4, conhecido jornalista, colaborador de influentes rgos de imprensa como o Jornal do Comrcio, do Rio de Janeiro, e O Estado de S. Paulo, onde se assinava V.Cy, em seu livro O Perigo Japons5, conta: "J em 1918, o sr. Artur Neiva 6 , ento testa do Servio Sanitrio de So Paulo, advertia: 'Se, porm, tivssemos de solucionar o problema (da falta de braos), com preocupao cientfica e com os olhos no futuro do Brasil, veriamos que as raas orientais so inassimilveis pelos ocidentais e os imigrantes inds e japoneses fatalmente se enquistaro entre ns, ou, usando uma imagem mais expressiva, a nao ter ingerido um alimento, o qual, uma vez tragado, no poder ser digerido ou regurgitado'. Foi esta talvez a primeira advertncia, em data" 7 . Em 1923, o deputado Fidlis Reis apresentara Comisso de Agricultura do Congresso Nacional o projeto n. 391, cujo artigo 5. dizia: " proibida a entrada de colonos de raa preta no Brasil, e quanto ao amarelo, ser ela permitida, anualmente, em nmero correspondente a 5% dos indivduos dessa origem existentes no pas" 8 . Em sua justificativa, o autor declara que estava com Gobineau 9 : "propenso a admitir a influncia decisiva e incontrastvel do sangue ariano, ou antes, do louro dolicocfalo de Lapouge e Huxley, em todos os progressos da civilizao"10. O projeto Fidlis Reis recebeu muitos apoios, e at mesmo da Academia Nacional de Medicina, presidida por Miguel Couto11. Assinado por ele e mais 27 mdicos, dizia em resumo que o Brasil deve zelar pela melhoria de sua formao tnica, considerando os asiticos absoluta-

Vivaldo Vivaldi Coaracy (Rio de Janeiro, 1882-1967). Formado em engenharia, escritor e jornalista, destacando-se como memorialista do Rio de Janeiro. 5 Vivaldo Coaracy. O Perigo Japons. Publicao do Jornal do Comrcio. Rio de Janeiro, 1942,176 pginas. 6 Artur Neiva (Salvador, 1880 Rio de Janeiro, 1943). Mdico, Diretor do Servio Sanitrio (1916-18) de So Paulo, interventor federal na Bahia (1931), constituinte em 1933. 7 O Perigo Japons, p. 140-41. 8 Fidlis Reis. Pas a Organizar. Rio de Janeiro, A. Coelho Branco F. (Editor), 1931, p. 237-38. 9 Conde Joseph Arthur Gobineau (1816-1882), francs, autor de Essai sur Linegalit des races humaines, defensor da superioridade da raa branca. 10 Pas a Organizar, p. 232. 11 Miguel de Oliveira Couto (Rio de Janeiro, 1864-1934). Mdico, presidiu a Academia Nacional de Medicina durante 20 anos (1914-34). Cientista muito respeitado, afirmava que o nico problema nacional era a educao do povo.

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mente inassimilveis no Ocidente: "...as leis eugnicas e econmicas se opem entrada de elementos dessa origem..." Coube ao deputado Oliveira Botelho12 contestar os argumentos de Fidlis Reis, depois de visitar algumas colnias japonesas de So Paulo e Minas, conforme relata em seu livro A Imigrao Japonesa. Botelho ressalta o interesse dos japoneses pela educao e a sua "incorporao... afeitos aos nossos hbitos"; exemplo de "constncia no trabalho, de disciplina, ordem e economia..." (p. 34-5). A seguir diz: "O preconceito de raa e a vitoriosa concorrncia econmica, exasperaram os norte-americanos" (p. 41), numa aluso campanha antinipnica em curso nos Estados Unidos. Sobre a "feira do japons", argumentada pelo deputado Joo de Faria, relator do projeto Fidlis Reis, Oliveira Botelho contra-ataca: "Os nossos aborgenes, de origem evidentemente mongol, de cujo cruzamento com os portugueses resultaram os tipos varonis dos bandeirantes... no so mais belos" (p. 35). Alm de Vivaldo Coaracy, j referido, outra figura influente na campanha antijaponeses foi Flix Pacheco14. Colocado como um dos Trs Heris da Campanha Anti-Nipnica15 (ao lado de Miguel Couto e Artur Neiva) por Xavier de Oliveira16, em discurso em homenagem ao trio, na Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, Flix Pacheco lutou incansvelmente tanto na imprensa como no Congresso Nacional contra a imigrao japonesa. No dizer de Xavier de Oliveira, ele foi, "depois de Alberto Torres e Oliveira Viana, dos primeiros brasileiros e do jornalismo indigena a desenvolver uma ao enrgica e sistemtica, constante e persistente, contra a imigrao japonesa para o Brasil" (p. 237). No seu discurso, Xavier de Oliveira informa que mapas indicativos de ncleos de colonizao japoneses foram feitos por oficiais do Exrcito e da Marinha nipnicos, com finalidades exclusivamente militares, visando a conquista do Brasil; mais ainda, a partir de Iguape, visando
12 Francisco Chaves de Oliveira Botelho (Montevidu,1868 Resende, 1943). Mdico, deputado estadual e federal, presidente do Estado do Rio (1910-14). Ministro da Fazenda em 1928, no governo Washington Lus. 13 Oliveira Botelho. A Imigrao Japonesa. Parecer do deputado. Rio de Janeiro, 1925. 77 p. 14 Jos Flix Alves Pacheco (Teresina, 1879 Rio de Janeiro, 1935). Jornalista, trabalhou 36 anos no Jornal do Comrcio do Rio de Janeiro, do qual se tornou diretor-proprietrio. Ministro do Exterior do governo Artur Bernardes (1922-26). Poeta, deixou vrios livros de poesia. 15 Antnio Xavier de Oliveira. Trs Heris da Campanha Anti-Nipnica. Revista de Imigrao e Colonizao, Ano VI, n. 2 e 3, mai-set. 1945. p. 235-54. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional. 16 Antnio Xavier de Oliveira (Juazeiro do Norte, 1884 Rio de Janeiro, 1953). Mdico especialista em psiquiatria. Defendeu a proibio da entrada de imigrantes japoneses e de todos os grupos de cor, especialmente de negros no Brasil.

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a Bolvia pelo noroeste do Brasil e de Belm, pelo rio Amazonas, com destino ao porto de Callao... tendo como objetivo principal o canal do Panam... (p. 237). Na direo do Jornal do Comrcio Flix Pacheco exerceu poderosa influncia na opinio pblica do pas. Convm lembrar aqui que a Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, fundada em 1932, ficou muito conhecida na colnia, porque os jornais editados em idioma nipnico veiculavam notcias sobre suas atividades antinipnicas. A propsito, Barbosa Lima Sobrinho 17 diz em seu livro Presena de Alberto Torres18: "Mas a grande demonstrao do seu prestgio e da irradiao do seu nome foi a fundao, em 10 de novembro de 1932, da Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, com sede no edifcio do Jornal do Comrcio. Destinava-se a cooperar para os trabalhos que a Assemblia Constituinte teria pouco depois que enfrentar" (p. 509-10). c) Na Constituinte de 34 Longos discursos, debates acalorados, brilhantes duelos verbais entre correntes contrrias e favorveis ao imigrante nipnico tiveram como palco a Assemblia Constituinte de 1933-34, at a aprovao da lei restritiva chamada "dos dois por cento". Os debates eram noticiados pelos jornais da colnia, os quais, de modo um tanto simplrio, classificavam os deputados que combatiam a imigrao japonesa de antijaponeses, e de filo-japoneses aqueles que a apoiavam. Por outro lado, o Japo procurava por todos os meios aumentar o nmero de emigrantes, diante dos problemas criados pelo excesso populacional, subsidiando a sada dos mesmos para o Brasil, informa Arlinda Rocha Nogueira 19 . O grande terremoto de 1923, que arrasara a regio de Tokyo e Yokohama, agravava a crise econmica do pas. por isso que os anos de 1928 a 34 constituram a fase de maior entrada do nmero de imigrantes nipnicos no Brasil. Na verdade, os japoneses aqui residentes preocupavam-se com a marcha das discusses na Constituinte, porquanto uma medida restritiva muito severa ou mesmo a proibio representariam um retrocesso na evoluo da comunidade e um obstculo a mais nos caminhos para a
17 Alexandre Jos Barbosa Lima Sobrinho (Recife, 1897), jornalista, poltico, ocupou vrios cargos pblicos, deputado federal, governador dePernambuco (1959-63), autor de numerosos livros, membro da Academia Brasileira de Letras. 18 Presena de Alberto Torres (Sua vida e pensamento). Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 1968, p. 509-10. 19 Arlinda Rocha Nogueira. Imigrao Japonesa na Histria Contempornea do Brasil. So Paulo, Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, Massao Ohno, 1984, p. 114.

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soluo do grave problema demogrfico do Japo. Alm disso, o sentido discriminatrio contra os japoneses, expresso nos discursos de constituintes, provocava apreenso, preocupao e certa revolta na comunidade nipnica. Na Assemblia Constituinte, envolveram-se nos debates cientistaspolticos como Miguel Couto, Artur Neiva e Xavier de Oliveira e advogados-polticos como Teotnio Monteiro de Barros20, Morais Andrade 21 e muitos outros. Por absoluta falta de espao, no podemos reproduzir os discursos, mesmo em sua forma mais reduzida. Limitar-nos-emos a citar a data do Dirio da Assemblia Nacional, no qual foram reproduzidos os pronunciamentos e destacar alguns pontos mais expressivos. A 19 de dezembro de 1933, a bancada baiana, liderada por Artur Neiva, apresentou a Emenda" 1.053: "Art. 125 parg. 2. S ser permitida a imigrao de elementos de raa branca, ficando proibida a concentrao em massa, em qualquer ponto do pas" (DAN, 24.12.33, p. 795-7). Em sua justificao, Artur Neiva declarava que "no tinha nem de longe, qualquer preconceito de raa" (p. 795). No entanto, esclarece: "A inteno do signatrio quando se refere imigrao de elementos de raa branca visa, e no deve ocultar, os povos asiticos" (p. 796). Xavier de Oliveira (DAN (suplemento), 27.12.33) apresentou outra Emenda, de nmero 1.164: "Art. Para o efeito de residncia, proibida a entrada no pas de elementos das raas negra e amarela, de qualquer procedncia". A principal preocupao do parlamentar a eugenia da raa brasileira. "Jamais seremos uma grande nao, se no cuidarmos de defender e melhorar nossa raa", assevera em sua justificao (p. 21). Teotnio Monteiro de Barros (DAN, 20.1.34) prope a criao de um rgo de natureza tcnica para "tomar todas as providncias de ordem eugnica e educacional... necessrias formao de uma mentalidade que seria a mentalidade mdia comum do brasileiro". favorvel imigrao do "elemento indo-europeu da bacia mediterrnea", porque "traz uma formao psquica e tambm somtica concorde com os nossos troncos fundamentais" (p. 269-70). Xavier de Oliveira (DAN, 31-1-34, p. 472-86). Cita o exemplo dos Estados Unidos, que, desde 1917, restringiram a imigrao de orientais. Teotnio Monteiro de Barros (Ribeiro Preto, SP, 1901 So Paulo, 1974). Advogado, doutor em direito. Vrias vezes deputado federal, secretrio da Educao e Sade (1941-43) e ministro da Educao (1961). 21 Carlos de Morais Andrade (So Paulo, 1889 - ?). Vrias vezes deputado federal. Participou da Revoluo Constitucionalista de 32. Advogado e professor.

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Aduz que a poltica eugnica dos Estados Unidos est sendo seguida pelos pases da Amrica, excludo o Brasil, "que ainda no quiz ou no pde chegar a ela" (p. 474). Contra a autoridade de Roquete Pinto22 (que aprovava, do ponto de vista cientfico, o cruzamento de brasileiros com japoneses), coloca a de Miguel Couto, Oliveira Viana e Renato Kehl23. Artur Neiva (DAN, 9.2.34, p. 749-58). Teme a capacidade de organizao dos japoneses: "os nipes so o milagre da organizao e ns o prodgio da desorganizao" (p. 752). Mas logo adiante diz que os japoneses no sabiam sequer se defender da malria e endemias. O Servio Sanitrio permitiu que o Dr. Kitajima24 ficasse trabalhando em Iguape e o Dr. Takaoka 25 em So Paulo, informa. Miguel Couto (DAN, 24.2.34, p. 966-9). Comea por falar do problema do negro no Brasil. "... se j prestmos um to grande servio humanidade na mestiagem do preto, o bastante... A do amarelo, a outrem deve competir" (p. 967). A certa altura afirma: "No h nenhum problema de imigrao japonesa: h um problema nacional, de segurana da Ptria, de vida ou morte do nosso Brasil" (p. 968). (Discurso de 27.2.34 inserido no livro Seleo Social, 86 pginas. Rio de Janeiro, Irmos Pongetti, 1942). Aps vrias consideraes sobre a periculosidade da imigrao nipnica: "Haja vista o memorial do primeiro ministro Tanaka(*)... ao Imperador... (O deputado Morais Andrade aparteia, declarando que tal documento j havia sido esclarecido na Liga das Naes, em Genebra, pelo representante nipnico, h trs ou quatro anos.) Miguel Couto l o suposto memorial, o qual, depois de algumas consideraes, como, por exemplo, "para sua prpria proteo, o Japo tem que remover as dificuldades que se apresentam na sia Ocidental", assevera: "Como primeiro passo para a conquista da China,
22 Edgar Roquete Pinto (Rio de Janeiro, 1884-1954). Mdico, antroplogo, escritor, professor do Museu Nacional. Autor de Rondnia (1916) sobre ndios do Mato Grosso. 23 Renato Ferraz Kehl (Limeira, 1889 - ?). Mdico, divulgador da doutrina de Galton (eugenismo), fundou, em 1918, a Sociedade Eugnica de So Paulo, a primeira do gnero na Amrica do Sul. 24 Kenzo Kitajima (provncia de Fukui, Japo, 1870 Registro, SP, 1923). Mdico da colnia de Registro, Iguape. Cuidou da sade dos imigrantes. Faleceu vtima da malria, a qual combatia. 25 Sentara Takaoka (provncia de Akita, Japo, 1885 So Paulo, 1963). Mdico, dedicou-se defesa da sade dos imigrantes, doutorou-se com a tese sobre malria pela Universidade de Kyoto. Atravs de livros e peridicos difundiu noes de higiene e medicina na comunidade.

(*) O chamado memorial secreto Tanaka (atribudo ao primeiro-ministro, general Giichi Tanaka (1864-1929), que ocupou esse cargo de 1927 a 1929), divulgado na China, teve ampla repercusso no mundo inteiro. Como a poltica militarista e expansionista, iniciada no governo de Tanaka, parecia confirmar o contedo do suposto memorial, este obteve credibilidade quase geral. Contudo, no julgamento do Tribunal de Tokyo (1946), ficou comprovada a falsidade do documento, segundo informa o prof. Tsutomu Ouchi, em seu livro Fashizumo e no Michi (A Caminho do Fascismo), p. 91, vol. 24, de Nihon no Rekishi (Histria do Japo), Tokyo, da Ed.Chuo Koronsha, 1967.

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temos que conquistar a Manchria e a Monglia. Para conquistar o mundo, temos que primeiro conquistar a China" (p. 64-5). Miguel Couto adverte contra a ambio expansionista do Japo. Carlos de Morais Andrade (Anaes da Assemblia Nacional Constituinte, vol., VI, p. 336-62, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1935). Apoia a emenda do deputado Teotnio Monteiro de Barros, mas discorda da crtica que este entendeu fazer imigrao japonesa na sua justificao. Afirma que o fato de ser advogado da Sociedade Colonizadora do Brasil Ltda. (Bratac) no o influenciava na sua maneira de pensar. Na defesa do imigrante japons, do ponto de vista cientfico, o deputado Morais Andrade recorre a duas respeitadas autoridades brasileiras da rea antropolgica. Refere-se primeiro a uma parte de um trabalho de Roquete Pinto: "Considerar eugnicamente indesejvel o cruzamento de japoneses com os brasileiros , mais ou menos, condenar o casamento de nortistas com meridionais do prprio Brasil". Ressalva, porm: "Pode haver motivos que desaconselhem a livre recepo de japoneses saudveis e educados neste pas. Sero motivos de ordem social, poltica, religiosa, esttica... ou esotrica. Razes eugnicas e antropolgicas-cientficas no" (p. 340). Em seguida, o deputado menciona parcialmente um artigo do Prof. Alfredo Ellis Jnior26, publicado no Dirio de So Paulo, edio comemorativa do 25. aniversrio da imigrao japonesa no Brasil (1933). O Prof. Ellis Jnior afirma que eugenia no pode ser s a cincia da beleza fsica (p. 343), numa referncia irnica a muitos publicistas da poca que confundiam a eugenia como uma cincia da busca da beleza fsica. E explica didaticamente o que vem a ser essa cincia (p. 343). Pouco antes, o Prof. Ellis Jnior havia dito: "No processo de assimilao, o japons no escapa. Ter de aos poucos de ser deglutido por ns, como o so muitos outros" (p. 342). Sendo virtualmente o nico e decidido defensor da imigrao japonesa na Constituinte, o deputado Morais de Andrade muito aparteado por seus adversrios. Encerra o discurso, dizendo: "O que desejo que fique assinalado, ao menos, depois deste trabalho exaustivo e desgraadamente intil (no apoiados), a minha posio, no meio de tanta celeuma, de tanta discusso" (p. 361-2). "Finalmente, a 24 de maio de 1934, por esmagadora maioria, a Assemblia Nacional Constituinte aprovou a emenda definitiva, resultante do acordo entre os proponentes de outras, e que, sob o n. 1.619, foi
26 Alfredo Ellis Jnior (So Paulo, 1896 -1974). Advogado e professor. Deputado estadual vrias vezes. Na Revoluo Constitucionalista de 1932 saiu ferido. Autor de vrias obras como: O Bandeirante Paulista e o Recuo do Meridiano e Confederao ou Separao, e livros didticos.

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apresentada com a assinatura de 130 deputados. Era o dispositivo que foi incorporado Constituio e que fixou a quota de 2% do nmero de nacionais de cada pas entrados no Brasil nos ltimos cinqenta anos, como limite mximo dos que poderiam ser admitidos em cada ano" (Vivaldo Coaracy. O Perigo Japons, p. 146). Era o art. 121, pargrafo 6. da Constituio de 16 de julho de 1934. A mesma restrio foi mantida no art. 151, da Constituio de 10 de novembro de 1937 (Estado Novo). d) Aflio e angstia Aprovada a lei de restrio de imigrantes, a entrada de nipnicos se reduziu drasticamente(*), para tristeza dos compatriotas aqui residentes. Vimos que no decorrer da segunda metade da dcada de 30 foram baixadas diversas medidas repressivas, prejudicando profundamente a vida social e cultural da colnia. Tomoo Handa, numa snte-se admirvel, escreve: "Pressionado entre os dois nacionalismos, a aflio e angstia do imigrante so indescritveis. O sofrimento que durou mais de uma dcada, pode ser considerado destino inelutvel defrontado pelo imigrante, agravado com a ecloso da II Guerra Mundial. Desenrolou-se sua frente uma situao toda especfica, que provavelmente jamais se repetir" (Tomoo Handa. Imin Seikatsu no Rekishi Histria da Vida do Imigrante, p. 590). e) Os defensores Alm dos exemplos j referidos, houve muitos defensores da imigrao nipnica, em livros, na imprensa, nos legislativos federal e estaduais. Na impossibilidade de organizar um quadro completo, faremos uma rpida referncia a alguns trabalhos, que refletem o pensamento da corrente favorvel introduo do imigrante japons no pas. O livro A Imigrao Japonesa para a Baixada do Estado do Rio de Janeiro27, de autoria de Nestor Ascoli, abre com o parecer do autor (datado de 30.10.1909), ento deputado estadual do Rio de Janeiro, inteiramente favorvel ao contrato de 1. de novembro de 1907, firmado entre o governo daquele Estado e os srs. Ryu Mizuno e Raphael Monteiro, para a funda-o de ncleos coloniais japoneses na Baixada Fluminense.
27 Nestor Ascoli. A Imigrao Japonesa para a Baixada do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Edio da Revista da Lngua Portuguesa, 1924.

(*) De 21.930 em 1934 para 9.611 em 1935, segundo P. Pereira dos Reis ("Algumas consideraes sobre a imigrao no Brasil", in revista Sociologia, Vol. XXIII, n. 1, maro de 1961, p. 84).

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O livro traz ainda numerosas opinies de personalidades a favor da imigrao nipnica, entre as quais Waldyr Niemeyer, Amrico Werneck28, Bruno Lobo29, Roquete Pinto, Reynaldo Rego, e os senadores estaduais por So Paulo, Padua Salles, Fontes Jnior e Joo Martins. Em sua obra De Japons a Brasileiro30, o Prof. Bruno Lobo, ento o mais conhecido niponfilo, defende a imigrao nipnica, fornece muitas informaes sobre o Japo, as atividades dos imigrantes, empresas de emigrao, entidades diversas relacionadas com a vida dos japoneses no Brasil. "... no s esto contribuindo para a formao de nossos tipos tnicos, como representam fator de primeira valia para o nosso desenvolvimento econmico" (p. 8-9), afirma. Rene opinies pr-japoneses de cientistas, polticos, jornalistas e outros estudiosos do problema imigratrio. Condena energicamente o preconceito racial. Em Impresses de uma Viagem ao Japo em 192831, o Prof. Juliano Moreira32, que pronunciou uma srie de conferncias em universidades e outras instituies cientficas daquele pas, relata suas impresses indicativas de grande admirao e apreo pelo povo nipnico. Aprova o cruzamento do japons com o brasileiro, cujos produtos "so, do ponto de vista ocidental, incontestavelmente mais belos do que o comum do tipo japons" (p. 112). "Temer a imigrao japonesa com receio de que no a assimilamos, descrer da capacidade do brasileiro de incorporar o aliengena" (p. 13), declara. Brasil e Japo Duas Civilizaes que se Completam , uma coletnea de 50 artigos publicados nos Dirios Associados, edio comemorativa dos 25 anos da imigrao nipnica no Brasil.
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28 Amrico Werneck (Paraba do Sul, 1855 Rio de Janeiro, 1927). Engenheiro civil, deputado federal e estadual. Colaborou em muitos jornais e deixou numerosas obras de fico e no-fico. 29 Bruno Alvares da Silva Lobo (Belm, 1884 - ?). Formado pela Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Diretor do Museu Nacional (1915-23). Obras sobre medicina. Membro de entidades cientficas nacionais e estrangeiras. 30 Bruno Lobo. De Japons a Brasileiro Adaptao e nacionalizao do imigrante. Rio de Janeiro, Tip. do Dep. Nacional de Estatstica, 1932. 31 Juliano Moreira. Impresses de unia Viagem ao Japo em 1928. Rio de Janeiro, 1935. 32 Juliano Moreira (Salvador, 1873 Rio de Janeiro, 1933). Formado pela Faculdade de Medicina da Bahia. Diretor Geral da Assistncia a Psicopatas, durante 28 anos. O nome HospitalColnia Juliano Moreira foi dado em sua homenagem. 33 Brasil e Japo Duas Civilizaes que se Completam. Edio dos Dirios Associados, em comemorao ao 25 aniversrio da imigrao japonesa no Brasil. 1934, 338 p.

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Ministros de Estado, diplomatas, empresrios, professores universitrios, escritores, jornalistas, etc. do Brasil e do Japo colaboram. Destacam-se pela objetividade cientfica os artigos dos professores Roquete Pinto (p. 252) e Alfredo Ellis Jnior (p. 267), nossos conhecidos. Figurando como editor Calvino Filho, e Alexandre Konder 34 como organizador, Fatos e Opinies sobre a Imigrao Japonesa35 relata um conjunto de fatos divulgados em jornais de todo o Brasil e opinies de personalidades ilustres, de vrios setores da sociedade brasileira, todos defendendo e elogiando o imigrante nipnico. f) Evoluo da antropologia "Neste volumezinho procuro ressaltar alguns aspectos, que me parecem interessantes, do problema da raa ou das raas no Brasil. No concluo nada, porque nada h feito, em nosso pas, sobre os temas aqui agitados. Formulo apenas algumas hipteses e as pesquisas dos tcnicos iro dizer se so ou no verdadeiras." "Estas hipteses, alis, no causam mal nenhum cincia; so estmulos para o trabalho, so sugestes para pesquisas. Mesmo que se verifiquem erradas, a cincia lucrar com elas; porque, como observava h pouco Ellwood(*) 'a cincia tem sempre progredido sobre a ruina das hipteses'. Umas so destrudas e, em lugar delas, outras surgem, mais fecundas e verdadeiras: e assim se acrescenta o patrimnio comum do saber humano." (Oliveira Viana. Prefcio do livro Raa e Assimilao. 3. a ed. Niteri, Companhia Editora Nacional, 1938. Col. Brasiliana, srie 5. a , vol. 4.) "A propsito, interessante notar que at os precursores em estudos antropolgicos no Brasil, E. Roquete Pinto (1933) e Oliveira Viana (1932), se envolveram em controvrsia, a favor ou contra a presena do japons, recorrendo-se, para tanto, a seus respectivos repertrios de conhecimento antropolgico. Essas e outras publicaes, inclusive os debates parlamentares e a publicidade subsidiada pelas entidades interessadas, constituem, por assim dizer, a fase pr-cientfica do estudo sobre o japons no Brasil."

Alexandre Marcos Konder (Itaja, SC, 1904 - ?). Jornalista e advogado. Alexandre Konder. Fatos e Opinies sobre a Imigrao Japonesa. Rio de Janeiro, Calvino Filho, editor, 1934.
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(*) Charles A. Ellwood, socilogo americano (1873-1946), da escola de psicologia social.

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" a partir de 1940 que desperta entre socilogos e antroplogos o interesse real pelo estudo do grupo japons. Desde ento, numerosas pesquisas e estudos foram conduzidos nos moldes cientficos em torno de um processo evolutivo a que, conforme perspectivas adotadas em cada caso, se nomearam de 'assimilao', 'aculturao', 'integrao', 'absoro', 'fixao' e outros." (Hiroshi Saito36 e Takashi Maeyama. Apresentao de Assimilao e Integrao dos Japoneses no Brasil. Ed. Vozes e Edusp, 1973.) g) As teorias raciais As teorias raciais que fundamentavam as discriminaes racistas e tnicas modernas se desenvolveram a partir do cientificismo naturalista, que se estende dos meados do sculo XIX ao clmax da afirmao da superioridade ariana do nazismo hitlerista da dcada de 30 do nosso sculo. Como principais criadores da teoria da superioridade da raa branca so citados o francs Conde Joseph Arthur Gobineau (1816-1882), autor de Essai sur Vingalit des races humaines; o ingls Houston Stewart Chamberlain (1855-1911) (filosofia poltica, superioridade do elemento ariano na cultura europia, pr-germnico) e outro ingls, Sir Francis Galton (1822-1911), criador da eugenia. No Brasil tivemos diversos cientistas, pensadores e polticos influenciados por correntes de pensamento racistas, alguns mencionados no texto. A principal reao a essa pseudocincia racial foi comandada pelos trabalhos do antroplogo alemo, naturalizado americano, Franz Boas (1858-1942). Entre ns, Gilberto Freyre (1900-1988), que estudou com Franz Boas nos EUA, o patrono da tendncia anti-racista e antidiscriminatria, o valorizador, por excelncia, da miscigenao tnico-racial.
5. OS NISSEIS ENTRE DOIS PENHASCOS

a) Uma definio provoca reao violenta "Os brasileiros descendentes de japoneses tm uma grande responsabilidade perante a Nao Brasileira."
Hiroshi Saito (Miyazaki, Japo, 1919 So Paulo, 1983). Professor da Escola de Sociologia e Poltica da USP, Ph.D. em economia pela Universidade de Kobe. Diretor do curso de ps-graduao da Escola de Sociologia e Poltica. Professor da Escola de Comunicaes e Artes da USP. Diretor Cientfico do Centro de Estudos Nipo-Brasileiros.
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Comea assim o artigo intitulado "A Nossa Mentalidade", assinado por Cassio Kenro Shimomoto 1 , bacharelando de direito, publicado no nmero 1, ano 1 (outubro de 1935), do jornal Gakusei (O Estudante), rgo da Liga Estudantina Nipo-Brsileira, com sede em So Paulo. A seguir, o articulista declara que so destitudas de bases as "acusaes que os nipnicos se enquistam, que no se assimilam ou que no se adaptam aos costumes brasileiros", aludindo campanha antijaponeses na poca, fortemente ativa na imprensa e no parlamento brasileiros. "Ns sentimos diz pouco adiante o mesmo entusiasmo que sentem os paulistas de h quatrocentos anos, ao ouvirmos o Hino Nacional...". "A prova desta afirmao foi dada pelos filhos de japoneses que, quando em 1932, So Paulo se levantou como um s corpo em defesa do seu sagrado solo, apesar do receio dos nossos maiores, sem refletirmos nas conseqncias resultantes da nossa atitude, cerramos as fileiras do soldado constitucionalista, com o nico pensamento de que desse modo estvamos cumprindo um dever para com a terra que de braos abertos recebeu os nossos pais, e que o nosso torro natal." Em resposta queles que criticavam a imigrao japonesa, dizendo que os filhos de japoneses aqui nascidos continuavam nipnicos, e tambm aos pais, que teimavam em criar seus filhos como sditos do Micado, Shimomoto argumentava: "Como poderemos amar a terra dos nossos antepassados? Se nem a conhecemos? Podemos ter quando muito um sentimento de respeito pela ptria de nossos pais, mas nunca a idia de patriotismo pela terra dos crisntemos" (grifo nosso). Esta expresso "terra dos crisntemos" teve uma repercusso inesperada e grave na colnia. Na poca, o Japo desenvolvia uma poltica ultranacionalista e militarista, com fundamentos msticos, como o carter divino do Imperador. O soberano era considerado descendente direto da Deusa do Sol, Amaterasu. Acontece que a flor de crisntemo o braso da Famlia Imperial. Uma interpretao(*) distorcida da expresso "nunca a idia de patriotismo pela terra dos crisntemos" acabou criando o incidente chamado de "lesa-majestade" ou de "desrespeito" ao Imperador. Por desconhecimento do portugus, ou propositadamente, a expresso "terra dos crisntemos" foi interpretada como sendo fruto de uma atitude de
1

Cassio Kenro Shimomoto (Provncia de Kochi, Japo, 1912 So Paulo,l968). Veio para o Brasil ainda beb. Primeiro nisei formado pela Faculdade de Direito do Largo So Francisco (1936). Ainda estudante, participou como voluntrio da Revoluo Constitucionalista de 1932. Promotor substituto em Cafelndia, em 1937. Em 1953, juiz do Tribunal de Imposto e Taxas. (*) A traduo para o idioma japons foi publicada no n. 4 da revista Gakuyu (1936). At ento ningum havia se manifestado contra a opinio exposta no artigo.

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desrespeito para com a augusta pessoa do Imperador do Japo. A presso dos ultranacionalistas da colnia foi to violenta que forou Cassio Shimomoto a se demitir da presidncia da Liga Estudantina NipoBrasileira, sendo substitudo por Kiyoshi Takabatake, estudante de direito. Na reunio de antigos diretores da LENB (ver "A Liga Revisitada Meio Sculo Depois"), Shigetoshi Takahashi, economista e antigo presidente da Liga, informou o seguinte: por causa da expresso considerada ofensiva ao Imperador, a diretoria da LENB foi visitada por elementos extremistas, que fizeram exigncias ameaadoras, procurando obter uma desculpa formal dos dirigentes da Liga. A diretoria explicou o sentido verdadeiro daquela expresso que se referia ao Japo e no ao Imperador , mas os radicais ultranacionalistas no ficaram satisfeitos. Retiraram-se reiterando o seu desagrado e proferindo ameaas; a diretoria da Liga foi chamada ao consulado geral do Japo (Takahashi e diversos diretores eram japoneses natos) para explicaes. Takahashi e seus companheiros expuseram o seu ponto de vista, considerando muito natural o pensamento expresso no artigo escrito pelo nipobrasileiro. Acrescentaram que os membros japoneses da Liga, inclusive ele, Takahashi, como sditos nipnicos, agiam como tais, mas compreendiam a atitude dos niseis, brasileiros, como os demais cidados desta terra. Na poca, a onda ultranacionalista e o culto de reverncia ao Imperador chegavam ao paroxismo. Todo o cuidado era pouco ao se referir Casa Imperial. A imprensa nipnica, submetida censura cada vez mais rigorosa, seguia a orientao ultranacionalista, dominada pelos militares extremistas. E os jornais da colnia refletiam, em grande parte, essa tendncia da poltica de Tokyo. A propsito do "incidente crisntemo", como ficou conhecido o caso, Tomoo Handa 2 faz uma anlise compreensiva do ambiente da colnia de ento: Com o "incidente crisntemo" ficava claro que se iniciava o processo de conscientizao e tomada de posio dos niseis. At ento, os imigrantes achavam que o futuro dos niseis dependia da vontade dos pais e, por isso, preocupavam-se com a educao, procurando aparentemente formar personalidades de carter dplice, demonstradas nas expresses como "primeiro o ensino japons, depois o brasileiro", "esprito japons com inteligncia brasileira"; ou ainda "ter sentimento japons, porm agir como brasileiro na vida social ou no trabalho". Foi nesse ambiente
2

Tomoo Handa. O Imigrante Japons Histria de sua vida no Brasil, p. 623.

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que surgiu a proclamao: "somos brasileiros, respeitamos o Japo, como ptria de nossos pais, porm como brasileiros devemos amar o Brasil". Os niseis proclamavam assim que eles prprios decidiam sobre o seu futuro. Nesse aspecto, Handa julga que o "incidente crisntemo" constitui um acontecimento de marcar poca na histria da imigrao japonesa. Todavia, o prprio Handa reconhece que, embora uma parte dos niseis j adultos tivesse comeado a pensar a sua posio a seu modo, no havia chegado ainda o tempo em que a maioria dos imigrantes pensasse sobre a educao dos filhos brasileiros do ponto de vista destes, isto , de brasileiros. Apenas alguns comeavam a compreender a posio dos niseis. Por outro lado, havia aqueles que, diante dessa evoluo do nisei, cnscio de sua brasilidade, sentiam-se apreensivos e preconizavam, como reao, a importncia da educao japonesa. A respeito da Revoluo Constitucionalista de So Paulo (1932), referida no artigo polmico de Cassio Kenro Shimomoto, convm oferecer aos leitores principalmente queles de geraes posteriores, que no viram nem participaram do grande movimento algumas informaes. Foi um movimento cvico patritico, que empolgou e mobilizou toda a populao de So Paulo. Visava essencialmente ao restabelecimento do regime constitucional suprimido pela ditadura de Getlio Vargas, implantada em conseqncia da vitria da Revoluo de 30. Muitos homens, principalmente jovens, alistaram-se nos muitos corpos de voluntrios que se organizaram. A luta armada durou de 9 de julho ao comeo de outubro de 1932. O prprio Cassio Shimomoto, ento estudante de direito, se alistou como voluntrio. Outro voluntrio foi Jos Yamashiro, ento estudante ginasiano. No seu caso interessante registrar o apoio que recebeu do pai, conforme noticiou o jornal O Estado de S. Paulo, um dos grandes veculos de propaganda do Movimento Constitucionalista. Em correspondncia de Cedro (localidade do Vale do Ribeira, hoje pertencente ao municpio de Juqui), informa: "O dia 7 de setembro foi condignamente comemorado pela colnia japonesa local". Acrescenta que na ocasio foi prestada homenagem ao "combatente Jos Yamashiro, filho do sr. Riukiti Yamashiro, lavrador residente nesta localidade". E mais adiante reproduz trecho da carta do pai do voluntrio endereado a um seu amigo 3 de So Paulo, aprovando a deciso do filho. "Entendo que ele, como brasileiro e paulista, obedeceu ao natural impulso ao pegar em armas para defender o seu Estado" (O Estado de S. Paulo, 19 de setembro de 1932, p. 3). 3 Trata-se de Sukenari Onaga (Naha, Okinawa, 1885 So Paulo, 1964) ento secretrio executivo da Dojinkai Sociedade Japonesa de Beneficncia no Brasil. Deixando-a, fundou e dirigiu o Nippon Shinbun (1932-41).

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Cassio Kenro Shimomoto, o primeiro brasileiro filho de japoneses a se formar em direito (1936), foi tambm o primeiro a falar publicamente, concitando os seus irmos, filhos de japoneses, a se conscientizarem de sua cidadania brasileira. A sua alocuo, intitulada "Uma Exortao aos Brasileiros Descendentes de Japoneses", "escrita na redao do Dirio de S. Paulo", foi publicada no livro Brasil e Japo Duas Civilizaes que se Completam, edio dos Dirios Associados, comemorativa do 25. aniversrio da imigrao nipnica no Brasil (1933). Shimomoto conclui a sua exortao: "Tudo pelo Brasil, tudo pela terra onde nascemos". b) Liga Estudantina Nipo-Brasileira (Gakusei Renmei) Pela apresentao do jornal Gakusei (O Estudante), rgo da Liga Estudantina Nipo-Brasileira (Gakusei Renmei, em japons), sabemos que a entidade foi fundada em 21 de outubro de 1934. Congregava estudantes de cursos superiores, ginsios, escolas normais, de comrcio e profissionais, liceus, etc. Havia scios japoneses e brasileiros, filhos de japoneses, na poca chamados dainisei segunda gerao. Objetivo: defesa dos interesses da classe, confraternizao entre estudantes, etc. Transcorrido um quarto de sculo desde a chegada do Kasato-Maru, muitos imigrantes com filhos aqui nascidos ou crescidos se preocupavam em mand-los prosseguir seus estudos nos cursos secundrios e superiores da Capital. Da o surgimento da LENB. Quanto origem dos associados, podiam se identificar alguns segmentos socioculturais bem distintos, como por exemplo: 1) jovens nascidos no Japo que haviam feito estudos primrios e secundrios na terra natal; 2) filhos de famlias residentes em So Paulo, na maioria pertencentes classe mdia (funcionrios do consulado do Japo, de empresas nipnicas, como a Kaik, a Bratac e outras, profissionais liberais, etc); 3) filhos de imigrantes residentes no interior, quase sempre lavradores, que, depois de terminado o curso primrio, vinham estudar nos ginsios, escolas normais e outros estabelecimentos de ensino. Muitos estudantes dos segmentos 1 e 3 moravam em casas de famlia, penses ou pensionatos para estudantes, os chamados kishukusha, quase sempre dirigidos por educador ou uma pessoa de confiana dos pais dos jovens, considerada moralmente competente para dar-lhes orientao adequada, numa cidade como So Paulo. Os imigrantes, lavradores em sua grande maioria, preocupavam-se muito com o perigo e tentaes a que se exporiam seus filhos na grande metrpole. No comeo da Liga, eram poucos os estudantes dos ltimos anos de curso ginasial ou cursando cursos superiores, ao passo que entre os issei

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ou jun-nisei(*) havia alguns com curso secundrio ou normal completos ou no, feitos no Japo. Por isso, inicialmente, a liderana da Liga coube em grande parte aos jun-nisei, embora o primeiro presidente, Cassio Kenro Shimomoto, fosse mais brasileiro do que jun-nisei, pois chegou aqui ainda beb. Do programa de atividades da LENB constavam sesses oratrias, ltero-musicais, piqueniques, viagens, shy-kai (reunies para aprofundamento educacional e cultural) e bailes, estes vistos com suspeitas e at franca e decidida condenao por parte de muitos pais conservadores do interior. A primeira publicao peridica da Liga foi uma revista chamada Gakuy (O Amigo do Estudante), lanada em outubro de 1934, inteiramente redigida em idioma nipnico. Dirigida e escrita quase exclusivamente por issei ou jun-nisei, refletia a orientao nacionalista de Tokyo. A Liga Estudantina Nipo-Brasileira teve seis presidentes nos sete anos de sua existncia: 1) Kenro Shimomoto (1934-35); 2) Kiyoshi Takabatake (1936); 3) Shigetoshi Takahashi (1937-38); 4) Joo Sussumu Hirata (1939); 5) Carlos Ryoma Inoue (1940) e 6) Hideo Onaga (1941). c) Jornal Gakusei (O Estudante) Em outubro de 1935, foi lanado o jornal Gakusei (O Estudante), em portugus, tendo como diretor o estudante de direito Teiichi Haga, secretrio Hiroshi Kimura (direito), redatores Roberto Massaki Udihara 4 (medicina), Kiyoshi Kawahara (medicina) e Kiyoshi Takabatake (direito). Na sua apresentao, intitulada "O que desejamos", afirmava como sua primeira finalidade: "Estreitar ainda mais, num ambiente cultural, o vnculo de amizade que nos liga, ns, brasileiros, filhos de japoneses, aos nossos colegas de estudo, comunicando-lhes, atravs de nossos escritos, a vontade que temos de escrever esta belssima lngua de Cames; a idia que alimenta o nosso esprito; a aspirao que sonhamos para a felicidade da ptria comum, o Brasil". Observa-se que a j existe uma clara manifestao de brasilidade dos estudantes dainisei. Foi precisamente nesse primeiro nmero que Cassio Kenro Shimomoto escreveu o artigo falando da "ptria dos
*Massaki Udihara (Pedra Branca, municpio de Catanduva, SP, 1913 So Paulo, 1981). Formado em medicina pela USP em 1939, trabalhou no Hospital Japons, atual Santa Cruz; a partir de 1953, diretor do Departamento Tcnico Social, do Hospital A. C. Camargo. Participou da FEB, no posto de 1. Tenente de Infantaria da Reserva, conforme consta do livro A FEB pelo seu comandante, do General J. B. Mascarenhas de Moraes, p. 274, Instituto Progresso Editorial, So Paulo, 1947. Foi condecorado com a Cruz de Combate, medalhas de Campanha e de Guerra. (*) Jun-nisei ao p da letra "quase nisei". Aquele que veio jovem do Japo e completou sua formao no Brasil.

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crisntemos", o qual provocou violenta reao de elementos ultranacionalistas da colnia, conforme vimos. O jornal apresentava, alm das caractersticas comuns a rgos de grmios estudantis da poca, artigos que focalizavam problemas especficos de estudantes filhos de japoneses, como sua integrao sociedade brasileira, assuntos atinentes cultura japonesa, etc. Haga continuou na direo do jornal at o nmero 12 (novembro de 1936), quando a sua publicao sofre uma interrupo, de seis meses, por escassez de colaboraes. Em maio de 1937 reinicia-se a publicao do jornal, sob a direo de Jos Yamashiro, e, finalmente, no ltimo nmero (setembro de 38), a direo volta a Teiichi Haga. d) Transio, expressiva obra da Liga Em abril de 1939 tomava posse a diretoria da LENB, presidida por Joo Sussumu Hirata 5 , composta em grande parte por dainisei. Interessante notar que elementos femininos ocupavam postos importantes, como Maria Akinaga Haga, vice-presidente, e Alice Yassutani, primeirasecretria. Uma das primeiras decises da nova diretoria consistiu na publicao de uma revista, com o significativo nome de Transio, substituindo o jornal Gakusei, extinto em setembro do ano anterior. A comisso de redao da revista era composta por Isau Udihara, Jos Yamashiro e Massaki Udihara. O primeiro nmero saiu em junho de 39. Na abertura, com o ttulo de "Ns...", dizia: "Ns, brasileiros, filhos de japoneses, somos uma transio. Transio entre aquilo que foi e aquilo que ser. Transio entre o Oriente e o Ocidente. Representamos o trao de unio entre dois extremos. Por paradoxal que parea, unimos os antpodas(...) Sabemos o que somos. Podemos, melhor do que qualquer outro, dizer o que representamos: a finalidade desta revista. Transio... E a objetivao, a evidenciao da mudana imperceptvel que em ns se opera. a compreenso de nossos pais, japoneses, pelos nossos irmos, os brasileiros, por uma lngua comum, a brasileira. A harmonizao de duas civilizaes, aparentemente antagnicas. A

Joo Sussumu Hirata (So Manuel, SP, 1914 So Paulo, 1974). Formou-se em direito pela USP em 1940. Presidente da Liga Estudantina Nipo-Brasileira em 1939. Sob sua gesto foi lanada a revista Transio. Prosseguiu seus estudos de Direito na Universidade de Tokyo. Trabalhou na NHK em transmisses em lngua portuguesa. No ps-guerra serviu no GHQ. Regressou ao Brasil em 1951, iniciando o trabalho de advocacia. Deputado estadual de 1954 a 1962, federal de 1962 a 1974, quando faleceu vtima de acidente rodovirio.

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fuso, num ideal de mtua compreenso, das qualidades inerentes de cada uma. Enfim, brasileiros cnscios e orgulhosos de sua terra e de seus pais. E o que queremos". Nos seis nmeros publicados, entre junho de 39 e setembro de 41, a revista manteve trs sees principais: Artigos Especiais, Literatura, e Seo da Liga. Com 44 a 60 pginas, a produo era custeada pela mensalidade dos scios (cerca de 150) e publicidade de organizaes empresariais nipnicas e da colnia. Escreviam scios da Liga (a maior parte pelos prprios redatores, j que poucos estudantes dainisei da poca tinham inclinaes literrias), intelectuais da comunidade (traduzidos quase sempre por Yamashiro), e algumas vezes estudantes brasileiros no descendentes de japoneses como Benjamin E. M. Bevilacqua, Luiz Tolosa Prado, Isaac Mielnik, Aloisio Cosgue, Ulysses da Silveira Guimares (o futuro poltico), Antnio Acauan e outros. Destaque-se ainda que Transio divulgava obras literrias ou cientficas nipnicas, ora traduzidas diretamente do original japons, outras traduzidas do ingls, francs e espanhol. A guerra encerrou as atividades da Liga Estudantina Nipo-Brasileira e da revista Transio, datada de janeiro de 1941. e) Alguns artigos em destaque No nmero 1 de Transio podem ser destacados alguns artigos que ainda hoje despertam ateno e interesse do leitor. Massaki Udihara, ento doutorando em medicina da USP, escreve sob o ttulo Assimilao, criticando aqueles que atacavam o imigrante japons como inassimilvel, sem estudo e observao contnua e intensa, mas como conseqncia "da tendncia em generalizar fatos restritos". Analisa argumentos tendenciosos que condenavam a inadaptabilidade ao meio ambiente, formando os chamados quistos raciais. "Do um ou mais exemplos de japoneses que no falam portugus, escolas em que s se ensina japons em meios coloniais onde imperam os usos e costumes do Japo." Critica essa maneira de condenar os japoneses, pois tais fenmenos se observam em outras correntes imigratrias tambm. "A tendncia de indivduos de mesma nacionalidade a se agruparem natural e compreensvel e por isso mesmo observada em qualquer meio. Basta simplesmente observar a distribuio demogrfica nos grandes pases imigratrios, mesmo se levando em conta a localizao oficial, por ao do governo, para se notar a predominncia deste ou daquele elemento nesta ou naquela zona, e isso independentemente do grau de adaptabilidade conferido a esse ou aquele grupo."

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Cita a seguir a concentrao de elementos de mesma origem em bairros da cidade, inclusive So Paulo, onde, em certos bairros, os italianos constituam cerca de 60% da populao. f) Com niseis americanos Outro trabalho que reflete a preocupao de filhos de japoneses com o problema da assimilao e integrao sociedade brasileira foi publicado no nmero 6 (setembro de 1941), com o ttulo Niseis norteamericanos, de autoria de Masao Dodo e divulgado originariamente na revista mensal Kaizo, de Tokyo, em maio de 1941. A apresentao e traduo de Jos Yamashiro, que, em 1940, participando da Caravana Cultural, composta de 22 estudantes da USP, visitou o Japo. Na ida teve oportunidade de conversar com membros da Japanese-American Citizen League, de Los Angeles, entidade formada de cidados norte-americanos descendentes de nipnicos. Na apresentao do artigo, Yamashiro sublinha a diferena entre as condies sociais existentes nos Estados Unidos e no Brasil. L predominava o preconceito de raa contra negros, amarelos e outras minorias raciais. "Ns vivemos num outro pas, onde a vida mais amena, e onde, brancos, amarelos ou pretos tm perante a lei e de fato os mesmos direitos e os mesmos deveres, contanto que sejam cidados conscientes." Outra observao: "Sabemos que o termo nisei usado pelos estudiosos americanos e japoneses. Aqui no Brasil, essa palavra no entrou, ao que parece, ainda no rol dos termos usados pelos socilogos, escritores e jornalistas nacionais. E de se crer, entretanto, que ele venha ser usado e divulgado e at discutido entre os intelectuais brasileiros". A partir da dcada de 50, o termo nisei substitui dainisei e se incorporou ao vocabulrio brasileiro. No seu artigo, Masao Dodo analisa a situao peculiar dos niseis americanos da poca. Sob a presso da sociedade americana, que no os aceita como co-cidados, os niseis travam intensas e dramticas lutas ntimas e externas. Congregados em associaes exclusivistas, lutam pelo seu direito de cidadania, pois, no obstante a forte discriminao, so tratados como japoneses ou portas-vozes do Japo, apesar de sua cidadania americana. Eles se consideram cidados dos Estados Unidos da Amrica. "Os niseis entretanto, s sabem seguir um caminho, do qual, queiram ou no, no podero fugir. o seu destino. O seu destino traado antes de nascerem", comenta Dodo.

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A seguir, narra as campanhas promovidas pelas entidades nipoamericanas na defesa de seus direitos, da sua clara definio de cidados americanos, e reafirmam, "sem reservas, nossa obedincia Constituio dos Estados Unidos e aos nossos ideais e s nossas instituies americanas". Transio quis, com a transcrio do artigo, mostrar aos niseis brasileiros o exemplo dos seus irmos do Norte, mais velhos e portanto mais experientes na luta pela defesa de sua cidadania. Como vimos, Transio tratava de problemas graves do perodo em que circulou: assimilao, casamento, etc. Vale a pena fazer referncia pesquisa realizada pelo Prof. Emlio Willems6, publicada no seu trabalho Aspectos da aculturao dos japoneses no Estado de So Paulo, n. 3, Boletim LXXXII, da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da USP, 1948. Willems foi um eminente precursor da pesquisa cientfica sobre o problema da assimilao dos japoneses no Brasil. Willems realizou, em 1940, um inqurito relativo distncia social entre raas e nacionalidades. Os questionrios foram preenchidos por alunos do curso profissional de diversas escolas normais do Estado de So Paulo. Uma das perguntas indagava se a pessoa interrogada admitia, como membro da prpria famlia, o portugus, o ingls, o italiano, o japons, etc. O resultado relativo apenas ao japons foi o seguinte: total de respostas 1.960; admitiam japoneses como membros da famlia pelo casamento, 100; porcentagem, 5,12%. No mesmo inqurito ficou demonstrado que a preveno contra judeus (3,56%), mulatos (4,27%) e negros (2,49%) era maior ainda. Willems diz que nesse resultado aparece a questo da diferena de classe social, j que os alunos das escolas normais pblicas do Estado de So Paulo so, na sua grande maioria, pessoas pertencentes s classes mdias, sobretudo pequena e mdia burguesia(*). Os artigos citados, restritos ao primeiro e ltimo nmero de Transio, comprovam o grau de evoluo do pensamento brasileiro de estudantes universitrios de origem nipnica. Na verdade, porm, eles constituam uma minoria avanada da mocidade pensante, porquanto
Emlio Willems. Imigrou para o Brasil em 1931. Doutor em filosofia pela Universidade de Berlim. Lecionou em ginsios do Paran, depois no Liceu Rio Branco, de So Paulo. Em 1941 foi nomeado docente de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da USP. Lecionou a mesma disciplina na Escola de Sociologia e Poltica. Autor de A aculturao dos alemes no Brasil (1946) e Aspectos da aculturao dos japoneses no Estado de So Paulo (1948). Em 1949 transferiu-se para os Estados Unidos. (*)No rodap da pgina 107 do mesmo volume, o Prof. Willems cita Transio. Observando que a segregao dos sexos entre filhos de japoneses comeava a deixar de existir nas cidades grandes, escreve: "Uma boa fonte de informao sobre o rumo que essas mudanas est tomando, a revista Transio que comeou a ser publicada em 1939 pela Liga Estudantina Nipo-Brasileira".
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muitos de seus irmos, principalmente do interior, viviam ainda sob forte presso e influncia do nacionalismo japons. Uma coisa fica bem clara: a fora do meio ambiente brasileiro na aculturao e integrao de filhos de japoneses. A respeito, citamos duas opinies de cientistas brasileiros: 1) Prof. Astrogildo Rodrigues de Mello: "Porm, o fator mais decisivo da transformao dos imigrantes japoneses so seus filhos. Cursando os colgios de mistura com os brasileiros, identificando-se completamente com estes, com aquela plasticidade s observada na idade juvenil, e so os mestres dos seus prprios pais, ensinando-lhes a lngua e iniciando-os nos novos hbitos". 2) Prof. Egon Schaden 7 : "Velho trao da cultura japonesa, a valorizao do estudo e do saber livresco e a preocupao com a instruo dos filhos fazem que o colono japons venha espontaneamente aproximar-se da cultura nacional, enviando os filhos s escolas normais e ginsios que fornecem diploma oficial e abrem caminho para os institutos de ensino superior, a que o japons devota o mais profundo respeito. A aculturao dos japoneses , assim, um problema de uma ou duas geraes; incrementa-se a competio por um 'status' na sociedade nacional, competio em que o nipo recorre ainda a valores de sua cultura tradicional e que no se resumem, mas encontram uma de suas mais significativas expresses no apreo que escola e ao estudo livresco dispensa a tradio japonesa". g) Nos campos de batalha da sia e da Europa Como vimos em "Entre a bigorna e o martelo", no final da dcada de 30 os imigrantes japoneses viviam prensados entre o ultranacionalismo nipnico e o nacionalismo do Estado Novo brasileiro. Nessa situao, pais japoneses, desiludidos com a impossibilidade de ministrar uma educao nipnica aos seus filhos, enviavam os jovens ao Japo a fim de formar sditos do Sol Nascente. De acordo com o jornal Nippak Shinbun, edio de 11 de janeiro de 1938, devido crescente presso exercida pelas autoridades brasileiras sobre o ensino nipnico, nada menos do que 70 jovens haviam seguido para o Japo, acompanhados pelos pais ou ss, nas recentes viagens de trs navios de bandeira japonesa, os famosos maru. Muitos desses jovens estudantes tinham dupla nacionalidade: brasileira e japonesa. Assim, quando atingiam a idade prpria, eram convocados para o servio militar e, depois de treinados, enviados para as
7 Egon Schaden (So Bonifcio, SC, 1913-1991). Professor de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras da USP, doutor em Cincias.

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diferentes frentes de batalha na China, Sudeste da sia e, aps a ecloso da Guerra do Pacfico, para a vasta rea do grande oceano. De acordo com Kensuke Baba, que retornou ao Brasil depois de haver lutado no Pacfico, 15 jovens nipo-brasileiros, seus conhecidos, participaram da guerra, sendo que seis deles morreram nos campos de batalha. Deste lado do planeta, brasileiros, filhos de japoneses, participaram da Fora Expedicionria Brasileira (FEB) que combateu nas frentes de batalha da Itlia. Entre eles figurava o mdico Massaki Udihara, e o advogado Kiyoshi Sakai, atualmente vice-presidente da Cooperativa Agrcola Central-Sul Brasil. Udihara integrou o VI Regimento de Infantaria para lutar como oficial da Infantaria, apesar de mdico. Mas, por conhecer bem o idioma ingls, serviu como oficial de ligao entre as foras brasileiras e americanas. Sakai fez parte do III Grupo de Artilharia como cabo radioperador, funo de muita responsabilidade, dada a importncia do servio de comunicao numa guerra. Por merecimento, foi promovido, no final da campanha, a primeiro-tenente e recebeu a condecorao da medalha de gueixa. Segundo Sakai, no III Grupo de Artilharia havia oito nipo-brasileiros, entre os quais Raul Kodama, filho de Ryoichi Kodama, um dos ltimos sobreviventes do Kasato-Maru, que faleceu depois de participar das comemoraes dos 80 anos da imigrao nipnica no Brasil. Raul ficou ferido numa perna, em combate. No dispomos do nmero de nipo-brasileiros que combateram na sia e Europa. h) A Liga revisitada meio sculo depois No dia 11 de agosto de 1989, foi realizada uma reunio de antigos dirigentes da Liga Estudantina Nipo-Brasileira. A iniciativa visava "uma rememorao e reviso dos pensamentos e sentimentos ento reinantes entre os jovens estudantes", considerando o papel desempenhado pela LENB naquele perodo (segunda metade da dcada de 30), perante a colnia nipnica e a sociedade brasileira. Participaram da reunio: Shigetoshi Takahashi, economista, presidente da Liga (1937-38); Hideo Onaga, bacharel em direito, jornalista, consultor de empresa, presidente da Liga (1941); Teiichi Haga, advogado, diretor do jornal Gakusei; Antnio Shimomoto, mdico, da diretoria da Liga; Hiroshi Kimura, advogado, da diretoria da Liga; Jos Yamashiro, jornalista, redator da revista Transio. Foi lamentada a ausncia de Maria Haga, advogada, Massami

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Hirota, engenheiro civil e Gervrio T. Inoue, bacharel em direito, diretorpresidente da Cooperativa Agrcola de Cotia, participantes da diretoria da LENB, em vrias gestes. Tentaremos destacar alguns pronunciamentos ou declaraes mais significativos, no sentido de mostrar o pensamento, o sentimento, a atitude ou ao dos estudantes nipo-brasileiros da poca. Inicialmente, o ex-presidente Shigetoshi Takahashi exps o chamado incidente crisntemo, j explicado no comeo deste captulo. Foi um acontecimento de marcar poca, conforme observou Tomoo Handa, porquanto representava a afirmao da maioridade dos dainisei mais avanados e independentes, capazes de pensar por si, no se deixando levar pela avalanche do ultranacionalismo nipnico predominante na colnia. Todavia, durante a reunio, foi observado que tal maneira de pensar ou seja, a proclamao de brasilidade por parte dos dainisei no representava o pensamento da maioria dos jovens nipo-brasileiros do interior, onde, nos maiores ncleos coloniais, muitos deles eram criados e educados como sditos nipnicos. A mudana de mentalidade da maioria dos imigrantes, em relao orientao educacional dos filhos brasileiros, ainda demoraria at o fim da II Guerra Mundial. A transformao de mentalidade tinha de ser necessariamente lenta, para a maioria dos imigrantes, dada a profunda e radical diferena cultural existente entre o povo brasileiro e o japons. Somente quando a massa dos japoneses aqui residentes se convenceu da impossibilidade de retornar ao Japo (ou sia Oriental ou territrios do Sudeste Asitico, sob domnio nipnico, como sonhavam os mais fanticos "vitoristas") e decidiu fixar-se de modo definitivo na terra brasileira, o processo de aculturao e assimilao adquiriu maior mpeto. Vrios depoimentos confirmaram, mais uma vez, a importncia do meio ambiente na formao da mentalidade dos jovens. Vejamos: Teiichi Haga: nasceu e cresceu na rua Conde de Sarzedas, onde se iniciou o chamado bairro japons da Liberdade, na capital paulista. Revelou: "Quando crianas jogamos futebol, quebramos vidraas, fomos nadar na vrzea do Glicrio...". "No sofremos nenhuma influncia do consulado, do meio japons. Nossa mentalidade era mais brasileira, da rua Conde de Sarzedas...". Na poca (dcada de 20) o nmero de famlias japonesas era pequeno, mesmo nessa rua. Haga passou o perodo do curso primrio e ginasial como um brasileiro. S quando entrou na Faculdade de Direito e estabeleceu contato com Kiyoshi Takabatake e outros estudantes, nascidos e educados no Japo, comeou a sentir a influncia deles. "A gente sentia que eles

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queriam nos dominar. Eles comandavam tudo, porque tinham j uma formao intelectual no Japo. Formavam um grupo coeso...". A idia da formao de uma entidade reunindo estudantes de origem nipnica amadureceu no campo de esportes do Colgio So Francisco, mantido por catlicos japoneses. A idia evoluiu para a organizao da Liga Estudantina Nipo-Brasileira de So Paulo (So Paulo Gakusei Renmei). At a concretizao da Liga houve consultas e reunies entre estudantes de diversas escolas. Antnio Shimomoto: "Pessoalmente eu posso afirmar que minha conscincia j estava formada porque a gente nasceu nesta terra. Indubitavelmente tinha que viver aqui, de acordo com a circunstncia, o ambiente. No adiantava pensar em Japo, em niponicidade; no valia a pena, porque isso estava muito afastado da gente". Hiroshi Kimura: "Com o tempo, houve mudanas, inclusive na mentalidade das pessoas. Depois, para gente da nossa gerao a formao japonesa, at ento mais influente, foi sendo substituda por elementos aqui nascidos. Estes comearam a ocupar cargos de direo na Liga. O Cassio Shimomoto, Joo Hirata, os irmos Udihara, Maria Haga, Ryoma Inoue, Hideo Onaga e outros. Tambm a situao no Brasil foi mudando e afinal veio a guerra e tudo mudou. Foi essa a caminhada, a evoluo. E pessoalmente, ns continuamos muito firmes, com as nossas amizades. Vrios j se foram. Mas, at anos atrs ns nos reunamos pelo menos uma vez por ano n u m almoo de confraternizao, para rememorar o passado, e continuamos assim, durante dcadas". Hideo Onaga: "Enquanto grande parte dos meus companheiros da Liga era formada de pessoas que tinham convvio com a colnia japonesa, seja no interior, seja em So Paulo, eu tive uma infncia e uma adolescncia quase exclusivamente no meio de brasileiros. As nicas relaes com japoneses eram com meus pais e alguns amigos seus. Quando comecei a entrar em contato mais freqente com niseis e tomar conscincia da minha situao de filho de imigrantes, eu j tinha uma certa concepo. Auxiliado por meu pai, que era um homem culto, firmei minha definio. Uma vez perguntei a ele por que me chamavam de japons. Ele me explicou: 'E por causa de sua cara, mas voc brasileiro porque nasceu aqui. Eu sou japons, nasci no Japo'. Quando comecei a freqentar a Liga, notei logo que grande parte dos companheiros tinha sofrido uma influncia cultural muito grande do Japo e do convvio com japoneses. Eu, alm de no falar nada do japons, no tinha tido esse convvio. O meu procedimento foi sempre de atuar muito mais como brasileiro, sem complexos de filho de estrangeiro. Na

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Liga compreendi que a associao de estudantes de origem japonesa era muito natural. Primeiro, quanto aos nossos pais, eu achava que tinham plena razo de formarem seus clubes e associaes, porque tinham problemas de comunicao em portugus, de alimentao e tudo o mais. Tinha lido sobre o problema dos niseis nos Estados Unidos e minorias raciais em vrios pases do mundo, o problema do judeu, por exemplo. Achei importante que a gente procurasse integrar-se e ganhar um espao dentro do pas onde nascemos para evitar justamente o enquistamento e a formao de guetos e esse tipo de coisa. Ento, desde o comeo, a minha colocao foi no sentido da integrao como filho de imigrantes, do mesmo modo que os italianos, alemes, etc, antes de ns, j haviam procurado se integrar e se integraram na sociedade brasileira. Eu achava que ns deveramos funcionar, no comeo, como uma espcie de transio entre os isseis e a sociedade brasileira, porque ns tnhamos os meios de comunicao e o conhecimento da sociedade melhor do que eles. claro que isso exigia muita luta, muita pacincia, porque havia muitos estudantes procedentes de ncleos japoneses. Era natural que eles fossem quase japoneses, muito mais influenciados pela cultura nipnica do que pela incultura cabocla, digamos assim. Quem viveu no interior Marlia, Aliana, Bastos, etc. e olhava em redor, via que seus pais eram mais cultos, mais disciplinados. Por isso a tendncia de seguir a cultura japonesa era mais forte. No era o que acontecia comigo, eu vivi num ambiente citadino, nasci e cresci no bairro da Lapa, onde havia pouqussimas famlias japonesas. Compreendendo a situao do nisei em geral, procurei dar minha colaborao, s vezes de uma maneira um pouco direta demais, um pouco veemente demais, provocando assim atritos com muita gente que achava que o nisei deveria ser a continuao do issei aqui no Brasil. Eu considerava que isso seria uma espcie de enclave nipnico no Brasil, no estava certo. Essa foi a parte fundamental da minha formao e da minha contribuio para a Liga Estudantina, e depois para a integrao na sociedade brasileira que eu procurei fazer de toda forma". Jos Yamashiro: "Comecei a participar mais ativamente da Liga com o lanamento da revista Transio, de cuja comisso de redao fazia parte, a lado dos irmos Massaki e Isau Udihara, ambos estudantes de medicina da USP. Embora Transio represente realmente aquela fase de transio do japons para brasileiro, a cpula dos elementos mais pensantes da Liga j se considerava brasileira. Eram brasileiros e era por essa compreenso que lutavam. Essa luta abrangia duas frentes, o que implicava em profundos conflitos ntimos e com a maioria da colnia. A frente japonesa queria que o filho de japons continuasse o Japo, herdando aquela cosa

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toda do Japo tradicional. De outro lado, havia a frente do nacionalismo do Estado Novo (1937-45) e ainda a campanha contra os japoneses, que atingia diretamente ou indiretamente os filhos de japoneses. Acho que em relao colnia em geral a nossa maneira de pensar e agir, promovendo bailes, piqueniques, sesses ltero-musicais, etc. maneira brasileira, constitua uma heresia, pois nos grandes aglomerados japoneses ainda os jovens dos dois sexos organizavam clubes separados, no havia convivncia social entre moos e moas...". Teiichi Haga: "Acredito que a revista Transio teve um papel muito importante, porque ns iniciamos o jornalzinho Gakusei e sentimos intimamente que havamos dado um pulo muito grande. Tnhamos sado do curso primrio para o curso universitrio e a acho que a revista exerceu uma influncia muito grande dentro do prprio grupo nisei. um marco divisor, eram pessoas que escreviam muito bem e em profundidade. E a gente, ento, se sentia mais forte. Esse foi o pensamento que eu tive. Sempre vivi de modo brasileiro. Meu pai veio na primeira leva de imigrantes. J tinha um pensamento um pouco diferente dos demais patrcios. Ele disse: 'Voc vai viver no Brasil, voc deve aprender primeiro o portugus e depois o japons'. E assim foi". Foi lembrado que Tomoo Handa faz uma anlise dos niseis das colnias do interior, de formao intelectual e social deficiente, por causa da prpria situao da comunidade. "Esses niseis quase analfabetos que trabalhavam duro na lavoura, ajudando os pais, eram vistos com desdm pelos imigrantes recm-chegados." "Na poca dizia-se 'nisei no presta', uma expresso ouvida no s no interior como na capital." Em certos crculos ligados a empresas japonesas, ouvamos essa expresso. Talvez porque no falvamos bem o japons, e tnhamos j gestos e atitudes bem brasileiros. Os recm-chegados, provavelmente dominados pelo esprito militarista e seguidores da poltica ultranacionalista, consideravam os niseis muito moles, "bobos e pacatos demais", como comenta Handa. Como o Japo se achava naquela fase de expanso no continente asitico, grande potncia militar, achavam que os niseis deviam pensar e falar como eles. Houve troca de lembranas do tempo da guerra, inclusive o caso da priso em massa de membros da Liga, quando promoviam um convescote em Eldorado. Tratava-se de simples comemorao do casamento de dois scios: Hideyuki Oda e Isaura Murai. Constou que houve denncia de que japoneses estavam construindo um submarino na represa...(!?). Ao descerem do nibus foram detidos todos e enviados ao DOPS, onde ficaram durante cerca de uma semana.

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Durante a guerra era proibido falar japons. Ento houve casos de niseis que no sabiam japons serem detidos por policiais "porque estavam conversando em japons". Em tempo de guerra, acontecem os casos mais absurdos. Havia os maus policiais, que, aproveitando o estado psicolgico dos sditos do Eixo (japoneses, alemes e italianos), procuravam arrancar dinheiro sob os mais ridculos e estapafrdios pretextos. Teiichi Haga revela que, como havia um grupo de homens importantes da colnia detido no DOPS, dona Margarida Watanabe, muito ligada ao mdico dr. Celestino Bourroul, um lder catlico, atravs de sua intermediao junto ao arcebispo D. Jos Gaspar, conseguiu permisso das autoridades policiais para entregar comida, roupa, etc. aos detidos. Isso aconteceu por volta de 1942. Assim comeou a Assistncia Social D. Jos Gaspar, que hoje presta relevantes servios aos idosos. Jos Yamashiro narra como ingressou no jornalismo: "Nasci em Santos, mas passei minha infncia e juventude numa localidade chamada Cedro. Estudei numa escola primria de Santo Antnio do Juqui, distante seis quilmetros de casa. Ia e voltava a p pelo leito da ferrovia, pois no havia outro caminho nem meio de transporte. Inicialmente, na escola era eu o nico filho de japons. Mas logo me misturei com a molecada, jogava futebol, brincava com os colegas. Um dia algum me chamou de japons. O professor, Cosme Deodato Thadeu, explicou na classe que eu era to brasileiro como os demais alunos porque nasci no Brasil. A lio calou fundo no meu esprito. Aqui em So Paulo fiz o curso ginasial noturno, trabalhando de dia no Dojinkai, sob as ordens do sr. Sukenari Onaga, pai do Hideo. Como o Hideo disse, Onaga-san considerava brasileiros os filhos de japoneses aqui nascidos. Posteriormente, Onaga-san fundou e dirigiu o Nippon Shinbun, onde manteve a mesma orientao em seus editoriais". "O sr. Sack Miura, dono do Nippak Shinbun, era uma espcie de espadachim combativo da imprensa colonial. Chegou a ser expulso duas vezes do Brasil, porque criticava as autoridades japonesas, inclusive o embaixador e figuras influentes da colnia, como o dono de outro jornal, seu principal concorrente. Com isso fez muitos inimigos. O Nippak Shinbun merece destaque especial, por ter sido o primeiro jornal da colnia a manter uma pgina inteira em portugus, j na dcada de 30. O primeiro redator dessa pgina foi Jorge Midorikawa, que dominava muito bem o nosso idioma, ao contrrio da maioria dos japoneses, que tinham dificuldade em aprender o portugus. Em 1936, Midorikawa teve que regressar ao Japo. E o jornal precisava de um redator para a pgina em portugus que conhecesse japons. O pr-

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prio Midorikawa, Onaga-san e outros senpai (companheiros sniores) indicaram o meu nome ao Miura-san. E assim ingressei no jornalismo." "Com o agravamento da situao internacional, os jornais japoneses foram fechados em julho-agosto de 1941. Fiquei desempregado. Um ano antes havia obtido o ttulo de tradutor pblico juramentado. Meu colega de ginsio, Carmo Rampazzo, me apresentou a um jovem advogado chamado Jnio da Silva Quadros, que tinha um escritrio na rua Benjamin Constant. Ele me cedeu um canto da sala. Por causa da guerra, tinha poucas tradues a fazer. Arranjei um bico na Cooperativa Agrcola de Cotia, para servio de tradues. Cabe aqui uma observao: apesar da guerra, os amigos brasileiros continuaram amigos e acredito que isso aconteceu com quase todos os japoneses e seus filhos." "No ps-guerra, em meio confuso criada pelo conflito entre 'esclarecidos' e 'vitoristas', participei da fundao do Jornal Paulista com o Hideo e outros companheiros do extinto Nippak Shinbun como Shuichi Takeuchi (diretor), Tokuya Hiruta (gerente do novo jornal) e Yoshiomi Kimura (redator-chefe da parte japonesa)." Hideo Onaga: "Fui convidado para ser o diretor legal do jornal. Fui falar com o sr. Kenkiti Simomoto lder da Cooperativa Agrcola de Cotia e tambm um dos prceres do movimento esclarecedor (em relao ao fim da guerra). Ele era um grande esteio moral e financeiro do grupo fundador do jornal, destinado a informar a verdade sobre o fim da guerra com a derrota do Japo, pois a maioria dos japoneses do Brasil no acreditava no revs militar do seu pas. A nica condio que impus foi: no conheo o idioma japons, ento precisamos fazer uma pgina em portugus. Assim surgiu a pgina portuguesa do Jornal Paulista, cuja publicao comeou a 1. de janeiro de 1947". "No foi propriamente uma continuidade, mas as idias defendidas na Transio foram defendidas no Jornal Paulista e fomos um pouco adiante e a foi uma briga danada...". Jos Yamashiro: "O Hideo e eu acreditvamos que j havia passado o perodo de transio para os estudantes, filhos de japoneses aqui nascidos. Por isso, eles deveriam agir em tudo como brasileiros. J no havia necessidade de formar agremiaes estudantis exclusivistas, somente com niseis. Combatamos tais agrupamentos". Hideo Onaga: "Principalmente pelos artigos meus e do Yamashiro. O Yamashiro manteve uma coluna chamada Hyde Park, durante muitos anos, onde defendia suas idias". (Jos Yamashiro)

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a) Investimentos e queda na imigrao Conforme vimos, no perodo da poltica emigratria de Estado, a emigrao japonesa para o Brasil evoluiu satisfatoriamente, at a adoo da chamada "lei dos dois por cento". No Japo, os servios de recrutamento, seleo e despacho de emigrantes eram monoplio da Kaik; o transporte martimo estava a cargo da Osaka Shosen Kaisha; a recepo e distribuio no Brasil tambm competia Kaik, sendo todas as despesas cobertas pelo governo nipnico. Uma parte dos imigrantes ingressava nas ij-chi da Bratac, mas a grande maioria continuava sendo recebida pelas fazendas de caf de propriedade de fazendeiros brasileiros. Em 1926, Tokushichi Nomura, do grupo financeiro Nomura, iniciou a explorao de uma fazenda de 3.300 hectares em Bandeirantes, PR. No ano seguinte, Fumiya Iwasaki, do grupo Mitsubishi, adquire, atravs da Companhia Agrcola Tozan, 3.900 hectares de cafezais em Campinas, SP, colocando-os sob sua administrao. A Nippak Takushoku Kabushiki Kaisha (Companhia Nipo-Brasileira de Colonizao), de Seibee Kawanishi, empresrio da regio de Kansai, comprou a Fazenda Barra Mansa, de 1.220 hectares (estao Avanhandava, E. F. Noroeste do Brasil). Em 1931, Takeo Atomiya, da Nomura Boeki (Comercial Nomura), comeou a explorar um cafezal de 730 hectares, em Cornlio Procpio, PR. Comeavam, assim, investimentos de capitalistas japoneses em atividades agrcolas no Brasil. Por outro lado, entre os primeiros imigrantes j surgiam fazendeiros com mais de 100 mil ps de caf; porm ainda era reduzido o nmero de proprietrios nipnicos capazes de receber bom nmero de imigrantes. Comeava, porm, a crescer o nmero de imigrantes das primeiras levas estabelecidos, e j com certa base econmica, que podiam receber parentes e amigos na forma de "imigrantes chamados" (yobiyose imin), para trabalhar em suas propriedades. Pela primeira vez em 1928, o nmero de imigrantes japoneses ultrapassa os 10 mil. J haviam se passado duas dcadas desde a viagem do Kasato-Maru. Os nipnicos aqui residentes passavam de 70 mil. Tanto os fazendeiros brasileiros como os imigrantes japoneses j tinham adquirido um conhecimento recproco melhor. Os imigrantes haviam se convencido da impossibilidade de ganhar dinheiro em poucos anos e retornar ptria. Reduzia-se assim a ocorrncia de questes ou disputas causadas por falta de conhecimento recproco nas fazendas onde os imigrantes eram colocados. Agora os contratos de trabalho eram em grande parte pelo prazo de

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um ano. E nas fazendas que recebiam certo nmero de famlias de imigrantes, quase sempre havia um intrprete. J eram raros os casos de fugas noturnas de imigrantes e outros incidentes desagradveis. Quanto a intrpretes, em maio de 1932 a Seo de Imigrao do Consulado Geral do Japo apoiou a fundao de uma Sociedade de Intrpretes em Fazendas de Caf, considerando muito importante a funo exercida por eles. A nova entidade recebia subsdio do consulado. No final daquele ano, o nmero de seus scios chegava a 76. Por causa da crise mundial j referida algumas vezes, a partir de 1929 os imigrantes japoneses enfrentaram uma situao difcil. A recuperao econmica demorava e por isso deterioravam-se as finanas das fazendas. Apesar do contrato, os salrios dos colonos sofriam cortes, e apareceram fazendas insolventes. Registraram-se falncias de fazendas onde trabalhavam imigrantes nipnicos. Por causa dessa conjuntura, em 1931 diminuiu drasticamente o nmero de fazendas interessadas em receber trabalhadores imigrantes. A propsito do caf, a crtica situao resultou diretamente da recesso mundial, mas no fundo havia ainda a questo da superproduo como a causa principal. Em 1932 foi proibido o plantio de cafezais novos no Estado de So Paulo, o maior produtor do pas. Dentre os 3,9 bilhes de caeeiros existentes no Brasil, 1,35 bilho pertencia a So Paulo. Desde ento cresce a cafeicultura paranaense, onde no havia a proibio, havendo, conseqentemente, deslocamento de lavradores para o norte desse Estado. Mesmo assim, a maior parte dos imigrantes nipnicos que chegavam era absorvida pelos cafezais paulistas. Por causa da situao social do ]apo, na poca, j descrita, e graas aos estmulos oficiais, o nmero de emigrantes para o Brasil subiu para mais de 20 mil nos dois anos seguintes. O problema dos imigrantes nipnicos dessa fase residia mais no servio de inspeo sanitria do porto de Santos do que nas condies de trabalho. Naquela poca a situao sanitria das zonas rurais japonesas estava muito deteriorada comparando-se de pases subdesenvolvidos. Por isso, na dcada de 20 houve muitos problemas com o servio de inspeo sanitria do porto de Santos. Exemplos: como resultado da inspeo de 740 imigrantes vindos a bordo do Manila-Maru, que chegou em fevereiro de 1925, descobriu-se alta porcentagem de possuidores de verminose. Desde ento o exame de fezes se tornou obrigatrio. Em outro navio foi encontrada distomatose pulmonar, at ento tida como inexistente no Brasil. Diante desses fatos, o governo brasileiro solicitou ao governo de Tokyo a proibio da viagem de pessoas portadoras de verminoses.

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Na prtica no se registrou nenhum caso de imigrante impedido de desembarcar no pas por causa de verminose. No entanto, no HawaiMaru, aportado em Santos em dezembro de 1925, foram encontrados portadores de tracoma grave. Tambm neste caso houve solicitao no sentido de se proceder a uma rigorosa fiscalizao antes da partida dos emigrantes do Japo. Mesmo assim, continuaram a chegar tracomatosos, at que 38 pessoas que chegaram a bordo do Kamakura-Maru, em 1928, e seis no Bingo-Maru, que aportou em Santos em 1929, foram proibidas de desembarcar e repatriadas. Depois desse acontecimento, portadores da molstia foram vedados de embarcar na fase de inspeo sanitria em Kobe. A imigrao nipnica, que na primeira metade da dcada de 30 chegou a um nmero superior a 20 mil/ano e fez um parlamentar japons desejar que esse nmero fosse elevado para 50 mil, comeou a decrescer a partir de 1935. Em 1940 reduziu-se a apenas 64 imigrantes. As causas foram a perigosa conjuntura mundial e, em especial, a clere ascenso e fortalecimento de movimentos nacionalistas, tanto no Brasil como no Imprio do Sol Nascente. Aps a implantao do Estado Novo, novas leis e decretos de restrio s atividades de estrangeiros foram sucessivamente adotados: em agosto de 1938, nova lei de restrio aos imigrantes estrangeiros, confirmando na prtica a lei dos dois por cento; em setembro de 1939, comeo da censura especial imprensa de lngua estrangeira publicada no pas; em 1940, comea o registro de estrangeiros. Diante dessas restries cai o ingresso de imigrantes japoneses. Em 1938 ainda se contavam (segundo fontes japonesas) 2.563 imigrantes entrados no Brasil. J em 1939 entraram 1.314 e voltaram ao Japo 2.001; em 1940 entraram 1.564 e se ignora quantos repatriados houve; porm, considera-se que, devido crescente tenso internacional, os que regressaram ao Japo talvez tivessem superado o nmero de imigrantes. No ano de 1941, at a chegada do Buenos Aires-Maru, que zarpou de Kobe a 2 de junho, 1.277 imigrantes nipnicos entraram no Brasil. Pouco depois vinha o rompimento de relaes diplomticas (janeiro de 42) entre o Brasil e o Japo. Findava tambm a fase de emigrao como "poltica de Estado" adotada na dcada anterior pelo governo nipnico. Na verdade, a reduo de imigrantes japoneses para o Brasil no foi causada somente pelas providncias nacionalistas aqui adotadas. Havia o nacionalismo e o militarismo japons. Ao ingressar na Era Showa (19261989), o Japo se viu dominado por um militarismo agressivo, que passou a controlar a poltica interna e externa do pas. Tal situao provocou suspeitas e desconfianas por parte da classe intelectual e poltica brasileira, em relao ao "expansionismo imperialista" do Japo.

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O Jornal do Comrcio do Rio, que at ento mantivera uma atitude ponderada sobre o problema da imigrao nipnica, mudou de opinio, a partir da invaso das foras nipnicas na Manchria, em setembro de 1931, passando a criticar como contrria aos interesses nacionais a introduo de japoneses no pas. Essa atitude foi adotada por no poucos polticos, pensadores e jornalistas. Mas o expansionismo conduzido pelo militarismo do Japo teria reduzido a emigrao para o Brasil, mesmo que no houvessem ocorrido as restries aqui adotadas. O chamado Incidente Manchu (Manshu Jihen, como o Japo chamava oficialmente a conquista dessa regio da China) resultou, em 1932, no estabelecimento do Estado Manchu, sob a tutela dos militares nipnicos. Para os militares expansionistas tornava-se importante introduzir imigrantes nipnicos na Manchria, cujo desenvolvimento econmico era uma necessidade urgente. Diga-se de passagem, os polticos e militares que adotaram a estratgia expansionista pretendiam solucionar os graves problemas internos (superpopulao, crise econmica crnica, etc.) mediante conquistas territoriais. Depois de promover a "independncia" da Manchria, os militares nipnicos enviaram cerca de 150 mil emigrantes como trabalhadores necessrios ao desenvolvimento da agricultura do novo "Estado". E procuravam, por vrios meios, impedir ou prejudicar a emigrao destinada ao Brasil. Durante os quatro anos que durou a Guerra do Pacfico, quando se interrompeu por completo a emigrao para o Brasil, foram encaminhados Manchria 120 mil emigrantes "desbravadores". Em resumo, os nacionalismos /dos dois pases contriburam para reduzir a zero, em pouco tempo, a entrada de imigrantes japoneses no Brasil. A populao brasileira em 1940 era de 41.160.000. At ento entraram 188.309 imigrantes nipnicos. Estima-se que, somando-se os filhos aqui nascidos, haveria ento cerca de 205 mil japoneses e descendentes; portanto menos de 0,5% da populao do pas. b) Alta porcentagem de fixao de imigrantes japoneses Mesmo entre emigrantes que objetivam radicar-se no pas receptor, uma parte retorna ptria e outra reemigra. Nos EUA, da segunda metade do sculo XIX at o comeo da I Grande Guerra (perodo de maior ingresso de imigrantes), estima-se que 30% dos que entraram saram do pas. No caso do Brasil, a porcentagem de fixao de imigrantes era bem inferior dos EUA. De 1819 a 1933 entraram no pas 4.623.789 imigrantes, dos quais os que reemigraram (para pases como Argentina, Chile, Peru,

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Bolvia, etc), ou se repatriaram, somaram 53%, segundo um clculo feito com base nos nicos dados existentes, correspondentes ao perodo de 1926 a 1933. Em relao fixao de imigrantes estrangeiros no Estado de So Paulo no perodo de 1908 a 1933, dispomos dos seguintes dados, segundo as nacionalidades: japoneses, 93,21%; turcos, 53,22%; espanhis, 51,05%; portugueses, 41,99%; alemes, 24,40%; italianos, 12,82%, e outros, 0,69%. A porcentagem de japoneses bastante elevada. Outros dados disponveis mostram a participao nas atividades agrcolas dos imigrantes de diferentes procedncias: japoneses, 98,8%; iugoslavos, 93,7%; lituanos, 88,3%; romenos, 87,5%; espanhis, 79,0%; italianos, 50,6%. Verifica-se que os imigrantes nipnicos do Brasil apresentam um ndice alto de radicao, raro na histria das migraes de todos os pases do mundo. E verdade que, posteriormente, na segunda metade do decnio de 30, registrou-se um aumento de imigrantes nipes que retornavam ptria, em particular nos anos imediatamente precedentes II Guerra Mundial. Mesmo assim, calcula-se que no passava de 10% dos que ingressaram no pas. Na fase final do perodo das grandes migraes (por volta de 1880), verificou-se grande participao dos italianos. Eles alcanam o maior nmero de emigrantes entre os pases emigrantistas no final do sculo passado, mas apresentavam carter temporrio (dekasegi), motivo por que nos EUA eram chamados de "aves de arribao". Igualmente, assim como os italianos, que comearam a emigrar quase no fim do ciclo das grandes migraes, os japoneses apresentavam caractersticas de dekasegi, como sabemos. No Hava, EUA e pases do Sudeste da sia muitos regressavam ao Japo depois de acumular certa quantia em dinheiro. Originariamente, tambm os imigrantes que vieram para o Brasil pretendiam regressar ao Japo, to logo conseguissem amealhar algum dinheiro. No entanto, a realidade acabou mostrando uma alta porcentagem de radicao no pas. Dentre as causas podemos enumerar: tratando-se de famlias que emigravam, havia certo grau de estabilidade espiritual entre seus componentes, mesmo vivendo em pas estrangeiro; at a segunda metade da dcada de 30, poucos puderam auferir lucros satisfatrios por seu trabalho; diversamente do que acontecia em outros pases, no Brasil quase todos (ao menos aps a concluso do prazo contratual nas fazendas) se dedicavam atividade agrcola autnoma (independente). Por esse motivo, ao ganharem dinheiro, procuravam investir na expanso de seus empreendimentos e, assim, auferir mais lucros;

DO APOGEU AO FIM 193

aumentou o nmero de imigrantes que ganharam dinheiro durante a II Grande Guerra e que pensavam em voltar ao Japo depois de terminado o conflito. Mas, ao tomar conhecimento da situao do Japo no ps-guerra, desistiram da idia; a natureza generosa e a hospitalidade inata dos brasileiros proporcionaram ambiente favorvel a uma vida tranqila, etc. Parece lgico que, em caso de desistncia de regresso terra natal, existissem imigrantes que precisavam enviar dinheiro ao Japo a fim de resgatar dvidas, ajudar parentes necessitados, etc. Acredita-se que o valor dessas remessas deve ter atingido somas considerveis, mas no se dispe de dados confiveis quanto quantia total. Ao se instalar a filial do Banco Espcie de Yokohama, em 1919, no Rio de Janeiro, d-se incio remessa de dinheiro dos imigrantes atravs desse estabelecimento. Os valores anuais enviados desde ento, at 1939, foram os seguintes (em yens):
1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929 1930 1931 1932 1933 1934 1935 1936 1937 1938 1939 190.197 223.626 65.538 259.028 265.916 1.155.325 1.461.166 660.906 831.829 1.737.062 1.217.406 549.040 154.358 178.746 13.151 517.823 429.784 775.483 1.199.391 380.743 337.602

Total

12.603.620 yens

Obs.: Nos perodos de 1930-35 e 1938-39, as remessas foram reduzidas por medidas oficiais de controle cambial. Fonte: Hatten-shi.

Alm do Banco Espcie de Yokohama, havia outras rotas para a remessa de dinheiro para o Japo. Desde cedo, imigrantes japoneses se utilizaram do servio de cmbio da filial de So Paulo do Citibank. No h registros certos sobre essas remessas, mas existe informao do envio de 1.620.000 yens em 1934 e 1.350.000 yens em 1935.

1 9 4 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

Em poucas palavras, pode-se dizer que os imigrantes nipnicos, ao se convencerem da dificuldade de regressar ptria com o dinheiro ganho no bolso, optaram pelo caminho mais prtico da remessa de numerrio por via bancria para o Japo. Muitos comearam essas remessas desde o tempo em que labutavam como colonos na fazenda. E o sistema tanomoshi(*) (ajuda mtua) foi utilizado j pelos primeiros imigrantes aqui chegados.
7. COMUNIDADE JAPONESA NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO

a) Melhoria da situao econmica


LAVOURA: 59,7% DE PROPRIETRIOS EM 1942

Mesmo no tempo em que a emigrao constitua uma poltica de Estado (Kokusaku imin), com exceo de alguns casos especiais, a grande maioria chegava ao Brasil como imigrantes contratados das fazendas de caf. E como o caf continuou sendo o carro-chefe da economia brasileira tambm na dcada de 30, muitos imigrantes, ao deixarem a fazenda, aps o trmino do prazo contratual, prosseguiam na cafeicultura, agora como lavradores independentes. Nos 30 anos, de 1912 a 1942, a posio dos cafeicultores nipnicos variou conforme o quadro seguinte. EVOLUO DA POSIO DE CAFEICULTORES NIPNICOS (1912-42) (EM %)
Ano Porcentagem de cafeicultores (em toda a lavoura) 92,5 76,3 52,0 62,2 59,0 32,0 24,3 Proprietrios Parceria Colonos

19.12 1917 1922 1927 1932 . 1937 1942

2,1 10,1 28,3 26,9 23,8 38,8 59,7

6,0 8,8 18,5 16,8 21,7 15,0 13,8

91,9 81,1 53,2 56,3 54,5 46,2 26,5

Fonte: Burajiru no Nihon Imin (Os Imigrantes Japoneses no Brasil).

(*) Tanomoshi ou Tanomoshik um sistema de financiamento mtuo existente desde o sculo XIII no Japo. Para comear forma-se um grupo a fim de ajudar o mais necessitado, funcionando base de compromisso moral, sem complicaes de ordem legal.

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO 195

Na poca em apreo, o prazo de contrato na fazenda de caf era em sua maioria de um ano. Verifica-se porm que o colono no permanecia s um ano. Prosseguia no seu emprego por dois a cinco anos a fim de formar uma reserva de capital necessria para passar etapa seguinte: lavoura de parceria ou lavrador proprietrio. Por essa razo encontramos no quadro maior porcentagem de colonos no qinqnio de 1927-32 quando aumenta o fluxo de imigrantes japoneses. Cresce nessa fase o nmero daqueles lavradores que faziam parceria pelo prazo de quatro a seis anos para formar um cafezal. O mtodo ento mais usado para a formao de cafezal consistia em derrubar mata virgem e proceder queimada; a seguir faziam-se covas (buracos de cerca de 30 x 20 x 18 cm) nas quais se introduziam seis gros de caf. A mdia de ""produo" de covas por pessoa/dia alcanava aproximadamente 800. A semente germina em cerca de uma semana. Depois procede-se ao desbaste de mudas de m formao, deixando trs a quatro mudas boas por cova. O cafeeiro comea a produzir um pouco de gros a partir do quarto ano. No caso de parceria de quatro anos, a renda consistia nas receitas proporcionadas pelas culturas intercaladas (arroz, feijo, milho, etc), durante o perodo, mais o pagamento que o proprietrio da terra efetuava ao parceiro razo de um tanto por cova. Quando o contrato estabelecia prazo de cinco a seis anos, alm das culturas intercaladas o lavrador de parceria ganhava mais as rendas do quinto e sexto anos proporcionadas pelo caf formado. A essa altura a produo de caf podia ser substancial. Por isso, conforme a safra e a cotao da rubicea, era possvel esperar uma receita considervel. A essa altura, os imigrantes japoneses que chegaram sob a gide da poltica emigratria do Estado japons no pensavam mais em regressar ptria com o dinheiro ganho em dois ou trs anos de trabalho. O consulado geral do Japo editou um livro Burajiru no Taiken o Kataru (Contando as Experincias Pessoais no Brasil, 1933), reunindo o depoimento de 34 imigrantes. A mdia de sua permanncia na fazenda era de trs a quatro anos. Depois da lavoura de parceria, vinha a fase de lavrador proprietrio de terra. Existem diversas fontes sobre o nmero de cafeeiros possudos por imigrantes nipnicos. Podemos verificar que aumentou da seguinte maneira (nmeros redondos): 1923 25 milhes; 1928 40 milhes; 1932 62 milhes. Calcula-se que existia 1,4 bilho de cafeeiros no Estado de So Paulo em 1932. Portanto, os japoneses contriburam com cerca de 4%. Dentre eles destacavam-se cinco cafeicultores donos de mais de 150 mil ps; dez

196 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

com mais de 100 mil ps e 65 com mais de 50 mil cafeeiros. O impressionante nessas cifras que seus autores comearam realmente do nada, s com a fora de vontade e o trabalho, uma formidvel reserva de energia para a luta pela produo. Registre-se que os imigrantes nipnicos construram, em um quarto de sculo, um alicerce econmico que nem poderiam ter imaginado no momento de chegada nas fazendas. Ento se torna senso comum acreditar que "para ganhar dinheiro no Brasil no se pode continuar trabalhador-assalariado. preciso tornar-se um agricultor independente". No s na cafeicultura como em outras culturas agrcolas aumentam rapidamente os lavradores independentes, proprietrios de terra.
Ano Proprietrios Porcentagem em relao ao total cio Estado rea de terras de propriedade de japoneses (alqueires) 134.974 174.145 171.919 206.532 Porcentagem em Valor estimado (em relao ao total do contos) das terras de Estado propriedade de japoneses 1,8 2,2 2,1 2,9 129.162 160.335 222.230 203.113

1932 1934 1936 1938

10.355 13.945 14.862 14.360

5,0 5,1 5,7 6,0

Obs.: Excludas as propriedades de pessoas jurdicas como a Bratac e de japoneses com nacionalidade brasileira. Fonte: Hatten-shi.

A ttulo de informao, o valor estimado em contos de ris (129.162:000$000) em 1932 eqivaleria a 31 milhes de yens (1 yen = 4.166 ris). Esta acelerada transformao dos japoneses em proprietrios de terra est fundamentada na inteno e vontade do imigrante, visando se capitalizarem. Por outro lado, na segunda metade da dcada de 10, aconteceu um fato indito na histria econmica de So Paulo: grandes proprietrios de terras comeavam a vender suas propriedades divididas em lotes de 10 alqueires (alqueire igual a 24.200 m2), aproximadamente. Esse novo e revolucionrio (para a poca) sistema de vendas facilitou o acesso terra aos imigrantes japoneses que deixavam as fazendas com algum dinheiro no bolso. No entanto, os japoneses que adquiriam pequenos lotes de terras virgens mostraram uma forte tendncia de formar agrupamentos s deles. Por isso, as companhias vendedoras ou proprietrios de terras com tino comercial estabeleciam uma seo japonesa com encarregados e / o u vendedores tambm nipnicos a fim de atender melhor os clientes dessa nacionalidade. Os lavradores japoneses que ocupavam

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO 197

essas terras logo formavam colnias (shokuminchi) ou ncleos coloniais, cada uma com topnimo prprio. Na dcada de 30, a maior concentrao de japoneses acontece como j vimos no Captulo 2 ao longo da E.F. Noroeste do Brasil. Apenas para citar um exemplo: na estao Lins da mesma linha frrea, em 1932, havia nada menos que 39 "colnias japonesas". Nelas viviam 551 famlias de proprietrios de terra, com 1.250.000 cafeeiros. Representava a mdia de 15 famlias proprietrias por colnia e cerca de 20 mil ps de caf por famlia.
A MISSO HIRAO ANIMA A COTONICULTURA PAULISTA

Como j foi exposto em outra parte, a cafeicultura, que se afigurava o principal alvo dos imigrantes nipnicos, sofre uma grave crise devido queda de preo causada pela crnica superproduo e a recesso da economia mundial iniciada em 1929. Em 32 foi proibida a plantao de caf no Estado de So Paulo. Como o norte do Paran onde existiam as famosas terras roxas, frteis, ainda no pisadas pelo homem no sofreu a proibio, muitos agricultores que desejavam plantar caf se transferiram de So Paulo para essa regio. Em 1939, 11% de cafeicultores nipnicos j se achavam instalados no Paran. Em poucas palavras, tendo essa situao como pano de fundo, na segunda metade do decnio de 30 os lavradores japoneses tiveram de mudar sua orientao quanto cultura: no ficarem presos somente ao caf. E tambm no limitar ao Estado de So Paulo o seu campo de atuao. ALTERAES NAS PRINCIPAIS CULTURAS DE LAVRADORES JAPONESES (1912-1947, EM %)
Ano'

Caf

Algodo

Arroz

Culturas tipo suburbano 0,6 4,2 10,2 11,1 13,0 14,5 19,9 27,5

Outras

1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947

92,6 76,8 52,0 62,2 59,0 32,1 24,3 23,6

1/2 4,5 12,1 11,1 14,0 39,0 39,3 31,2

2,5 9,5 17,6 10,5 8,3 6,0 4,5 3,8

3,1 5,0 8,1 5,1 5,7 8,4 12,0 13,9

Fonte: A Imigrao Japonesa no Brasil.

O quadro demonstra que o imigrante japons dedicou-se desde logo tambm a outras culturas que no o caf. E mostra que na dcada de 30

198 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

a posio de cafeicultores cai muito. Em compensao, nota-se a expanso de culturas tipo suburbano e "outros". A partir de 1937, principalmente, a cultura de algodo expande-se de modo extraordinrio. E na histria que o Brasil conhecido desde o sculo XVII como um grande produtor mundial de algodo. Mas sua produo se concentrou em Minas e no Nordeste. A produo cotonfera paulista somente comea a ser conhecida depois de 1919. A produo de So Paulo cresce na dcada de 30, tornando-se o maior Estado produtor do pas, em conseqncia da queda da cotao do caf e da proibio do plantio de novos cafezais. Os lavradores japoneses sofriam com a queda do preo do caf, e, por outro lado, na Constituio Brasileira de 1934 fora includa a clusula de limitao da entrada de novos imigrantes a dois por cento dos imigrantes recebidos no pas nos ltimos 50 anos. A comunidade passava por uma fase de depresso moral e dificuldades econmicas. Como uma tentativa de quebrar essa situao negativa, o governo japons enviou a misso chefiada pelo empresrio Hachisaburo Hirao, que permaneceu no Brasil de 16 de maio a 11 de junho de 1935. Quanto s restries emigrao, a misso nada conseguiu, mas procedeu a uma completa pesquisa sobre a situao do algodo, matriaprima valiosa para o parque fabril nipnico. Em conseqncia, nos anos subseqentes verificou-se extraordinrio incremento da importao do algodo paulista pelo Japo. Com base no relatrio da Misso Hirao, grandes grupos econmicos japoneses como a Brascot, Mitsui Bussan, Nanbei Menka, Bratac Shoji, Kanematsu Gosho, C. Itoh, etc. lanaram-se compra e exportao do algodo brasileiro, o que ocasionou aumento do volume de vendas e preos estveis do produto. Resultado: no valor total da exportao do Estado de So Paulo cresceu rpida e substancialmente a participao do algodo produzido pelos lavradores nipnicos. As exportaes brasileiras para o Japo foram fortemente incrementadas por essa participao a partir de 1936. Vejamos no quadro seguinte: EXPORTAES DO BRASIL PARA O JAPO
Ano
1913 1920 1935 1936 1937 1938 1939
Fonte: Hattcn-shi.

Valor (libra esterlina)


2.931 18.675 158.098 1.683.106 2.122.106 1.650.601 2.029.583

ndice
100 637 5.393 57.424 72.402 56.315 69.245

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO 199

A produo de algodo em caroo de lavradores nipnicos em 1932 foi de 1.848.836 arrobas, representando cerca de 31 % do total da produo paulista. J em 1939, sua participao alcanou aproximadamente 50%, com 26.270.850 arrobas. A mecanizao da lavoura estava ainda muito atrasada, quase tudo se fazia manualmente. Apenas na lavra da terra utilizavam-se arados de trao animal. Nessas condies, a rea cultivada por famlia no passava de 3 a 10 alqueires. A colheita por alqueire dependia naturalmente do grau de fertilidade do solo, condies climticas, ocorrncia ou no de prejuzos causados por pragas. Anotaes da poca revelam uma produo entre 100 e 200 arrobas por alqueire. Temos um dado concreto referente ao ano de 1932: custo de produo de uma arroba para o lavrador de 9.175 ris e o preo de venda, 12 mil ris. Por causa da boa lucratividade apresentada pela cotonicultura, nos anos de 1937 a 39, muitos cafeicultores ou plantadores de cereais cultivaram tambm a malvcea. Por isso, o nmero de lavradores nipnicos dedicados cultura de algodo teria chegado a 32 mil famlias. Em 1939, o valor total da produo agrcola dos imigrantes japoneses do Estado de So Paulo somava 524.945 contos de ris, dos quais o algodo participava com 69%.
POLICULTURA: LAVOURA SEGURA

No obstante o desenvolvimento favorvel na segunda metade da dcada de 30, os lavradores nipnicos nem sempre apresentaram uma evoluo constante e lucrativa em suas atividades. Destaque-se a dcada de 20, quando na zona rural de So Paulo ainda inexistiam instituies financeiras e mesmo as cooperativas agrcolas apenas ensaiavam os primeiros passos. Nessas circunstncias os lavradores recorriam a financiamentos (emprstimos) de particulares,"estrangeiros" ou patrcios, ou recorriam a adiantamentos de comerciantes cerealistas. Os juros bancrios estavam em torno de 1% ao ms, mas o financiamento de lavradores do interior (quando havia) custava normalmente 2%, chegando a 5% no limite mximo. Quando a safra era m, por causa de condies climticas anormais ou no caso de safra abundante, revoluo ou outra causa, quando caam os preos, a situao do lavrador se tornava mais grave. Vimos no captulo anterior como os agricultores japoneses da Noroeste e Sorocabana tiveram de recorrer a um financiamento a juros baixos, do governo japons, em 1924. E com a crise mundial de 1929 e anos seguintes, os lavradores foram forados a solicitar novo financiamento ao governo de Tokyo (desta vez recusado).

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATORIA DE ESTADO 201


Produto Tomate Ch Frutas Banana Hortalias Casulo de seda Ovos Produtos pecurios Outros Total Quantidade 4.690.000 caixas 250 toneladas 3.000.000 cachos 200 toneladas 15.000.000 unidades Valor (em contos de ris) 9.360 1.250 950 3.000 3.000 1.000 2.500 1.500 85 524.945 contos

Obs.: Este quadro apresenta uma considervel subvalorizao de produtos tipo suburbano. E mais: em 1939 comea a aumentar a produo de menta. De maneira que se pode concluir que, na realidade, as cifras aqui citadas devem estar mais d 10% aqum dos valores reais. COMRCIO E OUTRAS ATIVIDADES: COMEO DIFCIL

Segundo um levantamento feito pelas representaes diplomticas nipnicas no Brasil em 1940 (ltimo ano em vigor da poltica de Estado para a emigrao), cerca de 87% de japoneses ou 37 mil famlias trabalhavam na agricultura. Os imigrantes, cujo plano inicial consistia em ganhar dinheiro o mais depressa possvel e regressar ptria, se e quando surgia uma atividade fora da lavoura que oferecesse possibilidade de ganhar mais do que nas lidas do campo, l iam se aventurar at mesmo em profisso completamente estranha sua. Houve muitos imigrantes do Kasato-Maru e outros barcos da primeira fase da imigrao nipnica que, ao fugirem das fazendas, se dirigiam a Santos, porque constava ser o trabalho de estiva melhor remunerado do que o trabalho no cafezal. Acontece porm que era difcil conseguir trabalhos que no eram de simples assalariado por causa da barreira da lngua ou da questo de capital, s para citar os maiores bices. Essas dificuldades s foram sendo superadas medida que se acumulava capital na lavoura e o conhecimento do portugus j servia para as comunicaes mais simples. S ento os imigrantes se aventuravam a sair da lavoura e partir para outras profisses ou ofcios. A atividade comercial era relativamente mais fcil. Lavradores que renem um pequeno capital comeam a abrir uma pequena casa comercial numa vila do interior. Com o correr do tempo, vo ampliando e consolidando paulatinamente suas atividades. Na publicao Contando as Experincias Pessoais no Brasil, cita-se o caso de um lavrador que trabalhou muito tempo na fazenda de caf, em

202 EMIGRAO COMO POLTICA DE ESTADO

parceria, e depois, "a pedido de moradores da vizinhana", abriu um pequeno armazm de artigos de uso cotidiano. Pela rapidez nos clculos, honestidade e bom servio, os comerciantes japoneses foram conquistando a confiana de crescente nmero de fregueses, A maioria comeou com pequenas casas de comrcio no interior. Na dcada de 30 cresce muito o nmero dos que trabalham no comrcio como empregados (comercirios). De 1.434 em 1930, aumentou para 3.016 em 1932. E nesse ano os comerciantes somavam 871. Em Marlia, ento uma vila, vanguarda da fronteira de desbravamento no interior de So Paulo, em 1932 havia 116 famlias japonesas nela residentes. Segundo as profisses: mdico 1, dentistas 2, escritrio de agrimensura 1, profissionais liberais 4. No setor comercial contavam-se 12 armazns de secos e molhados, na intermediao de produtos agrcolas 7, bares e restaurantes 7, quitandas 6, farmcia 1, hotel 1, transportadoras 3. E mais: alfaiates, fotgrafos, barbeiros, corretores, dois estabelecimentos cada. Havia ainda 1 peixaria, 1 relojoaria, 1 vendedor ambulante e 13 famlias de comercirios. Atividades classificveis como indstrias (inclusive artesanatos), citavam-se carpinteiros 5, fbricas de sapatos 3, ferreiros 3, doceiras 4, fbrica de macarro 1, fbrica de tofu 1, beneficiamento de arroz 1, funileiro 1, somando 19 estabelecimentos. O levantamento inclua 16 famlias de lavradores e 10 de atividades diversas. Os intermedirios e corretores no serviam apenas como agentes nas compras e vendas de imveis. Paralelamente desempenhavam importante funo na comercializao de produtos agrcolas. Analisando as profisses de japoneses da vila de Marlia (que se expandia rapidamente e logo se tornaria uma dinmica cidade), verificase que, na realidade, as profisses ou atividades novas dos imigrantes no apresentavam ainda uma ntida diviso ou classificao. Muitas vezes misturavam-se com a de lavrador. Encontravam-se ento profisses como "metade lavoura, metade comrcio", "metade lavoura, metade indstria", alm de outras "mistas". Havia ainda agricultor que possua mquina de beneficiar caf, mquina de beneficiar arroz e que exercia simultaneamente a funo de atacadista de cereais e vendedor de produtos agrcolas. Essa incipiente e curiosa diversificao profissional verificava-se, em maior ou menor extenso, em toda a comunidade nipnica do Brasil. As atividades industriais mais comuns dos japoneses da poca eram instalao de beneficiamento de produtos agrcolas, fbrica de aguardente, de implementos agrcolas, de shoyu, de mveis, de doces, de macarro, de brinquedos, etc.

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATORIA DE ESTADO 203

Como acabamos de ver, na dcada de 30, os japoneses j no se limitavam a trabalhar na agricultura. Aproveitando conhecimentos e experincias adquiridos e usando o capital acumulado (embora quase sempre de pequena monta), buscam novos campos de atividade, visando a melhoria e expanso de suas bases econmicas. E a primeira opo por ser mais fcil de comprar era o comrcio. Por exemplo, o jornal Noticias do Brasil publicou, em 1933, um Anurio do Brasil, em comemorao dos 25 anos da imigrao japonesa no Brasil. A. publicao apresentou os cinco homens mais ricos, representativos da comunidade, e todos eles se dedicavam a atividades comerciais embora em setores diferentes. Todavia, mesmo em 1940 os japoneses que trabalhavam nos setores comercial e industrial da comunidade no passavam de 10% do total. E quase todos comearam a atuar no comrcio em cidades interioranas da Noroeste e outras regies. Instituies financeiras s aparecem na dcada de 30. Primeiramente instalou-se em 1932 a Casa Bancria(*) Tozan; em 1937 surgiram a Casa Bancria Bratac e Casa Bancria Kaik. Posteriormente surgiu a Casa Bancria Brascot. Conforme demonstram suas denominaes, as casas bancrias se apoiavam nos prprios grupos econmicos. Todas foram instaladas visando atender principalmente a clientela de lavradores nipnicos. Na ausncia de instituies de financiamento rural, as casas bancrias prestavam servios de financiamento, depsito bancrio, etc, at ento quase inexistentes no meio rural. Todas essas atividades no-agrcolas contriburam para o progresso econmico dos imigrantes e ao mesmo tempo apoiaram e ajudaram, direta ou indiretamente, o desenvolvimento da agricultura, que representava o cerne da economia brasileira. Alm das citadas profisses, havia um setor especfico onde a presena nipnica se tornaria significativa: a pesca. um fato histrico que japoneses comearam a chegar a Santos procedentes das fazendas de caf logo nos primeiros anos da imigrao. Uma parte dos que foram parar em Santos se dedicou pesca, empregando canoas, como faziam pescadores locais. Devido ao limitado consumo de peixe pela populao brasileira, a indstria de pesca levaria ainda muito tempo para se desenvolver. Mas, com o aumento de japoneses, italianos e outros povos consumidores de peixes e frutos do mar, cresce a demanda. Por volta de 1920, a pesca passa a ser realizada em barcos construdos de madeira, em vez de canoas,
(*) Casa bancria era uma instituio financeira legal, de pequeno capital, que prestava muitos dos servios bancrios convencionais.

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refletindo o progresso do setor. Em 1925 foi baixada uma lei que limitava a brasileiros a atividade pesqueira no pas, o que desanimou os pescadores nipnicos. Eles encontraram soluo naturalizando-se brasileiros. Assim, em 1928 foi fundada a Cooperativa de Pesca da Ponta da Praia (Santos), pelos pescadores japoneses naturalizados. Com o incremento do consumo, em 1930 a produo de pescados alcanou o valor de 975 contos de ris. Com o aumento de pescadores, em 1. de julho de 1932 instalou-se a Cooperativa de Pesca de Santos, reunindo cerca de 60 famlias de pescadores japoneses naturalizados brasileiros. J se empregavam barcos pesqueiros de 20 a 30 toneladas. A Cooperativa empregava muitos pescadores brasileiros, e em 1940 a tonelagem de embarcaes pertencentes aos nipo-brasileiros alcanava um total calculado em 360 toneladas. Na poca eles forneciam 70% de toda a produo de peixe em Santos. Agora a Cooperativa no cuidava somente da pesca: dispunha de fbrica de gelo, cmaras frigorficas e at instalaes e veculos de transporte terrestre a fim de atender ao mercado. Em fins da dcada de 30, a produo pesqueira dos nipo-brasileiros alcanava valor superior a 2.500 contos de ris. Ainda na dcada de 30 foi organizada uma cooperativa de pesca formada por scios nipo-brasileiros no Estado do Paran, que fornecia uma mdia diria de 3,7 a 4,9 toneladas de peixe ao mercado paranaense. Entre Santos e Rio de Janeiro atuavam alguns pescadores de origem japonesa. b) A estrutura da comunidade japonesa Embora o imigrante japons visasse voltar ao seu pas natal com o dinheiro ganho na fazenda de caf (que agentes de emigrao prometiam), na realidade a proporo dos que conseguiram se repatriar no chegava a 10%, como j vimos. Por conseguinte, ao chegar a dcada de 30, quando cresce muito o nmero de imigrantes, a populao da comunidade nipnica do Brasil registra um aumento rpido. Naturalmente nesse incremento demogrfico houve a contribuio do crescimento natural da prpria comunidade ( razo de 3,9% anuais no perodo de 1926-28). Essa porcentagem era superior mdia do Japo (mdia de 3,4% entre 1926 e 29) e do Brasil (3,26% em 1929). A elevada porcentagem de nascimentos justificvel se levarmos em conta a presena de muitos casais jovens entre os imigrantes. De acordo com levantamento feito pelas representaes oficiais nipnicas no Brasil, entre 1925 e 1940 a populao de japoneses e descendentes cresceu da seguinte maneira:

NO TEMPO DA POLTICA EMIGRATRIA DE ESTADO 2 0 5

1925 1930 1935 1940

49.400 116.502 192.825 202.514

Obs.: 1) O nmero referente a 1940 de 1. de outubro. 2) No se acham includos indivduos de nacionalidade brasileira. Fonte: Hatten-shi.

A distribuio geogrfica de japoneses sofre mudanas conforme a poca. Em abril de 1940 essa distribuio era a seguinte: Estado Estado Estado Estado Outros Total de So Paulo 193.364 do Paran 9.300 do Mato Grosso 3.710 de Minas Gerais 1.922 12 Estados 2.554 210.850

Obs.: Embora os dois quadros sejam das mesmas repai es pblicas japonesas, sendo este segundo datado de 30 de abril de 1940, verifica-se uma diferena de 8.336. No sabemos a que atribuir essa discrepncia.

Verifica-se que antes da II Grande Guerra os japoneses se concentravam, em sua grande maioria, no Estado de So Paulo. E no na capital. O interior abrigava a maioria deles. Segundo as regies (citando s as maiores concentraes): Noroeste Sorocabana Alta Paulista 59.725 pessoas 36.317 pessoas 21.830 pessoas

Quer dizer, quase 60% do total da populao japonesa se achava concentrada ao longo das trs ferrovias paulistas. A seguir vinha a linha Mogiana, 15.572; Paulista (linha tronco), 13.103. 87% dos japoneses da poca se classificavam como lavradores. E nas regies citadas formavam uma comunidade peculiar dentro do Brasil. Chamava-se concentrao de japoneses ou colnia de japoneses, sendo esta a designao mais usada. Dentro dessa comunidade foram se organizando associaes de nipnicos, juvenis, femininas, de apoio escola japonesa, cooperativas agrcolas, grupos esportivos e outras entidades. Entre os imigrantes estrangeiros os nipes se destacam como "manacos" do associativismo. Outras colnias, como as alems, tambm contariam com numerosas organizaes associativas. "Reunindo-se trs

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japoneses se organiza uma associao", costumavam eles prprios dizer, guisa de autocrtica.
PROTTIPOS DE ASSOCIAES DE JAPONESES, DE MOOS E DE SENHORAS VISTOS NA COLNIA DE REGISTRO

Considera-se a associao de japoneses (nihonjin-kai) como uma organizao de administrao autnoma dentro de um agrupamento (ou concentrao) de japoneses. Consta que a primeira organizao do gnero teria sido a Keijin-kai (Associao de Moradores da Colnia Katsura)(*), fundada em 1915. Se examinarmos a histria da Colnia de Iguape, em agosto de 1919 foi instalada a associao de japoneses denominada Kyotaku-kai (Associao de Desbravamento Coletivo), quando o nmero de colonos alcanava 290 famlias. Seria o primeiro prottipo de associao de japoneses e constava de cinco divises: Higiene, Educao, Pesquisa, Tesouraria e Expediente. Como a colnia estava dividida em cinco sees e 25 distritos, eram nomeados chefes de sees e de distritos sob o comando do presidente da entidade. A associao dispunha de estatutos e regulamentos minuciosos. Em se tratando de entidade destinada a cuidar de agrupamentos humanos formados em clareiras abertas na mata virgem, as questes mais importantes para ela eram: 1) controle dos assuntos de sade e higiene dos colonos; 2) manuteno e conservao de estradas e pontes; 3) estudo do problema educacional dos filhos e sua orientao; 4) ampliao da escola primria e construo de novo prdio; 5) instalaes necessrias s atividades produtivas, inclusive meios de transporte; 6) publicao de rgo oficial da associao, etc. Pesquisa uma das divises da entidade se destinava principalmente a estudos e pesquisas da rea de atividades econmicas. Um exemplo: em princpios da dcada de 20, a associao enviou um grupo de seus associados at o Estado de Pernambuco para estudar tcnicas empregadas em usinas de acar, com vistas implantao de um engenho de acar na colnia. Isso demonstra que a associao de japoneses constitua uma organizao coletiva que cuidava da administrao da colnia, com nfase na educao e na economia em geral.
(*) Katsura, nome dado em homenagem a Taro Katsura (1847-1913), estadista da Era Meiji, falecido no ano da fundao da Colnia de Iguape (Registro). O nome original do local era Gipovura; a mudana do nome foi para homenagear a memria de Katsura, que apoiou a fundao dessa colnia. Fazia parte das trs colnias que a Kaik fundou com o nome inicial de Colnia Iguape por se acharem localizadas s margens do rio Ribeira de Iguape.

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Ao que tudo indica, a tarefa imediata mais importante para a Kyotaku-kai era a conservao de 127 km de estradas e numerosas pontes existentes na Colnia de Iguape. Ela cobrava uma taxa de conservao dos colonos, e estes, em determinadas datas, prestavam servio nas obras de conservao das rodovias que ligavam os distritos. Registro a maior das unidades de Iguape e que com o passar do tempo substitui Iguape como denominao representativa das trs colnias tinha sido uma rea coberta de mata virgem at o ingresso de imigrantes japoneses. Por isso havia muito trabalho para a Kyotaku-kai: at servio de registro civil (remessa de comunicao de nascimento, casamento, bito, etc. ao consulado), correspondncia (servindo como uma espcie de agncia dos correios) e outros. E para a educao de adultos um professor percorria uma vez por ms os bairros para proferir palestras de cunho instrutivo. E a entidade publicava o seu rgo oficial, Kyotaku. Em 1922, por ocasio das comemoraes do Centenrio da Independncia do Brasil, marinheiros da esquadra de trs unidades da Marinha Imperial visitaram Registro. A esquadra japonesa participava das comemoraes do Centenrio. Em Registro e outras colnias que visitaram, os marinheiros foram alvo de entusisticas homenagens. Na ocasio, a Kyotaku-kai chegou a publicar uma Crnica da Colnia de Registro (Registro Shokuminchi-shi). Era a pioneira de publicaes semelhantes que iriam surgir em muitas colnias nipnicas. Para melhorar a administrao da colnia, a entidade enviou em 1924 uma delegao de estudos s colnias europias do Estado de Santa Catarina, onde ela estudou a fundo a gerncia agrcola, atividades cooperativistas, o sistema educacional, etc. Posteriormente a Kyotaku-kai dissolveu-se para dar lugar a uma organizao mais ampla de administrao autnoma, chamada G (Aldeia). A nova entidade herdou todas as funes da antecessora, mas com uma caracterstica diferente: os colonos que contribuam para as despesas da organizao recebiam o nome de kmin (cidados com plenos direitos). E 20 kmin elegiam um, representante para-a "Assemblia de G". Parece entretanto que essa assemblia no exerceu qualquer funo importante. Em 1928, Registro criou sua cooperativa agrcola. E os assuntos relacionados com as atividades econmicas passaram para a alada da cooperativa, saindo do mbito da G. Em 1930, a G organizou um tipo de curso suplementar da escola primria. Em 1935 construiu um hospital, que contou at com uma doao da Casa Imperial; em 36 instalou telefones rurais na colnia; e em 38 organizou uma cooperativa de assistncia mdica com apoio no hospital.

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Entrementes, crescia a ameaa da guerra. Tornava-se cada vez mais rigoroso o controle do governo brasileiro sobre os estrangeiros. E a Kaik, a empresa fundadora e matriz administrativa da Colnia de Iguape, mudou sua orientao administrativa. Como decorrncia, a organizao G dissolveu-se e em abril de 1938 foi absorvida pela Sociedade de Assistncia de Iguape. Tambm esta organizao acabou sendo fechada em novembro de 1940. Tomamos a organizao G de Registro como prottipo de associao de japoneses, no s por ter sido uma das primeiras como por ter ela desempenhado com muita eficcia as funes reais de uma associao de japoneses (nihonjin-kai). A Seinenkai (Associao Juvenil ou de Moos) de Registro comeou a funcionar em 1921, atendendo aspirao de jovens que queriam "ter uma organizao nossa na qual seja possvel estudar o portugus". Com essa finalidade, os jovens trabalharam horas extras fora de suas tarefas normais para ganhar um dinheirinho a mais destinado a reunir um fundo e construir um prdio-sede de sua associao. Anos depois, j na dcada de 30, a Associao Juvenil passa a promover sesses oratrias e competies esportivas, alm de atividades culturais. Ento j existiam na Colnia de Iguape diversas associaes de jovens que fundam uma federao. Em 1931 publicada a revista oficial Senku (O Pioneiro), que foi redenominada O Registro no ano seguinte e teve uma vida longa. A Federao das Associaes Juvenis de Iguape mostrou interesse por problemas industriais, promoveu freqentes viagens de estudos a outras regies. S encerrou suas atividades em 1941, com o rompimento das relaes diplomticas entre o Brasil e o Japo. Veremos adiante que antes de 1940 existiam poucas sociedades de senhoras na comunidade japonesa. Registro foi tambm pioneira nessa rea. Desde 1921 existia a Haha no Kai (Associao de Mes), e por volta de 1936 instalavam-se associaes de senhoras em todos os bairros. Alguns anos depois que irrompeu a guerra na China, ou seja, por volta de 1936, essas entidades, em colaborao com outras organizaes, promoveram movimentos de "contribuio para a defesa da ptria", "remessa de presentes para os combatentes", "contribuio para a oferta de um avio militar", etc.
EM 1940 HAVIA 480 ASSOCIAES DE JAPONESES

Vimos os prottipos de associao de japoneses, de jovens e de senhoras, criadas em Registro. No decorrer da dcada de 20, surgem, ao longo da linha Noroeste, numerosas colnias de japoneses, de todos os

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tamanhos. Algum tempo depois da derrubada da mata e sua queimada, como que de suas cinzas brotavam associaes de japoneses, umas aps outras. Seus objetivos: conservao de estradas, gesto de escolas, administrao de sade e higiene na colnia. Tudo isso exigia uma organizao de carter coletivo para sua execuo, Com o correr do tempo, entretanto, essas entidades sofrem transformaes em suas caractersticas. Os japoneses residentes na rea em torno da estao Cafelndia, linha Noroeste, somavam 1.048 famlias (183 famlias de lavradores independentes, 27 de arrendatrios, 397 de parceria, 373 de colonos e 68 "outras"). Esse total se reunia em 17 colnias e 28 fazendas de caf. Funcionavam 17 associaes de japoneses. Ao redor da estao Lins, igualmente na Noroeste, considerada zona de maior concentrao de japoneses do Estado, havia 1.966 famlias nipnicas (551 independentes, 9 de arrendatrios, 727 de parceria e 456 famlias de colonos e 223 "outras"). Essas famlias agrupavam-se em 39 colnias e 29 fazendas de caf. E formavam 23 associaes de japoneses. Acredita-se que havia virtualmente uma associao de japoneses em cada colnia. A verdade que existiam muitas com menos de dez famlias, e at uma microcolnia, constituda de apenas duas famlias. Em tais casos no se podia organizar uma associao nem ter uma escola prpria. Por outro lado, mesmo em fazendas de proprietrio brasileiro, quando trabalhavam muitos lavradores de parceria e colonos em grande nmero, organizava-se uma associao de japoneses. Dados referentes ao ano de 1932 mostram que ao longo da linha Noroeste funcionavam 115 associaes de japoneses e na Alta Paulista 20, somando 135 no total. Realmente a dcada de 30 representou a poca em que muitos imigrantes nipnicos se tornaram independentes. Isso quer dizer que se implantaram muitas colnias. Considera-se o curto lapso de tempo que vai de 1932 a 36 como uma fase de verdadeiro "boom" de associaes de nipnicos naquelas regies. S ao longo das duas ferrovias principais contavam-se 214 associaes de japoneses. Desconhece-se o nmero exato de associaes de japoneses existentes em todo o Brasil na poca. Mas em 1932 havia 223 (Anurio Brasil), nmero que saltou para 480 em 1940, segundo Zaihaku Hojin Shakai no Bunka Oyobi Keizai Shos (Diversos Aspectos Culturais e Sociais da Comunidade Japonesa do Brasil), de Kiyotaka Emi. A dimenso dessas entidades variava de alguns associados, quando pequenas, at 150 ou mais quando grandes. Quando existiam muitas associaes de japoneses numa zona, nascia naturalmente uma federao. Conforme a regio, organizava-se ainda uma entidade superior.

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Em face da expanso de lavradores nipnicos na Noroeste, em 1921 instalou-se em Bauru um consulado do Japo. Em seguida fundou-se a Federao das Associaes de Japoneses da Noroeste. Esta organizao figura como uma das entidades signatrias da solicitao, ao governo nipnico, do emprstimo de 850 mil yens a juros baixos. Todavia, devido a ainda incipiente capacidade econmica da maioria dos japoneses da regio, a Federao teve vida curta. No entanto, em 1933, atravs da proposta da Federao de Associaes de Japoneses de Promisso, foi organizada a Federao de Associaes de Japoneses da rea de Jurisdio de Bauru. A Federao realizava uma assemblia geral por ano. Sua pauta de deliberaes inclua itens como: "providncias a serem tomadas no futuro sobre o problema do movimento antijapons"; "proposta Sociedade de Pais sobre a educao"; "obteno de direito de voto para japoneses residentes no Brasil, em eleies brasileiras"; "sobre a criao da Confederao de Associaes de Japoneses do Brasil"; "atuar junto Kaik em prol da distribuio de novos imigrantes tambm para os proprietrios de terra patrcios"; "realizao de um censo dos japoneses residentes na rea de jurisdio de Bauru"; "envio de um grupo de niseis ao Japo por ocasio das comemoraes dos 2.600 anos da fundao do Imprio", "envio de representantes (da comunidade nipnica do Brasil) para manifestar apoio e simpatia aos soldados imperiais em campanha no Incidente NipoChins", etc. So propostas das mais variadas naturezas; no entanto, muitas foram concretizadas. Temos a uma sugesto para a criao de uma Confederao das Associaes de Japoneses do Brasil. Essas e outras manifestaes idnticas levaram constituio, em 1938, na cidade de So Paulo, da Associao Central de Japoneses do Brasil. Essa entidade porm dissolveu-se em menos de dois anos da fundao, por falta de apoio justamente da Associao de Japoneses da Cidade de So Paulo. E nunca mais se organizou uma entidade reunindo todos os japoneses do pas. Quase ao mesmo tempo que as associaes de japoneses, foram fundadas associaes juvenis (ou de moos), em diversas localidades. Entre seus objetivos figuravam com destaque o estudo de portugus, como no exemplo de Registro. Na linha Mogiana constituiu-se at um Grupo Jovem de Estudos de Portugus. Geralmente essas associaes visavam promover estudos (no s de portugus como de aperfeioamento em japons e outras matrias) atendendo sede de saber dos jovens, ao lado de objetivos outros como confraternizao entre jovens, educao moral e cvica, etc. J na segunda metade da dcada de 20, multiplicam-se as colnias nipnicas. As associaes de moos acompanham essa expanso.

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A essa altura, os principais objetivos das associaes juvenis passam a incluir sesses oratrias, beisebol, atletismo, etc. Essas atividades atingem o seu clmax em fins da dcada de 30, como veremos na parte competente. Na regio de Lins, a primeira associao de jovens foi instalada em 1924. At 1929 criaram-se nove entidades do gnero. Ento fundou-se a Associao Panlinense de Moos. Prossegue a criao de sociedades juvenis nas colnias e fazendas. Assim, em 1936, a pioneira Associao Panlinense de Moos se dividiu em trs: Associao Panlinense de Moos (14 filiadas), Federao Panguaimbense de Associaes de Moos (7 filiadas) e Unio Pangetulinense de Associaes de Moos (8 filiadas). Em 1932, na Noroeste existiam 70 associaes japonesas de moos. Da em diante cresce o nmero de federaes naquela regio, desconhecendo-se no entanto o nmero total de federaes e de suas filiadas. A mesma tendncia se observou em todas as regies do pas onde havia colnias japonesas. Em 1932 havia 140 associaes japonesas de moos no pas. Algumas associaes juvenis realizaram importantes servios de cunho social. Na poca, o servio postal na zona rural caracterizava-se pela sua precariedade. As associaes juvenis da regio de Lins uniramse para servir de intermedirios entre os correios e os moradores locais. O servio foi um sucesso, chegando a 780 mil correspondncias distribudas por ano. A taxa de servio recolhida dos usurios constituiu fonte de renda para a Associao Panlinense de Moos. Alis, ela conhecida tambm por ter sido a pioneira na sua "nacionalizao". Em 1940 passou todos os cargos de direo para as mos de brasileiros natos, mudando o nome para Associao Esportiva Linense. Na realidade, com o agravamento da situao internacional, s as entidades nacionalizadas poucas sobreviveram. As demais foram fechadas ou suspenderam suas atividades. No comeo das atividades colonizadoras quando se derrubava mata virgem para comear a cultivar caf e outras culturas as donas de casa no dispunham de tempo para reunir-se e organizar uma associao. As entidades femininas da zona rural ento eram quase todas de jovens (joshi seinen-kai). Rarssimas as associaes de senhoras como a de Registro.
ORGANIZAO DA REA DE EDUCAO

A Associao de Japoneses como se viu repetidas vezes tinha quase sempre como principal objetivo a construo de escola e sua manuteno. De acordo com um levantamento feito em 1932, das 187

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escolas elementares nipnicas, 141 estavam sob a administrao de associaes de japoneses. Entre as demais escolas, havia estabelecimentos mantidos por cooperativa de ensino, associao autnoma de educao e mesmo associao de moos. A partir de 1933 verifica-se rpido aumento de escolas japonesas. Em 1939 existiam486 estabelecimentos do gnero, com cerca de 30 mil alunos. Nos primeiros anos da imigrao, nem todos os japoneses se preocupavam com a educao dos filhos. De acordo com Shungoro Wako, "em 1918, na regio de Ribeiro Preto, ento o centro de maior concentrao de imigrantes japoneses, foi realizado um levantamento sobre educao em cerca de 1.000 famlias. Ningum demonstrou interesse pelo ensino da lngua japonesa". Os pais pensavam que bastava ensinar portugus aos filhos ou dar educao a eles em escola brasileira. Acontece que ento, fora das grandes fazendas, inexistia escola brasileira. Os pais s pensavam no ensino de portugus aos filhos. O mesmo sucedia na colnia de Registro, por volta do ano de 1920. No decnio de 20, quando se avolumam as concentraes de japoneses na linha Noroeste, associaes de japoneses comeam a instalar escolas elementares. Mesmo ento os pais no sabiam se davam educao brasileira, japonesa ou mista aos filhos. Essa fase durou vrios anos. Em 1927, o cnsul-geral do Japo em So Paulo, Sukeyuki Akamatsu, reuniu representantes de escolas japonesas e professores para discutir assuntos de educao. Da reunio resultou a fundao da Zaihaku Nihonjin Kyoiku-kai (Associao Educacional dos Japoneses do Brasil). Sob a gide dessa entidade, o ensino de japons comeou a se difundir e a seguir expandiu-se rapidamente. Havia casos em que, por se tratar de localidades muito afastadas dos centros urbanos, mesmo que as colnias nipnicas construssem prdios escolares e solicitassem a nomeao de professor s autoridades de ensino do Estado, o seu atendimento se tornava problemtico, demorado. E mesmo que fosse nomeado um professor quase sempre professora normalista, relutava em assumir a funo, por se tratar de uma zona rural, "no meio do mato". s vezes ficava-se s com o ensino de japons. E havia casos em que a colnia japonesa construa at uma residncia junto escola, a fim de facilitar a vida do professor nomeado pelo governo. Por outro lado, quanto ao ensino de japons, contava com firme apoio do governo de Tokyo. Em 1929, por intermdio do cnsul-geral Nakashima, fundou-se uma nova entidade, a Zai So Paulo Nihonjin Gakko Fukei-kai (Associao de Pais de Alunos de Escolas Japonesas de So Paulo), dissolvendo-se a anterior Associao Educacional dos Japoneses do Brasil. Tratava-se agora de uma pessoa jurdica oficialmente reconhecida.

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Em 1935 contava 36 filiais regionais. Todas as escolas primrias mantidas por japoneses participavam da nova entidade. Em maro de 1936 ela reformou seus estatutos e mudou o nome para Burajiru Nihonjin Kyoiku Fukyu-kai (Associao de Difuso do Ensino de Japoneses do Brasil). Essa entidade publicava uma revista, Reimei (Alvoradas), e chegou a nomear inspetores escolares a fim de aumentar a eficincia do ensino do idioma nipnico. Mas na dcada de 30 o governo brasileiro reorganiza o sistema de ensino, dando-lhe cada vez mais uma orientao nacionalista. Em abril de 1934, a Secretaria de Educao do Estado de So Paulo adota uma nova orientao em relao ao ensino de estrangeiros residentes no Estado, tomando as seguintes medidas: probe o ensino de lngua estrangeira a menores de dez anos; o ensino de portugus, geografia e histria deve ficar a cargo de professor diplomado, brasileiro nato ou naturalizado, cumprindo-se o tempo de aulas determinado pelas autoridades; o ensino de lngua estrangeira ficar a cargo de professor aprovado em exame de habilitao; os livros para ensino de lngua estrangeira devero ser previamente aprovados pelas autoridades de fiscalizao. Como as escolas primrias construdas por japoneses consideravam importante o ensino de portugus, a maioria estava devidamente legalizada. A situao de legalidade de escolas primrias de japoneses em 1932 era a seguinte: ESCOLAS PRIMRIAS DE JAPONESES (EM ABRIL DE 1932)
Escola Nmero Professores Japons Estadual Estadual e particular Particular Ainda no reconhecida Municipal Municipal e particular Sem comunicao Total Fonte: Anurio do Brasil. 24 23 54 27 18 10 31 185 22 27 75 34 18 11 24 211 Portugus 23 23 46 13 20 15 1 141 45 50 121 47 38 26 25 352 Total

Acrescente-se que existiam 51 escolas sem professor de portugus e 11 sem mestre de japons. A mdia de alunos por escola ficava em 49, o mximo de 243. Havia escolas (ou cursos) bem modestas, que funciona-

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vam em cabanas com dez ou menos alunos. Por lei, todo estabelecimento de ensino era obrigado a ter o reconhecimento oficial para funcionar. Mas em lugarejos do interior, situados longe da cidade e com poucos alunos, a escola funcionava de modo precrio. Nessas circunstncias, no poucas existiam clandestinamente, sem mesmo a necessria comunicao repartio competente. Quase todas s escolas elementares japonesas seguiam o regime de seis anos do curso primrio, igual ao adotado no Japo. E existiam escolas com cursos de oito anos (dois complemen tares). Nos casos h pouco citados, de miniescolas de pequenos povoados (colnias), o regime podia se reduzir a dois ou trs anos ou at a "tempo indeterminado", dependendo da capacidade financeira dos pais. A qualidade do ensino de japons pode ser aferida pelos nmeros seguintes: entre os 211 professores, sendo 172 homens e 39 mulheres, arrolados na relao, 85% tinham o curso ginasial completo ou superior a esse nvel no Japo, de modo que no se podia considerar baixa a sua qualificao. A remunerao do professor dependia das contribuies mensais pagas pelos pais, razo de 5 mil ris por aluno. Quando havia mais de dois alunos por famlia, gozava de descontos. Por isso poucos mestresescolas percebiam mais de 200 mil ris mensais. Dizia-se que devido ao baixo salrio bons professores no permaneciam muito tempo na escola dando aulas. O nmero de escolas construdas e mantidas por associaes de japoneses ou organizaes congneres aumenta muito at por volta de 1940. Na mesma poca, o governo brasileiro fortalece a poltica nacionalista e torna cada vez mais rigoroso o controle de estrangeiros. De 1938 a 1939 (quando irrompe a guerra na Europa) so baixadas medidas sobre "controle de associaes de estrangeiros", "controle de impressos em lngua estrangeira", "regulamento sobre a assimilao de filhos de estrangeiros", etc. E ainda "proibio de ensino da lngua estrangeira a menores de 14 anos", "limitao de aulas de idioma estrangeiro em escolas particulares", etc. J vimos que os japoneses no se interessavam s pelo ensino do idioma nipnico. Sua aspirao era formar homens instrudos, se possvel falando tanto o portugus como o japons. E se esforavam no limite mximo de suas capacidades econmicas para mandar os filhos estudar em cursos secundrios e superiores. Pode-se dizer que o ideal maior dos pais seria formar "doutores", e no mediam esforos e sacrifcios a fim de enviar os jovens para estudar em So Paulo. Mas na realidade poucos eram ainda os pais em condies de custear estudos nos cursos secundrios e superiores.

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Kiyoshi Kawahara ingressou na Faculdade de Medicina de So Paulo ao lado de Massaki Udihara, mas no chegou a se formar, por ter falecido durante o curso, vtima de molstia. Em 1939 formaram-se, alm de Udihara, em curso superior, Maria Haga, Joo Sussumu Hirata e Teiichi Haga, todos em direito. Um ano antes havia se formado Luiz Yukishige Tamura, tambm em direito, na Faculdade do Largo So Francisco. O nmero de estudantes filhos de japoneses vai aumentando de ano para ano. J em 1934 o seu nmero, incluindo secundaristas, normalistas, de contabilidade, etc, ultrapassava uma centena. Foi ento fundada a Liga Estudantina Nipo-Brasileira (ver "Os niseis entre dois penhascos"). Muitos pais ento sentiam ser necessrio ensinar aos filhos pelo menos o japons do curso elementar e depois pass-los a cursos secundrios e superiores brasileiros. E acontecia tambm de japoneses manterem cursos acima do primrio. A Associao de Japoneses de Presidente Prudente, alm da escola elementar at ento mantida, instalou em 1938 a Escola de Comrcio Presidente Prudente. E no ano seguinte colocou sob sua administrao o Ginsio So Paulo, pertencente a brasileiros. A colnia de Bastos mantinha nove escolas primrias. Em 1939, atendendo a pedidos de interessados, fundou um ginsio, que passou a funcionar como ginsio do Estado. c) Organizaes destinadas a cuidar da higiene e da assistncia mdica. O Hospital Japons Entre os objetivos das associaes de japoneses destacavam-se a organizao de servio de higiene e de assistncia mdica nas colnias. Mas, at 1940, as nicas colnias que contavam com instalaes de assistncia mdica e mdicos para cuidar da higiene e sade da populao local eram Registro, Aliana, Bastos e Tiet, no Estado de So Paulo, e no Estado do Par, a colnia de Acar (atual Tome-Au). Por conseguinte, apesar da ateno dada pelas associaes de japoneses questo da sade, freqentemente registravam-se srias ocorrncias de molstias. E isso aconteceu no s nos primeiros tempos da imigrao, como depois de 1920, quando imigrantes nipnicos formavam colnias. No comeo da sua fase de independncia econmica, as pssimas condies de habitao, alimentao inadequada, excesso de trabalho, falta de orientao quanto s condies sanitrias em ambiente tropical desconhecido, etc. constituam no raro causas de doenas graves. E mesmo na segunda metade da dcada de 30, por causa da extrema mobilidade dos cotonicultores, suas moradias continuavam to pobres e precrias como na fase inicial da colonizao, como vimos em "Tragdias causadas pela

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pressa do sucesso", do Captulo 2. A prpria alimentao apresentava graves falhas quanto ao seu valor nutritivo. Tudo isso resultava em precrias condies de sade, causando muitas doenas. A malria foi a enfermidade que mais vtimas produziu entre os imigrantes japoneses. Ela grassou no comeo da imigrao e tambm depois, em 1925 e 26. Nesses anos, na zona de Ourinhos, linha Sorocabana, entre 169 famlias nipnicas, 144 foram afetadas pela maleita, provocando a morte de 43 pessoas. Segundo uma pesquisa da Dojinkai (Sociedade Japonesa de Beneficncia no Brasil), da qual falaremos mais adiante, entre 1.319 pessoas de 326 famlias, examinadas nas linhas Douradense e Paulista, foram detectados 760 doentes de malria. Felizmente, desde ento cai o nmero de maleitosos. No entanto, continuaram a aparecer portadores de outras doenas: tracoma, disenteria amebiana, ancilostomose duodenal, tuberculose pulmonar e doenas mentais. Destacava-se o tracoma, que atingia numerosas colnias japonesas do interior. Segundo o resultado de uma pesquisa feita entre alunos de escolas de japoneses, verificou-se que na zona de Birigi 86% dos alunos estavam contaminados pela doena; em Guarant alcanava 98%. Quanto a doenas mentais, no Manicmio de Juqueri (atual Franco da Rocha) em 1939 estavam internados 185 japoneses (60% homens e 40% mulheres). O mais grave que se registrava uma tendncia de aumentar de ano para ano. Na dcada de 30, o Departamento de Sade do governo do Estado de So Paulo instalou postos de sade no interior, porm em nmero insuficiente para atender a todas as regies. E fora das cidades havia poucos mdicos particulares. As despesas com tratamento mdico situavam-se a alturas inacessveis ao bolso dos lavradores em geral. Na comunidade japonesa registraram-se muitos casos de impossibilidade de chamar mdico para assistir a um doente na famlia. Tomando conhecimento dessa situao, o Ministrio do Interior do Japo concedeu, em 1923, um subsdio de 26 mil yens, destinado instalao de servios de assistncia mdico-sanitria para os imigrantes nipnicos. Esse auxlio passa a ser distribudo atravs do Gaimusho (Ministrio dos Negcios Estrangeiros), a partir do ano seguinte. Contando com esse fundo, o cnsul-geral Saito conseguiu formar a Zai Burajiru Nihonjin Dojinkai (Sociedade Japonesa de Beneficncia no Brasil), conhecida mais por Dojinkai, com a participao de 29 scios mantenedores. Em outubro de 1926 consegue o reconhecimento do governo brasileiro como sendo uma fundao. Posteriormente, constri o Hospital Japons, conforme est relatado linhas adiante. Em 1939 mudou o nome para Sociedade de Beneficncia Santa Cruz. Havia ento mais de uma dezena de mdicos nipnicos com diplo-

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ma brasileiro. Mas, para atender aos patrcios espalhados em amplas reas do pas, tornava-se necessrio saber qual a melhor maneira de atender s suas necessidades no campo de assistncia mdica. Depois de consultar associaes de japoneses e de moos de muitas localidades, a Dojinkai passou a prestar os seguintes servios: distribuio de soros antiofdicos; pesquisa de ocorrncia de tracoma e campanha para sua erradicao; campanha de erradicao da malria, ancilostomose duodenal; instalao de postos mdicos no interior (Santos, Lins, Bauru, Presidente Prudente); visita de mdicos s colnias do interior para diagnstico e tratamento "in loco" de doenas; distribuio, a preo de custo, de medicamentos necessrios no lar; formao de elementos auxiliares do servio mdico; instalao de sanatrio de internao de doentes de tuberculose pulmonar em Campos do Jordo (depois chamado Sanatrio So Francisco Xavier). Alm da Dojinkai havia ainda as seguintes organizaes beneficentes mantidas por japoneses: Ryoyukai: Japoneses residentes em Campos do Jordo fundaram um sanatrio em 1931, a fim de atender ao grande nmero de vtimas de tuberculose pulmonar que procuravam aquela cidade, conhecida pelo seu clima ameno. Rinsu Gojo Aizen Kumiai (Cooperativa Beneficente de Ajuda Mtua de Lins): fundada em maro de 1932. uma espcie de cooperativa de assistncia mtua. Jinrui Aizen-kai San Pauro-shi Bunkai (Seo de So Paulo da Associao de Amor Humanitrio: uma filial da entidade matriz existente no Japo. Fundada em 1930, atendia a mu'tos doentes que vinham do interior em busca de assistncia mdica. O Hospital Japons, inaugurado em 29 de abril de 1939, tornou-se a maior instituio de assistncia mdica da comunidade japonesa. Desde sua fundao, a diretoria da Dojinkai julgou indispensvel construir um hospital. Tanto assim que j em 1926 adquiriu um terreno de 15.000 m 2 na rua Santa Cruz, So Paulo. Em 1931, por iniciativa do cnsul-geral Iwataro Uchiyama, organizou-se uma comisso de construo do Hospital Japons de So Paulo. No dia 18 de junho de 1933, data em que se celebrava os 25 anos da imigrao nipnica no Brasil, foi lanada a pedra fundamental do nosocmio. O hospital tem cinco andares acima do solo e um no subsolo, rea construda de 9.691 m2, 76 quartos, 200 leitos. Era ento o mais completo do pas quanto a equipamentos e instalaes. A obra custou 4.979 contos de ris (995.856 yens). Dessa soma a Famlia Imperial contribuiu com 50 mil yens, o governo japons, com 150 mil e contribuies de entidades e

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pessoas fsicas japonesas chegaram a 400 mil yens. O restante foi coberto por japoneses residentes no Brasil. No s do Estado de So Paulo como residentes em outros Estados organizaram-se e reuniram 1.250 contos de ris. Foi o empreendimento que mais uniu os japoneses aqui residentes, antes da guerra. O Hospital Japons (depois chamado Hospital Santa Cruz) realizou sua sesso de inaugurao em abril de 1939; o incio de atendimento hospitalar se deu em setembro de 1940. Em conseqncia do rompimento das relaes diplomticas entre Brasil e Japo, o hospital passou administrao de outra entidade, nacional, a fim de evitar o seu confisco pelo governo como propriedade de pas inimigo. A situao se perpetuou, e o hospital foi afastado das mos de japoneses. d) Entidades econmicas dos lavradores
O CAMINHO DO COOPERATIVISMO

A primeira organizao de carter econmico, ou mais precisamente financeiro, fpi a Tanomoshik, uma tradicional prtica de ajuda mtua existente no Japo desde o sculo XIII. Tambm chamado simplesmente tanomoshi ou k, baseada na confiana entre pessoas, sem complicaes e formalidades de ordem legal. Funciona entre grupos de mesma profisso, moradores de uma aldeia, etc. No caso aqui em exame, comeou pela necessidade que tinham os imigrantes da fase inicial de remeter dinheiro ao Japo. Reunia-se um grupo e estabelecia-se uma quantia x, necessria remessa, mediante a contribuio dos interessados. Regra geral, estabelecia-se o entendimento de que os mais necessitados seriam os primeiros a receber o valor reunido. Quanto sistematizao do financiamento rural no Brasil, s comeou em 1938, e sua aplicao efetiva somente no ps-guerra. Anteriormente quase no havia agncias bancrias na zona rural para financiar atividades agrcolas. Por isso, na segunda metade da dcada de 20, quando imigrantes nipnicos formavam colnias no interior paulista, o financiamento de lavradores se limitava a operao de emprstimos entre particulares. Preenchendo esse vazio, a tanomoshi se difundiu amplamente nos meios coloniais japoneses como um meio de financiar as atividades agrcolas. Como se trata de uma organizao particular e espontnea, reunindo, geralmente, pequenos grupos, existem raros registros escritos a respeito de sua atuao. Todavia, na Sorocabana existiram em forma de sociedades organizadas com o nome de Tanomoshik de Dez Mil Ris, Cooperativa de Poupana Sanhyo, Cooperativa de Formao de Capital Industrial e outras.

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Ao se aventurarem na batalha de sua independncia econmica, formando ncleos coloniais na sua "marcha para Oeste", os imigrantes japoneses sentiram a necessidade de uma organizao de carter econmico mais ampla do que a simples tanomoshi. Na atividade agrcola necessrio vender os produtos e comprar insumos, implementos agrcolas, etc. Ao escolherem o caminho da lavoura por conta prpria, deixando a fazenda de caf, os primeiros imigrantes encontraram uma srie de dificuldades e obstculos. Havia a barreira da lngua, que, na melhor das hipteses, levaria anos para ser superada, e era uma das causas que os foravam a formar colnias s de japoneses. E as diferenas nos mtodos de comercializao dos produtos (em comparao com os do Japo) tambm constituam fortes bices e, combinados com o problema da comunicao, formavam unia muralha quase intransponvel. Em face dessa realidade, os imigrantes pensaram numa organizao de carter econmico como instrumento de autodefesa. As associaes de japoneses tinham no raro, entre suas funes, algumas de carter puramente econmico. No exemplo da Colnia de Registro, a Associao de Japoneses, logo aps sua fundao, instalou um centro de beneficiamento de produtos agrcolas, depsitos e at meios de transporte. Mas, ao perceber que existia incompatibilidade entre as funes de entidades de administrao autnoma da colnia e atividades econmicas, j em 1923 realizou uma reunio preparatria para tratar da criao de uma cooperativa de venda e compra coletivas. Na realidade, anos antes dessa deciso da Associao de Japoneses, um grupo de colonos havia fundado a "Cooperativa de Produo e Industrializao de Cana". E at 1925, cada uma das cinco "sees" da colnia operava uma organizao de carter cooperativista. A Cooperativa Agrcola de Cotia, hoje a maior cooperativa do gnero na Amrica do Sul, resultou do seguinte: a partir de 1914 comeou a crescer o nmero de plantadores de batata na ento aldeia de Cotia, arredores de So Paulo, que apresentava condies locais diferentes das colnias criadas na hinterlndia. Em 1916, j eram quase 50 famlias que se dedicavam cultura da batata-inglesa. Organizou-se logo a Associao de Japoneses e instalou-se uma escola primria de japoneses. A seguir a Associao ampliou sua rea de ao com o estudo da tcnica de produo, aquisio coletiva de fertilizantes, acordo de salrio de trabalhadores, limitao de rea de plantio dos associados a fim de evitar a superproduo, etc. No entanto, tambm neste caso, no havia compatibilidade entre a organizao de autogoverno funo precpua da Associao de Japoneses com as atividades puramente econmicas. E, j em 1921, comeou-se a pensar na organizao de uma cooperativa. Depois de muitas reunies e discusses, finalmente a 27 de dezembro de 1927

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instalou-se a Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Limitada dos Produtores de Batata em Cotia S. A. A organizao de numerosas cooperativas agrcolas na comunidade japonesa do Brasil ocorreu antes da II Grande Guerra, quando a grande maioria dos nipnicos se dedicava agricultura. No Japo, j em 1900 fora promulgada a lei das cooperativas, de modo que por volta de 1920 o movimento cooperativista rural havia se expandido muito nesse pas. Por isso, entre os imigrantes nipnicos existia crescente nmero de elementos conhecedores e com experincia de cooperativismo agrcola. Justamente por causa dessa circunstncia, ou seja, por ter o movimento cooperativista se desenvolvido entre os imigrantes com base no modelo japons, as cooperativas ento fundadas apresentavam caractersticas semelhantes s nipnicas. Muitas tinham a estrutura de cooperativa de crdito, venda e compra ao mesmo tempo. Nesse aspecto elas diferiam das numerosas congneres fundadas por imigrantes europeus no Sul do Brasil. As cooperativas agrcolas de japoneses fundadas na dcada de 20 e 30 eram numerosas e geralmente de reduzida dimenso. No caso de Registro, citado repetidas vezes, a cooperativa legalmente constituda foi a Cooperativa Agrcola de Registro, instalada em abril de 1928. Anteriormente, porm, alm dessa, haviam surgido cooperativas de produtores de caf, de fruticultores, de criadores de bicho-da-seda, de produtores de ch, de banana, etc, chegando a mais de uma dezena, mas que logo desapareceram. O fenmeno de rpida proliferao, seguida de extino em pouco tempo, no sucedeu somente em Registro, dando-se com muita freqncia nas outras concentraes de nipnicos. E praticamente todas se formavam motu prprio, sem se importar em obedecer legislao pertinente. No Brasil, a Lei de Sindicatos Profissionais e de Sociedades Cooperativas de 1907 pode ser considerada a primeira legislao cooperativista. Mas entre os lavradores japoneses ningum conhecia tais leis e nem havia nenhuma vantagem em registrar uma cooperativa. Por isso, na prtica, todas as cooperativas ento surgidas apresentavam carter espontneo, o mesmo acontecendo com as cooperativas de imigrantes europeus dos estados do Sul. Todavia, a partir de 1927 se organizam, a comear pela CAC, cooperativas agrcolas de japoneses devidamente legalizadas: a Cooperativa Agrcola de Cotia CAC (1927), Registro, Katsura e Sete Barras (1928), Juqueri (1929), Hirano (1930), Promisso, Igarapava (1931), num total de oito, em cinco anos. Essa'formao de cooperativas legalizadas se deve orientao do Consulado Geral do Japo em So Paulo.

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No mesmo consulado funcionava uma Seo Agrcola, que orientava lavradores japoneses sobre assuntos relacionados agricultura. Ao ser criado no Japo o Ministrio de Assuntos Ultramarinos em 1929, a Seo Agrcola do consulado passou para a jurisdio do novo ministrio, mudando o nome para Seo de Fomento Industrial, passando no s a orientar os lavradores sobre a agricultura como ampliando suas funes at a orientao sobre a organizao de entidades agrcolas. Considerando necessrias as cooperativas para o desenvolvimento dos lavradores nipnicos, ela chegou a subvencionar as despesas de organizao de novas cooperativas. Somente as cooperativas legalmente organizadas gozavam do direito a essas subvenes. Foi a mola propulsora do surgimento das primeiras cooperativas agrcolas de japoneses legalmente registradas. Graas subveno, as oito cooperativas instalaram depsitos, mquinas de beneficiar arroz, mquinas de beneficiar caf, etc. A subveno do governo japons s foi concedida s oito cooperativas referidas. H algum tempo, entretanto, muitas colnias sentiam a necessidade de uma organizao do gnero, registrando-se assim rpido aumento de cooperativas agrcolas nas concentraes nipnicas. Segundo um levantamento feito pela Seo de Fomento Industrial do Consulado Geral do Japo em So Paulo, temos a seguinte relao de cooperativas agrcolas organizadas por japoneses: NMERO DE COOPERATIVAS AGRCOLAS DE JAPONESES
Ano Registradas Espontneas (no registradas) 25 44 38 35 Total

1930 1931 1932 1933 1934

5 8 11 13 18

5 33 55 51 53

Fontes: Seo de Fomento Industrial, Consulado Geral do Japo e Hatten-shi.

Se verdade que a expanso significativa do cooperativismo agrcola entre os japoneses do Brasil na primeira metade da dcada de 30 se deveu ao estmulo e orientao proporcionados pela Seo de Fomento Industrial do Consulado, tambm houve outro importante fator. Em 19 de dezembro de 1932 o governo brasileiro baixou uma lei de cooperativas. Pela primeira vez a lei atribua um carter de pessoa jurdica especial s cooperativas, estabelecendo benefcios fiscais, como isenes de alguns impostos. De acordo com a nova legislao, o Estado de So Paulo criou,

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pela lei estadual n. 5.966, o Departamento de Assistncia ao Cooperativismo (DAC) dentro da Secretaria da Agricultura. O DAC, por seu turno, orientou e estimulou a formao de cooperativas agrcolas de lavradores japoneses. A combinao desses fatores resultou no aumento de cooperativas agrcolas organizadas de acordo com a lei. Todavia, apesar do meritrio trabalho do DAC, ainda existiam muitas cooperativas espontneas (no legalizadas) conforme demonstra o quadro, porque muitas das cooperativas de nipnicos eram de pequeno tamanho. Em 1934, por exemplo, a mdia de associados de 18 cooperativas agrcolas registradas no passava de 160, o que pouco. No mesmo ano, a mdia de cooperados das 35 cooperativas espontneas era de apenas 42. Nessas condies, muito difcil se tornava arrecadar fundos necessrios para cobrir despesas de registro e de contabilidade, etc, exigidos por lei. Por isso, elas continuavam prestando servios aos lavradores, realizando as atividades coletivas necessrias, porm sem o registro. Segundo alguns documentos da poca, existiam muitas minicooperativas, em especial em localidades interioranas do Estado de So Paulo ou mesmo no Estado de Gois. Algumas delas eram to inexpressivas que sua localizao hoje impossvel. Elas foram organizadas ao lado de cooperativas at hoje bem conhecidas como a de Mogi das Cruzes, Alvares Machado, Alianas, etc. Mesmo na poca no se conhecia o nmero certo das cooperativas agrcolas de japoneses. Todavia, parece que chegava quase a se igualar ao de associaes de japoneses. Em 1934, quando o surto de cooperativismo comea a impressionar observadores, o cnsul-geral Iwataro Uchiyama promoveu uma reunio de "Executivos das Cooperativas Agrcolas Japonesas do Brasil". Dessa reunio originou-se a organizao da Cooperativa Central Agrcola Nipo-Brasileira! Essa entidade prestou relevantes servios como rgo de orientao e ligao das numerosas cooperativas rurais de nipnicos ento formadas em muitas regies do pas. No momento da criao da Cooperativa Central, dela participaram 16 cooperativas. Esse nmero aumentou para 20 em 1939. Ento havia em mdia 356 cooperados por cooperativa filiada. A CAC j contava 1.620 associados, desenvolvendo-se como uma organizao econmica atuante no s numa localidade, mas abrangendo muitas, em diversas regies. Durante a guerra (maro de 1942), a Cooperativa Central Agrcola NipoBrasileira mudou o seu nome para Cooperativa Agrcola Central de So Paulo. No decnio de 30, a agricultura de japoneses se divide claramente em dois tipos ou padres: o tipo interiorano e o tipo suburbano. Conseqen-

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temente, as cooperativas tambm seguem esses padres. Os de tipo suburbano aumentam e crescem acompanhando a expanso e o desenvolvimento extraordinrio da cidade de So Paulo: CAC, Juqueri (a atual Sul-Brasil), Mogi das Cruzes, Suburbana de So Paulo, Itaquera, chegando a somar dez cooperativas. Mas as cooperativas mais numerosas e ativas na segunda metade da dcada de 30 pertenciam ao tipo interiorano. Como j foi visto, tendo como marca divisria a crise mundial de 1930, a agricultura do interior paulista sofreu profundas alteraes nos seus produtos principais. At ento o caf era o rei das culturas agrcolas e o esteio da economia nacional. Por conseguinte, os japoneses buscavam terras nas colnias do interior para cultivar caf e a se fixavam. Mas depois do "craque" de 29, o preo do caf cai muito e, com a proibio do plantio da rubicea no Estado de So Paulo, comea a expandir, em seu lugar, a cultura de algodo. Por isso, depois de 1935, os imigrantes japoneses que terminavam o prazo contratual nas fazendas de caf passam a arrendar terras para plantar algodo e outras culturas. Todas culturas de curto prazo, de maneira que se julgava desnecessrio e mesmo inconveniente imobilizar capital em compra de terras. S que os japoneses, mesmo em se tratando de arrendatrios, costumavam gerar concentraes de dimenses considerveis. E a organizavam associaes de japoneses, levantavam escolas primrias japonesas e fundavam cooperativas agrcolas. A organizao de cooperativas por lavradores arrendatrios se devia ao algodo. Embora a produo de algodo se expandisse muito, o sistema de financiamento rural era muito precrio. O Consulado Geral do Japo em So Paulo reuniu ento representantes de produtores de algodo de vrias regies junto com representantes da indstria txtil japonesa para uma "Conferncia de Algodo", com o fito de estudar um meio de financiar os cotonicultores. Isto resultou na formao dos "Grupos de Cinco" cotonicultores. Consistia no seguinte: as empresas txteis japonesas forneciam financiamento adiantado a esses Grupos de Cinco. Era o financiamento do plantio. E os Grupos dos Cinco evoluem facilmente para uma pequena cooperativa, tendo como base um bairro ou distrito de colnia. Destarte, no final da dcada de 30, surgem numerosas pequenas cooperativas agrcolas na hinterlndia paulista. Tomando como exemplo Marlia, havia a Cooperativa de Showa (17 cooperados), Cooperativa Agrcola da Segunda Colnia Mesquita (25) e Cooperativa Koei(30). Na mesma Conferncia do Algodo, a Cooperativa Central Agrcola props a criao de poderosas cooperativas de 300 a 500 membros, com base nos Grupos dos Cinco. Cada uma das cooperativas manteria e administraria uma usina de benef iciamento de algodo para cada 300 mil

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arrobas de algodo produzidas. As despesas de instalao da fbrica seriam cobertas da seguinte maneira: um tero pelos produtores, o restante por emprstimo feito de terceiros a juros baixos. At ento os cooperados que produziam algodo limitavam-se a vend-lo usina de beneficiamento operada por particulares. Passando a operao de beneficiamento para a cooperativa, os cooperados teriam um lucro adicional. Essa nova orientao provocou interesses de produtores de grandes colnias japonesas. Em conseqncia, entre 1938 e 40 foram fundadas as cooperativas de A vare, Vera Cruz, Araatuba, Presidente Prudente, Pompia, Marlia, Paraguau, Taquaritinga, Monte Alto, Tup, Birigi, Londrina, etc. Antes, j existiam 11 cooperativas, entre elas a de Bastos, Aliana, Tiet, Hirano, trabalhando com usinas de beneficiamento de algodo prprias ou recorrendo a terceiros, beneficiando o produto. Em resumo, as cooperativas agrcolas de lavradores japoneses se encontravam em fase de grande expanso e atividade na hinterlndia. Tiveram, contudo, curta durao. Praticava-se a cultura de algodo no somente em novas zonas de terras de arrendamento como nas colnias j existentes ao longo da linha Noroeste. At mesmo colnias conhecidas por sua orientao policultural, como Bastos, procuravam aproveitar o "boom" da cotonicultura. A produo de algodo, no caso de Bastos, teve a seguinte evoluo: 1930 4.500 arrobas 1934 481.700 arrobas 1938 519.420 arrobas Em cinco anos, a contar de 1930, a produo centuplicou, chegando a participar com 80% do valor total das vendas da cooperativa local. Essa expanso continuou at a II Grande Guerra. Acontece que, como j dissemos, na poca essa lavoura era predatria: como a monocultura do algodo esgota a fertilidade do solo com rapidez, a produtividade caiu em poucos anos. Isso provocou a migrao de lavradores em busca de novas terras. O fenmeno se observou na colnia especial (ij-chi), como Bastos, onde os lavradores deveriam estar firmemente radicados. No caso do colono da fazenda de caf, que passou diretamente a lavrador arrendatrio, tal mobilidade era mais evidente e freqente. Shungoro Wako, que procedeu a um levantamento de cerca de 11 mil famlias da "jurisdio de Bauru" (compreendendo a Noroeste e Alta Paulista), verificou o seguinte: os imigrantes se achavam, em mdia, h 11 anos no Brasil e se mudavam a cada dois anos e meio. Ao longo da

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ferrovia Noroeste em 1935 residiam 7.459 famlias de lavradores nipnicos; em apenas trs anos, 16% delas abandonaram a cafeicultura (mais estvel) e se transferiram para outras localidades, em busca de novas terras. Ento predominava a lavoura predatria, intensa. Observava-se uma extraordinria mobilidade de lavradores no interior, onde a monocultura de grandes reas constitua norma geral. Em particular, no caso da cotonicultura, que esgota depressa a fertilidade do solo, esse fenmeno ocorria com maior freqncia. Destarte, muitas cooperativas agrcolas de japoneses formadas no tempo do "boom" da cultura de algodo desapareciam com a sada de lavradores. E mesmo cooperativas que no tiveram esse destino, com o incio da II Guerra Mundial, consideradas associaes de sditos de pas inimigo, passaram a sofrer interveno do governo brasileiro, resultando no seu enfraquecimento e / o u fechamento. Cooperativas legalmente registradas puderam continuar em atividade, mesmo durante o conflito, por serem consideradas entidades nacionais. Todavia seus diretores foram compulsoriamente substitudos por cidados brasileiros. Ou ento o governo mandava administradores ocuparem a direo das cooperativas. Quando esses homens que vinham dirigir cooperativas no se destacavam pela integridade de seu carter e competncia, acabavam realizando uma administrao relaxada, resultando em falncia da cooperativa, em alguns casos. Deve-se observar, porm, que, embora as cooperativas de japoneses tivessem sofrido srias crises no perodo da guerra, os lavradores nipnicos, de modo geral, conseguiram melhorar suas bases econmicas, conforme j se comentou. Os efeitos malficos da II Grande Guerra sobre as cooperativas suburbanas foram idnticos aos verificados nas do interior. Todavia, os grandes centros consumidores, como as cidades de So Paulo e Rio de Janeiro, continuaram a se desenvolver e expandir-se mesmo durante a conflagrao, e a produo de lavradores nipnicos dos subrbios cresceu de modo seguro e contnuo. Segundo uma pesquisa da Secretaria da Agricultura do Estado de So Paulo, a produo dos lavradores japoneses em 1935 chegou a representar 70% dos embarques do Estado. A produo dos nipnicos era indispensvel mesmo durante a guerra. Por essa razo, entre as cooperativas suburbanas se destacaram aquelas que consolidaram seus alicerces no decorrer do conflito, para depois se expandirem rapidamente, como a Cooperativa de Cotia e a de Juqueri (Sul-Brasil). A CAC tornou-se uma grande cooperativa, com 2 mil cooperados.

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e) A comunidade japonesa da cidade de Sao Paulo Em 1939 ano em que comeou a guerra na Europa residiam no Brasil 202.211 japoneses. Na cidade de So Paulo, 4.875, ou seja, apenas 2,4% do total. At ento a grande maioria morava na zona rural e a maioria absoluta se dedicava agricultura. Na segunda metade da dcada de 20 comea a crescer o nmero de japoneses que vivem em So Paulo. A capital paulista era uma cidade diferente da metrpole de hoje. A populao do municpio no chegava a 880 mil almas, das quais cerca de 700 mil no setor urbano, segundo estimativa. As residncias em sua maioria eram sobrados, e a rea de maior concentrao urbana no chegava a 10% da atual. A construo da catedral da S havia comeado em 1915, o centro girava em torno dessa praa e do chamado Tringulo (ruas XV de Novembro, Direita e So Bento). Bondes eltricos ligavam ao centro bairros afastados como Santo Amaro, Pinheiros, Vila Mariana e outros. Bairros cheios de residncias, casas comerciais e indstrias se contavam nos dedos: S, Santa Ifignia, Bela Vista, Liberdade, Cambuci, Brs, Vila Mariana. At mesmo Vila Mariana, depois de se passar a fbrica da Brahma, apresentava muitos terrenos baldios. Nesse bairro, algumas famlias nipnicas cultivavam verduras em chcaras. A Avenida Paulista contava j com majestosas residncias senhoriais de fazendeiros de caf, mas viam-se poucos pedestres caminhando por l. O novo mercado municipal (hoje, o velho) s foi concludo em 1933, do outro lado da cidade, na margem esquerda do Tamanduate. Saindo da zona urbana, logo vinham os subrbios. Pinheiros, tradicional sada da cidade, Tucuruvi, Tatuap, Ipiranga e outros bairros perifricos constituam uma espcie de incipientes cidades-dormitrios. Em 1933 moravam 48 famlias nipnicas em Freguesia do O, 32 em Santana, 67 em Tucuruvi, 8 em Pinheiros, 39 em Trememb, 61 no Morumbi, todas elas de lavradores suburbanos. Pequenos lavradores com terras arrendadas medindo de 2 a 5 hectares, poucas com mais de 10 hectares. J se viam plantaes de laranjeiras e outras rvores frutferas, criao de galinhas, etc. Consta que ficou famoso o fumo produzido por japoneses de Tucuruvi, devido sua excelente qualidade. Existiam ainda muitos lotes destinados lavoura no municpio de So Paulo. Na zona rural da capital contavam-se 400 famlias japonesas com 2.700 pessoas dedicadas ao amanho da terra, e no setor urbano, 600 famlias com cerca de 3 mil pessoas. Na rea urbana de So Paulo, com raras excees (como a Casa Fujisaki, a Casa Hachiya, grandes comerciantes), os japoneses residiam ao redor da rua Conde de Sarzedas, bairro da Liberdade, onde chegaram

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procedentes do interior. Exerciam atividades variadas como lojas de artigos japoneses, armazm de secos e molhados, casas de gneros alimentcios, e ainda hotis, alfaiates, barbeiros, farmcia, mdico, restaurantes, etc. J formavam quase um bairro japons. Na segunda metade da dcada de 20, cresce consideravelmente a populao japonesa na capital, espalhando-se por bairros diferentes. E nessa fase que alguns comerciantes instalados em cidades do interior comeam a se transferir para So Paulo, a fim de ampliar suas atividades. Em 1931, um deles abriu uma casa atacadista de cereais na rua Paula Souza. E havia trs fbricas de bebidas fermentadas (inclusive shoyu) e duas de macarro. J no ficavam s na Liberdade; estendiam-se para bairros quase dormitrios, como Pinheiros e Tucuruvi e tambm em torno do mercado de verduras. Antes da inaugurao do novo mercado, os lavradores da zona rural do municpio levavam seus produtos para o velho mercado que ficava na esquina da rua General Carneiro com a 25 de Maro, ou aos mercados de Pinheiros e Tucuruvi. Nesses pontos surgem ento casas comerciais para atender fregueses japoneses, como comrcio varejista, restaurantes e penses. A construo, em Pinheiros, do depsito que depois se tornou sede da CAC provocou uma maior concentrao de moradores japoneses. Outras causas, alm das j referidas, contriburam para incrementar o nmero de moradores nipnicos na cidade de So Paulo: a instalao, em 1916, do Consulado Geral do Japo, do escritrio da Cooperativa de Emigrao (em 1917 reorganizada como Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha). Um pouco mais tarde, em 1929, abrem-se os escritrios da Casa Tozan e da Bratac. Em 1933 instalam-se a Casa Bancria Tozan e outras empresas. Com o correr dos anos mais japoneses chegam do interior. A repartio que os nipnicos mais procuravam era o consulado. Isso porque sditos residentes no exterior precisavam apresentar uma srie de comunicaes e requerimentos representao consular de seu pas: comunicao de residncia e de mudana de residncia, requerimento de adiamento de alistamento militar (que devia ser anexado comunicao de residncia), comunicao de extravio de passaporte, de registro de nascimento, falecimento, sucesso de famlia, de casamento, de divrcio, de adoo de filho... Uma complicada burocracia. que o consulado exercia funo idntica de cartrio de registro civil da cidade, vila ou aldeia no Japo. Na dcada de 30 aumenta o nmero de lavradores que pretendem chamar parentes e amigos do Japo para trabalhar na sua propriedade (fazenda, stio ou chcara). Ento s exigia, alm das indispensveis formalidades junto a Kaik, apresentao ao consulado de um "Requerimento de certificado de chamada". Diante do fato de que no Novo Continente muitos pases seguem o

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jus solis no tocante s crianas nascidas no seu territrio, em 1923, o Gaimusho enviou s representaes diplomticas e consulares um "aviso sobre preveno de dupla nacionalidade", procurando com isso evitar atritos com autoridades de pases imigrantistas. De acordo com o levantamento realizado em 1937 na jurisdio do consulado japons de Bauru, entre os 23.459 nascidos, 52,2% tinham dupla nacionalidade; 45,2% nacionalidade brasileira e 2,6% nacionalidade nipnica. Como se v, o imigrante tinha muitos assuntos para tratar no consulado de seu pas. Em 1918, o Gaimusho instalou em Ribeiro Preto uma filial do Consulado Geral de So Paulo, em 1921 o consulado de Bauru e uma agncia do consulado geral de So Paulo em Santos, a fim de facilitar a vida dos imigrantes. Isto no chegou a diminuir o nmero dos que procuravam o consulado geral da capital paulista. Inicialmente esse consulado ficava na Praa da S, 33; a seguir transferiu-se para a rua Libero Badar, 93 e em 1933 mudou-se para a avenida Brigadeiro Lus Antnio, 83. A essa altura, os japoneses j estavam espalhados por quase todos os bairros da cidade, embora ainda em nmero reduzido. Suas ocupaes mais comuns eram, ento, as de motoristas de txi, doceiras, hoteleiros, donos de restaurantes, tintureiros, barbeiros, carpinteiros. Entre os carpinteiros figuravam trs empreiteiros de obras. O chamado ryotei (um tipo de restaurante japons) aparece em 1929. Entre os profissionais, os hoteleiros e barbeiros j organizavam sua cooperativa profissional (Dogyo kumiai). Alm delas, instalou-se uma Cooperativa Japonesa de Comrcio e Indstria. Os mais abastados entre os moradores de So Paulo formavam o grupo "de cima" (ue-machi) e os de renda menor formavam o grupo "de baixo" (shita-machi). O grupo de cima fundou em 1920 o Clube Japons (Nihon Kurabu) e o de baixo a Doshi-kai (Associao de Companheiros). Havia constantes disputas e atritos entre os dois grupos. O ento cnsul-geral Sukeyuki Akamatsu fez diligncias para acabar com a rivalidade, surgindo da uma Associao de Japoneses da Cidade de So Paulo. Parece, entretanto, que os desentendimentos no cessaram. Em 1934 organizou-se a Sociedade de Cultura dos Japoneses do Brasil, que teve existncia efmera. No ano de 1937 iniciou-se um movimento pela fundao de uma Associao Central de Japoneses do Brasil, mas, sem conseguir o apoio da Associao de Japoneses da Cidade de So Paulo, a iniciativa acabou morrendo. Contudo, no decnio de 30 surge uma tendncia generalizada para a realizao de eventos e organizao de entidades comunitrias de carter geral, abrangendo nipnicos ou seus representantes residentes

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em vrios estados. Tais celebraes e organizaes ostentavam quase sempre a denominao de Zen-Haku (Todo o Brasil), embora na realidade representassem apenas os Estados onde havia japoneses suficientemente numerosos para tomar parte nos acontecimentos. Assim, em 1931 realiza-se a Primeira Exposio de Belas Artes de japoneses e a I Competio de Atletismo dos Japoneses do Brasil; em 1932, a I Reunio de Ensino da Lngua Japonesa no Brasil; em 33 festeja-se em toda a parte o quarto de sculo-da imigrao japonesa no Brasil. Entre as comemoraes destaca-se a festa que teve lugar no terreno destinado construo do Hospital Japons, seguida do lanamento da pedra fundamental. Essa cerimnia contou com a presena de representantes de muitas localidades. So Paulo comea efetivamente a ocupar o lugar de centro da comunidade japonesa do Brasil. Os eventos e celebraes de carter comunitrio que renem todas as colnias nipnicas espalhadas por diversos Estados brasileiros crescem em nmero e se realizam em So Paulo. Ainda em 1933 acontece a visita de atletas japoneses e se promove tambm uma competio atltica nipo-brasileira, com participao de atletas brasileiros convidados pela entidade esportiva da comunidade. Ao mesmo tempo, So Paulo se transforma aos poucos em centro das atividades econmico-financeiras da comunidade. J vimos que a partir de 1933 estabelecem-se casas bancrias japonesas que contribuem para facilitar a vida dos agricultores, mediante financiamentos rurais, at ento praticamente inexistentes para os pequenos lavradores. A vinda da Misso Hirao contribui tambm para estimular e expandir a produo algodoeira no Estado de So Paulo, com a instalao em So Paulo de subsidirias de poderosas empresas nipnicas do setor txtil. Elas representam papel decisivo na compra e exportao do algodo paulista. Em 1934 d-se a fundao da Universidade de So Paulo USP (estadual). At 1940 inexistiam estabelecimentos de ensino superior no interior do Estado. Nessa poca aumenta o nmero de filhos de japoneses que se dirigem capital do Estado para estudar em cursos secundrios e superiores. Surgem pensionatos para estudantes chamados Kishukusha. Registre-se que o primeiro japons a se formar numa escola superior no Brasil foi Takeo Kawai, que fez o curso de engenharia no Mackenzie. Na poca, a maioria dos estudantes filhos de japoneses procurava as faculdades de medicina, de direito ou engenharia. Como poucos japoneses estavam em condies de custear os estudos de seus filhos na cidade de So Paulo e ainda no havia curso noturno de escola superior, o nmero de estudantes era pequeno. Entretanto, j em 1934 estudantes nipo-brasileiros organizavam a

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Liga Estudantil Nipo-Brasileira (Gakusei Renmei) (ver "Os niseis entre dois penhascos", neste Captulo). Alm das escolas superiores brasileiras, existiam em So Paulo alguns estabelecimentos de ensino mantidos por japoneses, com caractersticas especiais. Por exemplo, o Seishu Gijuku, fundado em 1925 pelo pastor protestante Midori Kobayashi, que havia reemigrado dos Estados Unidos. Em 1928 foi a vez do Colgio So Francisco Xavier; em 1932 a Escola de Corte e Costura Nipo-Brasileira e o Instituto Prtico de Agricultura M' Boy; em 1933 a Escola de Corte e Costura Akama. s trs ltimos estabelecimentos j foram tratados em outra parte. f) Jornais de lngua japonesa: alma de comunicao da comunidade Como acabamos de ver, So Paulo se tornou, em relao ao interior e mesmo para japoneses residentes em outros Estados, um verdadeiro centro de atividades poltico-administrativas, econmicas, culturais e educacionais. Na segunda metade dos anos 30, o que mais simbolizava a posio de So Paulo dentro da comunidade japonesa era a chamada "imprensa escrita em lngua japonesa". O primeiro jornal japons publicado no Brasil foi o Nanbei, lanado por Ken-ichiro Hoshina, em janeiro de 1916. Ento viviam no Brasil cerca de 16 mil nipnicos. Mesmo em meados de 1941, quando por causa da guerra os jornais japoneses so fechados, no passava de 200 mil a populao japonesa aqui radicada. No entanto, nos 25 anos, a contar do primeiro jornal, os nipnicos do Brasil lanaram numerosas publicaes, como veremos adiante. Destaquem-se em especial os anos subseqentes a 1926: quando j havia mais de 50 mil japoneses no pas, o desenvolvimento editorial se torna algo bastante expressivo, em particular os jornais. Em maio de 1933 existiam as seguintes publicaes peridicas (entre parnteses o ano de lanamento): 1) Jornais Diretor-proprietrio Burajiru Jiho (1917) Nippak Shinbun (1916) Seishu Shinpo (1921) Nippon Shinbun (1932) Aliana Jiho (1934) Seisaku Kuroishi Sack Miura Rokuro Koyama Sukenari Onaga bimensal semanal bimensal semanal semanal 12 pginas 8 pginas 8 pginas 6 pginas 4 pginas

2) Revistas Nogyo no Burajiru (Brasil Agrcola) 1926 mensal cerca de 100 pginas Hamon (Ondulao) mensal cerca de 100 pginas

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Popular mensal cerca de 70 pginas Pogo Kgiroku (Curso de Portugus) 10 edies/ano cerca de 100 pginas Burajiru no Kokugo (O vernculo do Brasil) bimestral Kana-Burajiru semanal 8 pginas Aozora (Cu Azul) mensal 4 pginas Kyoyu (Amigo da Aldeia) mensal cerca de 50 pginas Wakabito (Jovens) mensal Rikko no Sakebi (o Grito de Rikko) mensal 19 pginas Kshin (Renovao) bimestral cerca de 50 pginas Katei to Kenko (Lar e Sade) mensal 8 pginas Kakuteki (Apito de Caador) mensal Okaba mensal Shintenchi (Mundo Novo) mensal Foram arroladas aqui 20 publicaes peridicas, entre jornais e revistas. Havia ainda rgos oficiais e boletins de associao de japoneses, associaes juvenis, cooperativas agrcolas, etc. Depois de 1934 foram lanados Shokogyosha no Tomo (Amigo de Comerciantes e Industriais), Gakuyu (Amigo de Estudantes), ambas revistas, e Noroeste Minpo (Jornal Popular da Noroeste). Em 1937, Chihcisen (Horizonte), Minami Jujisei (O Cruzeiro do Sul) e Rashinban (Bssola), todas revistas. Em 1938, Sangyo no Burajiru (Brasil Industrial), Bunka (Cultura), revistas. Em 1939, Shokumin (Colonizao) e em 1940, Shizen (Natureza), tambm revistas. Algumas dessas publicaes tiveram vida curta, por motivos econmicos e outros. Por outro lado, importavam-se livros e revistas do Japo. Quanto importao de livros e revistas do Japo, temos apenas os seguintes dados: 1928 5.674 kg e 1931 7.674 kg. No h dvida, porm, de que na segunda metade da dcada de 30 as importaes apresentaram um considervel aumento. Em 1932, todas as empresas jornalsticas japonesas possuam sua prpria oficina grfica. Alm destas existiam mais trs oficinas tipogrficas para impressos em idioma nipnico: So Jos, Hakuyudo e Nihondo. A existncia de tantas grficas correspondia necessidade de publicao de outros tipos de impressos alm dos peridicos, tais como diversas obras tcnicas agrcolas editadas pelo Consulado Geral, pela Kaik e outras entidades. Em ordem cronolgica: em 1922, Pogo Tegami no Kakikata (Como Escrever Cartas em Portugus), de Kumaki Nakao; 1923, Hokusei Nenkan (Anurio da Noroeste), de Shungoro Wako; 1927, Noroesute Nihonjin Nenkan (Anurio Noroeste de Japoneses), da empresa jornalstica Seishu Shinpo; 1930, Noroesute, Sorokabana, Paurisuta Hojin Nenkan (Anurio de Compatriotas da Noroeste, Sorocabana e Paulista), da mesma editora; 1931, Burajiru no Chiri (Geografia do Brasil) e Burajiru

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no Rekishi (Histria do Brasil), editadas pela Associao de Pais das Escolas de Japoneses de So Paulo. Em 1933 transcorria o 25. ano da imigrao nipnica no Brasil. Comemorando a data, o jornal Burajiru Jiho (Notcias do Brasil) publicou o Burajiru Nenkan (Anurio do Brasil), vrias vezes citado por ns. O Seishu Shinpo, mais conhecido pelo seu nome abreviado de Seiho, publicou Zaihaku Nihonjin Ishokumin Nijugoshunen Nenkan (Anurio dos 25 Anos de Imigrao e Colonizao de Japoneses no Brasil, 1934). Essas publicaes constituem valiosas fontes de dados e informaes sobre os primeiros cinco lustros da imigrao nipnica em nosso pas. Tratava-se de uma poca de exaltao nacionalista no Brasil e de ataques e restries imigrao japonesa. Por isso a Sociedade de Cultura de Japoneses no Brasil publicou Hakkoku Kenpo Gikai di Okeru Nihon Imin Haiseki Mondai no Keika (A Tramitao da Questo de Combate Imigrao Japonesa na Assemblia Nacional Constituinte do Brasil) e Aruberuto Toresu no Shis to Toresu Doshi-kai ni Tsuite (Sobre o Pensamento de Alberto Torres e a Sociedade Amigos de Alberto Torres). Em 1936 aparece Nikuyoku (Desejo Carnal), traduo do romance A Carne, de Jlio Ribeiro, feita por Zenpati Ando. Em 1937 saiu a lume Burajiru no Katei Isho (Medicina do Lar no Brasil), do Prof. Dr. Sentaro Takaoka; Nihon Imin Gaishi (Histria Resumida da Imigrao Nipnica), edio da Kaik; Po Bunten Setsuzoku-h Kaisetsu (Explanao da Conjuno na Gramtica Portuguesa) de Zenpati Ando; em 1939, Bauru Kannai no Hojin (Japoneses da Jurisdio de Bauru), de Shungoro Wako. Em 1940, Zaihaku Hojin Shakai no Bunka Oyobi Keizai Shos (Diversos Aspectos da Cultura e Economia da Comunidade Japonesa do Brasil), de Kiyotaka Emi; Burajiru Shi (Histria do Brasil), de Zenpati Ando; em 1941, Ruten no Ato (Vestgios das Vicissitudes), de Shungoro Wako; Umoreyuku Takujin no Sokuseki (Pegadas de Pioneiros que se Apagam), de Teijiro Suzuki, e Pa Encho-sen Kyoiku-shi (Histria da Educao da Alta Paulista) e outros. Todas as obras so significativas em seus respectivos campos. Nessa fase se publicaram ainda muitas histrias referentes a colnias fundadas por imigrantes japoneses, falando da sua formao, evoluo e situao presente. De todas as publicaes japonesas, os jornais, em especial os de So Paulo, exerceram a mais poderosa influncia na comunidade nipnica do Brasil. Na segunda metade do decnio de 30, os jornais japoneses se desenvolveram e se expandiram muito. Aqueles que em 1933 circulavam duas vezes por semana passaram a dirios em 38, com quatro a oito pginas por edio. Quanto tiragem, que em 33 no passava de cerca de 3 mil, em 38 o Nippak Shinbun alcanava 19.500 exemplares, o Burajiru Jiho 17 mil, o Seishu Shinpo 9 mil e o Nippon Shinbun 5 mil; o Aliana jiho, que

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em 1937 transfere sua sede para Araatuba e muda o nome para Nippak Kyodo Shinbun (Jornal Nipo-Brasileiro de Cooperao), 5.500; o Noroeste Minpo (Jornal Popular da Noroeste) 4.500. Desses sete jornais, os primeiros quatro eram publicados em So Paulo e eram os mais influentes na opinio pblica da comunidade. O Seishu Shinpo (Notcias do Estado de So Paulo) comeou em Bauru, transferindo-se para So Paulo em 1934. Muitos imigrantes das cerca de 40 mil famlias liam avidamente os jornais, porque a poca era de graves acontecimentos e transformaes. J vimos que tanto o Brasil como o Japo passavam por radicais mudanas polticas e sociais, tornando-se imprescindvel acompanh-las pela imprensa. No Brasil, depois da revoluo de 1930, de Getlio Vargas, tivemos a Revoluo Constitucionalista de So Paulo em 1932. Japoneses residentes em So Paulo organizaram um grupo de apoio Cruz Vermelha. Com o patrocnio dos quatro principais jornais procedeu-se arrecadao de fundos de apoio campanha constitucionalista. No decorrer da revoluo, que durou trs meses, ocorreu requisio de veculos e produtos agrcolas em certas regies do interior. Nos anos que se seguiram Revoluo Constitucionalista, houve muitos tumultos e choques entre extremistas de direita e esquerda e entre eles e a polcia. Um sdito japons morreu atingido por uma bala perdida n u m desses entreveros. Verifica-se ento crescente tendncia de fortalecimento do poder central. At ento os Estados gozavam de muita autonomia. Os chefes do executivo estadual tinham o ttulo de presidentes. No governo provisrio de 1930 a 34, os Estados eram governados por interventores federais. E sob o Estado Novo tambm. O Estado Novo, que resultou de um golpe de Estado dirigido pelo presidente Vargas em 1937, um regime autoritrio e nacionalista. Medidas cada vez mais rigorosas de controle sobre a vida de imigrantes estrangeiros so tomadas, inquietando-os. certo porm que a maioria dos leitores procurava nos jornais de lngua nipnica as notcias do Japo, j que, a partir de 30, o pas mostra crescente tendncia militarista. O militarismo aos poucos dominava todos os segmentos da sociedade nipnica. Em 1931 o Japo ocupava militarmente a Manchria, com a subseqente implantao do Estado Manchu, sob sua tutela. A seguir retira-se da Liga das Naes por ter sido condenado pela agresso ao territrio chins. Em seguida acontece o chamado Incidente da China (1937), na realidade uma guerra entre a China e o Japo que duraria at o trmino da II Guerra Mundial (1945). Tudo isso acontece na rea externa, enquanto internamente se

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repetem tentativas de golpes de Estado lideradas por chefes militares e polticos ultranacionalistas e pr-fascistas, como o de 15 de maio de 1932 e o de 26 de fevereiro de 1936, s para citar os mais graves. Embora reprimidos, esses movimentos acabaram fortalecendo mais ainda a influncia militarista no governo de Tokyo. E, em ltima anlise, eles levariam o pas ao desastre de 1945. No entanto, para os japoneses residentes no exterior, as notcias sucessivas de espetaculares vitrias das foras imperiais, devidamente monitoradas e controladas pelas autoridades militares, chegavam e eram recebidas como um blsamo, provocando verdadeira exaltao nacionalista. Em momentos de euforia nacionalista e militarista muito difcil ao mortal comum fazer uma anlise fria da marcha dos acontecimentos. Todos, ou quase todos, estavam contagiados pela febre belicista que empolgava a nao japonesa de alto a baixo. A partir de novembro de 1938, comeou a transmisso da radioemissora estatal para o Brasil. Todavia, a incipiente tecnologia de ento no podia assegurar uma transmisso perfeita a uma distncia to longa, tornando-se um fator a mais para aumentar a procura de jornais. Por volta de 1939, comeam dentro da comunidade japonesa do Brasil os movimentos patriticos de associaes juvenis, associaes de japoneses e outras entidades em prol da contribuio s foras japonesas em luta na China e at a oferta de um avio militar. Quando as foras nipnicas ocupam a ilha de Hain, no sul da China (1939), houve at um jornal que preconizou a reemigrao de patrcios para essa ilha. Os proprietrios de jornais de lngua japonesa de So Paulo eram todos donos de forte personalidade, e entre redatores e administradores igualmente figuravam profissionais com idias prprias a respeito da misso da imprensa. Cada um sua maneira, mas todos imbudos da noo de responsabilidade do jornal perante a comunidade. Sack Miura, cuja vida antes de sua chegada ao Brasil est ainda envolta em mistrio, se sobressaa com seu estilo agressivo e personalssimo, com ataques contundentes a representantes diplomticos nipnicos e outras personalidades de seu desagrado e ao seu concorrente e adversrio, diretor do Notcias do Brasil. Miura tinha por isso amigos ntimos e admiradores e inimigos ferrenhos na comunidade. Foi expulso duas vezes do Brasil por denncia de seus desafetos de que ele seria um elemento nocivo aos interesses nacionais. A primeira em 1927 quando seus amigos conseguiram a revogao do decreto de expulso, no momento em que j se achava nas Ilhas Canrias, a caminho do exlio na Europa. Na segunda, em 1939, foi parar no Japo, onde acabou encarcerado pela polcia poltica como elemento perigoso ao pas. Finda a guerra, foi libertado, mas faleceu vtima de subnutriro.

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Numa poca em que a maioria dos imigrantes japoneses pensava em educar os filhos moda nipnica, Sukenari Onaga, do Nippon Shinbun, sustentou opinio contrria: os filhos aqui nascidos eram brasileiros e por isso deveriam ser educados como tais. O fato de jornais japoneses terem atingido uma circulao to elevada se deveu, como vimos, circunstncia de se tratar de uma fase de grandes acontecimentos no s no Japo e no Brasil, como no mundo inteiro. Outra causa foi o fato de a grande maioria dos imigrantes nipes no dominar bem o portugus e por isso no conseguir ler jornais brasileiros. As empresas jornalsticas japonesas de So Paulo, alm da publicao de peridicos, lanaram-se a outros negcios, quando a circulao de jornais crescia auspiciosamente: importao de livros, venda de vitrolas e discos, servio grfico para terceiros, etc. J em 1933, o Nippak e o Jih, os dois rivais e maiores jornais, contavam cada um com mais de 60 funcionrios distribudos pela redao, fotogravura, impresso, administrao, expedio, etc. Em 1940 cada empresa havia se expandido at 300 empregados. Pela sua capacidade de influir na comunidade japonesa, e pelo seu porte econmico e nmero de empregados, os dois maiores jornais de idioma nipnico de So Paulo e em escala menor os outros dois podiam ser considerados rgos representativos da comunidade na segunda metade da dcada de 30. Todavia, os peridicos nipnicos que alcanaram tal desenvolvimento comeam a sofrer declnio em seu prestgio. Em 1937 havia sido decretada a regulamentao do controle de jornais e revistas de lngua estrangeira, mas no chegou a interferir nas atividades de jornais de idioma nipnico. S com a criao, em 1939, do Departamento de Imprensa e Propaganda DIP comeou a censura nesses jornais e revistas: foi exigida a traduo para o portugus das principais matrias e imposta a criao de uma seo escrita em portugus. O Nippak era o nico que j mantinha uma pgina inteira redigida na lngua do pas. Em dezembro de 1939 escolas de lngua estrangeira foram fechadas; em janeiro do ano seguinte estabeleceu-se o sistema de registro de estrangeiro, tornando obrigatria a obteno de carteira de identidade de estrangeiro. Em agosto de 1941 foi proibida a publicao de jornais em idioma estrangeiro. Pouco antes, em julho, o Seishu Shinpo tomava a iniciativa de encerrar suas atividades, com o artigo de despedida: "Ns, asiticos, devemos voltar sia". Depois da proibio da publicao de jornais em lngua estrangeira, o Notcias do Brasil continuou durante certo tempo a circular clandestina-

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mente. O Brasil Asahi (ex-Nippak Shinbun) passou a ser totalmente editado em vernculo, pelos primeiros jornalistas niseis. Mesmo assim, logo aps o comeo da Guerra do Pacfico, acabou sendo fechado (segunda quinzena de dezembro de 1941). Comea ento um perodo de seis anos, sem jornal de lngua japonesa na comunidade, que se prolonga at depois do trmino da conflagrao mundial. A falta de rgos de comunicao de massa, em particular de jornais, criou um vazio de informao, abrindo espao para a gerao de notcias estrambticas e boatos sem fundamento na fase final da guerra e depois do seu fim, provocando grande caos na comunidade nipnica do Brasil. Temos ento a fase mais negra, o vale tenebroso da histria da imigrao japonesa, em oito dcadas, a contar do seu incio, o que assunto do Captulo 4.

8. UM PEQUENO JAPO DENTRO DO BRASIL

Reiteradas vezes assinalou-se que no princpio quase todos os imigrantes japoneses visavam ganhar dinheiro em poucos anos e regressar ao Japo. No entanto, poucos anos antes da guerra, cerca de 90% deles estavam com residncia fixa no Brasil. Com exceo daqueles que desde o comeo estavam decididos a se radicar para sempre no pas, os demais no pensavam porm em fixao permanente nem em assimilao ao meio social brasileiro. Os fatores decisivos para a mudana dessa orientao e mentalidade foram, em primeiro lugar, o carter afetuoso, aberto e hospitaleiro do povo brasileiro em sua grande maioria, e o clima ameno das regies onde a maioria dos imigrantes se radicou. Outra mola propulsora dessa transformao foi a evoluo favorvel da economia brasileira no perodo de 1925 a 41, no obstante a fase de forte crise que teve incio em 1929 e alcanou os primeiros anos da dcada de 30. Acompanhamos no decorrer desta histria as vicissitudes experimentadas pelos imigrantes e sua incessante luta para vencer as tremendas dificuldades de adaptao, enquanto, ao mesmo tempo, buscavam as culturas agrcolas mais adequadas para seu sucesso econmico. Resumidamente, foi dentro de tais circunstncias que eles promoveram o seu desenvolvimento econmico, de modo geralmente considerado satisfatrio. Seu esprito estico, treinado para o trabalho duro e para suportar as agruras da vida nas fazendas e na abertura de novas fronteiras econmicas, foi a base moral para alcanarem esse resultado. Nos 20 anos que vo de 1920 a 40 a populao do Brasil cresceu de

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30.630.000 para 41.160.000, ou seja, 34%. E sua economia expandiu-se mais de 150%. Nos 15 anos de 1925 a 39 registrou-se um incremento de cerca de 100%, um resultado bastante expressivo. Apesar de a inflao ser um mal crnico de praticamente toda a histria do pas, naqueles trs qinqnios (de 25 a 39) ela no passou de 32%. Foi portanto um perodo bastante favorvel na economia brasileira. Nessa conjuntura, os imigrantes organizavam associaes de japoneses, associaes juvenis e outras entidades, formando uma comunidade estruturada. As atividades econmicas giravam em torno de cooperativas e outras organizaes, os filhos se educavam em escolas construdas pelos prprios imigrantes, onde se ensinava o idioma japons e, quando os recursos da colnia permitiam, outras matrias em japons, alm naturalmente do curso primrio oficial brasileiro. Todas as notcias de dentro e de fora da comunidade eram recebidas por intermdio de jornais editados em japons. De acordo com a pesquisa Japoneses da Jurisdio de Bauru, a distribuio de jornais de lngua nipnica alcanava cerca de 90% da populao nipnica. Em 1939, o nmero de exemplares de jornais japoneses superava o de famlias japonesas. Supese que o ndice de leitura de jornais se aproximasse de 100% da comunidade. A imprensa da comunidade dedicava parte considervel de seu espao a notcias do Japo, transmitindo a orientao ultranacionalista e militarista l dominante. Na verdade, podia-se dizer que a comunidade japonesa da poca formava um pequeno "Japo dentro do Brasil". Por conseguinte, compreensvel que houvesse crticas por parte de alguns brasileiros de que os nipnicos eram inassimilveis. J se notava aumento expressivo de niseis, filhos de japoneses aqui nascidos. Ainda segundo Japoneses da Jurisdio de Bauru, em 1937, dos 45.637 "japoneses" dessa regio, nada menos do que 35% eram niseis, portanto, brasileiros. E, com o aumento de jovens que passavam a freqentar cursos superiores em So Paulo e outras capitais (Rio, Niteri, etc), comea a se desenvolver entre eles a noo de brasilidade (ver "Os Niseis entre dois penhascos"). Todavia seu nmero ainda no representava muito no universo estudantil de So Paulo. Segundo depoimentos de estudiosos como Tomoo Handa, na realidade muitos filhos de japoneses aqui nascidos e educados maneira nipnica consideravam-se japoneses. No Pequeno Japo Dentro do Brasil, as campanhas militares levadas a efeito pelas foras nipnicas no continente asitico, com slogans grandiloqentes como "Construo da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental", "Guerra Santa" (contra o comunismo, principalmente),

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"Expanso do Povo Japons", "Estabelecimento de Nova Ordem Mundial", provocavam intenso entusiasmo. Por inspirao ou mesmo ordens de pais, crentes na justeza da causa do Japo e na vitria certa, niseis e junniseis (aqueles que vieram crianas e aqui cresceram) viajaram para o Extremo Oriente a fim de se apresentarem como voluntrios (o mesmo fenmeno se verificou entre filhos de alemes, entusiasmados com as vitrias iniciais dos exrcitos hitleristas). Por outro lado, o governo brasileiro intensificava sua campanha nacionalista e nacionalizante. O culto do esprito de brasilidade se tornava extensivo aos filhos de estrangeiros aqui nascidos. Os dois nacionalismos do Japo e do Brasil entram em choque frontal. Os pais japoneses que seguiam a orientao nacionalista de Tokyo comeam a vacilar com relao deciso de permanecer para sempre no Brasil ou retornar ao Japo. a) O ensino de japons reprimido Do Nippak Shinbun, de 27 de setembro de 1938: "Furaco sobre o ensino sopra de todos os lados. Intensifica-se de modo severo a fiscalizao em relao s escolas de estrangeiros. O furaco da opresso mais forte no Estado do Paran. A nica maneira de ensinar o idioma japons, que era o mtodo de professor itinerante, tambm se tornou impossvel. Resultado: muitos incidentes desagradveis...". A seguir, o jornal cita casos de fiscalizao por parte de inspetores de ensino ou mesmo pela polcia. "Atualmente no norte do Paran, as crianas no podem aprender japons nem em sua casa", informa. Explicitando o chamado mtodo itinerante: consistia em o professor de japons dar aulas em casas de famlia, depsitos de produtos agrcolas ou cabanas erigidas dentro do mato, reunindo trs a cinco crianas para ensinar-lhes o idioma nipnico. O mtodo comeou a ser adotado depois da proibio, em 1938, do ensino de lngua estrangeira para crianas com menos de 14 anos de idade. A Associao de Difuso do Ensino de Japons aconselhava esse mtodo. O mesmo Nippak Shinbun, em sua edio de 11 de janeiro de 1938, escrevia: "Mandam filhos ao Japo devido represso ao ensino de japons. Diante das sucessivas medidas restritivas em relao aos estrangeiros como a Lei de Fiscalizao de Estrangeiros, Lei de Imigrao, etc, de carter nacionalizante, estrangeiros residentes no pas ficam com vontade de reclamar, junto com um suspiro: 'O Brasil no um pas que tem por poltica nacional a igualdade racial?' 'Para os nipnicos, a fonte de sua

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maior preocupao a questo da educao dos niseis, que tem no momento um futuro completamente incerto. No faz muito tempo noticiou-se que uma colnia inteira se decidiu reemigrar para a China. realmente profunda a preocupao dos pais que pensam no futuro dos filhos'. As escolas de lngua japonesa foram todas fechadas. E idias como melhoria da educao em famlia ou a adoo do mtodo de ensino itinerante so impraticveis. Presentemente, na regio norte do Paran sucedem-se casos deplorveis, razo por que necessrio estar preparado para enfrentar intervenes injustas de autoridades locais. Depois de muito pensar e refletir, pais que desistiram de 'ensinar o idioma nipnico a fim de formar bons brasileiros', desiludidos, esto enviando os filhos para o Japo. Chegam a mais d 70 o nmero de niseis que, acompanhados dos pais ou ss, seguiram para o Japo a bordo dos navios Buenos Aires-Maru, Santos-Maru e Rio de Janeiro-Maru que recentemente passaram pelo Brasil". Entre jovens que estudavam no Japo e possuam a nacionalidade nipnica ou dupla nacionalidade, no poucos foram convocados para o servio militar no Japo para lutar nos campos de batalha da II Grande Guerra. Kensuke Baba, estudante recrutado que combateu no Pacfico e depois regressou ao Brasil, revelou que, entre seus conhecidos, 15 niseis haviam sido convocados, dos quais seis morreram nos campos de batalha. A partir de 1938 aumentam notcias como as citadas, mostrando o estado de comoo de quem percebeu, depois de viver muito tempo como se aqui fosse uma espcie de prolongamento do Japo (sem restries de espcie alguma por ser estrangeiro), e de repente descobriu que se encontrava num pas estrangeiro. O Nippak Shinbun, em data de 9 de fevereiro de 1939, noticiou o seguinte: "Patrcios assustados com o furaco nacionalista, querem ir para a China. Conseguiram a terra onde podiam viver tranqilos. Mas, e a educao dos filhos?" "Ainda est fresca na memria de muita gente a notcia de que quinze famlias moradoras da Fazenda Portinho, da Estao Ibitinga, na Linha Douradense, assustadas com o furaco nacionalista, demonstraram o desejo de viajar para a China em grupo." Agora so as nove famlias lideradas pelo sr. Shichiro Minami, da Colnia Keisei, estao Duartina, linha Paulista, que "como pais estvamos satisfeitos por havermos -encontrado uma terra onde podamos viver com tranqilidade, mas ao pensar no futuro dos dainiseis..." Com

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esse prembulo solicitaram os bons ofcios do consulado geral que apresentava a seguinte petio, manifestando o desejo de reemigrar para o Norte da China: "(...) As presses amedrontadoras exercidas pelas autoridades deste pas sobretudo na questo da educao dos filhos, acabam quebrando os fundamentos que devem formar as bases do Yamato damashii (esprito de Yamato) do povo japons. Havendo finalmente encontrado a terra onde se pode viver em paz, estamos satisfeitos com este pas, no entanto, ao pensar no futuro dos dainisei, no podemos permanecer indiferentes, pois isso seria uma irresponsabilidade. Contudo, por mais que sintamos extrema indignao e revolta, nada podemos fazer contra dispositivos da Constituio deste pas. Por essa razo, estamos procurando outra soluo. E consideramos o mais desejvel trabalhar no desbravamento da Manchria e do norte da China. No momento atual somos mais de trinta famlias com a mesma aspirao. Que facilidades poderia o governo nos proporcionar? Solicitamos pois uma especial ateno de Vossa Excelncia. Com a assinatura de uma parte dos interessados nos dirigimos a Vossa Excelncia (...)". No momento em que por causa das novas leis nacionalistas e nacionalizantes do governo brasileiro se compenetram de que este pas no constitui uma espcie de extenso do Japo, nasce no imigrante o desejo de viver sob a proteo da bandeira do Sol Nascente. Todavia, muitos alegam como motivo imediato a impossibilidade de ensinar a lngua japonesa aos niseis. Nota-se uma sria mudana na atitude dos imigrantes que at a dcada de 20 pensavam na educao dos filhos com prioridade para o ensino do idioma portugus. No decnio de 30 adotam atitude inversa, dando preferncia absoluta ao ensino de japons. Era o reflexo do que acontecia na ptria, o Japo, agora cada vez mais nacionalista e militarista. A nova orientao ideolgica de Tokyo era transmitida pelo noticirio e comentrios de jornais de lngua japonesa aqui publicados, das revistas e outros impressos importados do Japo, e ainda pelas diretrizes baixadas atravs da embaixada (onde o adido militar exercia forte influncia) e dos consulados. Convm lembrar que a propagao e o ensino do chamado esprito japons (Yamato damashii) contriburam para gerar a mentalidade "vitorista" na comunidade no imediato ps-guerra. Quanto ao pedido de reemigrao para a China, o Consulado Geral de So Paulo respondeu: "Entendemos a inteno (dos requerentes), mas

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impossvel atend-los". E aconselhou que agissem com muita cautela em tudo. Muitos imigrantes s comearam a considerar a volta ao Japo ao compreenderem que viviam em pas estrangeiro. Naturalmente havia diferenas de graduao na atitude de cada um. Um que refletiu profundamente sobre a questo, Shungoro Wako, nosso conhecido, autor de vrias obras relacionadas com os japoneses do Brasil, tomou a definitiva deciso de radicar-se no pas. Comeou a refletir sobre se "seria mesmo uma infelicidade para os filhos, se forem educados como bons brasileiros?", um dos motivos alegados por aqueles que aspiravam voltar ao Japo ou reemigrar para a sia, e diz: "Transcorreram trinta anos desde que chegamos a este pas. Nesse lapso de tempo pereceram, vitimados por vrias causas, um total de quase vinte mil almas, entre velhos, jovens, homens e mulheres. Voltar ao Japo, abandonando seus tmulos, no constitui absolutamente o caminho certo com respeito aos nossos antepassados...". E, a seguir: "Eu trabalharei com todo empenho at o dia de ser sepultado neste pas. Com a imagem saudosa da ptria, o Japo, no corao, orarei at o meu ltimo suspiro pela sua prosperidade. E farei o mximo de esforo para fazer de meus filhos bons brasileiros, capazes de servir bem sua ptria". Era a sua deciso definitiva, de radicar-se para sempre no Brasil. Sabemos que a grande maioria acabou ficando no Brasil, embora nos parea que poucos refletiram to profundamente como Wako. Voltando ao noticirio dos jornais japoneses da comunidade sobre o discutido problema do ensino de japons, o fato que, apesar dos ttulos chamativos, pelo texto podemos concluir que,, dos mais de 200 mil nipnicos residentes no Brasil, eram muito poucas as famlias que retornaram ao Japo por causa do problema do ensino da lngua nipnica ou que enviaram os filhos terra dos ancestrais. Outras notcias entre muitas que agitaram as pginas de jornais da comunidade: "Por cantar a cano Aikoku Koshin-kyoku (Marcha Patritica) na viagem de volta em caminho, de uma competio de beisebol, fomos multados pela polcia em 90 mil ris, sob a acusao de sedio". "Proibida legenda em japons numa folhinha de casa comercial". "Proibida reunio de mais de cinco pessoas". "Tirando proveito da poltica nacionalista, autoridades locais enchem o prprio bolso". Constou ento que, por contar com muitos alemes e italianos (sditos de pases do Eixo), a perseguio teria sido mais intensa no

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Estado do Paran. Todavia, mesmo no Paran houve muitas regies onde japoneses puderam se dedicar ao trabalho da lavoura sem serem molestados. Os primeiros nipnicos ingressaram em Maring, ainda coberta de matas virgens em 1939, sendo seguidos por outros em grande nmero, sem incidentes. Quer dizer, mesmo nesse perodo, a grande maioria de nipnicos, apesar de sentirem que a "situao no est nada fcil", prosseguiu nas suas atividades produtivas. dessa poca a instalao da CooperativaAgrcola Nipo-Brasileira, depois denominada Cooperativa Agrcola Bandeirante; a Cooperativa de Transporte Coletivo de Mogi das Cruzes se transforma em Cooperativa Agrcola de Mogi das Cruzes. E tambm organiza-se a Federao de Moos das Cooperativas Agrcolas, reunindo jovens cooperativistas dos subrbios de So Paulo e do interior. b) Intercmbio cultural Nos quatro ou cinco anos que precederam guerra, registrou-se intenso intercmbio cultural entre o Brasil e o Japo, no obstante a tensa conjuntura internacional na Europa e crescente agravamento da situao na sia e no Pacfico. 1936 Inaugura-se o servio de radiotelefonia entre os dois pases. Visita dos escritores japoneses Toson Shimazaki e Ikuma Arishima. 1937 Os primeiros estudantes brasileiros bolsistas no Japo, Luiz Antnio Pimentel e Mozart Varela, seguem em maro para aquele pas. O antroplogo, Prof. Ryuzo Torii, pronuncia conferncias e realiza escavaes arqueolgicas em sambaquis na colnia de Katsura. O tenor Yoshie Fujiwara visita So Paulo e d recital no Teatro Municipal e em outros teatros. Publicao do Novo Dicionrio Portugus-Japons, de Wasaburo Otake. 1939 O professor de direito Kotaro Tanaka, da Universidade Imperial de Tokyo, pronuncia conferncias em So Paulo e no Rio. O professor Ernesto de Souza Campos, da Faculdade de Medicina de So Paulo, e o escritor Alexandre Konder visitam o Japo. Dr. Jos Soares de Melo, professor da Faculdade de Direito da USP, e senhora visitam o Japo.

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1940 O pintor Ryosuke Ohashi visita o Brasil, na companhia de sua esposa Helena, filha do pintor brasileiro Oscar Pereira da Silva. O escritor e senhora Cludio de Souza visitam o Japo. Vinte e dois estudantes da USP, chefiados por Mario Botelho de Miranda, visitam o Japo, a Coria e a Manchria. Ainda em 1939, o esportista Chuhei Nanbu esteve no Brasil, dando orientao tcnica a esportistas patrcios. No mesmo ano, o avio Nippon voa at o Brasil, em viagem de volta ao mundo, patrocinada pelos jornais Mainichi e Tokyo Nichi-Nichi. c) L e c, grandes mudanas Em 1940 o Japo comemorou os 2.600 anos de sua fundao (a antiga escola oficial comeava a contar o princpio da histria do pas no ano 660 a.C; j a nova histria, adotada no ps-guerra, rejeita essa verso por misturar mitologia com histria). E tambm foi quando os militares nipnicos tomaram a deciso de deflagrar a guerra contra os EUA e seus aliados. Os partidos polticos so dissolvidos e substitudos por um partido nico, a Taisei Yokusan-kai (Associao de Apoio Poltica Imperial). As mercadorias de consumo popular so submetidas a rigoroso racionamento. Com a assinatura da Aliana Trplice Japo, Alemanha e Itlia, a probabilidade de Imprio do Sol Nascente entrar na guerra se torna maior. Na comunidade japonesa do Brasil, a Casa Bancria Bratac se transforma em banco, com o nome de Banco Amrica do Sul e capital de mil contos de ris. O novo banco abre 14 agncias nos centros agrcolas onde vivem muitos lavradores japoneses. Em So Paulo instala-se a Cmara de Comrcio Japonesa; o consulado nipnico em Curitiba inicia suas atividades; a 24 de setembro desse ano inaugura-se o Hospital Japens. 1941. A Alemanha, j virtualmente senhora da Europa Continental, lana o ataque Unio Sovitica e o Japo se atira na guerra contra os EUA, Inglaterra, Holanda e outros pases aliados. A seguir, tambm a Alemanha e a Itlia declaram guerra aos EUA. A II Guerra Mundial alcana sua amplitude mxima. Os lavradores japoneses do Brasil, beneficiados pela extraordinria alta dos preos da seda e da menta, e boas cotaes de outros produtos agrcolas, melhoram sua situao econmica. Ainda no mesmo ano a Bratac inaugura sua fiao de seda e se instala a Casa Imai (comrcio), intensificando-se mais ainda a atuao dos nipnicos na rea econmica.

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Entre os dias 29 e 31 de agosto de 1940, teve lugar no campo de beisebol de Campo Belo, da Tozan, em So Paulo, o Campeonato Brasileiro (Zen-Haku) de Beisebol. Acabou sendo o ltimo certame do gnero antes da ecloso da Guerra do Pacfico. Sobre o pblico presente ao jogo, algum escreveu: "Observou-se aumento de automveis particulares, parecendo indicar que cresceu o nmero de novos-ricos japoneses. J se vestem bem e seu comportamento (social) se tornou cavalheiresco". Quanto zona rural, Tomoo Handa, que visitou as colnias da Noroeste, diz em sua O Imigrante Japons Sua Vida no Brasil: "A cidade de Lins, cheia de vida at h alguns anos, j se tornou uma cidade acabada, com tendncia estagnao". Naquela cidade evidenciava-se o avano dos niseis e o crescimento dos que aqui chegaram crianas (jun-nisei). A propsito dos niseis Handa observa: "E o caso de um ser humano ainda no totalmente assimilado sociedade brasileira, apenas consegue aparentar exteriormente no modo de falar, movimento e expresso, o brasileiro". E classifica-os como: "conscientemente so mais japoneses do que brasileiros". Os prottipos de niseis seriam "esses indivduos de transio em todos os sentidos". Ao que tudo indica, o mesmo poderia dizer sobre os niseis de outras concentraes de japoneses. Em sntese, a comunidade do "Japo que existe dentro do Brasil", decorridos mais de 30 anos desde o incio da imigrao, sofria aos poucos profundas transformaes. Mesmo no campo econmico, "embora parcialmente", avana o abrasileiramento de seus componentes. Pelo amplexo da nao chamada Brasil, a grande maioria dos imigrantes nipnicos permaneceu no pas, sem retornar sua ptria, apesar dos dois nacionalismos que os colocavam entre a bigorna e o martelo. (Katsuo UchiyamaTetsuya Tajiri/Jos Yamashiro) BIBLIOGRAFIA

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CAPTULO 4

PERODO EM BRANCO NA CORRENTE IMIGRATRIA E OS DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA


1. A COMUNIDADE NIPNICA NO PERODO DA GUERRA 2. A COMUNIDADE ENFRENTA UM CAOS SEM PRECEDENTES 3. DA CONFUSO GERAL ESTABILIDADE

1. A COMUNIDADE NIPNICA NO PERODO DA GUERRA

a) As vsperas da Guerra no Pacfico A 13 de agosto de 1941 ancorou no porto de Santos o navio Buenos Aires-Maru. O barco, que trouxe a bordo 417 imigrantes novos, navegando numa atmosfera internacional extremamente tensa, quando as negociaes diplomticas entre o Japo e os Estados Unidos chegavam a uma fase crtica, marcou o ponto final do movimento emigratrio japons para o Brasil, no perodo anterior Guerra do Pacfico. Encerrava-se um ciclo histrico da imigrao nipnica iniciado com o Kasato-Maru, 33 anos antes, e que agora somava um considervel contingente de 190 mil pessoas. Com a entrada em vigor do dispositivo constitucional (1934) que fixava a cota de 2% de nacionais de cada pas entrados nos ltimos 50 anos (ver "Na Constituinte de 1934", p. 163), a imigrao japonesa sofreu uma grande reduo. A seguir, o decreto de 1937, proibindo o ensino de lngua estrangeira a menores de 14 anos, causou tremendo choque nos imigrantes, que, com a premissa de um dia regressar ao Japo, estavam concentrando esforos no ensino do idioma japons aos filhos. Alm de terem sido em vo todas as tentativas para contornar essa situao, em fins de 1938, escolas estrangeiras, principalmente aquelas pertencentes aos nacionais de pases do Eixo Japo, Alemanha e Itlia foram sumariamente fechadas.

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A srie de medidas nacionalizadoras adotadas pelo Estado Novo na segunda metade da dcada de 30 exerce crescente presso psicolgica sobre a vida do imigrante, que aos poucos comea a pensar em abandonar o Brasil e procurar "viver sob a proteo da bandeira do Sol Nascente". No ano de 1939, Shungoro Wako publicou o relatrio do levantamento da situao real dos imigrantes nipnicos da regio Noroeste de So Paulo ento a maior concentrao desses elementos no pas , sob a jurisdio do consulado japons de Bauru: Compatriotas da Jurisdio de Bauru (publicado em junho de 1939). Na introduo, Wako escreveu sobre Kikoku ka Eij ka (Regresso ao Japo ou permanncia definitiva no Brasil), comentando a tendncia observada na comunidade nipnica da poca: "Pelos objetivos deste livro, bastaria descrever pormenorizadamente a situao real dos patrcios. Acontece, porm, que as relaes internacionais se agravaram de modo extraordinrio nos ltimos tempos, e como conseqncia, ns que moramos no exterior, sofremos presses e angstias indescritveis. Essas provaes impostas aos japoneses esto provocando forte desgaste na nossa fora moral. Como resultado, o problema de regressar ptria ou permanecer definitivamente no Brasil, antes assunto de conversa descompromissada, se transformou em problema srio e profundo pesando sobre nossas cabeas. Por isso, inclumos neste levantamento um item referente 'Permanncia definitiva ou regresso ptria'. Como se trata de um assunto de interesse imediato do momento, obtivemos uma resposta quase cem por cento ao nosso questionrio. Do total de 12 mil consultas, 85 por cento responderam 'regresso' e apenas 10 por cento 'permanncia definitiva'. A resposta dos restantes 5 por cento era 'no sei'. Analisando as trs respostas, chegamos s seguintes concluses: 1. Entre os 85 por cento que desejam regressar, figuram pessoas fracassadas em seus empreendimentos e outras que podem ser consideradas vitoriosas. E s vezes temos dainisei (nisei) que nada sabem do Japo. 2. A maioria dos que responderam pela 'permanncia definitiva' imigrante chegado h poucos anos, sendo poucos os economicamente independentes, a maioria pertencente categoria de 'colonos' (trabalhadores contratados das fazendas) ou arrendatrios. So pessoas que sofreram os efeitos da crise econmica no Japo. Elas pensam vagamente que 's o fato de o pas ter recursos naturais em abundncia j suficiente para optar pela residncia permanente'. Mas de se suspeitar que com o passar do tempo e ao enfrentar obstculos e sofrimentos ou ainda, mesmo que alcancem uma situao cmoda, tero que refletir seriamente nas presses sobre a raa e no futuro dos filhos. E h aqueles que sendo imigrantes antigos vivem sem preocupao

A COMUNIDADE NIPNICA NO PERODO DA GUERRA 249

de ordem financeira e escolheram "residncia permanente'. Analisando bem seus empreendimentos, porm, indicam pontos de dvida sobre a sua solidez. Existem aqueles que decidiram efetivamente permanecer para sempre no pas, dando uma orientao nica educao dos filhos, mas so muito raros. Doze ou treze pessoas esto casadas com brasileiros ou outros estrangeiros. E sua resoluo de 'permanncia', no geral soa como uma deciso resignada. Existe ainda uma pequena minoria de catlicos tradicionais, os quais surpreendentemente optaram em definitivo pela permanncia. Trata-se de descendentes de catlicos japoneses que suportaram, no sculo XVII, cruis perseguies. Por isso emigrando para um pas catlico, a sua deciso de 'permanncia' deve ser para valer. 3. Os que responderam 'no saber', em sua maioria o fizeram com muita seriedade. A primeira vista, parecem pessoas relativamente lcidas, sem perder a atitude serena, na aparncia. Mas pode-se inferir que igualmente elas se encontram em posio to insegura como muitos que escolheram o 'regresso'. Diante do exposto, chegamos concluso de que cerca de 90 por cento de residentes na jurisdio consular de Bauru aspiram 'retornar ao Japo'. Entre eles incluem-se 60 por cento de nascidos no Brasil e elementos que vieram para c ainda crianas, os chamados jun-nisei (quase nisei). Quais as razes dos que desejam a volta ao Japo? Nos ltimos anos, a conscincia nacional est se tornando muito poderosa e ardente tambm no Brasil. Como resultado dessa tendncia, ns imigrantes, vivemos dias desagradveis. Por outro lado, a figura do Japo em plena ascenso de suas foras, brilha com vigor na sia Oriental. O sentimento generalizado (de chegar l), fez com que se decidisse a favor do regresso, antes de se submeter ao juzo da razo. Quanto a isso, parece no haver dvida. E mesmo no existindo essas condies, o ltimo e recndito desejo voltar ptria. O pas que mais amamos o Japo. E a finalidade maior de retornar prspero terra natal constitui a aspirao dos 200 mil patrcios do Brasil, acalentada desde o momento que partiram do Japo. E um juramento tambm. Na verdade, todos ns viemos para este pas no para nele permanecer em definitivo, mas sim conseguir bens materiais. Mesmo que haja pessoas que tenham mudado sua orientao para a permanncia definitiva, no se trata de sua inteno inicial. A histria dos trinta anos de nossa imigrao representou exclusivamente e to s a histria de vigorosas e contnuas lutas para a consecuo desta promessa de retorno ptria".

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Embora demonstrando compreenso em relao ao sentimento dos imigrantes que, dentro das circunstncias, desejavam ardentemente voltar terra natal, Wako, pessoalmente, explica a sua deciso firme de permanecer no Brasil para sempre. Dizia: "Recordemos que ns j vivemos trinta anos neste pas e tivemos nesse espao de tempo, o sacrifcio de vida de homens, mulheres, velhos e crianas no total de quase 20 mil almas... Regressar ao nosso pas de origem, abandonando estas sepulturas no representa cumprir um dever para com os nossos antepassados... Ento, contribuir com o nosso sangue misturado ao dos brasileiros, introduzindo nossas boas tradies, ... encontraremos o verdadeiro significado da nossa imigrao... Por isso, devemos trabalhar com todas as nossas foras at o dia de nosso sepultamento nesta terra, orando pela prosperidade da nossa ptria e fazer dos nossos filhos bons brasileiros, capazes de servir ao Brasil"1. Mas, s vsperas da ecloso da Guerra do Pacfico, o sentimento de quase toda a comunidade japonesa do Brasil era um s: aspirao ardente de voltar ao Japo... A invaso da China Continental, a ocupao da ilha de Hain e da Indochina pelas Foras Armadas imperiais sob a bela capa propagandista de "Construo da Nova Ordem na Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental" representavam aos olhos dos imigrantes "a imagem brilhante do Japo prspero e poderoso dominando a sia Oriental". Essa imagem fortalecia neles a idia de que "o nosso esforo construtivo tem que ser sob a bandeira do Sol Nascente", reforando a idia da transferncia para as regies da sia, estimulando cada vez mais a febre pelo regresso. Expressando esse sentimento, um imigrante escreveu longo artigo, ocupando uma pgina inteira de um jornal de idioma nipnico, com o ttulo de "Serei um emigrante que se bate em retirada gloriosa". "Um assunto atual que chama de modo extraordinrio a nossa ateno o problema da reemigrao para a sia Oriental... O caminho da nossa ptria est definido: a construo da nova ordem da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental, grandiosa obra nacional sem precedentes. E esse fato deve servir tambm como indicador do nosso caminho, do nosso dever. Naturalmente, ns viemos para o Brasil como japoneses e no como outro povo, em absoluto. E tambm no futuro no pretendemos progredir ou construir outra cultura, de outro povo. Esta
1 Entretanto, o prprio Wako, depois de voltar da visita que fez ao Japo como representante dos imigrantes do Brasil aos festejos dos 2.600 anos da fundao do Japo em 1940, mudou de opinio, defendendo a "reemigrao para a ilha de Hain", causando perplexidade comunidade (Rokuro Kowyama (ed.). A Histria dos 40 Anos da Imigrao Japonesa. 1949. p. 311).

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tendncia geral da maioria de ns, no admitida pelo Brasil, de modo que nessa disputa ns somos naturalmente derrotados. Assim, os nossos esforos no tero outro significado seno prestar servio como trabalhadores assalariados para um capitalista branco chamado Brasil. Ns nos encontramos na encruzilhada de ou consumimos nossa vida nesse servio ou faremos uma retirada gloriosa... Se ns desejarmos viver no esprito japons de 'unidade sob o Imperador', na presente situao internacional, no teremos outra alternativa seno o glorioso retorno ptria... Ns alimentamos o profundo desejo de viver sob a proteo da bandeira do Japo e deixar aos nossos descendentes uma vida plena de satisfao espiritual e material. Essa deciso representa, no momento, um servio ptria, no havendo nenhuma razo para ficarmos presos a um Estado branco e nem de escapar da nossa reemigrao para a Esfera da sia Oriental. N u m local onde no h desenvolvimento construtivo como povo nipnico, como poderemos contribuir para o bem da ptria ou do mundo?... Por isso, quero sustentar que uma parte da massa de lavradores da comunidade nipnica do Brasil est firmemente pensando assim e decidida a agir nessa direo. A onda de imigrantes que voltam ao Japo verificada recentemente representa uma expresso dessa tendncia. Por que a camada dirigente se mostra confusa diante desse quadro?..." (Saburo Kawabata. Seishu Shinpo, 31 de maio de 1941). "A volta terra natal rico e prspero o anseio mais profundo da vida e tambm o juramento. No viemos para este pas para nele viver e sim para conseguir bens materiais." "No emigramos para o Brasil como outro povo que no o nipnico, no pensamos em desenvolvimento como outro povo ou construir cultura nessa condio no porvir." Os imigrantes que assim tinham definido seu roteiro reafirmaram sua deciso diante do aumento do peso "das presses e perseguies. Assim firmaram a sua orientao de v o ^ e r terra natal e "viver sob a bandeira do Sol Levante". A sua grande aspirao agora era a reemigrao. No se dispe do nmero certo de imigrantes que retornaram ao Japo quela altura dos acontecimentos, isto , o comeo da guerra JapoEstados Unidos no Pacfico2. Nos jornais de lngua japonesa, datados do segundo semestre de 1939 at 1940-41, viam-se anncios redigidos mais ou menos nos seguintes termos: "Informo meus amigos que vou regressar temporariamente terra natal...".
2 Apenas como referncia: "Em 1939, o nmero dos que regressaram ao Japo somava 2.011, superando o de imigrantes, 1.546" (Yuko Yamada. Problemas da Emigrao para o Brasil no Comeo da Era Showa. Publicao do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Rikkyo. Edio comemorativa do 20. aniversrio da fundao, 1984, p. 182).

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Noticiando a situao da poca, o jornal Seishu Shinpo (13 de maio de 1939) dizia sob o ttulo de "Aspectos diversos da febre de regresso ao Japo que ocorre no interior": "Diante das medidas restritivas ao ensino de japons no interior do Estado, como conseqncia da poltica nacionalizadora do governo brasileiro, verifica-se intenso movimento de volta ptria dos compatriotas, em nmero crescente...". "Considera-se, por exemplo, que na maior concentrao japonesa que Bastos, mais de 50 famlias esto se retirando depois da safra corrente. E estima-se em mais de cem famlias para a prxima safra." "Acontece que tradicionalmente havia a volta daqueles que se enquadravam na classificao 'retornar prspero terra natal', agora, so em sua maioria pessoas que se contentam em 'ter o dinheiro para a passagem de navio'. Os primeiros podiam viver folgadamente na terra natal e proporcionar uma educao adequada aos filhos. Os ltimos pretendem, depois de chegar ao Japo, reemigrar para a Manchria ou Norte da China, a fim de trabalhar de novo como imigrante" 3 . No podendo permanecer indiferente diante desse movimento de regresso de imigrantes ptria de origem, o Consulado Geral do Japo em So Paulo, em nome do cnsul-geral Junzo Sakane, publicou nos jornais o seguinte aviso: "Ateno com referncia reemigrao para a sia Oriental ou volta ao Japo. Ultimamente est havendo entre imigrantes aqui residentes quem sustente a tese de reemigrao para a Manchria e outras regies da sia Oriental. Existem at aqueles que, sob os mais diferentes argumentos
3 Com a elevao do nmero dos que desejavam repatriar-se, intensificaram-se, a partir de 1939, a compra e venda de yen. Essa transao constitua contraveno lei cambial, pois s era permitido entrar no Japo com papel-moeda at o valor de 200 yens. Mas continuava a volta de imigrantes ao Japo levando yen, procedente da China e aqui adquirido. Jornais japoneses da comunidade divulgavam notcias e comentrios a respeito do negcio, com ttulos sugestivos: "Por que um ato antipatritico comprar papel-moeda yen" (Nippqk Shinbun, 14 de maro de 1939); "No param as compras de yen" (Nippak Shinbun, 15 de abril de 1939); "De novo, descoberto cmbio negro de yen. No cessam as atividades de traio ptria" (Brasil Asalii, 18 de outubro de 1940); "A dana das operaes de yen no cmbio negro cem mil yens no Montevideo-Maru?" (Brasil Asahi, 2 de fevereiro de 1941); "No cessam atos de traio ptria: vendedores de yen visam os que voltam para o Japo" (Brasil Asahi, 9 de agosto de 1941), etc. Alm dessas matrias que faziam advertncias, a 22 de janeiro de 1940, em nome do Consulado Geral do Japo, jornais em idioma nipnico publicaram um edital sobre a obrigatoriedade dos possuidores de yen "comunicarem o fato" e explicarem minuciosamente como adquiriram o yen papel-moeda, para a devida fiscalizao. Os interessados deveriam comparecer ao consulado de sua jurisdio, levando o yen em seu poder. Apesar dessa fiscalizao, a compra e venda de yen se realizava sem cessar, ajudada pela queda de cotao da moeda japonesa nos mercados internacionais. Tem-se como certo que o "caso dos negcios de yen" que acontece no ps-guerra teve origein nessas transaes ilegais.

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artificialmente arranjados, aconselham a retirada dos compatriotas. E por outro lado, parece haver patrcios bastante confusos face a estes movimentos. Na atual conjuntura, de rpidas transformaes no mundo e ao pensar na situao atual de nossa ptria que se defronta com uma crise de gravidade sem precedentes, parece-nos natural que pessoas pouco familiarizadas com as conjunturas interna e internacional do pas sintam inquietao. Tambm compreensvel a aspirao de participar da grandiosa obra de construo de uma nova ordem na sia Oriental, encetada pelo nosso pas, contribuindo o mnimo que seja. Contudo, se por causa disso, vier a abalar, pouco que seja, a estabilizao e fixao permanente dos japoneses aqui residentes em geral, necessria muita cautela... A verdade que ainda no houve nenhuma convocao de residentes para o servio militar ativo, nem qualquer outra providncia especial, fatos que demonstram ser a situao atual do Japo ainda relativamente folgada. O estmulo emigrao para a Manchria e a explorao econmica do continente chins e da ilha de Hainan, constituem importantssimos empreendimentos da poltica nacional de nossa ptria. Todavia, a Manchria por exemplo, como do conhecimento geral, apresenta profundas diferenas no tocante ao clima, condies naturais, ambiente, etc, em comparao com a Amrica do Sul. Portanto, os que retornam desta regio so considerados inadequados para as atividades agrcolas na Manchria. Por isso, as autoridades adotam a orientao de no aprovar essas pessoas como emigrantes agricultores para a Manchria. No s isso. Nas reas da China continental e da ilha de Hainan, h abundante mo-de-obra barata, inexistindo espao para a entrada de outros, razo porque para essas regies no h, no momento, nem mesmo planos de envio de emigrantes agricultores. Aqueles que viveram muitos anos na Amrica do Sul e pouco familiarizados com a recente situao do Japo, procurarem neste momento reemigrar com idias vagas, sem capital nem mesmo preparo ou tcnica especial, estaro longe de poder contribuir ao desenvolvimento daquelas regies. E certo, outrossim, que pessoalmente correm o risco de sofrer muito. E tambm possvel algum querer voltar ptria, iludido pela aparente prosperidade da indstria de guerra no interior do Japo. Neste ponto necessrio toda cautela, pois completamente impossvel ganhar dinheiro fcil, na situao de rgido controle econmico l em vigor. Temos informao de que entre aqueles, que sonhando com tal ganho fcil voltaram terra natal, no poucos, inteiramente desiludidos, querem retornar ao Brasil. Por outro lado, problemas como o da educao dos filhos, embora tenha havido, em relao ao passado, diferenas por motivos internos deste pas, como a asoiraco dos imigrantes, consiste em formar bons cidados

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brasileiros de origem nipnica, no h motivo para qualquer atrito com as autoridades competentes. Nesta oportunidade, se os japoneses residentes no pas tomarem a iniciativa de, espontaneamente, oferecer colaborao s autoridades brasileiras, as suas verdadeiras intenes sero compreendidas. Portanto, inexiste quase nenhuma dvida de que este problema ser solucionado em futuro prximo. Parece-nos indesculpvel que residentes no exterior se retraiam e sintam-se derrotados diante de obstculos deste gnero. Felizmente entre o Japo e o Brasil no h nenhum problema capaz de futuramente provocar atritos. Por isso, os princpios norteadores da proteo e orientao dos emigrantes para o Brasil so a coexistncia e coprosperidade dos dois pases e estmulo residncia permanente dos emigrantes no pas. Essa orientao bsica no de natureza a sofrer mudana por causa do Incidente da China(*), nem pela guerra na Europa. Portanto, em relao a esses fatores no h nenhum motivo para japoneses aqui residentes quererem regressar ptria ou pensar em reemigrao. A esse respeito, podem ficar perfeitamente tranqilos... Em resumo, os nipnicos residentes no Brasil devem enfrentar a conjuntura interna e internacional com calma e prudncia, sem se deixar abalar por rumores levianos, dedicando-se cada vez mais com afinco aos seus afazeres. Esta a verdadeira misso dos compatriotas residentes neste pas. Deve-se considerar, pelo menos no presente momento, imprprio e desnecessrio abandonar os alicerces econmicos construdos em longos anos de labor para regressar ptria. Por essa razo, recorremos a esta forma de comunicado para chamar a ateno dos senhores e desejar-lhes uma atitude de autocontrole de sua parte" 4 .

(*) Oficialmente o governo japons chamou a guerra na China de "Incidente da China". Embora declarando que " compreensvel o sentimento de desejar contribuir, mesmo um mnimo que seja, na construo da grandiosa obra da "Nova Comunidade da sia Oriental...", o consulado geral fez publicar essa advertncia, contrariando a vontade da maioria absoluta da comunidade, porque na poca o governo de Tokyo ainda mantinha a orientao de estimular a emigrao para a Amrica Central e do Sul, Por conseguinte, o regresso ao Japo representava um gesto contrrio poltica nacional nipnica. Os ministrios do Exterior e dos Assuntos de Ultramar do Japo, em abril de 1939 (quando o crescente nmero de repatriados comeava a dar na vista), elaboraram um documento: "Sobre a Orientao e Estmulos Emigrao para as Regies da Amrica Central e do Sul", que recebeu a aprovao do gabinete. A percepo e orientao fundamentais dessa poltica so, segundo o documento: "E muito importante procurar reforar as relaes de amizade e ao mesmo tempo revigorar a cooperao econmica em relao a pases da Amrica Central e do Sul, face nova situao da sia Oriental. Com referncia consecuo desses objetivos, os cerca de 240 mil compatriotas residentes nas referidas regies contribuem de modo valioso com a atual estabilidade de sua base econmica, e expanso da economia e comrcio internacional, colaborando na realizao da nossa poltica nacional, como emigrantes trabalhadores do setor econmico. Em face dessa realidade, reconhecemos que a emigrao de compatriotas para aquelas regies de extrema importncia...".
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A Bratac (Sociedade Colonizadora do Brasil), que havia formado os ncleos coloniais de Aliana, Tiet e Bastos, no Estado de So Paulo, e de Trs Barras (atual Assai), no Paran, desenvolveu o chamado Movimento G AT (Gozai a Terra), preconizando, no s nesses centros de colonizao como em relao a todos os patrcios aqui residentes, a necessidade de amar o solo e fixar residncia permanente no pas. Uma revista, Bunka (Cultura), editada em So Paulo, tambm desenvolveu e defendeu a idia de fixao do imigrante e sua assimilao sociedade brasileira. No entanto, mesmo nas colnias da Bratac, embora houvesse quem optasse pela permanncia definitiva no Brasil, aos poucos, a maioria foi se inclinando a favor do repatriamento. Acontece, porm, que, na realidade, a crtica situao internacional se agravava mais rapidamente e de modo mais violento do que os acontecimentos na comunidade. Apenas uma pequena parte daqueles que retornavam ao Japo tinha condio de pagar o anncio de despedida nos jornais. Eram os favorecidos da sorte. A grande maioria dos imigrantes no teve tempo de concretizar o seu sonho de se repatriar, pois irrompeu a Guerra do Pacfico, deixando completamente ilhados os nipnicos do Brasil. Como j informamos, o Buenos Aires-Maru, que chegou ao Brasil em 1941, marcou o ponto final da corrente emigratria do Japo para o Brasil. Das conseqncias funestas da guerra, a suspenso da publicao de jornais em idioma nipnico foi o fato mais doloroso e que teve influncia decisiva na gerao de distrbios na comunidade no imediato psguerra, objeto de exame neste captulo. Sob presso crescente da fiscalizao oficial, esses rgos de imprensa s conseguiram manter sua circulao mediante a apresentao, censura, de todo o texto traduzido para o portugus, a partir de 1940. Mas, entre julho e dezembro de 1941, todos eles acabaram fechando suas portas. O Seishu Shinpo encerrou suas atividades no dia 30 de julho, publiA seguir expe como se far concretamente "a colaborao realizao da poltica nacional" como trabalhadores do setor econmico: " Aquisio de capital em moeda estrangeira. Contra subsdios oficiais e investimentos privados no total de 30 milhes de yens, os bens dos patrcios residentes no Brasil, Peru e Argentina somam 200 milhes de yens; a remessa de numerrios pelos emigrantes: trs a quatro milhes de yens por ano. Fomento das exportaes. O valor total do comrcio internacional com a Amrica Central e do Sul em 1937: 300 milhes de yens. O envio de emigrantes representa abertura e manuteno de novos mercados. E ainda aumenta a demanda dos estrangeiros em geral, ampliando o mercado. O mesmo pode-se dizer da navegao. Para atender necessidade de suprir materiais escassos no nosso pas. No fornecimento de artigos indispensveis como algodo, leo de rcino, juta, madeira, couro de boi, etc, os emigrantes esto dando importante contribuio e com expectativa de colaborao maior no futuro. Dentro da orientao bsica acima referida, o governo ir enviar, como nova leva de emigrantes, 3 mil ao ano para o Brasil e 1.000 para o Paraguai e outros pases" (de Problemas da Emigrao para o Brasil no Comeo da Era Shotva, j citado, p. 191).

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cando um editorial "Asiticos, voltemos para a sia", como despedida. O Burajiru Jih expirou dia 31 de agosto, divulgando o aviso: "Hoje, ltimo dia". O Brasil Asahi, que resultar da mudana de nome do Nippak Shinbun, continuou a circular mesmo depois de agosto, editado totalmente em lngua portuguesa. Mesmo assim, recebeu ordem de parar a circulao na segunda quinzena de dezembro, poucos dias aps a ecloso da Guerra do Pacfico. Os jornais editados em idioma japons desapareceram por completo, e isso criou um verdadeiro vazio de comunicao e informao na colnia. At ento poucos imigrantes conseguiam ler e entender jornais de lngua portuguesa. Os imigrantes, desprovidos do seu nico Veculo de comunicao, ficaram completamente isolados, como se fossem um grupo de prisioneiros. Esse isolamento foi, como hoje de conhecimento geral, uma das principais causas da pgina negra ou vale tenebroso, representando pouco mais de uma dcada (1942-53), na histria dos 80 anos da imigrao nipnica 5 . b) A comunidade japonesa durante o conflito A 7 de setembro de 1941 irrompeu a Guerra do Pacfico. A notcia da deflagrao da luta armada se alastrou de modo surpreendentemente
5 De acordo com a publicao Compatriotas da Jurisdio de Bauru, j referida, o nmero de assinantes de jornais da comunidade e adquirentes de revistas japonesas, conforme levantamento de 1939, era o seguinte: Revistas infantis 1.078 Revistas femininas 1.168 Revistas masculinas 5.967 Jornais 10.154 Total 18.367 Foram pesquisadas 11.576 pessoas, de modo que a porcentagem de assinantes, segundo a natureza da publicao, era: Revistas infantis 9,3% Revistas femininas 10,09% Revistas masculinas 51,15% Jornais 87,72% As revistas eram quase todas importadas do Japo, mas os jornais eram todos de lngua japonesa editados no Brasil. Como diz o prprio Wako, editor do livro, "No tocante aos jornais, o nmero de assinantes chega a 90 porcento, podendo afirmar que eles dominavam o mercado de peridicos". Um ndice bastante expressivo, mostrando o grau de escolaridade dos imigrantes nipnicos. "O surpreendente porm que apesar das 15 mil famlias pesquisadas tivessem mdia de onze anos de residncia no Brasil, no fosse mencionada uma nica revista brasileira. Havia cerca de cem jornais brasileiros, mas a maior parte deles era lida por intelectuais moradores da cidade. Uma lstima. Essa realidade justifica at a preocupao do governo brasileiro (de que os japoneses so inassimilveis)." Na verdade, as condies sociais para o surto de boatos sem fundamentos e confuses que iriam acontecer na comunidade j se formaram no momento da proibio da publicao de jornais em idioma nipnico. A boataria sobre a vitria do Japo e as confuses na comunidade atingem o seu clmax, como veremos adiante, quando chegou a notcia da derrota do Japo.

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rpido, via comunicao oral, na ento comunidade japonesa do Brasil, destituda dos meios de comunicao. E as informaes iniciais (de triunfos espetaculares das foras imperiais nipnicas) eram de molde a limpar a atmosfera reprimida e pesada da comunidade. No era possvel erguer publicamente os braos e gritar Banzai, mas todos sentiram aquela ntima satisfao de quem exclama: "muito bem, rapazes!". Contudo, logo no comeo do ano seguinte, ou mais precisamente entre os dias 15 e 27 de janeiro, realizou-se no Rio de Janeiro a Conferncia de Chanceleres Americanos. Os pases participantes, com exceo da Argentina e do Chile, tomaram a resoluo de romper as relaes econmicas com os pases do Eixo. A seguir, a 29 do mesmo ms, o governo brasileiro rompe relaes diplomticas com esses pases. No dia anterior, a embaixada japonesa do Rio e o Consulado Geral de So Paulo e outras representaes oficiais de Tokyo encerravam suas atividades. Em conseqncia do rompimento das relaes diplomticas, foram reforadas as medidas de fiscalizao sobre os naturais do Japo, Alemanha e Itlia, que se tornaram sditos de pases inimigos, e sua liberdade foi grandemente restringida. No dia 19 de janeiro, a Superintendncia da Segurana Pblica de So Paulo baixou o seguinte edital "para regulamentar a atividade dos estrangeiros naturais dos pases do 'eixo'": "I Em face da ruptura das relaes diplomticas do Brasil com a Alemanha, Itlia e Japo, fao pblico que ficam os sditos destes ltimos pases, residentes neste Estado, proibidos: 1. da disseminao de quaisquer escritos nos idiomas de suas respectivas naes; 2. de cantarem ou tocarem hinos das potncias referidas; 3. das saudaes peculiares a essas potncias; 4. do uso do idioma das mesmas potncias, em concentraes, em lugares pblicos (cafs, etc); 5. de exibir em lugar acessvel, ou exposto ao pblico, retrato de membros do governo daquelas potncias; 6. de viajarem de uma para outra localidade, sem salvo-conduto fornecido por esta Superintendncia; 7. de se reunirem, ainda que em casas particulares, a ttulo de comemorao de carter privado; 8. de discutirem ou trocarem idias, em lugar pblico, sobre a situao internacional; 9. de usarem armas, mesmo que hajam anteriormente obtido o alvar competente, bem como, negociarem com armas, munies ou materiais explosivos ou que possam ser utilizados na fabricao de explosivos;

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10. de mudarem de residncia sem comunicao prvia a esta Superintendncia; 11. de se utilizarem de avies que lhes pertenam; 12. de viajarem por via rea sem licena especial concedida por esta Superintendncia. II Os salvo-condutos sero fornecidos todos os dias teis, das 9 s 11 horas das 14 s 18 horas e das 21 s 23 horas. Aos domingos das 14 s 17 horas". O edital era assinado pelo major do Exrcito, Olinto de Frana Almeida e S, Superintendente da Segurana Poltica e Social. Poucos dias depois desse edital, ou seja, a 2 de fevereiro, sob a alegao de motivo de segurana, os japoneses da rea da rua Conde de Sarzedas zona de maior concentrao de nipnicos na cidade de So Paulo receberam a primeira ordem de evacuao. A seguir, a 11 do mesmo ms, foi decretado o congelamento dos bens dos sditos de pases do Eixo. Os bens desses elementos sofreram restries e limitaes diversas, regulamentando-se ao mesmo tempo a sua destinao. O congelamento visava coibir atividades econmicas e atos destinados a favorecer os pases inimigos e, ao mesmo tempo, instituir um fundo de garantia para resgate de danos de guerra. Com essa finalidade determinava a arrecadao compulsria de uma determinada porcentagem sobre os juros dos depsitos bancrios de sditos dos pases do Eixo para sua posterior incluso no fundo de indenizao de guerra. Os imveis tiveram sua compra e venda ou hipoteca proibidas. A medida que a guerra evolua, foram baixadas numerosas medidas complementares, relacionadas com os bens de sditos inimigos. Muitas propriedades de sditos de pases do Eixo ficaram sob o controle do governo brasileiro, administradas por interventores por ele nomeados, tendo havido at casos de liquidao sumria. O congelamento s foi levantado em novembro de 1950, cinco anos depois do trmino da guerra. Todavia, na poca, os imigrantes nipnicos em geral no tinham ainda o hbito de depositar dinheiro em banco. De modo que o congelamento limitou-se a afetar as transaes de imveis, vedadas pelo respectivo decreto. A medida no provocou prejuzos diretos aos indivduos, mas as cooperativas agrcolas que ento comeavam a crescer e casas de comrcio, fbricas, fazendas e bancos, etc, de certa projeo, conhecidos entre os japoneses, ficaram durante longo perodo submetidos fiscalizao de interventores nomeados pelo governo. No entanto, as notcias de vitria das foras nipnicas divulgadas pelo Quartel-General Imperial e clandestinamente transmitidas por aqueles que ouviam as emisses da Rdio Tokyo (proibidas desde o comeo

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da guerra), ou atravs de comunicados mimeografados por pessoas interessadas na divulgao das vitrias do Japo, entusiasmavam os nipnicos. Por isso, as medidas oficiais restritivas e fiscalizadoras tomadas pelo governo brasileiro no causavam, de imediato, nenhum sofrimento insuportvel. Sobre a atitude dos imigrantes no perodo inicial da guerra, a Cooperativa Agrcola de Bastos enviou o seguinte relatrio matriz da Bratac (Sociedade Colonizadora do Brasil)1: "O estado de esprito dos imigrantes. Muito calmo, tendo em geral conscincia de estar residindo em pas inimigo. Confiantes na vitria final, obedecem s leis do Brasil e seguem os trs princpios de no ver, no ouvir e no falar. Mantm atitude pacfica, prosseguindo com afinco no esforo de incrementar a produo... Deve-se registrar apenas que o sr. Jinsaku Wakiyama 2 foi detido por ter pertencido ao exrcito japons e ainda no retornou a Bastos. Outros trs ou quatro elementos que haviam sido encarcerados j foram libertados. No tem ocorrido acontecimentos a lamentar como o crime contra a pessoa, latrocnio nem ofensas aos nipnicos. E quanto queles detidos por uso da lngua nipnica ou participar de reunio proibida que alcanou nmero de algumas dezenas, em sua maioria foram soltos dentro de vinte e quatro horas. Entretanto, as medidas restritivas adotadas contra japoneses, como por exemplo a suspenso da liberdade de viagem, proibio de livros em lngua nipnica, de ouvir discos e a transmisso de rdio em nossa lngua e receber tratamento de pouco caso por parte de brasileiros analfabetos e ter que ler receiosos publicaes escritas em japons, nos criam uma situao em que se forado a viver com toda cautela conforme j foi mencionado antes". "Observaes sobre a atitude geral que deve ser tomada pelos imigrantes depois da guerra. Levando-se em conta a atmosfera em que vivem os imigrantes, natural que 80% deles aspirem uma vida mais estimulante e livre sob a bandeira do Sol Nascente. E parece que a maioria deles deseja emigrar

Masayuki Mizuno. Bastos Nijgonen-slii (Histria dos 25 Anos de Bastos), 1955, p. 116. poca Wakiyama era presidente da Cooperativa Agrcola de Bastos, acumulando o cargo de diretor-presidente da Cooperativa Central Agrcola. Por se tratar de coronel reformado do exrcito nipnico e tambm por haver visitado a ptria, no ano anterior ao incio das hostilidades (1940), convidado que foi como representante dos imigrantes do Brasil s comemoraes do 2.600. aniversrio da fundao do Imprio do Japo, suscitou suspeitas, tendo sido preso assim que comeou a guerra. Permaneceu na priso at o fim da conflagrao. Foi assassinado a 6 de junho de 1947 por elementos da Tokkotai, ligada Shindo Renmei.
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para as regies do sul e sudeste da sia que ficaro sob a influncia de novas foras. E os que preferem permanecer no Brasil so: 1. aqueles que tm filhos nascidos e educados no Brasil; 2. aqueles que se encontram em situao boa, relativamente beneficiados pela vida no Brasil; 3. aqueles que j consolidaram sua vida econmica, tendo construdo boa posio financeira e social; 4. aqueles que esperam a melhoria dos sentimentos (de brasileiros) em relao aos japoneses e reconhecem ser a fixao definitiva no Brasil melhor tambm como opo nacional do Japo." "Por outro lado, o grupo pr-retorno ptria, ou seja, os que almejam reemigrar para os Mares do Sul3, constitudo de: 1. jovens muito ambiciosos; 2. esto preocupados com a educao de seus filhos ou pensando no futuro dos dainisei (niseis), consideram no ser o Brasil pas para permanncia definitiva; 3. no gozam de situao favorvel em sua vida no Brasil; 4. receberam choque extraordinariamente forte com as mudanas sociais ocorridas no comeo da guerra; 5. sentem uma espcie de saudosismo da terra natal, agravado com a vida de aperto (do tempo de guerra). No presente momento, cerca de 80% esto dominados pela idia de voltar ptria, mas estima-se que no caso de se efetivar o regresso, na realidade no passaro de 15% ou, no mximo, 20%. Dentro da situao de guerra, os lavradores gozam de boa posio. Acontece, por outro lado, que para passar s atividades comerciais ou industriais existem os obstculos de novas leis e outras restries, razo por que so muito poucos os que se transferem para outras profisses. Pelo contrrio, muitos querem viver s da terra." A situao de relativa calma acima descrita sofre alterao com a marcha da conflagrao e a intensificao das medidas restritivas em relao aos sditos de pases inimigos. Em particular, quando navios brasileiros so afundados por submarinos alemes: dois em 26 de fevereiro de 1942; por volta do dia 12 de agosto do mesmo ano mais cinco, em Natal, RN; a seguir, um navio mercante pertencente ao Lloyd Brasileiro,
Aqueles que, no comeo da guerra, pleiteavam o regresso ptria, para reemigrarem rumo Manchria, China e ilha de Hain, com a ampliao de territrios ocupados pelas foras japonesas no Sudeste da sia, se transformaram em aspirantes "reemigrao para os Mares do Sul". Poder-se- dizer que muitos daqueles que desejavam retornar ptria, dentro das condies aqui referidas, acabaram participando do grupo "vitoristas" no ps-guerra.
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nas costas de Belm, PA. Criou-se assim uma situao de beligerncia direta, razo por que o governo brasileiro acabou declarando guerra Alemanha e Itlia. A populao indignou-se diante do afundamento de navios. Na noite de 15 de agosto, uma multido calculada em 200 mil pessoas promoveu uma manifestao contra o Eixo. Formou-se uma atmosfera muito ruim para os japoneses e seguiram-se prises de elementos do Eixo suspeitos de atos de espionagem ou de sabotagem. Em relao ao torpedeamento do navio do Lloyd, o povo de Belm, como vingana, comeou a atacar, destruir e incendiar casas de japoneses, alemes e italianos. Por darem na vista facilmente, os nipnicos sofreram maiores prejuzos. Havia no fundo um incitamento de natureza poltica, o que contribuiu para a ecloso e prosseguimento da violncia popular, colocando em risco a vida e a propriedade dos sditos do Eixo. Com o objetivo de fiscalizar os sditos do Eixo e proteg-los, o governo federal resolveu recolher em Acar (atual Tome-Au, PA), ento chamada "ilha solitria" do continente (primeira colnia nipnica da Amaznia), todos os japoneses, alemes e italianos residentes na Regio Norte. As perseguies aos sditos do Eixo alastraram-se no litoral do Estado do Paran, a Campo Grande, no Estado de Mato Grosso, e outras regies. A 6 de fevereiro, os moradores nipnicos da rua Conde de Sarzedas, na cidade de So Paulo, receberam a segunda ordem de retirada, desta vez com o prazo de dez dias. Assim, a rua Conde de Sarzedas, conhecida como rea de concentrao de nipnicos, ficou virtualmente sem uma sombra de japons. No ano seguinte, dia 8 de julho, nada menos do que cinco navios cargueiros do Brasil e dos Estados Unidos foram torpedeados e afundados por submarinos germnicos, pouco depois de terem zarpado do porto de Santos. O acontecimento foi considerado resultado de espionagem por parte de sditos do Eixo residentes no litoral paulista, sendo por isso ordenada a evacuao dos mesmos no curto prazo de 24 horas. Os evacuados, tendo 1.500 japoneses frente, depois de abrigados na Hospedaria de Imigrantes da capital paulista, encontraram acolhida e abrigo na cidade de So Paulo e no interior, com a ajuda de parentes e amigos. A 3 de julho do ano anterior (1942), representantes do governo nipnico, a comear pelo embaixador e cnsul-geral, mais aqueles convocados pelo governo de Tokyo, ou ainda os elementos tidos como teis para a construo da chamada Esfera de Co-prosperidade da sia Oriental exceto os imigrantes , retornaram ptria a bordo do navio de repatriamento Gripsholm, de bandeira sueca. Em troca, instalou-se no Consulado Geral da Espanha um servio de Interesses Japoneses, encarregado de proteger os direitos e bens dos sditos nipnicos. Contudo, a

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retirada dos representantes do governo japons provocou a sensao de abandono no esprito dos imigrantes, aprofundando o sentimento de desamparo e solido. Tambm surgiu tona a at ento quase oculta conscincia de que o imigrante no passava de sdito entregue sua prpria sorte. E dessa conscincia de "sdito abandonado" nascia, numa parte da comunidade, a idia de reorganizar a sociedade japonesa do Brasil, instalar um novo rgo orientador... "... No comeo da guerra da Grande sia Oriental (nome dado pelo Japo Guerra da China e do Pacfico), no momento em que o Brasil se tornou pas inimigo, as autoridades do Imprio que serviam no pas retornaram ptria, deixando apenas uma palavra de conforto aos seus compatriotas. Os chamados elementos de elite dos japoneses aqui residentes, eram no geral, pessoas de forte inclinao individualista e liberal, no se encontrando quase ningum que desfrutasse a confiana dos imigrantes, capaz de apoiar os compatriotas que perderam, como se verificou, os seus rgos oficiais de controle e de orientao [...]. Por iniciativa de um pequeno nmero de pessoas nasceu uma entidade temos a a gnese da Shindo Renmei" 4 . Esta a parte de anotaes de um dirigente regional da Shindo Renmei. Explica-se: com o desaparecimento das organizaes at ento existentes criou-se um vcuo. O sentimento de que era preciso salvar a comunidade nipnica, que cara numa espcie de anarquia, resultou na criao da Shindo Renmei. Mas j pelo ano de 1944, alm da Shindo Renmei surgiram, furtivamente, outros movimentos similares. Simultaneamente, comeam a correr os boatos mais estapafrdios. Por exemplo, com referncia evacuao compulsria do litoral, espalharam-se rumores de que "na verdade se tratava de medida estratgica comandada pelo governo japons (preparando o terreno) para o desembarque de foras nipnicas". E, a propsito do nascimento de uma criana deformada, com cabea humana e corpo de bicho, apelidada "Eis a verdade", circulou uma suposta profecia atribuda a ela, que teria dito: "A guerra terminar este. ano com uma grande vitria do Eixo". E teria morrido aps declarar: "Eis a verdade...". Boatos absurdos como esse eram aceitos como fatos verdicos at por elementos possuidores de certo bom senso, segundo consta de alguns registros 5 .
Hekisui Yosh. Gokuch Kaiko-roku (Memrias da Priso manuscrito), 1948. Tomoo Handa. Imin no Seikatsu no Rekishi (Histria da Vida do Imigrante), 1970, p. 635. (Publicado em portugus sob o ttulo de O Imigrante Japons A Histria de Sua Vida no Brasil, So Paulo. T.A. Queiroz Editora, 1987.)
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Afora esses rumores gerados por um desejo coletivo, outros corriam soltos em quantidade crescente, o que acabaria num violento conflito entre "vitoristas" e "esclarecidos" ("derrotistas") no ps-guerra, quando se registram trgicos derramamentos de sangue. O germe da confuso e conseqente luta brotou e se alastrou aos poucos dentro de uma comunidade fechada (sem jornais e outros meios de comunicao em sua lngua), acuada em um estado de sria intranqilidade espiritual. Enquanto notcias infundadas e rumores so esquecidos como simples boatos, no h problema. Mas quando eles so aceitos como fatos verdadeiros e chegam a gerar uma srie de atos, o caso passa a apresentar conseqncias muito graves. Por volta de abril de 1944, em vrias localidades do interior acontecem ataques com destruio e incndio de usinas de beneficiamento de menta e barracas de criao de bicho-daseda. Tratava-se de ao de "condenao e punio" baseada na idia de que, sendo a menta e o casulo do bicho-da-seda produtos que favoreciam os pases aliados, dedicar-se sua produo constituiria atividade antipatritica 6 . de conhecimento geral na comunidade nipnica que entidades denominadas Seinen Aikoku Und (Movimento Patritico da Mocidade) e Tenchugumi (Grupo de Castigo Celeste) foram as organizaes promotoras desses atos de destruio. Esse fato demonstra que j ento se iniciava uma luta fratricida entre japoneses, luta essa que se agravaria no ps-guerra. O casulo do bicho-da-seda transformado em tecido empregado na confeco de pra-quedas, sendo portanto compreensvel que seja tratado como material blico. Sobre a menta foi escrito o seguinte "arrazoado", clandestinamente distribudo entre os nipnicos: "A aplicao de menta na guerra. Abaixo o que escreveu um qumico alemo sobre a menta em tempo de guerra: 1.) Aumenta o poder explosivo e de descarga de armas de fogo (*); a) Misturada nitroglicerina, elimina os defeitos destas, multiplicando ainda por trezentas vezes o seu poder explosivo; b) Misturada carga de propulso do canho, aumenta em vrias vezes o alcance das chamas (aumentar alcance das chamas quer dizer tornar mais poderosa a fora de propulso do projtil) (**); 2.) Misturada ao produto gerador de gs txico, aumenta a sua capacidade de penetrao, tornando intil a mscara contra gs atualRokuro Kowyama. Imin Yonjnen-sh (Histria dos 40 Anos de Imigrao), 1949, p. 215. (*) e (**) Esta explicao tcnica, atribuda a um "qumico alemo", est vazada em linguagem confusa. Fala em hsha radiao, o que seria incompreensvel aplicada a um projtil de canho. Deve ser hsha, homfono, grafado em outros ideogramas, que significa carga de propulso, projeo ou disparo. E assim vrias outras expresses se acham empregadas de maneira incorreta, confusa ou absolutamente errada.
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mente usada. Por outro lado, o gs tradicional sendo mais pesado do que o ar tende a estagnar-se nas partes baixas do terreno, de maneira que sem a utilizao da fora do vento no consegue desenvolver toda a sua eficincia. Mas, uma vez misturado a menta aumenta extraordinariamente a sua fora expansiva. 3.) A menta indispensvel no sistema de refrigerao de motores de alta velocidade". O casulo do bicho-da-seda teve seu preo elevado desde o comeo da conflagrao . A cotao, que estava a 6 mil ris por quilo em 41, em 45 alcanava 52 cruzeiros, mais de oito vezes. Tomando o exemplo de Bastos, a produo de casulo, que em 41 era de pouco mais de 65 mil kg, em 44 ultrapassou 520 mil kg, chegando a 620 mil kg em 45. Consta que a cultura de hortel-pimenta foi iniciada por volta de 1937 por lavradores japoneses da Noroeste. Mas seu preo era to vil que no valia a pena comercializ-la. No entanto, com o incio da guerra, tal como sucedeu com o casulo do bicho-da-seda, teve uma acelerada valorizao. Em 1944, o preo do mentol atingia 130 cruzeiros o quilo. Por essa razo, na zona da Alta Sorocabana, prpria para a cultura de hortel, em razo de suas terras midas, a rizicultura e a cotonicultura, at ento praticadas na rea, foram abandonadas, e cresceu o nmero de lavradores que passaram a cultivar hortel. A produo de menta do Estado de So Paulo no ano agrcola de 1944/45 alcanou 1.500 toneladas, das quais 90% ou 1.350 toneladas foram produzidas por japoneses, segundo revelou a Sociedade Rural Brasileira7. A produo de menta e criao do bicho-da-seda recebiam estmulos oficiais, e at financiamento do governo. Esses produtos eram exportados para os Estados Unidos, de maneira que os prprios produtores pensavam na sua implicao no uso blico. Dizem que por causa dessa conscincia de certa culpabilidade, os lavradores no davam parte polcia, mesmo quando suas plantaes sofriam destruio causada por incndio criminoso. Acrescente-se que no s menta e casulo da seda como tambm algodo, amendoim e outras culturas alis conforme registra o relato da Cooperativa Agrcola de Bastos j aludido mantiveram preos altos durante a guerra. Destarte, contrastando com seus sofrimentos morais, que lhes foram impostos como sditos de pas inimigo, economicamente os agricultores nipnicos foram beneficiados, chegando a apresentar situao de estabilidade econmica. Portanto, ser possvel considerar
7 Sobre casulo de seda: "Histria dos 25 Anos de Bastos", p. 115, e sobre menta: "Histria dos 40 Anos de Imigrao", p. 255.

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que, parte o conflito "vitoristas x esclarecidos" do ps-guerra, a guerra atuou como fora motriz para o salto de desenvolvimento realizado pela comunidade nipnica do Brasil. 2. A COMUNIDADE ENFRENTA UM CAOS SEM PRECEDENTES a) Um relmpago em cu azul: a notcia da derrota A Alemanha nazista rendeu-se a 7 de maio de 1945. A Itlia fascista j havia capitulado antes, em setembro de 1943. A paz voltava Europa. O povo brasileiro, que participara diretamente da guerra enviando seus filhos frente italiana, festejou do fundo do corao o restabelecimento da paz, soltando fogos de artifcios. Diante da derrota completa dos dois membros do Eixo, acalmou-se o nimo guerreiro dentro do Brasil: as medidas de fiscalizao das autoridades foram se abrandando; em maio, aboliu-se o salvo-conduto necessrio viagem, tornando-se livre a locomoo dos sditos do Eixo em territrio brasileiro. Pouco depois do trmino do conflito armado na Europa, a 6 de junho, o Brasil tomou a iniciativa de declarar guerra ao Japo. Na poca as foras americanas j haviam desembarcado em Okinawa, o Imprio japons se encontrava em situao agonizante. O Brasil declarou guerra em cumprimento ao compromisso coletivo de cooperao e defesa comum de pases americanos confirmado na Conferncia Pan-Americana realizada pouco antes, no Mxico. Entretanto, em relao a essa declarao de guerra, o povo brasileiro no demonstrou excitao, como no caso da Alemanha e Itlia, mantendo-se quase indiferente. Os jornais limitaram-se a noticiar o fato, de modo que os nipnicos residentes no interior, em sua maioria desinformados quanto situao do pas, ignoraram praticamente a entrada do Brasil na guerra contra o Japo. Outrossim, provvel que, mesmo que tomassem conhecimento, no chegassem a se preocupar. Com exceo de pequeno nmero de pessoas, a grande maioria tinha como confivel verdade os comunicados do Quartel-General Imperial, ouvidos clandestinamente nas ondas curtas transmitidas do Japo. No duvidavam da vitria final da ptria. A situao de guerra, em que as tropas imperiais foram, de recuo em recuo, acuadas at Okinawa, ou os bombardeios dirios do territrio metropolitano japons pela aviao americana, ou mesmo as bombas atmicas lanadas pelos EUA sobre Hiroxima e Nagasaki, no tinham nenhuma relao com a derrota do Japo. Acreditavam e no duvidavam dos comunicados do QuartelGeneral Imperial que anunciavam: a estratgia consistia em atrair as

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foras inimigas at "a palma da mo", a fim de destro-las. Aguardavam como prximo o dia da ltima batalha decisiva. E a vitria nipnica estava intimamente ligada esperana de poder viver sob a proteo da bandeira do Sol Levante. Precisamente nessa situao, a 14 de agosto, foi divulgada a notcia da rendio japonesa, que caiu sobre a comunidade como um relmpago em cu azul. Na realidade, a informao chegou aos japoneses no dia seguinte, 15 de agosto. Sobre a situao desse dia fatdico e dos dias seguintes, alguns imigrantes registraram os seus sentimentos nos seus dirios(*). A seguir daremos alguns exemplos: I Dirio de Yoshio Abe1 "15 de agosto (quarta-feira). Tempo bom. Confuso total. Pasmo! Na transmisso (de rdio) das 7 horas, inesperadamente o Japo comunicou a aceitao da recomendao de cessar fogo, coisa que se julgava no passar de um boato. Rendio?! Na realidade, deve ser a derrota mesmo. Mas, e a chamada deciso de ataque suicida dos cem milhes de japoneses(**)? Teve que se render diante do violento poder destrutivo da bomba atmica? Vamos glorificar a Rssia que rompendo o tratado de amizade entrou na guerra? A moral da humanidade caiu por terra? Onde est a justia? Nem o Papa de Roma tem autoridade para reprimir a imoralidade da Inglaterra e dos Estados Unidos? A prpria religio, em ltima anlise, no passa de um meio de vida? No existem nem Deuses nem Buda?(***). Est se materializando o inferno nesta vida? No! O povo nipnico espera o futuro desenvolvimento. O Japo continuar a existir como nica nao capaz de manter a justia internacional. No sei o que fazer, pensando nisto e naquilo, como estivesse de p na escurido. Passo o dia aturdido. A noite tomo umas e outras com pessoas reunidas com as mesmas preocupaes. Todos emocionados com a situao. 16 de agosto A transmisso do Pacfico das 4,30 da manh inaudvel. Ao comear a recepo da transmisso das 7 horas, pessoas preocupadas se juntam para ouvir. Entretanto, do noticirio das 7 s deu para ouvir uma pequena parte do comeo. Nada se ouviu da transmisso das 7,45 e das

1 Yoshio Abe. Imin no Hi (Lpide do Imigrante), edio particular, p. 20. Sem data de publicao. Abe morava em Penpolis, E. F. Noroeste do Brasil. Dedicou-se voluntariamente ao movimento esclarecedor. (*) O hbito de escrever dirio uma tradio multissecular entre os nipnicos. (**) A populao do Japo na poca era estimada em 100 milhes de almas. (***) Os japoneses em sua maioria seguem tanto o xintosmo como o budismo. E se dirigem aos deuses e a Buda quando pedem ajuda de um poder superior.

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8,50. Ah, para onde vai o Japo? O que ser da nossa ptria!? Esperemos com calma. Sem ouvir algo mais claro, no se pode ouvir nada (sobre o fim da guerra). 17 de agosto (sexta-feira). Tempo bom. (com corte da parte inicial)... A falta de nitidez nas transmisses da rdio japonesa est provocando verdadeira inundao de boatos em toda a parte. Seria bom esperar com calma at que a verdade seja esclarecida. Mas isso impossvel..." (corte da parte final). II Dirio de Masao Hashiura2 "15 de agosto. A notcia de que os combates de ontem foram favorveis s foras nipnicas entusiasmou os japoneses do interior. Mas, uma pessoa que voltou hoje ao anoitecer da cidade A., contou que o Japo se rendeu incondicionalmente. Os japoneses da dita cidade, atnitos, no sabem o que fazer, etc. Eu no acredito nessa verso, mas afirma-se que a informao fidedigna. O pessoal da famlia est apreensivo mas animei a todos e fui me deitar. No podendo pegar no sono, assaltado por emoes incontveis levantei-me silenciosamente. E fiquei na posio de reza sobre a mesa, repetindo as oraes de exorcismo e grande purificao(*) at o amanhecer. 16 de agosto. Sa cedo de casa, tomei o nibus, cuja velocidade me pareceu lenta demais, e assim que cheguei cidade A., procurei o sr. Suzuki que teria trabalhado numa emissora de rdio no Japo. Disse-me ele que no havia ouvido a Mensagem Imperial que, segundo consta, teria sido transmitida na manh do dia 14. Contudo, mostrou-me o documento distribudo pelo mdico Katsuda, cujo teor o seguinte: 'Segundo os ensinamentos deixados pelo nosso Fundador e nossos Antepassados, Ns iniciamos a guerra da sia Oriental, visando a estabilidade dessa regio. Desde ento at hoje, os resultados da luta armada no nos favoreceram. Alm disso, os nossos inimigos chegaram a empregar bombas proibidas de violento poder destrutivo causando danos
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Dirio pessoal de Masao Hashiura. Por ocasio da fundao da fazenda Segunda Aliana, na Noroeste, Hashiura ingressou na colnia (Fazenda Tottori), na qualidade de diretor local da Sociedade Colonizadora da Provncia de Tottori. Na poca morava num subrbio de Araatuba (a cidade A. referida no dirio). O mdico Katsuda, citado no texto, trabalhou na divulgao da verdade da denota. Faleceu repentinamente a 18 de outubro do mesmo ano (1945), em conseqncia das apreenses e preocupaes que teve de suportar. (*) Rituais xintostas.

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extraordinariamente grandes. quase impossvel impedir tais acontecimentos. O resultado (se continussemos a guerra) seria o fim do nosso povo e a destruio da cultura da humanidade. Seria contrariar os ensinamentos do nosso Fundador e dos nossos Antepassados. Por esta razo, Ns aceitamos a Declarao Conjunta dos inimigos. Lamentamos profundamente a perda de oficiais e soldados e manifestamos os nossos sentimentos perante suas famlias. O nosso povo deve suportar o insuportvel, pois ns estamos ao seu lado. O povo dever procurar no se atrasar no progresso cultural da humanidade. Deve compreender o nosso intento'. A Declarao Conjunta 1) No ser violada a suprema prerrogativa imperial. 2) O poder poltico do Imprio ser exercido pela vontade do povo. 3) Transferir para a zona de segurana os prisioneiros de guerra aliados. 4) Suspender imediatamente as atividades militares. Essa Mensagem Imperial foi baixada depois de reunies dos principais conselheiros com a presena de Sua Majestade realizadas a partir do dia 10 (de agosto). Informa-se que o gabinete Suzuki renunciou coletivamente; o ministro da guerra, general Anami suicidou-se depois de dirigir palavras de encorajamento s tropas das linhas de frente(*). O novo gabinete chefiado pelo Prncipe Naruhiko Higashikuni (59 anos) por ordem de Sua Majestade o Imperador. Por outro lado, continuou como sempre confusa a transmisso da manh do dia 14, mas ouviu-se com clareza a da manh do dia 15, tendo sido possvel receber quase todas as informaes transmitidas, segundo me disseram. De acordo com uma verso, a transmisso para o exterior ser feita doravante pelo Departamento da sia Oriental, s 3,30 da manh. A minha interpretao depois da leitura respeitosa da Ordem Imperial a seguinte: 1) Existncia de erros crassos, num documento que dever ficar registrado na histria futura do mundo; 2) Apesar da falta de clareza na transmisso do dia 14, aquela da manh de 15 foi ouvida com bastante nitidez; 3) Se foi uma rendio incondicional, no deveria mais existir um Departamento da sia Oriental. Tendo como fundamentos estes trs pontos, concluo:

(*) Na realidade o ministro Anami matou-se pedindo desculpas ao Imperador, por haver um grupo de jovens oficiais tentado impedir a transmisso da gravao do Edito Imperial sobre o fim da guerra. Tratava-se de uma conspirao destinada a impedir a rendio japonesa e prosseguir na luta. A tentativa de golpe de Estado fracassou por causa da decidida oposio de membros do Alto Comando.

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1) A Mensagem Imperial anotada pelo sr. Katsuda resultou da alterao feita naquela baixada no dia 14; 2) A Emissora Japonesa de Radiotransmisso para o Alm-Mar foi destruda dia 14 pela aviao americana, de maneira que as transmisses posteriores ao dia 15 so falsas, feitas nos Estados Unidos da Amrica; 3) E o termo 'receber' fica entre 'protocolar' e 'aceitar', razo por que forosamente deveria haver a apresentao de condies de reciprocidade. Suzuki e eu chegamos a esta concluso depois de analisar o escrito e com isso recuperamos nosso nimo. A fim de trocar idias com o sr. Katsuda, fui ao Hotel Shiraishi, local de reunio para conversas sobre a conjuntura. O sr. Katsuda estava sentado no meio de muita gente, com fisionomia sombria, falando sobre a rendio do povo nipnico e a atitude que deveramos tomar daqui para diante. Dizia ele: 'At a Declarao Conjunta dos Trs Pases anteriormente entregue, os inimigos exigiam a reduo do territrio japons quele de antes da guerra nipo-chinesa de 1894-95. E o pas ficaria sob a fiscalizao dos Estados Unidos. E agora, lanadas as bombas atmicas, passou a ser uma Declarao dos Quatro Pases, segundo a qual, embora reconhecendo as prerrogativas imperiais, toda a poltica militar e diplomtica fica sob controle americano, sendo inevitvel a realizao de uma grande remodelao da poltica nacional. Devemos regredir Restaurao Meiji e comear tudo de novo, etc. Impressionado pela atitude sincera do sr. Katsuda, no pude conter as lgrimas que corriam sem parar. Quando terminou sua fala, me animei a dar a minha opinio. Eu disse: mesmo na pior hiptese aventada pelo sr. Katsuda, sem dvida os japoneses se erguero antes de 2.000 anos. Isso porque, com exceo de bombas atmicas e avies, as demais armas sero desnecessrias... Mas, o que acaba de acontecer no representa capitulao, e sim comeo de um tratado de paz de igual para igual. Como pode manter as prerrogativas de Sua Majestade e ao mesmo tempo arrebatar a sua funo militar e diplomtica? Eles so useiros e vezeiros em vender gato por lebre. Pode o Japo se encontrar numa situao muito precria, porm no possvel que caia na armadilha dos adversrios. Por outro lado, a Declarao das Quatro Potncias apresenta-se mais branda do que a dos Trs Pases, porque inclui o parecer da Unio Sovitica. Isso foi demonstrado na Conferncia dos Trs Grandes de Berlim. A minha opinio recebeu aprovao geral, de maneira que o sr. Katsuda e um tal de Fusamae ficaram sem saber o que fazer e se retiraram. Se, por convenincia, chamarmos os que aceitam a derrota japonesa de 'moles', e os vitoristas de 'duros', os que procuram o meio-termo de

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moderados, o sr. Katsuda representava originariamente a ala moderada. E ele tinha facilidade de receber informaes pelo rdio. Assim sendo, era nosso costume ouvi-lo em casos de notcias urgentes. Portanto, a sua adeso ao grupo 'mole' representa um grave golpe para as pessoas de origem nipnica da cidade de A" (corte do restante). III Dirio de Seiichi Tomari 3 "15 de agosto. Deveria ser um dia de grande alegria. No entanto, ouo falarem na rendio incondicional do Japo, iludidos por notcias falsas enviadas dos Estados Unidos. Temos assim um dia de vergonha. Passei a noite sem dormir, chorando. Pensando bem, so muitos os pontos de interrogao. Espero a manh do dia 16 para visitar o Velho. Dele ouvi palavras tranqilizadoras 4 . Resumindo, concluo que foi uma grande vitria do Japo. Lgrimas de alegria correm sem parar. S alegria, no me vem outro pensamento. 22 de agosto. Agarrei uma notcia correta. E meu mrito ter enviado ao interior essa informao certa, que estava arquivada junto a uma autoridade competente. No h alegria maior. Sinto-me gratificado ao escrever estas notas, pensando na alegria que devem estar sentindo a estas horas os compatriotas do interior. 25 de agosto Viagem ao Interior. 5 de setembro Regresso ao lar"5. Temos a dirios escritos respectivamente por elementos do grupo esclarecido (derrotista), moderado e "vitorista". Em torno do dia 15 de agosto, os japoneses que tiveram direta ou indiretamente conhecimento das informaes transmitidas pela rdio japonesa ficaram atnitos e estupefatos, e choraram com a triste notcia da derrota. Entretanto, na verdade, foi um nmero muito reduzido de pessoas que acreditou piamente no revs militar do Imprio. A maioria recebeu a notcia com suspeita de que se tratava de um boato maquinado pelos Aliados. E antes mesmo desse dia, j corria a informao de grande triunfo do Japo. E no
Dirio pessoal de Seiichi Tomari. Documentos sobre a Shindo Renmei, do Departamento de Ordem Poltica e Social (DOPS) do Estado de So Paulo, fl. 1.717. Como se ver depois, Tomari agiu desde a guerra no sentido de atacar as atividades produtivas que resultavam em ajudar o inimigo. No ps-guerra atuou na fundao da Shindo Renmei e se tornou um dos seus mais ativos dirigentes e orientador direto das Tokktai (Unidades de Ataques Especiais, encarregadas de atos terroristas). 4 "O Velho" o futuro presidente da Shindo Renmei, Junji Kikkawa, na poca na priso. Conforme veremos na nota 8, Kikkawa ouviu sobre a grande vitria do Japo ainda no crcere. Tomari visitava-o freqentemente para consultas. 5 Mesmo depois, Tomari percorreu ativamente muitas localidades para consolidar a organizao da Shindo Renmei e difundir as notcias do triunfo nipnico na guerra.
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mesmo dia foi vinculada por fonte ignorada a notcia de que a informao da derrota era falsa e que na verdade o Japo obtivera uma grande vitria. Esta no era uma notcia falsa adrede preparada, como viria a acontecer posteriormente, com a finalidade de obter vantagens pecunirias, enganando os patrcios. possvel que tenha sido gerada pelo sentimento de "no querer acreditar na derrota". Os boatos destinados a negar a derrota e desejar que o Japo tivesse alcanado a vitria surgiram de muitas fontes. impossvel determinar suas origens, mas acredita-se que brotaram simultaneamente em vrias localidades. Na vida da comunidade, isolada e sem informao, dvidas e suspeitas entre seus membros j existiam durante a guerra. Mas ao chegar a informao da derrota da ptria, que acreditavam absolutamente invencvel, a situao se agravou de maneira assustadora. Tendo como data-bas 15 de agosto, a comunidade nipnica do Brasil mergulhou num turbilho de caos. Ser que, de fato, o Japo venceu ou perdeu a guerra? Do dirio de Hashiura, h pouco mencionado, podemos colher as seguintes informaes acerca da tremenda confuso gerada na comunidade. "17 de agosto. De acordo com notcias ouvidas por pessoas do grupo 'mole', a delegao nipnica para assinar a rendio no chegou a Okinawa. Por isso os americanos ordenaram que ela fosse a Manila, no dia 18, em avio pintado com cruz verde em fundo branco. E por fim, a notcia de que mulheres japonesas reclamavam da falta de gneros no interior do pas, motivo por que pediam a volta da paz com a maior urgncia possvel. A comear do sr. Katsuda, todos que ouviam as informaes derramavam lgrimas abundantes, ningum falou durante algum tempo. Mas eu penso: por maior que seja a penria, estranho recorrer a mulheres para falar. Se for uma ttica para forar a capitulao dos soldados da linha de frente, uma grande idiotice, servindo apenas para estimular os abusos inimigos. Na minha opinio definitiva no passam, igualmente, de notcias falsas" (corte parcial). "Dirijo-me ao Hotel Shiraishi. Mostram-me notcias alvissareiras que acabam de chegar via So Paulo, Marlia e Lins: 1) Nas proximidades de Tmank, as foras japonesas cercaram 160 mil soldados soviticos, liquidando 60 mil deles. 2) Em pleno combate contra o exrcito comunista chins e 20 divises americanas, contra-atacando-os. 3) Ao longo do litoral de Kujkuri, cercados 400 navios da marinha inimiga, afundados 60 e causados grandes estragos a 40 outros; trezentos navios se renderam.

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So notcias boas demais. Mas no impossvel entender se tomarmos o exemplo do equvoco de considerar a aceitao de proposta da Conferncia de Paz por parte do Japo como rendio e interpretar como tendo havido contra-ataque s foras inimigas que vinham desarmar as foras nipnicas(*). 18 de agosto. A notcia dos 'moles' recebida esta manh diz que, devido ao mau tempo, atrasou-se a partida da delegao; o problema de como mudar o emprego de 11 milhes de empregados na indstria pesada e outras. Parece haver muitas notcias do gnero, mas devido s violentas crticas dos 'duros' (os 'moles') diminuram suas informaes. A grande massa desorientada entusiasma-se com as informaes dos 'vitoristas'; no momento seguinte quase desmaia diante de notcias derrotistas. As mulheres alegram-se e choram vezes sem conta no decorrer de um dia. o que se chama 'alternncia da tristeza e alegria', a situao destes ltimos dias. Mal se alimentam e no conseguem dormir noite. A minha tese de imparcialidade s tem apoio de pequeno grupo de pessoas. 21 de agosto. Maekawa que ouviu o noticirio de Fukunishi conta: Em Manila, quinhentos representantes e jornalistas de muitos pases se reuniram. Do Japo participaram 16 pessoas sob a chefia do tenente-general Kawabe. Terminada a assinatura no documento de rendio, decidiu-se concluir os pormenores a seguir. "Na minha opinio no se trata, de rendio e sim assinatura do compromisso recproco para a realizao da conferncia de paz que comear em seguida (corte parcial). Casualmente aparece um tal de Mori, coloca-se no centro e, como o faz em seus sermes diz, abrindo os braos: 'Tudo acabou... Todos devem seguir o caminho certo...'. Fiquei furioso e exclamei: 'Cala a boca!' 'Voc no tem direito de falar na nossa presena. Tenha cuidado com o que diz!'. Abandonei o local e me dirigi imediatamente ao Hotel Shiraishi. Ali a turma estava no auge da euforia, diante de boas notcias procedentes de Lins. Tive de advertir o pessoal contra a credibilidade cega face a tais informaes. Algumas dessas notcias alvissareiras recebidas via Lins: 1) Afundadas 1.100 belonaves da l. a , 2.a e 3.a Esquadras dos Estados Unidos; 300 capitularam.

(*) Redao confusa. Alguns trechos dos dirios (talvez por sua subjetividade inerente) so de compreenso difcil, obrigando o redator a verdadeira ginstica mental a fim de adivinhar ou tentar entender o significado do texto ou das palavras.

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2) Participaram dez mil aparelhos da Fora Area Japonesa. 3) O Imprio do Japo aconselhou a rendio incondicional a quarenta e dois pases. 4) A Inglaterra j capitulou; parece que os Estados Unidos esto postergando a sua rendio. 5) Declarao de desarmamento de todas as foras militares inimigas do Pacfico. 6) Vladivostok caiu em oito horas. 7) No registro os demais poucos itens, por no merecerem, em absoluto, qualquer credibilidade. 25 de agosto. ... (corte da parte inicial). Na Fazenda Tiet alguns beberam demais na festa de celebrao da grande vitria nipnica e exibiram a bandeira do Sol Nascente, resultando da uma briga com brasileiros, com derramamento de sangue. Dezenas de japoneses foram detidos, sendo que quatro dos principais acusados foram remetidos para a Delegacia de Polcia da cidade A. Uma vergonha... (corte da parte final). 30 de agosto. Yasuda e Matsumoto que estiveram em So Paulo informaram na sua volta que aumenta a distncia entre o grupo dos duros e dos moles. O j conhecido Mori de tal chegou a declarar bombasticamente: 'Se o Japo saiu vitorioso mesmo, eu vou praticar o seppuku (haraquiri)'. Agora no o momento de discutir inutilmente a vitria ou a derrota da ptria, mas sim devemos pensar todos como preservar a beleza e a vitria do esprito nipnico... (corte parcial)... Desejamos voltar nosso olhar para a ptria at o fim, com o vigoroso esprito de vitria certa. O discutido Anze teria dito: 'J est decretada a derrota japonesa. Mesmo que tenha sobrado a ilha de Honshu, a recuperao impossvel. Os japoneses do Brasil precisam deixar de se preocupar com a ptria e se fixar no Brasil'. A meu ver, esto aparecendo poltres em vrias regies... (corte da parte final). 5 de setembro. ... (corte da parte inicial). Tanto o noticirio dos duros como dos moles so extremados, no se pode acreditar cem porcento em qualquer deles. Um exemplo de exagero extremado: 'comovido diante do apelo direto do povo ao Trono, Sua Majestade o Imperador cedeu o cetro ao Prncipe Herdeiro, tendo como regente Sua Alteza Imperial o Prncipe Chichibu. A seguir, S. M. dirigiu-se capitnea e assumiu o comando da Esquadra, e em dois dias, aniquilou a esquadra inimiga. Regressando triunfalmente, S. M. recebeu o cetro do Prncipe Herdeiro', etc. 'Participaram dessa batalha naval 3 mil belonaves, cem mil avies', etc. 'So Francisco e Nova York se transformaram em mar de fogo', etc. 'A Rssia

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e a China perderam a condio de naes, etc/ So verses absolutamente inaceitveis. Em resumo, as notcias dos duros destes dias constituem uma fico, partindo de fatos verdadeiros; as do grupo mole torcem a verdade. 10 de setembro. Aumenta a densidade da informao chegada cidade A., relativa a vinda ao Brasil de uma delegao (japonesa) para tranqilizar os nipnicos aqui residentes. Diz ela: 'A misso de consolao dos compatriotas residentes no exterior chefiada pelo sr. Hachiro Arita e composta de 200 membros partiu do Japo no dia 1. de setembro, a bordo de algumas belonaves, sob a proteo de avies. Chegar ao Brasil por volta do dia 15 de setembro. Consta que o nmero total de enviados a outros pases soma trs mil pessoas. Os duros da cidade A. julgam que a finalidade da misso consiste principalmente em confortar os patrcios residentes no Brasil, o que um absurdo. Sinto raiva diante do pretensioso esprito de achar que temos qualificao bastante para receber uma visita de 'conforto'". Os rumores de que uma misso de conforto ou simpatia ou ainda uma misso militar viria ao Brasil foram amplamente difundidos entre os nipnicos do interior. Em setembro, japoneses levando a bandeira de seu pas viajavam para So Paulo a fim de recepcionar a misso. Por causa disso, os hotis pertencentes a japoneses ficaram lotados. Consta que o nmero de japoneses que vieram do interior para a capital somava 2 mil. Quando ocorreu o boato de que "uma esquadra nipnica de 16 navios chegar a Santos s 15,30 horas do dia vinte e quatro de setembro", muitos desceram viajando de trem cidade praiana. Mas, informados de que a esquadra no mais aportaria em Santos e sim no Rio de Janeiro, seguiram rumo ao Rio um aps outro, pela Central do Brasil6. No entanto, como a misso no vinha, mudaram diversas vezes a data e o local de chegada, com as conseqentes trapalhadas. Mas havia a certeza absoluta e nenhum deles duvidava de que um dia essa misso daria o ar de sua graa no Brasil. Junji Kikkawa, nomeado presidente da Shindo Renmei, depois de sair da priso no dia 17 de novembro, descreveu do seguinte modo a situao 7 : "Desde ento vivi contando os dias, esperando a ofensiva das foras japonesas, a partir do dia 10 de setembro que, segundo ouvi, seria a data

Histria dos 40 Anos da Imigrao, op. cit., p. 216. Junji Kikkawa. Bysh Zakkan (Impresses Vrias no Leito de Enfermo) na revista Shindo, n. 1,1945, p. 4.
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comemorativa 8 . Uma viagem direta de navios de guerra do Japo levaria mais ou menos vinte dias, mesmo via Cabo da Boa Esperana ou Canal do Panam. Mas mesmo passados 20 dias, 30 dias nada aconteceu. Considerei estranho o fato. Contudo, uma vez fora da priso, sintetizando as mais diferentes verses que ouvi, cheguei inesperada concluso de que se tratava da mais ilimitada magnanimidade de Sua Majestade: a fim de evitar a transformao deste Brasil em grande campo de comoo, j foi concludo, secretamente, entre as mais altas autoridades dos dois pases um tratado de paz. No momento, parece-me que a situao se esclarecer em devido tempo. Fico cada vez mais grato diante da profunda generosidade de Sua Majestade. Mesmo brasileiros de classe inferior, ao verem o grande esprito imperial, reverenciaro (sic) o Japo, com lgrimas nos olhos". Entende-se pelo escrito de Kikkawa que o dia 10 de setembro fora estabelecido como data comemorativa da vitria e que nesse dia chegaria, viajando em navio de guerra, uma misso de consolao ao Brasil. Esse rumor foi espalhado logo depois do fim da guerra. A no-concretizao dessa visita se deveu ao seu adiamento "graas benemerncia imperial, a fim de evitar que o Brasil se transforme em campo de comoo" (na interpretao de Kikkawa). Por ter sido a procrastinao causada pela magnanimidade do Imperador, ningum reclamava. Todavia, embora adiada, a misso enviada pelo Imperador viria sem falta. Tempos depois ainda acreditavam, sem nenhuma dvida, e aguardavam com fervor esse dia. Todas as organizaes que aguardavam esse dia, acreditando na vitria nipnica, prepararam uma longa representao escrita. A representao da Shindo Renmei dizia: "Tendo vazado por acaso a informao sobre a vinda da misso, fomos tomados de uma profunda e indescritvel emoo, mas, ao considerarmos a situao atual da comunidade japonesa do Brasil, lamentamos o seu estado, por demais vergonhoso". Comea assim a representao, explicando a seguir pormenorizadamente "a situao real aps a retirada dos rgos diplomticos do Imprio", e "a comunidade japonesa no ps-guerra e o aparecimento de traidores da ptria". Acrescenta: "Se descuidarmos, todos os trezentos mil compatriotas do Brasil se tornaro retrgrados traidores da ptria,
8 Mais ou menos em meados de agosto, quando ainda se achava na priso, ouviu de um companheiro de crcere que, no ataque geral da Terceira Esquadra Americana baa de Tokyo, o Japo empregou a bomba com aplicao de ondas de alta freqncia (sic), afundando dezenas de navios inimigos. Atemorizados, os restantes vasos de guerra se renderam; Mac Arthur se dirigiu a Tokyo para assinar a capitulao e outras notcias de triunfos. Ao inesmo tempo, soube que ficou marcado o dia 10 de setembro como "Dia da Vitria".

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criando-se uma situao sem salvao. Diante disso, num grupo de patriotas ergueu corajosamente, com risco da prpria vida, num movimento patritico, abrindo com isso os olhos dos trezentos mil patrcios. Iniciou-se assim um corajoso e poderoso movimento destinado a esclarecer e salvar os trezentos mil compatriotas. Assim surgiram a Shindo Renmei e outras organizaes". Descreve as causas do surgimento de "movimentos patriticos" e a posterior "marcha da represso aos movimentos patriticos". "Os motivos de levar considerao e apreciao da nobre Misso, o resumo da situao real dos compatriotas no Brasil, desde o fim da guerra at o presente so: como tais compatriotas rebeldes agiram e falaram de modo a deshonrar a nossa ptria e violaram o carter sagrado da Famlia Imperial. E ao mesmo tempo, solicitar Misso a fineza de estudar e pesquisar as suas causas, para material de reflexo no futuro. Tambm solicitamos pesquisar a atitude tomada pelas autoridades e povo brasileiros em relao aos nossos patrcios, bem como os prejuzos de toda espcie sofridos pelo povo brasileiro e pelos irmos nipnicos, a fim de obter importante subsdio para as futuras relaes diplomticas nipo-brasileiras. Em particular, em relao aos atos de ultraje sagrada imagem de Sua Majestade e bandeira do Japo, rogamos investigao completa e rigorosa, a fim de evitar danos ao prestgio da nossa ptria o Japo", conclui9. Por outro lado, Kiyoo Yamanouchi, presidente da Zaig Gunjin-kai (Associao dos Militares da Reserva), outra poderosa organizao da ala "vitorista", aps expor com pormenores o que aconteceu durante e depois da guerra, e o antagonismo entre "vitoristas" e "derrotistas", declara: "Embora parea parcial o que se exps, a pura verdade, no tendo sido propositadamente enfeitado, torcido ou falseado. Est tudo baseado em provas e testemunhas. No se pode negar em absoluto as ofensas Famlia Imperial e Nao praticadas pelos derrotistas. Se no forem tomadas, nesta oportunidade, providncias apropriadas em relao a uma parte antipatritica de japoneses residentes no Brasil, ser muitssimo difcil a harmonizao das alas dos duros e dos derrotistas da comunidade nipnica do Brasil. Estamos profundamente preocupados com a sua influncia sobre a educao dos niseis e tambm sobre a possibilidade de provocar mal-entendidos dos estrangeiros que no compreendem o esprito japons. E ainda mais, para mostrar a dignidade e majestade do Imprio desejamos sejam tomadas medidas drsticas".

No est mencionado nem o nome do autor ou data. V-se porm no texto a expresso: "Passados trs anos do fim da guerra", de modo que se pode concluir que de 1948, aproximadamente (Museu da Imigrao, documento sobre Shindo Renmei, PB 8).

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"E se por acaso houver necessidade de coletar registros e provas dos fatos, a qualquer momento faremos uma mobilizao geral dos companheiros da ala dura para atender s suas ordens com alegria e seriedade, considerando-as uma honra para ns", escreve10. Quer dizer, na viso deles, aqueles que acreditavam na vitria do Japo eram, como nipnicos, os homens absolutamente justos. Contrariamente, os esclarecidos (derrotistas), ou aqueles que se dedicavam a atividades produtivas que favoreciam os inimigos do Japo, eram traidores da ptria. Por isso, esperavam que a misso do Imperador, que haveria de vir um dia sem falta, faria um claro julgamento, premiando uns e punindo outros. O pensamento de que o navio ou avio esperado viria inf alivelmente um dia dominava no s a mente dos dirigentes das entidades vitoristas como de todos aqueles que acreditavam na vitria do Japo na guerra. "Por volta de 1945-46 morvamos no ncleo colonial chamado entre os nipnicos de Colnia Rolinha, que ficava a 15 km da estao Aguape, perto de Valparaso. Todos os japoneses daquela colnia acreditavam que o Japo havia ganho a guerra. E esperavam intimamente a vinda do avio da fora area japonesa. Muitos compraram pano branco para confeccionar a bandeira nipnica. O pavilho do Sol Nascente destinava-se a chamar a ateno do piloto do aparelho da fora area. Minha me disse que como tinha trazido uma bandeira quando veio do Japo, no havia necessidade de fazer outra. Mesmo quando estavam trabalhando na roa, toda vez que passava um aeroplano, todos paravam de trabalhar e, encostados no cabo da enxada, acompanhavam com o olhar at ele sumir no horizonte" 11 . (Esta uma declarao de um casal residente no interior e que pertenceu Shindo Renmei, recordando o que aconteceu h 40 anos.) As publicaes do grupo vitorista da poca divulgavam, como que a atender aos ardentes anseios dos patrcios, verses ilusrias, baseadas em aspiraes as mais diversas. So escritos enganadores, destinados a atender aos desejos vitoristas. Um exemplo eloqente de tais escritos o que apresentamos a seguir. "Chega voando uma aeronave com a marca viva do Sol Nascente. Surpresa e alegria dos compatriotas que pensavam fosse um sonho. Dia 12 ltimo um avio procedente do lado de Santos sobrevoou o ncleo colonial Taboa, nos arredores da cidade de So Paulo. Um patrcio
No tem ttulo, mas consta como autores Kiyoo Yamanouehi e companheiros. A data: "dia... ms... ano 26 da Era Showa" (1951). 11 Testemunho de Koichi Nakadate e Yoshii Nakadate. O Japo Venceu os Aliados na Segunda Guerra Mundial? O Movimento Social "Shindo Renmei" em So Paulo (1945-49). Junji Nakadate: tese de mestrado da seo de Histria do Departamento de Cincias Humanas da Universidade Catlica de So Paulo, 1988, p. 576.
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olhou casualmente e descobriu nas azas prateadas do aparelho, que voava relativamente baixo com ruido ensurdecedor, uma bandeira do Sol Nascente pintada em cor vermelha viva. Sem querer gritou: 'Ah!', e quiz correr atrs dele, mas a aeronave j se afastava e sumia rapidamente no cu. Beliscou o rosto, sacudiu a cabea, pensou at que fosse uma iluso, mas aquela esfera de cor vermelha viva gravada na retina era uma realidade indubitvel. Quero ver mais uma vez! Aquele avio veio da direo de Santos. Pode ser que volte seguindo a mesma rota. isso! O patrcio saiu correndo e, a cavalo, avisou todos os compatriotas da vizinhana. Ao voltar sua casa, outro japons havia chegado para dar a mesma notcia. Esperaram com ansiedade e expectativa, apertando o peito. Aps trs horas de espera, pelas 14 horas aproximou-se o roncar de motor rompendo o pesado ar da atmosfera. Todos saem correndo de suas casas, tanto os vizinhos da frente como os dos lados. O aparelho se aproxima, e que sorte, est voando baixo, com o ensurdecedor ronco do motor. Naquele instante, o olhar de todos se concentra na aeronave. Ela passa rpido, mexendo nos nervos das pessoas. Elas acompanham com o olhar atento o avio que se afasta no horizonte. Ah! L estava o Sol Nascente! Uma aeronave japonesa! O pulsar do corao da ptria percorre todo o nosso corpo! O avio se distancia, se transforma num ponto e desaparece. Mas ningum se mexia na posio de p em que se achavam/' "Aquele avio que provocou comoo profunda em toda a zona de Taboa idntico ao hidroplano 94, de reconhecimento (da Marinha japonesa) divulgado no suplemento Tabela de Novas Armas, organizada por Yahei Ohba, da revista Hinode (Sol Nascente), porm sem o flutuador. Monomotor, monoplano. Voava a 150 a 200 m. Nas asas e na fuselagem estava a clara marca da bandeira do Japo, reconhecida por mais de vinte famlias s em Taboa. Ida, s 10,30; volta s 14 horas, aproximadamente. Consta que no desceu no aeroporto mais prximo" 12 . No se sabe se este artigo foi uma inveno ou se pessoas de 20 e tantas famlias viram uma fantasia em pleno dia. Mas o certo que, por meio de informaes desse gnero, foi se fortalecendo a crena na vitria nipnica. Os dirigentes da ala vitorista, cujo artigo de f era a vitria do Nippon adotavam todas as medidas ao seu alcance para fortalecer a crena dos seus partidrios e tambm atrair para o seu grupo os chamados "lerolero", que, sem saber se seu pas venceu ou perdeu a guerra, formavam o partido neutro, que ficava em cima do muro.
Ascn Shinp (revista oficial da Shindo Renmei), nmero 9,1945, p. 3.

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"Servio Radiofnico Nacional (Domstico) 12 de outubro. 1. Desembarque em So Francisco, Estados Unidos! Decidiu-se enviar o comandante supremo das nossas foras terrestres. 2. Houve uma longa conferncia entre o nosso ministro do Exterior e o general derrotado MacArthur que est preso no prdio do antigo consulado geral (americano), chamando-o ao Centro Cvico de Hibiya." Estas "notcias da guerra" estavam acompanhadas, como sempre, e guisa de um adendo, de espertas observaes como as seguintes: "Depois de um longo intervalo estamos lhe enviando um noticirio. Mas o leitor no deve se prender ao noticirio, e sim acreditar no que deve acreditar, no se deixar levar pelo duvidoso, confiando na sua prpria f. Seja como for, em se tratando de sdito nipnico que no tiver certeza da vitria ou no consegue t-la, que no possui a conscincia de ser nipnico. Tratando-se de japons com f, no se apoiar em notcias nem se deixar enganar por boatos; assim sendo, dever encarar a notcia como apenas uma novidade do dia. preciso ter cautela com relao visita de muitas pessoas que procuram a nossa sede em busca da verdade ou que querem saber onde fica o local de recepo (de notcias). Por isso s podemos declarar 'sem fundamento." 13 Alm dos informes escritos como os referidos atrs, foram tambm produzidas fotografias falsificadas em grande nmero e distribudas como provas da vitria nipnica. O edito imperial divulgado por ocasio da cerimnia de assinatura da rendio realizada a bordo do Missouri, a 2 de setembro de 1945, na baa de Tokyo, dizia: "Ns ordenamos aos nossos sditos suspender imediatamente as hostilidades, depor as armas e obedecer fielmente s clusulas da parte do documento e s ordens do governo imperial e do Quartel-General Imperial". Entretanto, esse documento foi falsificado em foto reproduzindo a do Missouri, com os seguintes dizeres: " Ordeno que o supremo comandante aliado aceite as clusulas da declarao do Imprio do Japo comunicada em Potsdam, suspender imediatamente os atos de guerra e obedecer as clusulas do documento do acordo e tambm a todas as ordens do governo imperial e do QuartelGeneral Imperial. a) Hirohito".
Shindo Renmei News, outubro de 1945 (Documento do Museu da Imigrao, PB 8).

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E a bandeira dos Estados Unidos foi trocada pelo estandarte da marinha de guerra do Japo, com a legenda: " Desfraldada a bandeira naval nipnica no vaso de guerra Missouri", com a explicao de tratarse de reproduo de uma foto publicada no jornal A Tribuna, de Santos, do dia 16 de setembro. A foto foi vendida em grande quantidade, muita gente disputava a sua aquisio14. Bem mais tarde, uma pessoa que pertencia ala esclarecida, e participou do movimento de esclarecimento e por isso foi at ameaado de morte, escreveu o seguinte a propsito do caso de falsificao de fotografias. "Encontramos muita dificuldade em revelar e explicar a falsificao, pois se tratava de notcias e fotos falsas muito bem feitas, verdadeiras obras-primas. Por causa delas muitos 'moderados' passaram para o grupo vitorista. No comeo eu mesmo encontrei srias dificuldades em explicar que se tratava de fotografias forjadas. Foi a 19 de setembro que o pastor Ono me mostrou essas fotos. Na ocasio, eu mesmo senti cambalear minha posio" (corte da parte final)15. Conforme esse testemunho, essas fotos forjadas, que apelavam viso, tinham efeito extraordinariamente grande na propaganda vitorista. De modo que, passado menos de um ms do fim da conflagrao, o nmero dos que acreditavam na vitria aumentava cada vez mais, organizando-se, umas aps outras, as associaes vitoristas. Entre elas, aquela que, organizada clandestinamente j n tempo da guerra, agia na luta pela eliminao das atividades produtivas que favoreciam o inimigo, em setembro mudou o nome para Shindo Renmei e reorganizou-se rapidamente, e dentro de poucos meses conseguiu congregar 20 mil famlias, somando um total de mais de cem mil pessoas, transformando-se num grande movimento organizado 16 .

Museu da Imigrao, Documento PB 10. Essas fotos tm o carimbo de onde foram feitas: Foto Yoshida, de Marlia. "lbum Comemorativo da Grande Vitria na Guerra da Grande sia Oriental" (foram encontrados os volumes 1,5 e 6) e cada jogo de 12 fotos custava 70 a 80 mil ris. Cada foto 30 mil ris, segundo informa Takeo Nishikawa. Nos documentos do DOPS sobre a Shindo Renmei constam pedidos como "Com referncia ao pedido de foto da belonave Missouri e do presidente Truman, fotografado depois da cerimnia (de rendio) solicitamos com urgncia a remessa de mais 20 cada. 16 de fevereiro. seo de Tup". Ou ainda: "30 de maro, seo de Rancharia, pedimos o envio de cinco fotos do Missouri". Correspondncias desse teor so encontradas em grande nmero. 15 Idem. 16 Existem diversas verses sobre a data de fundao e nmero de associados da Shindo Renmei. Falaremos disso mais adiante.

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b) O Edito Imperial sobre o fim da guerra e a expanso do grupo vitorista Por causa do boato da vinda da misso militar ou misso de consolao, como enviados do Imperador, provocou-se a concentrao de mais de 2 mil nipnicos em So Paulo. No ms de setembro, estranhando a extraordinria movimentao de japoneses pelas ruas, as autoridades policiais de So Paulo chegaram a advertir os nipes para que eles prprios procurassem acalmar os nimos a fim de evitar a interveno do governo. Importantes jornais paulistas comearam a noticiar os acontecimentos e a questionar as estranhas atividades de japoneses que acreditavam na grande vitria do Japo. Diante da previso de um agravamento da situao, elementos de proa da comunidade nipnica de So Paulo, preocupados, sentiram a necessidade de se adotar alguma providncia e reuniram-se vrias vezes para estudar a conjuntura. Enquanto eles buscavam uma soluo efetiva, chegou o ms de outubro. No dia 3 desse ms chegou s mos de Chibata Miyakoshi, antigo diretor da filial da Kaik(*), pela primeira vez e oficialmente, o Edito Imperial sobre o trmino da guerra e a mensagem do ministro Togo, das Relaes Exteriores, endereados aos compatriotas residentes no exterior, enviados pela Seo Brasileira da Cruz Vermelha Internacional, com sede no Rio. Miyakoshi discutiu com os prceres patrcios da Capital sobre a maneira de fazer chegar o Edito Imperial e a mensagem do chanceler aos compatriotas. Foi decidido proceder distribuio, aos centros de maior concentrao de nipnicos, do Edito e da mensagem ministerial acompanhados da seguinte mensagem explicativa1.
MENSAGEM EXPLICATIVA DA DISTRIBUIO DO INFORME SOBRE O FIM DA GUERRA

" Caros compatriotas residentes no Brasil. Ns, abaixo assinados, com a anuncia das autoridades policiais da cidade de So Paulo, levamos ao seu conhecimento o comunicado oficial do Ministrio das Relaes Exteriores do Imprio do Japo sobre a crtica situao enfrentada pela nossa ptria. 0 comunicado em referncia consta, conforme se v do texto anexo, do Edito Imperial baixado no dia 14 de agosto e da mensagem do ministro Togo, das Relaes Exteriores. Relatando a rota do recebimento da nota oficial, informamos que, logo aps a divulgao do Edito Imperial, o
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Documento do Museu da Imigrao.

(*) Kaik, abreviao de Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia de Fomento Industrial no Ultramar).

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Ministrio das Relaes Exteriores telegrafou para a Cruz Vermelha Internacional sediada em Genebra, Sua. Por sua vez, a Cruz Vermelha telegrafou para a Seo Argentina da entidade em Buenos Aires; e desta a mensagem foi enviada ao Brasil, pelo correio; dia 29 de setembro, o sr. E. Hegler, presidente da Seo Brasileira da Cruz Vermelha remeteu, pelo correio, o documento, ao Padre Guido dei Toro, diretor do Colgio So Francisco, de So Paulo (no momento, a Sucia que representa os interesses japoneses no Brasil, mantm suspenso o servio de defesa desses interesses; a escolha do Padre Guido se deve ao fato de o prelado ser vigrio da seo japonesa da Igreja Catlica). E assim chegou s nossas mos no dia 3 de outubro. O prembulo do comunicado oficial est escrito em francs; o Edito Imperial e a mensagem em ingls, de modo que traduzimos o Edito e a mensagem para a lngua japonesa. Fizemos o possvel para realizar uma traduo fiel, mas em se tratando de traduo, poder haver alguma diferena com o original na fraseologia. Quanto ao contedo procuramos evitar todo e qualquer erro, razo por que solicitamos a sua compreenso. O prembulo do comunicado oficial diz: 'entre os sditos do Imprio residentes em pases inimigos ou cujas relaes diplomticas com o Japo esto rompidas, existe o receio da possibilidade de algum entre os sditos do Imprio praticar atos graves, razo por que solicitamos a entrega do presente comunicado'. Neste momento, a nossa ptria, o Japo, se defronta com uma crise nacional sem precedentes desde a sua fundao. Conforme lemos reverentemente no Edito Imperial, Sua Majestade nos concita a suportar o insuportvel e agentar sofrimentos intolerveis, reprimindo a exploso de quaisquer sentimentos, para unidos e coesos, marchar na reconstruo do Novo Japo. Apresentamos os nossos melhores votos pela sua sade. Aa.) Jinsaku Wakiyama Shigetsuna Furuya Kunito Miyasaka Kiyoshi Yamamoto Sen-ichi Hachiya Chibata Miyakoshi Kameichi Yamashita" (No foi observada nenhuma ordem de distino nas assinaturas.)
EDITO IMPERIAL

"Ns comunicamos aos nossos leais e bons sditos: Ponderando profundamente a situao real do Imprio diante da

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tendncia geral do mundo, Ns resolvemos, nesta data, solucionar a presente conjuntura, adotando providncias extraordinrias. Ns ordenamos ao governo imperial comunicar aos Estados Unidos da Amrica do Norte, Gr-Bretanha, China e Unio Sovitica que o nosso Imprio aceita as clusulas da Declarao Conjunta desses pases. Buscar a prosperidade e o bem-estar de todos os pases e a segurana e tranqilidade do nosso povo constituem ensinamentos deixados pelo Fundador do Imprio e pelos nossos Antepassados Imperiais e tambm o que Ns desejamos do fundo do nosso corao. Com a finalidade de assegurar o direito de existncia do nosso Imprio e a estabilidade da sia Oriental, declaramos guerra aos Estados Unidos e Gr-Bretanha, no sendo, porm, nosso intuito violar a soberania de outros pases ou conquistas territoriais. Sustentamos o estado de beligerncia h quase quatro anos, tempo em que os Nossos oficiais e soldados lutaram, dura e valentemente, tanto na terra como no mar; e aqueles que se ocupam de assuntos do Estado esforaram-se ao mximo, ao mesmo tempo em que os cem milhes de sditos da frente civil cumpriram com dedicao total o seu dever patritico. Contudo, a marcha da guerra nem sempre nos favoreceu. E a tendncia geral do mundo igualmente est desfavorvel ao Imprio. Acresce que o inimigo recorreu ao uso de um novo artefato explosivo dotado de infinita capacidade destrutiva, matando numerosas pessoas inocentes. Prosseguir na campanha blica, no s acarretaria a destruio do Imprio e o aniquilamento total do povo nipnico, como tambm o colapso da civilizao humana no mundo. Diante de tal situao, como Ns poderamos salvar os milhes de nossos sditos e como poderamos comparecer perante os augustos espritos do nosso Fundador e dos nossos Ancestrais? Eis a razo da nossa resoluo de ordenar a aceitao da Declarao Conjunta dos Quatro Pases. Com relao aos pases aliados da sia Oriental que prestaram inestimvel colaborao ao Imprio pela libertao da sia Oriental, Ns s podemos expressar nosso profundo pesar. Os qf iciais e soldados que tombaram nos campos de batalha, aqueles que cumpriram o dever at a morte nos seus locais de servio, os que pereceram vtimas de acidentes imprevisveis e todos os seus familiares constituem motivos de Nossa aflio permanente. Nossa profunda preocupao para com os feridos na guerra, s vtimas da luta armada, aqueles que perderam o lar e o meio de subsistncia e a tranqilidade. As dificuldades e sofrimentos que o Imprio dever enfrentar devero aprofundar-se cada vez mais. Ns conhecemos o vosso sofrimento, Nossos sditos. No entanto, Ns decidimos suportar o insuportvel, agentar sofrimentos intole-

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rveis, para construir o caminho futuro da paz, em benefcio de nosso povo, o que constitui saber seguir as mudanas da poca. Ns queremos manter a linhagem ininterrupta da nossa Dinastia, confiar na lealdade sincera dos Nossos sditos e atuar sempre ao seu lado. Exercer rigorosa vigilncia em relao a exploso violenta de sentimentos de qualquer natureza que possam gerar conflitos inteis, evitar disputas entre irmos que levam ao caos, conservando destarte a confiana do mundo, eis o Nosso desiderato. Sditos Nossos: confiai firmemente na perpetuidade da ptria divina, lembrai da vossa grave responsabilidade e a grande distncia a percorrer no rumo do porvir; o povo todo deve cooperar unido eternamente como uma s famlia, dedicando-se com toda a sua energia construo do futuro. Sditos Nossos: cultivai o caminho da sinceridade, exaltai a quintessncia do esprito nipnico, elevai a imortal glria do Imprio e assegurai a participao no desenvolvimento mundial. 14 de agosto do ano 20 da Era Showa (1945)." Assinatura e Selo de Sua Majestade o Imperador. Subscrevem o Presidente do Conselho de Ministros e todos os Ministros de Estado.
MENSAGEM DO MINISTRO SHIGENORI TOGO(*), DO EXTERIOR

"Obedecendo augusta vontade de Sua Majestade o Imperador, expressa no Edito Imperial, datado de 14 de agosto, o governo imperial e os sditos de Sua Majestade tomaram a deciso definitiva de enfrentar a crtica conjuntura, mantendo firme o orgulho do povo nipnico. Dos compatriotas residentes no exterior, igualmente, esperamos que mantenham a mesma determinao resoluta, so as expectativas do governo e do povo que compartilham sempre dos vossos anseios e aspiraes." Um dos japoneses que continuou a campanha de esclarecimento, vivendo numa coletividade japonesa onde aumentavam os adeptos do grupo vitorista, mantinha contudo uma pequena esperana de que, embora a guerra tivesse terminado, no tivesse sido uma derrota completa. Todavia, sentiu que essa tnue expectativa se desfazia completamente diante do Edito Imperial. Ele escreveu, conforme se transcreve a seguir, uma carta, em que confessa a sua desiluso. Na verdade, esse deveria ter

(*) Shigenori Togo (1822-1950), diplomata de carreira, embaixador na Alemanha e Unio Sovitica, duas vezes ministro do Exterior, se'rjdo a ltima no gabinete Suzuki, quando tratou das negociaes de paz. Condenado a 20 anos de priso por crimes de guerra, faleceu no crcere.

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sido, honestamente, o estado de esprito de todos os japoneses, possuidores de algum bom senso, no momento de receber o comunicado oficial relativo ao trmino do terrvel conflito armado. "Desde o dia 15 de agosto, no que diz respeito sorte de nossa ptria, ns, eu e meu irmo, sofremos a deshonra de sermos chamados traidores. extremamente lamentvel a situao em que fomos obrigados a reconhecer o infortnio que se abateu sobre o Imprio, mesmo aps analisado sob todos os ngulos, com base no racionalismo e bom senso, na condio de sdito do Grande Imprio do Japo. Se, por acaso e por piedade, acontecesse um grande milagre capaz de demolir o nosso modo de entender, no s eu e meu irmo como toda a nossa famlia no ficaramos arrependidos. Era pelo que orvamos diuturnamente. Mas foi tudo em vo. A ltima esperana se desfez e o milagre no aconteceu. Lamentavelmente, tivemos a confirmao definitiva de que a nossa interpretao (sobre o fim da guerra) estava correta" (corte da parte final)2. No entanto, a maioria dos japoneses no aceitou documente o Edito Imperial como um "comunicado oficial" emitido pelo governo de Tokyo 3 . A distribuio do Edito Imperial foi decidida numa reunio da Comisso de Estudos de Medidas para Enfrentar a Conjuntura, realizada na sede da Cooperativa Agrcola de Cotia, e da qual participaram 300 pessoas interessadas, vindas do interior. Foi decidido ento que os signatrios da mensagem, j citados, e outros fariam pessoalmente a explicao sobre o trmino da guerra e, ao mesmo tempo, aproveitariam a oportunidade para promover um organizado movimento esclarecedor sobre a derrota nipnica. Em seguida, os signatrios, com a colaborao de elementos esclarecidos do interior, iniciaram viagens para entrega direta de cpias do Edito Imperial e da explicao da conjuntura junto s principais concentraes (colnias) japonesas. Mas j era tarde demais. A situao do interior estava muito mais dominada pelos vitoristas do que se imaginava. A comitiva sentiu-se at ameaada na integridade fsica de seus membros.

Cartas de Takeo Nishikawa. Documento do Museu da Imigrao, PB 15. No s os vitoristas, mas tambm Masao Hashiura, que se dizia neutro ou moderado, escreveu sobre a distribuio do Edito Imperial, no seu dirio: "S posso pensar que se trata de uma farsa preparada por Miyakoshi e outros derrotistas. Um Edito Imperial escrito em francs, material remetido pelo correio, mas sem endereo do destinatrio... Por pior que seja a situao de dificuldades do Japo, no possvel que se envie uma correspondncia to estpida. um sacrilgio inteligncia da nossa me-ptria". Do Dirio de Hashiura, j mencionado.
3

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Miyakoshi, um dos signatrios, nessa viagem, falou pormenorizadamente acerca da precria situao da ptria, sob o ttulo de "Aos Compatriotas do Brasil"4. E ao mesmo tempo, observou: "Com referncia conjuntura atual, ouvi palavras imperdoveis sobre a augusta pessoa de Sua Majestade o Imperador 5 . Esse fato, no meu entender, muito mais grave do que ouvir a discusso relativa vitria ou derrota na guerra. Pela minha convico pessoal, o Imprio do Japo existe porque existe S. M. o Imperador e no o contrrio, o Imperador existe porque existe o Imprio Japons. Mesmo que reste o territrio nacional, um territrio sem o Imperador no pode ser chamado de Japo. Este encerramento do conflito, resultou da augusta deciso de S. M. Acredito que sem a ordem de Sua Majestade, o Grande Marechal, de depor as armas, os nossos leais e bravos militares de terra e mar das frentes de combate nunca teriam suspenso a luta. Que todo o Japo tenha escapado a um passo de se transformar em terra arrasada e todo o povo perecer em holocausto, deixando uma abertura para sua recuperao, aceitando o cessar fogo, deveu-se infinita bondade de Sua Majestade". Miyakoshi apelou, expressando sua f no Imperador Absoluto, mas no foi ouvido pelos que estavam tomados da firme crena na vitria nipnica. Tambm foram contraproducentes as crticas de Miyakoshi s Foras Armadas, dizendo: "Onde no h respeito pela pesquisa no nasce uma boa cincia. Tanto o exrcito como a marinha do Japo ficaram exclusivamente apegados ao Yamato Damashii (Esprito de Yamato ou Esprito Japons), no atriburam a devida importncia cincia. Eu considero que a teve origem a tragdia desta guerra". Entre os vitoristas que depositavam confiana absoluta nas Foras Armadas do Imperador, tais palavras foram consideradas absolutamente inaceitveis e condenveis. Posteriormente, a Shindo Renmei, ao apresentar sua representao misso j referida, citou com pormenores esta crtica aos militares, comentando: "Com base em observaes superficiais e grosseiras, sem nenhuma diferena com as feitas por generais adversrios ou povos inimigos, explicam a derrota nipnica. H pouco, quando da derrota da Alemanha e da Itlia, at de italianos, conhecidos pela sua relativa ignorncia (sic), no ouvimos palavras nem vimos gestos que envergonhassem a sua ptria, fazendo a propaganda da derrota de sua terra de origem. E no entanto, sditos japoneses, possuidores da gloriosa e tradicional histria de trs mil anos, falam e agem da maneira exposta.
Relatrio da Viagem ao Interior, manuscrito. Documento do Museu da Imigrao, PB 15. Representao da Shindo Renmei, j aludida. Documento do Museu da Imigrao, PB 15. No se conhece bem o contedo, porm parece tratar-se de informaes procedentes do Japo sobre a responsabilidade do Imperador na guerra ou sua renncia.
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Eles so inferiores aos italianos, na verdade no so nipnicos e sim pessoas pertencentes a pases inimigos. So traidores da ptria. E no se limitam a fazer propaganda da derrota da ptria, insultam as foras armadas imperiais, maldizem o sistema social da ptria, denigrem a nossa brilhante histria". Esforavam-se dessa maneira para denunciar os esclarecidos 6 . Para os vitoristas, o ato de distribuir o "chamado comunicado oficial" como sendo "Edito Imperial da rendio incondicional de Sua Majestade o Imperador a quem reverenciamos"... (corte parcial no original), "Os senhores que se posicionam na alta classe da comunidade japonesa do Brasil, traduziram a seu bel-prazer, para o idioma nipnico, este Edito de rendio incondicional, de legitimidade duvidosa, tratandoo levianamente como se fora legitimo e verdadeiro; e afirmando tratar-se da derrota nipnica (corte parcial)... imprimiram alguns milhares de cpias do panfleto, distribuindo-os entre os compatriotas, forando, irresponsavelmente, a aceitao da derrota como fato verdico" 7 . Uma ousadia imperdovel, um ato insolente, nada mais, segundo os vitoristas. Em suma, a entrega do comunicado oficial do governo japons redundou em provocar a ira dos vitoristas e aumentar a sua fora na comunidade, acabando por "despejar leo no fogo". As viagens ao interior igualmente tiveram resultado contraproducente, razo por que foram suspensas depois de visitadas duas localidades. Discutiram-se ento meios mais eficazes de ao: estabelecer ligao com pessoas esclarecidas de vrias partes da hinterlndia, a fim de alcanar o objetivo (de informar corretamente) de modo mais agressivo; conseguir jornais, revistas e outras publicaes do Japo, atravs do consulado geral americano, distribuindo-os aos patrcios, a fim de divulgar a verdadeira situao do Japo; concretizar a idia de socorrer as vtimas de guerra da me-ptria. Com essa campanha visava-se, alm de ajudar as vtimas japonesas, chegar a uma soluo para a confuso criada na comunidade. Em ltima anlise, predominava uma atmosfera pouco animadora: no haveria outra maneira seno esperar passar o tempo para fazer com que os vitoristas entendessem a situao real da ptria. O ano terminou sem uma luz no fim do tnel.

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Op. cit, p. 7, PB 15. Op. cit. Representao de Kiyoo Yamanouchi. P. 1, PB 5.

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c) Irrompem atos terroristas dos vitoristas No dia 1. de janeiro de 1946, o Imperador do Japo baixou um Edito Imperial, no qual declarava: "Os laos que nos unem a vs Nossos sditos basearam-se sempre na confiana e afeto mtuos e no so frutos de meras lendas e mitos. No se baseiam no falso conceito de que o Imperador deus-presente e que o povo japons superior aos demais e, por isso, est fadado a governar o mundo". a chamada "Declarao da Condio Humana" do soberano nipnico, de importncia vital e decisiva na mudana da orientao poltica e social do pas. A notcia foi divulgada pela imprensa brasileira, mas naturalmente quase ningum daqueles crentes no triunfo nipnico tomava conhecimento dela. E mesmo que tivessem ouvido a informao, apenas serviria para irrit-los, pois considerariam mais uma notcia falsa destinada a caluniar o micado 1 . Do mesmo modo, a histrica visita do Imperador ao general Douglas MacArthur, no dia 27 de setembro do ano anterior, foi divulgada pelos jornais. Entretanto, toda informao relativa derrota nipnica depois do dia 15 de agosto, inclusive o "Comunicado Oficial", constitua apenas "notcias falsas", resultantes da conspirao ou maquinao do inimigo. Aqueles que acreditavam nelas e procuravam transmiti-las como expresso da verdade entre os patrcios "no so japoneses e sim traidores da ptria". Entre os grupos vitoristas que consolidavam sua organizao, ia se revigorando a vontade de castigar e punir aqueles "elementos perniciosos que trairam a ptria". "Vocs dois ousaram falar mal da augusta pessoa de Sua Majestade o Imperador. Por isso, ns japoneses sacudiremos nossas baionetas para castig-los. Portanto importante vocs se prepararem para se arrepender de seus crimes e se suicidarem. Se no o fizerem, os visitaremos, razo por que devem aguardar-nos, lavando bem seus pescoos" (*).
Um diretor da Shindo Renmei (vice-presidente), Ryotaro Negoro, comentou da seguinte maneira o Edito Imperial, em carta que escreveu em data de 15 de maro seo da entidade em Alfredo Castilho, SP: (corte da parte inicial) "O chamado Edito Imperial distribudo dia 1. de janeiro corrente por compatriotas decadentes, uma vez bem lido e examinado, no passa de uma clara falsificao e se trata de um (documento) violador da Nao Japonesa, uma imperdovel literatura subversiva. Desejando conhecer o verdadeiro carter desse grupo, pretendemos promover investigaes nesta sede. Assim sendo, solicitamos a sua seo (filial) a fineza de levantar a origem, residncia, nome completo, etc. (desses elementos), comunicando-nos com urgncia o resultado" (corte da parte final). Documento DOPS. (*) Uma aluso ao antigo costume de cortar o pescoo do inimigo vencido em combate entre samurais na poca feudal do Japo. E todo samurai que se prezava mantinha sempre limpos "a alma e o corpo".
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"Desde o trmino da guerra entre o Japo e os Estados Unidos, voc no s tem falado com falta de respeito devido para com a Famlia Imperial, como mandou prender compatriotas residentes no Brasil, causando-lhes muito sofrimento. Trata-se de um crime muito grave. Ns cumpriremos o nosso dever de lealdade para com a Famlia Imperial e vingaremos os sofrimentos a ns impostos no crcere. Banzai, o grande reino mundial do Grande Imprio do Japo. Grande vitria do Grande Japo!" 2 . Em relao queles que falavam no revs nipnico, at em confins da zona rural do interior chegavam cartas de ameaas infantis no seu contedo, como as que acabamos de ver. A medida que se adensava a atmosfera de inquietao na comunidade, esta, de repente, se viu abalada por atos de homicdio terrorista. Por volta das 23,30 horas do dia 7 de maro de 1946, Ikuta Mizobe, diretor-gerente da Cooperativa Agrcola de Bastos, aps haver se despedido de uma visita, foi privada que ficava nos fundos da casa. Ia fechar a porta do sanitrio, saindo de costas, quando foi baleado por trs, queima-roupa, com um tiro de revlver. Atingido na artria pulmonar esquerda, teve morte instantnea. A seguir, na madrugada de 1. de abril, Chuzaburo Nomura, antigo redator-chefe do jornal Nippak Shinbun e ex-secretrio geral da Burajiru Nipponjin Kyiku Fuky-kai (Sociedade de Difuso de Ensino dos Japoneses do Brasil), recebeu na cabea tiros de um grupo que invadiu sua casa quando a esposa abriu a porta dos fundos. Ao cair desmaiado, recebeu mais alguns disparos, tendo expirado pouco depois. Pouco antes desse mesmo dia, Shigetsuna Furuya, um dos signatrios da mensagem explicativa sobre o fim da guerra, dono de uma fazenda de banana, em Cedro, municpio de Juqui, SP, e que tinha sido tambm ministro plenipotencirio japons na Argentina, ao levantar-se da cama na sua residncia no bairro da Aclimao, So Paulo, foi alvejado com tiros de revlver disparados atravs da vidraa da janela. Furuya se refugiou na sala de visitas, mas os terroristas continuaram a atirar e tentaram forar a entrada, arrombando a porta da frente. Mas esta resistiu e a vtima escapou de ser morta. Dois do grupo atacante foram detidos por guardas noturnos que acorreram ao local. Ainda nos meses de abril e maio, elementos que se dedicavam campanha esclarecedora sobre o fim da guerra foram sucessivamente atacados em vrias localidades, resultando em mortos e feridos graves e leves. Em Bastos chegaram encomendas postais com explosivos; ao abri2

Documento do Museu da Imigrao, PB 8.

290 PERODO EM BRANCO E DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA

Ias, explodiam provocando ferimentos nos receptores. O nmero de pessoas que receberam tais encomendas contendo artefatos explosivos chegou a sete, causando grande pnico entre os esclarecidos e a populao em geral. Depois, na noite de 2 de junho, foi morto por terroristas, em sua casa no bairro do Bosque da Sade, So Paulo, o coronel reformado do exrcito japons, Jinsaku Wakiyama, outro signatrio do documento, como Furuya, e que tinha ocupado o cargo de diretor-presidente da Cooperativa Central Agrcola Nipo-Brasileira e da Cooperativa Agrcola de Bastos. Quatro dos criminosos, pertencentes Shindo Renmei, procuraram Wakiyama em sua casa, s 19 horas desse dia, sendo recebidos na sala de visita. Exibiram-lhe a carta de "recomendao para se auto-imolar" e a bandeira do Sol Nascente, encostaram o punhal no peito, exigindo que se matasse. Wakiyama recusou-se, declarando "no haver necessidade" de tal sacrifcio e ainda tentou admoest-los mostrando-lhes o erro, quando foi executado a tiros dados pelos terroristas, que gritavam: "E intil discutir". No "conselho para suicdio" diziam (corte de parte inicial): "Os trezentos mil compatriotas do Brasil dividiram-se em duas faces, diviso essa que se agrava dia a dia, chegando at ao derramamento de sangue entre irmos. Por causa dessa situao, cerca de dois mil e algumas centenas de patrcios inocentes esto sofrendo atrs das grades de ferro, deixando suas esposas e filhos perdidos, sem saber o que fazer. De quem a culpa? Com toda certeza, daqueles que, cooperando com a propaganda mentirosa do inimigo, sustentam que a ptria foi derrotada" (corte parcial)... "O ato de subscrever a propaganda falsa da derrota da nossa ptria divulgada pelo inimigo, constitui uma evidente violao da dignidade das foras imperiais e conspurca a honra dos leais e valorosos soldados imperiais. Tais crimes de traio ptria merecem a morte dez mil vezes. Por isso, ns da Tokktai (Unidades Especiais de Execuo), respeitando a posio de Vossa Senhoria de ser um glorioso militar do Imprio, proporcionamos a oportunidade de praticar o suicdio, a fim de evitar que continue a viver inutilmente, acumulando seus crimes. Assim poder espiar o grande delito de lesa-ptria e preservar a sua honra militar. Ao Senhor Coronel Wakiyama. Assinado: Tokktai3". O ms seguinte, de julho, j perto de completar um ano do trmino da conflagrao, foi o mais abundante em incidentes desenfreados registrados na disputa ferrenha entre esclarecidos e vitoristas. Nos maiores
3 Este conselho est escrito em trs folhas de papel de carta (japonesas). Documento DOPS1910. (Como se v pelas escritas homfonas, Tokktai "Unidades Especiais de Ataque" e "Unidades de Ao Especial", aparecem muitos erros e confuses de grafia de termos japoneses, alm de outros erros. No japons existem muitas palavras homfonas, porm de grafia e significados diferentes).

A COMUNIDADE ENFRENTA UM CAOS SEM PRECEDENTES 291

centros de colonizao nipnica como as regies da E. F. Noroeste, E. F. Paulista, etc, aconteceram assassnios e tentativas de morte com ferimentos, exploso de bombas, etc, e a violncia alastrou-se como um vendaval. S nesse ms de julho registraram-se 11 casos de mortos e feridos. O incidente mais grave aconteceu em Osvaldo Cruz, na Alta Paulista, com tumultos sem precedentes que duraram quatro dias. O caso comeou na noite de 30 de julho, por causa de uma discusso entre um motorista de caminho nipnico e um brasileiro. O bate-boca acabou em luta corporal. O motorista matou o brasileiro com uma faca. Acontece que antes, a 23 de julho, elementos vitoristas explodiram a residncia do esclarecido Abe e tambm atearam fogo na casa de um Suzuki. Tudo isso havia provocado inquietao e agitao na populao da cidade. O crime de um japons assassinar um cidado brasileiro agitou toda a cidade, a ponto de a situao se tornar incontrolvel. A irritao de cidados brasileiros em relao aos shind explodiu em furor contra todos os japoneses. "Matem o shind", "Acabem com os japoneses!". Assim gritando, comearam a atacar residncias e casas de comrcio de nipnicos com machados e armas brancas. E sucede que entre vitoristas havia aqueles que chegavam a declarar: "Dentro em breve ns mandaremos em vocs", e com isso se tornaram alvos de ataques da multido. Muitos vitoristas sofreram ferimentos graves, outros foram protegidos pela polcia, escapando assim de complicaes mais graves. Os distrbios prosseguiram at os dias 1. e 2 de agosto, tendo sido necessrio mobilizar tropas do exrcito da vizinha cidade de Tup. Com a atuao conjunta de soldados do exrcito e da polcia, foi finalmente restabelecida a ordem. Mesmo no ms de agosto, quando se completou um ano do fim da guerra, ocorreram mais ataques terroristas dos elementos vitoristas denominados Kesshitai (Esquadres Suicidas) ou Tokktai (Grupos Especiais de Ataque), contra os esclarecidos de vrias localidades do interior. O total de atentados somou dez, tendo sido mortos quatro esclarecidos. Tendo como pico os meses de julho e agosto, quando ocorreram o maior nmero de atentados, os atos terroristas comearam a declinar. Isso porque em vrias localidades foram tomadas medidas rigorosas de represso pelas autoridades policiais e, ao mesmo tempo, os homens do movimento esclarecedor formavam uma organizao de autovigilncia, ampliando-se assim o sistema de segurana. No entanto, no ano seguinte, mais precisamente a 6 de janeiro de 1947, no bairro da Aclimao, cidade de So Paulo, onde faltava medida de vigilncia especial, Shoji Suzuki foi vtima de atentado de dois terroristas. Os dois criminosos visavam matar Yoshikazu Morita, encarregado dos interesses japoneses do Consulado Sueco e cunhado de Suzuki. Tomaram Suzuki por Morita. Aquele sara com a primognita do

292 PERODO EM BRANCO E DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA

cunhado no colo para um passeio matinal e o mataram com um tiro. A criana de oito meses de idade foi salva por uma senhora brasileira que passava pelo local, quando os terroristas tentavam atirar tambm no beb. No prazo de um ano aps a guerra, do conflito entre japoneses divididos a respeito do trmino da Guerra do Pacfico, resultou em mais de cem incidentes, dos quais contaram-se 23 mortos, em sua quase totalidade elementos esclarecidos, vitimados por atos terroristas. Os grupos terroristas pertenciam, em sua maioria, Shindo Renmei, motivo por que esses incidentes so chamados de "Caso Shindo Renmei". Os casos aqui relatados isto , um conflito sangrento entre patrcios constituem uma tragdia maior e sem precedentes nos 80 anos da histria da imigrao japonesa no Brasil, marcando tambm uma pgina negra de vergonha inapagvel. E no parou nisso. A cotao dos japoneses entre os brasileiros caiu por terra, estimulando o movimento antinipnico (muito ativo desde a dcada de 30, como vimos em outra parte deste livro), e, por pouco, no se chegou proibio completa, na Constituio de 46, da imigrao nipnica (ver quadro sobre os atentados terroristas). RELAO DE CASOS DE FERIMENTOS E MORTES RELACIONADOS COM A DISPUTA ENTRE ESCLARECIDOS E VITORISTAS NO ESTADO DE SO PAULO (jan. 1946/jan. 1947)
Data 1946 7 maro 1. abril Local Caso Vtima Autores

Bastos So Paulo

morte ataque

Ikuta Mizobe (escl.) casal Shigetsuna Furuya

1. abril

So Paulo

morte

Chuzaburo Nomura (escl.)

11 abril 17 abril

So Paulo Marlia

ataque ferimentos

19 abril 30 abril

So Paulo Presidente Prudente Bastos Campos do Jordo Bastos Bastos

suicdio ataque

Seigui Fujihira (escl.) Kanezo Shibuya, Hisamitsui Hayashi, Isamu Miura (todos esclarecidos) Sukeo Nagano (vitorista) Eikichi Tsuzuki (esclarecido) Masao Ikeda (escl.) Shishito Chihara (escl.) Masao Honda (escl.) Yoshimatsu Kusahara (escl.)

Satoru Yamamoto Tatsuo Watanabe, Mitsuru Ikeda, Tokuichi Hidaka, Kazunori Yoshida, Shinpei Kitamura Masakicbi Taniguchi, Masao Honke, Fumio Ueda, Hiromi Yamashita, Taro Mushino Ignorado Shusui Nakamura, Tadashi Fukuna

Ignorado

30 abril Abril 1. maio 1. maio

exploso ferimentos exploso exploso

Ignorado Ignorado Ignorado Ignorado

294 PERODO EM BRANCO E DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA


Data 1947 6 janeiro 10 janeiro Local Caso Vtima Autores

So Paulo Penpolis

morte e ferimentos morte

Shoji Suzuki (escl.) Mayumi Morita Namide Shimano (vitorista)

Sanzo Mushino, Hisamatsu Mitake Ignorado

Fonte: Nakadate. A Grande Ofensiva Terrorista Japonesa no Estado de S. Paulo.

TOTAL DE CASOS DE FERIMENTOS E MORTES


Ferimentos 1946 maro abril maio junho julho agosto setembro outubro novembro dezembro 2947 janeiro Mortes Esclarecidos Vitoristas Nmero de terroristas

8 6

1 2

1 11 4

64 6

1 9 6 1 35 10


40


2 86

1 12 1 5 18 6

2 23 86 23 109 Esclarecidos Vitoristas

3 66 66 43 109

1 43


2 45

Total

Feridos Mortos

Fonte: Nakadate. A Grande Ofensiva Terrorista Japonesa no Estado de So Paulo.

De acordo com Sengo Jnen-shi (Histria dos Dez Anos do PsGuerra), o total de agresses de vitoristas (aos esclarecidos) com ferimentos leves ou sem ferimentos somaram 9; ferimentos graves 12; vtimas de incndio ou explosivos 9, mortos 15. d) Intensifica-se o sentimento antinipnico Por volta do ms de setembro de 1945, ano em que terminou a guerra, as autoridades, rgos de imprensa e mesmo a populao em geral viam com espanto a estranha movimentao de nipnicos que proclamavam publicamente a vitria do Japo e agiam de modo arrogante. Todos se mantinham em atitude de observao, enquanto aqueles elementos no partiram para atos violentos e desumanos. Todavia, logo aps a entrada do Ano Novo, a 7 de janeiro de 1946, eclodiu o incidente chamado "Bandeira do Sol Levante", em Tup, Alta Paulista. Tratava-se de uma confrontao direta com autoridades brasileiras. Ento endure-

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ceu de imediato a atitude brasileira em relao ao grupo vitorista, que sustentava haver o Japo triunfado na guerra. A seguir, acontece o atentado terrorista, a 7 de maro, com a morte de Ikuta Mizobe, em Bastos. A imprensa de So Paulo noticiou o fato como "Crime covarde na cidade de Bastos Como surgiu o novo 'quisto' da Alta Paulista" (A Noite, 26 de maro de 1946). Divulgam-se assim em todo o territrio brasileiro as atividades incompreensveis de japoneses. Em So Paulo quando sucedem o assassnio de Chuzaburo Nomura e a tentativa de morte de Shigetsuna Furuya, no dia 1. de abril, os jornais abrem manchetes de primeira pgina, acompanhadas de fotografias e ttulos sensacionalistas: "Fanticos de uma organizao secreta japonesa tentaram assassinar nesta capital o ex-embaixador(*) japons na Argentina. Gestapo japonesa organizada em So Paulo" (Folha da Noite, 1. de abril); "Uma organizao japonesa est agindo em S. Paulo", "Assassinado um industrial no Parque Jabaquara", "Outra moradia assaltada na Aclimao" (Dirio da Noite, 1. de abril). Nos dias seguintes continuaram as notcias com manchetes como: "Fanatismo nipnico", "Descoberta uma sociedade secreta japonesa", "Priso de elementos da quadrilha de fanticos" (O Estado de S. Paulo, 4 de abril); "Fanticos nipes agindo em plena So Paulo", "Dezenas de japoneses ameaados de morte pedem, atemorizados, garantias polcia paulista", "Afirmam que o Japo ganhou a guerra e querem eliminar os que se convenceram da derrota" (Correio Paulistano, 3 de abril); "Desmascarando as atividades das sociedades secretas japonesas em So Paulo", "A 'Shindo Renmei' tem mais de 100 mil scios" (Correio Paulistano, 4 de abril); "Quadrilhas de 'Moos Suicidas' desembarcam em So Paulo para matar japoneses", "O prprio governo do Japo seria responsvel pela firme convico de vitria de seus sditos no Exterior", "As comunicaes oficiais no falam em derrota e justificam as interpretaes, to bem exploradas pelas sociedades secretas" (Correio Paulistano, 4 de abril); "Prises em massa na madrugada de hoje (Desarticulao total da 'Shindo Renmei' em So Paulo", "Esto sendo detidos todos os dirigentes da organizao no interior do Estado", "Sero submetidos a processo e possivelmente expulsos do pas" (Folha da Noite, 5 de abril); "Quatrocentos japoneses j esto nas mos da Polcia de S. Pauto", "A Ordem Poltica anuncia que a 'Shindo Renmei' foi completamente desmantelada" (Correio Paulistano, 9 de abril); "Um nipo-brasileiro fala: 'A 'Shindo Renmei'

(*) Equvoco do jornal: referia-se ao "ex-ministro plenipotencirio". Equvocos e erros desse gnero eram freqentes na imprensa da poca, ainda pouco familiarizada com os japoneses. Por outro lado, poucos japoneses sabiam explicar, em portugus, a diferena entre ministro (kshi) e embaixador (taishi).

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continuar", "Entrevista do jornalista Hideo Onaga a Orlando Criscuolo" (A Noite, 10 de abril). Mesmo depois, os atentados terroristas da Shindo Kenmei prosseguiram, sendo tais acontecimentos noticiados de modo sensacionalista pela imprensa. Alm do noticirio aparecem com muita freqncia editoriais, comentrios, crticas e condenaes Shindo Kenmei, avolumando-se na opinio pblica manifestaes contrrias imigrao nipnica e o crescente sentimento antijapons. Em meio convulso e confuses criadas pelas atividades criminosas de elementos vitoristas da Shindo Kenmei e organizaes semelhantes, crescia naturalmente o sentimento antinipnico na opinio pblica brasileira. No entanto, algumas vozes se erguiam para defender os bons imigrantes, que, j tendo aceito a derrota de sua ptria como fato consumado, procuravam viver sua vida laboriosa e honesta, trabalhando diligentemente na produo agrcola e em outras reas econmicas. Entre tais vozes destacamos um artigo de Wladimir de Toledo Piza. "SHINDO RENMEI Wladimir de Toledo Piza Os crimes brbaros que determinados elementos da colnia japonesa praticaram no Estado de So Paulo, e que deram pista polcia para a descoberta de uma vasta organizao de carbonrios que vivia e prosperava entre ns, determinaram, em certos crculos, uma injusta apreciao de toda a colnia nipnica radicada no Brasil. Se, porm, plenamente justificvel a revolta contra os sicrios estrangeiros, que escolheram nossa terra para a satisfao dos seus instintos primitivos e sanguinrios, a extenso desse sentimento a todos os componentes de um grupo humano, ordeiro e trabalhador, disciplinado e obediente, no deixa de ser uma clamorosa injustia. So Paulo, pelo nvel de civilizao que alcanou o que, em grande parte se deve instituio de polcia de carreira bem merece um maior respeito, de todos indistintamente, mas principalmente, dos que, provindos de todas as partes do mundo, encontram aqui ambiente propcio para a aplicao rendosa das suas atividades. No pode passar, pois, sem um veemente protesto, a prtica, em nossa terra, de processos de intimidao que, violando afrontosamente as leis do pas, oferecem espetculo insultuoso aos nossos foros de civilizao. No admissvel que tenhamos que receber e conservar em nosso convvio, indivduos que no respeitam a hospitalidade que lhes oferecemos num pas onde todos so recebidos sem reservas e nem preconceitos. Mas, tambm no justo que, por causa de alguns malfeitores, se

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queira ver, em cada japons domiciliado no Brasil, um elemento pernicioso, capaz de repetir atrocidades que s depois de muitos anos de colaborao til e proveitosa de uma boa colnia pudemos isoladamente, observar em maus elementos nela infiltrados. Faamos justia aos nipnicos que vivem aqui h tanto tempo e que tanto esto contribuindo para o desenvolvimento da nossa agricultura, mas faamo-la agora, justamente no momento em que, vtimas tambm dos atos criminosos de alguns patrcios, so os japoneses coletivamente apresentados como rus. Muito se discutiu aqui a respeito da imigrao nipnica. Miguel Couto foi seu acrrimo inimigo. Outros defenderam-na com argumentos como aqueles do grande mestre de medicina, tambm puramente tericos ou baseados apenas em suposies. No tinha havido tempo suficiente para podermos avaliar como o japons se adaptara nossa vida, quando as mais acirradas discusses foram travadas. Agora, depois de alguns decnios de experincia, dispomos os brasileiros de seguros elementos para julgar das vantagens ou desvantagens da colonizao nipnica. Os japoneses, na sua imensa maioria, localizaram-se no interior do Estado, ou nas zonas rurais limtrofes dos grandes centros. Mas todos eles, ou quase todos, muitos anos passados, ainda se dedicam ao trabalho agrcola. Por esse aspecto, nenhum outro colono mais vantajoso para o nosso Estado, pois, se temos falta de braos na atualidade, essa falta se faz sentir, preferentemente para o cultivo da terra. Argia-se contra a colonizao nipnica a dificuldade de miscigenao do japons radicado no nosso meio. O sdito do imprio do sol nascente no se casaria com a brasileira, dando sempre preferncia, na hora de contrair npcias, s suas conterrneas ou s brasileirinhas, filhas de patrcios. Nada menos verdadeiro. Se a algum cabe culpa nesse particular, esse culpado no deve ser procurado entre os imigrantes que aqui aportaram e foram localizados por autoridades brasileiras. O erro foi nosso. Sem nos atermos a casos existentes no nosso meio, de formao de quistos raciais, como ocorreu com os alemes de Santa Catarina, permitimos que os japoneses se localizassem em regies de baixo teor demogrfico e em grandes massas. A Ribeira de Iguape primeiro, a Noroeste depois, receberam levas humanas imensas, todas constitudas por naturais do Japo. Aconteceu, ento, o inevitvel. Falando idioma totalmente diverso do nosso, encontrando sria dificuldade no aprendizado do portugus pela razo material de no terem com quem falar a lngua da terra, uma vez que s conviviam com patrcios, os japoneses mantiveram, por muito tempo, hbitos, usos e costumes da sua prpria ptria. Nada mais natural

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que, dessas circunstncias decorresse o consrcio entre indivduos da mesma nacionalidade, pois continuavam isolados dos brasileiros, pela localizao que receberam e pela impossibilidade de convvio, uma vez que no lhes entendiam o linguajar. J aqueles que, por fora de profisses diferentes, tiveram maior contato com os brasileiros, revelaram no haver entre os novos colonos, qualquer esprito preconcebido que lhes impedisse a assimilao da nova ptria, tambm pelo sangue dos filhos. So sem conta os japoneses, domiciliados entre brasileiros, que se casaram com gente da terra. Tambm perdurou muito a lenda de que, aferrado terra de origem, o japons se negava a mandar os filhos para as escolas brasileiras. A preveno, se houve, durou pouco, e hoje, nos lugares onde predominam os nipnicos tambm nas escolas oficiais se nota a percentagem alta de filhos dos novos imigrantes. Tem mesmo o japons a preocupao de fazer com que o filho se instrua, nesse particular oferecendo um exemplo sadio e benfico ao nosso caboclo, rotineiro e renitente ante as vantagens de alfabetizao. Se o Estado lhe oferecer escola brasileira, jamais organiza ensino prprio. Se algum se der ao trabalho de examinar a relao dos alunos do Ginsio do Estado e todos ns que por ali passamos as acompanhamos com saudade verificar que enorme, para o nmero de japoneses domiciliados na capital, a percentagem de nomes que revelam a origem nipnica dos alunos do tradicional estabelecimento de ensino. Totalmente desconhecidos da grande massa brasileira, os japoneses mantiveram-se aos nossos olhos, durante muito tempo, envoltos numa aura de mistrio e de lenda. Mas, proporo que a lenda se desfaz e o mistrio desaparece, podemos ver, sem juzos preconcebidos, um povo laborioso e bom, com defeitos e qualidades como todos os demais, mas com grande predominncia de excelentes qualidades. No se lance, pois, a todos os ltimos imigrantes que recebemos, e que tanto j fizeram pelo nosso progresso, um labu infamante que deve ficar circunscrito apenas a alguns dos seus membros. Mas, tambm deixemos de lirismo sem propsito ou de sentimentalismos ridculos com relao aos criminosos que resolveram relembrarnos cenas de cangao, que j no so do conhecimento de, pelo menos duas geraes de paulistas. Mandemo-los de volta, no primeiro navio, com frete a pagar. Mesmo porque, os tempos em que 'agir niponicamente'(*), era proveitoso, j l vo. E no deixaram saudades..." (Correio Paulistano, 11 de abril de 1946.)
(*) Frase atribuda ao general Pedro Aurlio Gis Monteiro, chefe militar muito ligado a Getlio Vargas, desde a Revoluo de 1930. Quando a Revoluo Constitucionalista de 1932 foi derrotada pelas foras de Vargas, So Paulo foi militarmente ocupada. Na poca o Japo conquistava a Manchria, dominando-a "militarmente". Gis Monteiro teria comparado a ocupao de So Paulo da Manchria.

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" Vai iniciar na Constituinte uma vigorosa campanha antinipnica Prope-se o deputado Miguel Couto Filho a combater a imigrao japonesa. Rio, 17 (Meridional) O deputado Miguel Couto Filho vai romper, na Constituinte, uma vigorosa campanha contra os japoneses e a sua imigrao para o Brasil. Falando imprensa sobre o assunto, declarou o deputado Miguel Couto Filho: "a campanha antinipnica iniciada por meu pai, comeou em 1924, logo que o Japo se props enviar-nos dez milhes de amarelos para habitar em nosso pas, terras compradas pelo Mikado e aqui criou o "Shin Nihon", o Novo Japo. O perigo tornou-se evidente e despertou o ardoroso patriotismo de meu pai, sempre preocupado com questes eugnicas e de defesa da Ptria. Tal era a convico de meu pai contra as inconvenincias e os maus propsitos dos nipnicos no Brasil e a certeza de que um dia lanariam um golpe de traio contra a nossa Ptria, que escreveu, como dedicatria do seu livro "Seleo Social" estas palavras significativas: "Deste folheto foi tirada apenas uma pequena edio para os meus netos. E eles diro: profecias (ainda bem que erradas?) do meu av?" O que est ocorrendo hoje acentuou o deputado Miguel Couto Filho com o verdadeiro fanatismo nas colnias japonesas de So Paulo com o famoso "Shindo-Renmei" justifica, plenamente o receio e as providncias dos constituintes de 1934 que, em tempo, impuzeram em lei a restrio imigrao japonesa. Temos o dever de combater, arduamente, os nipnicos e a sua entrada no Brasil. De minha parte no pouparei esforos para mostrar, da tribuna da Constituinte que os daninhos e antipatriticos objetivos desses perigosos amarelos revelando os seus intuitos e manobras, merecem a nossa mais veemente repulsa". (Dirio de S. Paulo, 18 de abril de 1946.) Por coincidncia, na poca logo aps a libertao da Segunda Guerra intensificava-se na sociedade brasileira, cansada da longa opresso da ditadura Vargas, o movimento de restaurao da democracia. Clamava-se pela reforma da Constituio antidemocrtica do Estado Novo. Em outubro de 1945, o presidente Getlio Vargas renunciou e em dezembro realizaram-se o pleito presidencial e as eleies para a escolha de congressistas, que acumulariam as funes de constituintes para elaborar a nova Constituio do Brasil. Em janeiro de 1946 foi eleito e empossado o novo presidente, Eurico Gaspar Dutra. Simultaneamente, na Assemblia Nacional se procedia elaborao da nova Carta Magna. Nos debates sobre artigos da Constituio referentes entrada de estrangeiros no pas refletiam-se fortemente os deplorveis acontecimen-

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tos relativos disputa "vitoristas versus esclarecidos" ocorridos na comunidade de imigrantes nipnicos. Os sucessivos atentados terroristas que aconteceram em vrias localidades no s provocaram grandes repercusses na sociedade brasileira, como acabaram sendo noticiados na imprensa japonesa e at em publicaes americanas, como a revista Time. Desse modo, a insana situao reinante na comunidade nipnica do Brasil chegou a chamar a ateno mundial. O novo gabinete japons, constitudo a 22 de maio, sob a chefia de Shigeru Yoshida, j no dia 30, isto , poucos dias aps sua organizao, demonstrando sua preocupao com os acontecimentos, enviou um telegrama aos conterrneos do Brasil, assinado pelo ministro do Exterior Shigeru Yoshida (primeiro-ministro acumulando este cargo), explicando a situao do ps-guerra, atravs da Legao Sueca no Rio de Janeiro. A comunicao foi divulgada a 6 de junho pela Seo Encarregada dos Interesses Japoneses daquela representao diplomtica: "A 14 de agosto de 1945 foi baixado o Edito Imperial sobre o fim da guerra e, com a assinatura do documento de rendio no dia 2 de setembro na baa de Tokyo, o Japo confirmou a aceitao das condies de rendio", informava o comunicado. E acrescentava: "Os japoneses residentes no Brasil no devem ser iludidos por irresponsveis boatos sem fundamento veiculados no exterior e sim manter atitude de pacincia e prudncia, a fim de enfrentar a cruel realidade do futuro do Japo, cheio de dificuldades. Esperamos que os japoneses do Brasil vivam em paz e tranqilidade, dedicando todo o seu esforo no trabalho de cada um, para contribuir na construo da prosperidade de sua ptria adotiva, o Brasil". Esse era o contedo da mensagem. A ela foi anexada a cpia do Edito Imperial de 2 de setembro para ser amplamente distribuda em forma de impressos com o emblema da Legao Sueca. Mas o resultado foi nulo. Por causa da palavra Sude, em vez de Sucia, contida no emblema, no foi levada a srio. Diziam tratar-se de uma falsificao. Mais ainda, como no comunicado o chanceler Yoshida disse entre outras coisas: "com o auxlio das potncias aliadas, o Imprio est dedicando todo o esforo na repatriao de compatriotas do ultramar", interpretaram essas palavras como "comea o repatriamento dos japoneses residentes nos Estados Unidos", "Breve viro os navios para nos levar de volta ao Japo". Essas "notcias" foram amplamente difundidas entre os vitoristas. Por outro lado, o interventor federal em So Paulo, embaixador Jos Carlos de Macedo Soares, preocupado com a virulenta atuao dos terroristas, reuniu, dia 19 de julho, no palcio dos Campos Elsios, ento sede do governo estadual, com a presena do ministro plenipotencirio

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da Sucia, Ragmar Kumlin, representantes do grupo vitorista de So Paulo e de importantes centros de concentrao japonesa no interior, com o elevado objetivo de dar uma soluo grave situao criada na comunidade, explicando a real conjuntura internacional aos elementos fanticos. Compareceram entre 500 e 600 representantes do grupo vitorista. Para se ter uma idia da importncia atribuda reunio pelo governo do Estado, dela participaram, entre outras personalidades: o cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, arcebispo metropolitano; o general Milton de Freitas, comandante da 2.a Regio Militar (atual Comando do Sudeste); o brigadeiro Armando Ararigboia, comandante da 4.a Zona Area; Edgar Batista Pereira, secretrio de governo; Arthur Piqueroby de Aguiar Whitaker, secretrio de Justia e Negcios do Interior; Antnio Cintra Gordinho, secretrio de Negcios da Fazenda; Francisco Malta Cardoso, secretrio da Agricultura, Indstria e Comrcio; Plnio Caiado de Castro, secretrio da Educao e Sade Pblica; Cassio Vidigal, secretrio da Viao; Pedro A. de Oliveira Sobrinho, secretrio da Segurana Pblica; o general Luis Gaudie Levy, comandante geral da Fora Pblica do Estado (atual Polcia Militar); Ragmar Kumlin, ministro da Sucia, encarregado dos interesses japoneses no Brasil; Erik Forssell, cnsul sueco em So Paulo; Augusto Gonzaga, delegado auxiliar, respondendo pelo Departamento de Ordem Poltica e Social (DOPS); Suetaka Hayao, diplomata japons, adido Legao da Sucia; Paulo Yoshikazu Morita, auxiliar e intrprete do Consulado da Sucia, e Jos Santana do Carmo, tradutor pblico juramentado, servindo como intrprete oficial. O Salo Vermelho do Palcio ficou literalmente lotado com as centenas de nipnicos que ouviram do ministro sueco e do interventor federal, atravs dos intrpretes, explicaes pormenorizadas da situao. O ministro sueco leu o comunicado do chanceler japons Yoshida, o Edito Imperial sobre o fim da guerra, do dia 14 de agosto, e o do dia 2 de setembro, relativo assinatura da rendio, j divulgados, expondo com detalhes as circunstncias em que o Japo aceitou a rendio incondicional. A seguir usou da palavra o interventor Macedo Soares, que, dirigindo-se aos japoneses, declarou: "Como se v da leitura dos documentos feita pelo sr. ministro da Sucia, a situao do Japo est clara e bem definida. Antes de terminar, porm, recomendo a todos o respeito s leis brasileiras e s instrues do governo da Sucia, pas escolhido pelo Imperador para representar os interesses do Japo no Brasil". E terminou por conclamar que acabassem com a luta de irmos contra irmos, para se dedicarem s atividades produtivas, a fim de contribuir para o desenvolvimento do pas que os acolhera, o Brasil.

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Os presentes fizeram ouvidos moucos s palavras do representante diplomtico da Sucia e s ponderaes do interventor federal. Ao ser concedida a palavra, representantes do grupo exigiram do interventor a eliminao, doravante, de toda e qualquer referncia derrota nipnica no noticirio da imprensa e a supresso de termos como "rendio incondicional", "derrota na guerra", na ata que seria assinada a seguir. Tendo o interventor concordado com tais exigncias, os vitoristas presentes exultaram, acreditando que sua posio fora aprovada como correta. Um membro da Shindo Renmei relata do seguinte modo o que aconteceu na reunio daquele dia1: "... O presidente do Estado(*) levantou-se e declarou: 'Conforme o sr. ministro sueco acabou de informar, est fora de dvida a rendio incondicional do Japo. Por isso, os srs. japoneses devem acreditar nisso, acabar a luta entre compatriotas e suspender imediatamente os atos terroristas. Espero que assim trabalhem para o desenvolvimento econmico do Brasil' (Imaginem o ranger de dentes dos representantes japoneses!) Depois de um intervalo, o interventor disse: 'Se algum tiver algo a dizer, pode falar'. O nosso companheiro, sr. Omasa (representante de Duartina) levantou-se e declarou: 'A nossa ptria o Japo um pas divino. Tem uma gloriosa histria da dinastia de trs mil anos. Ns japoneses herdamos o tradicional esprito nipnico, como sditos japoneses educados pelo sistema educacional do Japo, no aceitamos o esprito japons absolutamente no cede diante de qualquer mtodo de propaganda da rendio incondicional do Japo. Na verdade, o Japo ergueu-se (nesta guerra) por ordem divina, para a construo da Grande sia Oriental e em prol da justia e da humanidade. A justia no morre. Ns acreditamos, piamente, na vitria do Japo justo!', exclamou o sr. Omasa. Sem poder conter nossa emoo, gritamos: 'Muito bem! Apoiado!' (gritos de aplauso e palmas enchem o recinto). Quando o intrprete Morita traduziu (a fala de Omasa), parecia-nos ver lgrimas nos olhos do interventor e outras autoridades presentes. Os chefes militares, impressionados com o esprito altivo do orador, sorriam e se admiravam. Na verdade, o sr. Omasa falou corajosamente, representando o nosso pensamento, seus companheiros; no podemos deixar de manifestar nosso agradecimento.

Muitos dos jornais citados neste captulo no existem mais: A Gazeta, Correio Paulistano, Dirio de S. Paulo, Dirio da Noite, A Noite, Folha da Noite. (*) At a Revoluo de 30, os chefes de executivos estaduais tinham o ttulo de presidente, da o emprego desse termo em lugar de interventor, pelos japoneses, ainda pouco familiarizados com a organizao poltica brasileira. Alis, usam presidente e interventor, indistintamente, como se ver logo em seguida.

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A seguir, a nica representante do belo sexo, sra. Sachiko Omasa (representante de Agudos), falou em portugus: 'Senhor Presidente do Estado. Excelncia: ns japoneses no acreditamos, em absoluto, na derrota do Japo. Se Vossa Excelncia desejar sustar as disputas e atos terroristas entre japoneses, comece por comunicar a vitria do Japo e mande suspender imediatamente a propaganda falsa da derrota. Sem essa suspenso, os atos terroristas jamais cessaro'. O presidente do Estado, depois de alguns momentos de reflexo silenciosa, pediu o seguinte: 'Meus caros duzentos mil japoneses residentes no Brasil. Os srs. so um tesouro do Brasil. So a parte mais importante da populao brasileira. Queiram ouvir-me. O nosso pas, o Brasil no entrou em guerra com a ptria dos senhores, o Japo. O Japo esteve em guerra contra a Gr-Bretanha, os Estados Unidos, Rssia e China. Eu, Macedo Soares, prometo mandar, nesta reunio em que esto presentes representantes das vrias colnias nipnicas, eliminar a expresso 'rendio incondicional' (elimina-se a expresso na mensagem lida pelo ministro sueco), e a partir desta data ordenarei a proibio de notcias sobre a derrota japonesa nos jornais (ordena o secretrio da Segurana Pblica, Pedro de Oliveira Ribeiro, assinar a determinao) e doravante no permitirei qualquer tipo de panfleto que fale na derrota do Japo, punindo severamente quem distribuir ou elaborar tais escritos. Por isso, solicito aos senhores que colaborem com as autoridades, esforando-se ao mximo na eliminao de atos terroristas'. Todos os presentes, percebendo o pensamento ntimo do interventor em relao a todos os nipnicos, prometeram esforar-se no sentido de atender ao seu pedido. Encerrou-se assim a reunio". "Impresses sobre a reunio, da qual participei. Analisando detidamente o que foi discutido na reunio entre as autoridades do governo paulista e representantes dos 'duros' da colnia japonesa do Brasil, encontramos realmente incontveis pontos misteriosos. Quem convocou a reunio foi naturalmente o governo do Estado. Tentou-se transmitir a inteno do governo, mas na prtica resultou em ns, representantes da colnia, transmitir nosso intuito ao governo, transformando numa reunio para mandar o governo paulista executar a vontade dos japoneses do Brasil. Este fato mostra, na realidade, o grande poder do Imprio do Japo, a expresso de uma ponta do princpio poltico de Hakk Ichiu (Todo o universo sob um teto)(*). Lembremos que na conduo da guerra
(*) Hakk ichiu, "O universo (o mundo) sob um teto", expresso insistentemente usada pelos propagandistas do expansionismo e militarismo japons na dcada de 30 at o fim da guerra.

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santa(*), oficiais e soldados bem como os cem milhes da frente interna passaram quase dez anos lutando freneticamente na defesa da ptria. Enquanto isso, ns que vivemos num pas inimigo, aprofundamos, ao participar da reunio, o sentimento de que deveramos, como nipnicos residentes no exterior, procurar seguir para a sia Oriental o quanto antes, a fim de tomar parte, como soldados da produo, na construo da Grande sia Oriental. a) Kiyoshi Kuratome, representante de Quintana." Os jornais do dia seguinte, 20 de julho de 1946, noticiaram a reunio no palcio do governo com as seguintes manchetes: "A reunio nos Campos Elseos e a ao condenvel dos fanticos da 'Shindo Renmei' Recusaram-se a assinar a ata, fizeram imposies e exigiram at censura imprensa" (A Gazeta); "A Shindo Renmei imps condies ao governo do Estado O interventor Macedo Soares promete proibir toda e qualquer publicao referente derrota do Japo O Secretrio da Segurana tambm promete zelar pelas suscetibilidades dos terroristas Continuam no acreditando na derrota do Japo Redundou em pleno fracasso a reunio de ontem realizada no Palcio dos Campos Elseos" (Jornal de So Paulo). No dia 22, respondendo a indagaes de jornalistas sobre os motivos do compromisso feito com os fanticos vitoristas, o interventor Macedo Soares declarou: "Para acabar com a srie de crimes". O atrevimento dos vitoristas, que chegaram a exigir a proibio de notcias da derrota nipnica, impondo censura imprensa, mereceu reao e revolta de todos os jornais. Um jornal representativo da imprensa paulista da poca escreveu o seguinte editorial: "Terrorismo japons A reunio de ontem, nos Campos Elseos, qual compareceram os terroristas nipnicos, membros da associao de delinqentes denominada Shindo Renmei, a prova do atrevimento de colnias estrangeiras que no sabem cumprir o seu dever em nossa casa. No tiveram eles a compostura necessria em presena do interventor federal que, levado pelos desejos de solucionar a perturbao reinante entre os japoneses, lhes deu a honra de audincia como aquela. Na arrogncia dos indesejveis amarelos houve, de fato, a demonstrao da criminosidade dessa gente que, por descuido de nossos governos passados, foi admitida no

(*) Guerra santa, outro slogan muito repetido pelos chefes polticos e militares na campanha contra os Aliados, principalmente contra chineses e soviticos Em certas ocasies, tinha conotao anticomunista.

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Brasil, sob a iluso de constituir grupos de trabalhadores em condies de colaborar no progresso de nossa terra. O oposto que tem sido a realidade. Indivduos maus, perniciosos mesmo, inassimilveis pelo labor racial, trouxeram, para aqui, as dissenses de sua poltica, vindo causar tristes apreenses em conseqncia dos banditismos que cometem luz do dia, sem temor das leis da ptria que os abriga. Ousados e rebeldes, jogam-se ao delito com a avidez de feras, no retrocedendo na execuo dos assassnios ordenados pela sociedade secreta a que obedecem. A colnia asitica, com excluso de um que outro membro, formou 'societas sceleris' em nosso meio, a mais sinistra. Porque celerado se revelaram ontem, no palcio do governo. Mas a interventoria no tem outra coisa que fazer, seno mandar s gals tipos to falhos de sentimentos e educao, obsessionados pelas convices de imperialismo que lhes injetou a megalomania do imperador Hirohito, o caricato filho do sol, derrotado pelo herosmo dos soldados norte-americanos. Desde que esses salteadores da tranqilidade interna no querem se submeter vergonhosa queda do poderio militar de Tokyo, e ainda teimam em sustentar o gangsterismo do pacto infernal do 'eixo7 vencido em 1945, o lugar deles na cadeia, como delinqentes vulgares, de sanha que ameaa a todos. Um deles teve, nos Campos Elseos, a empfia de exigir que os jornais silenciem a respeito dos homicdios traioeiros perpetrados por ordem da Shindo Renmei. Acha ruim que a imprensa diga ter sido totalmente destroado o Japo em todos os sentidos e de haver sido incondicional e humilhante a sua rendio ao poderio ianqui. Onde estamos ns, que a agressividade do estrangeiro nefasto chegue a semelhante ultraje? Ultraje sim. Aos nossos brios de pas vencedor. Abusando do esprito de cordialidade do interventor Macedo Soares, os amarelos mostraram a dentua de saqueadores e canibais como se porventura fosse o Brasil a Coria ou as Filipinas. A corja nipo-nazi-fascista se engana. H de retroceder nos propsitos de celeratez, antes que o povo brasileiro se decida a enxot-los daqui, como bandidos que so. Se o governo paulista no ordenou, ainda, a captura de tais rus confessos de terrorismo, deve faz-lo sem tardanas. E tenha a certeza de que a opinio pblica lhe louvar a energia. O que se passou nos Campos Elseos transcende as raias da tolerncia, da pacincia e da boa vontade. Com estranhos traioeiros no se pode ter nenhuma condescendncia. Maxime se ameaam a ns tambm. Sim, E isto mesmo. Ameaam-nos de morte, se dissermos que o ridculo imperador do expansionismo nipnico se curvou supremacia estadunidense. Por toda parte, o amarelo apregoa valentia que, no fundo, no mais do que premeditao de assassnios brbaros, frios e calculados com os requintes das maiores perversidades.

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No h dvida, de que necessrio expulsar da nossa casa os propagadores da onda de delitos que transforma o Brasil em refgio de bandidos". (A Gazeta, 20 de julho de 1946.)
NA CONSTITUINTE DE 46

Os seguidos homicdios perpetrados por terroristas que no respeitam as leis do pas que os abriga repercutiram intensamente na Assemblia Nacional Constituinte, j na fase final de discusso da nova Constituio Brasileira. Tornava-se cada vez mais poderoso o movimento contrrio entrada de imigrantes japoneses e a incluso de um dispositivo constitucional nesse sentido. Em agosto, ao aproximar-se o primeiro aniversrio do trmino da conflagrao mundial, o grupo vitorista, que refora sua deciso de exterminar os esclarecidos "traidores", intensifica as atividades terroristas. A atitude abusiva e arrogante dos representantes vitoristas na reunio de Campos Elsios repercutia ainda, refletindo na revolta da imprensa brasileira, diretamente atingida pela exigncia de censura ao noticirio sobre a derrota nipnica. Nesse ambiente extremamente desfavorvel aos japoneses, chegou a vez de ser discutida e votada, na sesso noturna do dia 27 de agosto de 1946 da Assemblia Constituinte, a emenda n. 3.165, apresentada pelos representantes Miguel Couto Filho e Jos Augusto. A emenda estava assim redigida: "E proibida a entrada no pas de imigrantes japoneses de qualquer idade e de qualquer procedncia. Miguel Couto Jos Augusto". Diferente da clusula que restringia a dois por cento do total de imigrantes entrados no pas, nos ltimos 50 anos, para cada nacionalidade, includa na Constituio de 1934, visando indiretamente a imigrao japonesa (ver "Na Constituinte de 34", p. 163), desta vez apontava claramente os japoneses, vedando inteiramente sua entrada. Uma medida drstica. Em torno da emenda travaram-se violentas discusses na Assemblia Nacional. Vamos aqui destacar alguns trechos dos pronunciamentos dos senhores constituintes, recorrendo aos Anais da Assemblia Constituinte de 1946,147.a Sesso em 27 de agosto de 1946 (Extraordinria). (Cortada parte inicial dos debates) O sr. Adroaldo Costa (PSD) Vrios oradores nesta Assemblia tratando do assunto, mostram que os japoneses so, como o enxofre, insoluveis, no se deixando assimilar. Iro constituir quistos sociais. O sr. Rui Almeida (PTB) (corte da parte inicial do aparte)... A prova

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evidente de que so nocivos ao Brasil, reside em que, ainda hoje, mesmo oriundos de pas derrotado, ainda nos esto dando trabalho. de estranhar que ainda apaream aqui defensores dos inimigos do Brasil (Trocam-se outros apartes). O sr. Jos Augusto (PSD) (corte da parte inicial)... Cabe acentuar que as objees trazidas pelos nobres colegas que me apartearam reduzemse a duas: uma delas, a do nobre Deputado por So Paulo, Sr. Aureliano Leite, que declara tratar-se de assunto inconstitucional. A S. Excia. respondo imediatamente dizendo que ainda no votamos a Constituio e, assim, no h qualquer matria inconstitucional. O assunto interessa fundamentalmente prpria sobrevivncia da nossa ptria... O sr. Aureliano Leite (UDN) 2 Mas poder ser deixada para a lei ordinria. O sr. Jos Augusto ... Em relao desumanidade por S. Excia. argida, quero declarar e o fao julgando que traduzo to bem quanto S. Excia. o sentimento do Brasil que desumano permitir que nossa ptria seja invadida por gente que no ser assimilada. O sr. Aureliano Leite A matria pode ser regulada em lei ordinria. No sou favorvel imigrao japonesa; ao contrrio, sou contra ela, no momento. Acho, porm, inquo incluir esse dispositivo no texto constitucional. O sr. Jos Augusto ... por gente que no se incorpora ao Brasil, que aqui est formando quistos raciais, representando, assim, sempre e cada vez mais, um perigo para a prpria existncia da nossa nacionalidade. (Palmas) (corte). O sr. Hamilton Nogueira (Senador pela UDN) Todos estamos de acordo em que, no atual momento histrico, a imigrao japonesa indesejvel. O sr. Rui Almeida nociva. O sr. Jos Augusto Ser uma calamidade. O sr. Hamilton Nogueira Isso, entretanto, deve constar da lei ordinria. Incluir numa Carta constitucional, dispositivo em que fique estabelecida a condenao da imigrao japonesa afirmar um princpio racista, que j condenamos no nazismo. (Trocam-se inmeros apartes. O sr. Presidente pede ateno.) O sr. Jos Augusto Sou to anti-racista quanto o nobre Senador Hamilton Nogueira. No encaro, entretanto, a questo pelo aspecto racial, mas pela sua feio poltica (apoiados) e, deste ponto de vista, a entrada do japons deve ser proibida no Brasil, porque representa uma grave ameaa para a nossa prpria sobrevivncia.
Siglas partidrias: PSD Partido Social Democrtico; PTB Partido Trabalhista Brasileiro; UDN Unio Democrtica Nacional.
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O sr. Aureliano Leite ... o Brasil convidado a seguir uma teoria nazista... O sr. Jos Augusto (L trecho do pronunciamento do sr. Santiago Peralta, diretor do Servio de Imigrao Argentina.) 'No queremos uma imigrao ao acaso; queremos nesse caso, agir fria, tcnica e cientificamente...' (corte da parte central do trecho)... Por isso, defendo a emenda, que de muitos membros desta Casa, e que impede a entrada no pas de elementos que tm sido aqui, conforme ainda agora os fatos demonstram, elementos de perturbao e de desordem, e assim totalmente nocivos ao interesse nacional. (Muito bem; muito bem. Palmas. O orador cumprimentado.) O sr. Nereu Ramos (PSD) (Pela ordem) Sr. Presidente, embora radicalmente contrrio imigrao japonesa, no darei meu voto incluso da emenda no texto da Constituio. (Muito bem. Palmas.) O sr. Miguel Couto Filho de lamentar. (Prosseguem ainda os debates com a interveno de muitos parlamentares, mas so omitidos por falta de espao). O sr. Mello Viana, Presidente da Constituinte Considero que a emenda j foi regimentalmente discutida, tendo se manifestado os Senhores Representantes contrariamente e a favor. Deliberou ainda a Assemblia que, aprovada, figuraria nas Disposies Transitrias. Vou submet-la a votos. (Palmas.) Os Senhores que aprovam a emenda n. 3.165, queiram levantar-se. (Pausa.) Minha conscincia vacila na proclamao do resultado. Trata-se de assunto de mxima importncia e no quero assumir a aprovao ou a rejeio sem absoluta segurana. Vou proceder contagem dos votos. (Procede-se verificao da votao.) Votaram a favor 99 Senhores Representantes, e contra 99. Voto contra a emenda. Est rejeitada". Caiu a emenda n. 3.165. Destaque-se que os prprios representantes que votaram contra ela eram, em sua maioria, contrrios imigrao japonesa, como se verifica pela amostra dos debates aqui reproduzida. Apenas no concordavam com a incluso de tal dispositivo na nova Constituio. A deciso que favoreceu a imigrao japonesa foi tomada pelo voto de Minerva de presidente da Assemblia Constituinte, Mello Viana.

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O dispositivo de entrada de estrangeiros no pas est definido no artigo 162, que manteve o texto original do projeto de Constituio: "Art. 162 A seleo, entrada, distribuio e fixao de imigrantes ficaro sujeitas, na forma da lei, a exigncias do interesse nacional". A nova Constituio foi promulgada logo a seguir, a 18 de setembro de 1946. Naturalmente, a grande maioria da comunidade japonesa do Brasil, desinformada da situao mundial e da prpria sociedade brasileira, ignorava tambm sua crtica situao, provocada pelas nefastas atividades dos vitoristas fanticos. Estes, desde a reunio do palcio do governo, longe de se emendarem, no abandonaram a crena vitorista. e) Os vitoristas representados na Shindo Renmei Os atos terroristas terminam com o assassnio de Shoji Suzuki, ocorrido a 6 de janeiro de 1947, ou seja, um ano e quatro meses depois do trmino da guerra. Contudo, isso no significava a cessao das atividades fanticas dos vitoristas. Pelo contrrio, elas prosseguiram por longo tempo. Cento e poucos japoneses, pertencentes ao chamado Sakuragumi Teishintai (Peloto Suicida do Grupo Sakura), promoveram uma passeata pelas ruas de So Paulo e apresentaram ao Consulado Geral do Japo uma petio "Sobre o Repatriamento Geral dos Japoneses". A imprensa brasileira noticiou com destaque o acontecimento. Pouco depois, as secretarias da Justia e da Segurana Pblica, recorrendo ao direito do Estado, decretaram a dissoluo do grupo. Isso aconteceu em fevereiro de 1955, quase dez anos depois do fim da Guerra do Pacfico. Convm lembrar que, em 1953, foi reiniciada a vinda de imigrantes do Japo, interrompida com a guerra; reativavam-se as relaes entre o Brasil e o Japo. Quem eram ou o que representavam os chamados "vitoristas", que, mesmo a essa altura dos acontecimentos, ainda acreditavam na vitria do Japo e promoviam movimentos estranhos e inexplicveis? Seguindo as pegadas do movimento vitorista, verificamos que ele teve incio no tempo da guerra, quando os imigrantes nipes sofriam presses diversas por se tratarem de sditos de um pas inimigo do Brasil. No ano de 1938, quando o governo Vargas implantava vigorosamente o nacionalismo, reforava-se, ao mesmo tempo, sob o regime do Estado Novo, a poltica de assimilao das comunidades estrangeiras radicadas no pas. Quando o ensino da lngua nipnica e jornais editados nesse idioma sofrem represso, intensifica-se a aspirao do imigrante de "viver sob a proteo da bandeira do Sol Nascente". Como j se exps, na

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realidade, aumentava o nmero de imigrantes que retornavam ptria. Com o fechamento da rota de volta ao Japo, causado pela irrupo das hostilidades no Pacfico, aquela aspirao ou desejo, em vez de enfraquecer, tornou-se mais forte. Os imigrantes sonhavam que, quando a guerra terminasse, naturalmente com a vitria japonesa, iriam viver em terras do Sudeste da sia, e l regio tropical como o Brasil aproveitariam a sua experincia de desbravadores de terras brasileiras, e, por isso, seriam recebidos como orientadores dos demais imigrantes. Jamais podia passar pela sua mente a hiptese de um revs de sua ptria. A f inabalvel na vitria tinha profundas razes no sistema educacional do Imprio japons, implementado no perodo Meiji (1868-1912). E, por essa razo, com exceo de parte dos primeiros imigrantes aqui chegados, os chamados imigrantes orientados pela "poltica nacional de emigrao", ou seja, aqueles que chegaram ao Brasil na dcada de 30, tinham recebido desde sua infncia a sistemtica educao de "sditos do Imperador", de obedincia absoluta ao micado. Estavam imbudos da ideologia militarista e ultranacionalista de "Japo, pas divino e invencvel". Esses imigrantes chegam ao Brasil cheios de esperana, mas encontram um ambiente completamente diferente do pas de origem, enfrentam tremendas dificuldades de adaptao. E nessas circunstncias que lhes exigida, logo que chegam, sua assimilao ao meio social local. As medidas nacionalizantes do Estado Novo acendem nos imigrantes recmchegados o desejo de regressar terra natal e reemigrar para terras que se acham sob a proteo da bandeira nipnica. Todavia, com a ecloso da guerra, essa reemigrao se torna impossvel. Ento no lhes resta seno viver na crena da certeza do triunfo japons. E comportamento tico para viver como sditos do Imprio e na condio de inimigos no pas em que residem consiste em no prejudicar a ptria e no favorecer pases inimigos, aguardando em silncio a chegada do dia da vitria. Logo aps o comeo das hostilidades, acontece a repentina alta de preos da menta e do casulo do bicho-da-seda. Muitos compatriotas se dedicam sua produo, aumentando o nmero de lavradores nipnicos que prosperavam, em comparao com o perodo do pr-guerra. Ento, no se sabe de onde, surge o rumor de que aquelas mercadorias, aproveitadas como material blico, ajudavam pases adversrios do Japo. E, a seguir, circulam escritos aparentemente razoveis condenando as atividades produtoras daqueles artigos, surpreendendo e confundindo produtores. Apesar disso, porm, no diminui o nmero de~produtores; pelo contrrio, prossegue a tendncia de aumento, ano aps ano. Logo aps o comeo da guerra no Pacfico, apesar da proibio legal, organizaram-se sociedades patriticas japonesas, defensoras do caminho

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a ser seguido pelos sditos do Imprio iniciativa daqueles que acreditavam piamente na vitria certa do Japo. E tais grupos se multiplicavam em vrias regies de So Paulo e outros Estados de maior concentrao de imigrantes nipnicos. Diante do crescimento do nmero de produtores de menta e casulo de seda atividades que favoreciam potncias inimigas alguns daqueles grupos iniciam um movimento visando impedir, e at castigar, tais produtores antipatriticos. Em fevereiro de 1944, organiza-se em So Paulo uma entidade secreta denominada Kdsha. As circunstncias de sua formao e as vicissitudes por que ela passou so expostas a seguir1. "Em plena guerra entre o Japo e os Estados Unidos, Washington pediu ao Brasil que fomentasse a produo de menta e de seda, itens necessrios fabricao de material blico. E os americanos comearam a comprar em grande quantidade, elevando em dez vezes o seu preo do tempo de paz. Como 99% de produtores desses artigos so nossos compatriotas, somos de opinio de que, mesmo vivendo em pas inimigo, como sditos nipnicos, devemos evitar a produo de mercadorias destinadas fabricao de armamentos. Com esse intuito e apreensivos face tendncia de aumentar cada vez mais o nmero de produtores, seduzidos por preos realmente atraentes chegou-se a produzir aqueles itens em todas as zonas servidas por ferrovias brasileiras buscouse impedir a sua produo. Com tal objetivo, organizou-se, inicialmente em Paraguau, Estrada de Ferro Sorocabana, a Sekisei-dan (Grupo de Servidores Sinceros do Imperador), contando com pouco mais de uma dezena de membros. O grupo procurou o sr. Junji Kikkawa, residente na cidade de So Paulo, que tinha a patente de tenente-coronel do Exrcito japons, levando-lhe o prospecto da organizao e solicitando seu apoio. Na mesma poca, o sr. Kiyoo Yamanouchi, colega do sr. Junji Kikkawa na Academia Militar, igualmente preocupado com a perda da noo de 'caminho de sditos', dos patrcios residentes no Brasil e com a finalidade de enaltecer o esprito japons e enfatizar os deveres de sditos do Imprio, elaborou um prospecto, visando a organizar uma entidade. E procurou e obteve a adeso do ex-coronel sr. Jinsaku Wakiyama, tambm colega da Academia Militar alis o oficial japons de mais alta patente no Brasil. A seguir conseguiu-se o apoio do sr. Junji Kikkawa. Como os objetivos deste grupo coincidiam com os do Sekisei-dan, h pouco mencionado, os dois grupos resolveram agir em conjunto, da em diante, pelo bem da ptria.
"Estmulo da Cultura de Menta e da Sericicultura. Adendo: a Formao da Kdsha (antecessora da Shindo Renmei)"; "Um Registro da Realidade: A linha SantosJuqui sob Violento Vendaval", editado em abril de 1946. No consta o nome do autor, mas supe-se que seja um dirigente da Associao de Reservistas da linha SantosJuqui.
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Por isso, os dois oficiais escreveram sobre as aplicaes militares da menta, do fio de seda e tecido de seda, distribuindo aos companheiros e estes aos produtores patrcios, sugerindo a sua reflexo, a respeito da necessidade de se evitar (mesmo vivendo em pas inimigo) produes que favoreciam os pases inimigos. Depois, com o aumento gradual de scios, chegou-se condio de formar uma verdadeira sociedade. Consultado o sr. Jinsaku Wakiyama, obteve-se o seu apoio e ele deu o nome de Kdsha entidade. Isso aconteceu nos primeiros dias de fevereiro de 1944. O sr. Jinsaku Wakiyama havia sido solto poucos dias antes da priso. Por isso ainda se achava sob rigorosa vigilncia das autoridades. Havia necessidade de muita cautela, razo por que ele declinou do cargo de presidente. Assumiu ento o sr. Junji Kikkawa, tendo como vice o sr. Kiyoo Yamanouchi, dedicando-se ambos ao servio da nova organizao. Inesperadamente, porm, algum entre os produtores compatriotas, sentindo-se prejudicado em seus interesses, denunciou o sr. Kikkawa, que foi detido em agosto de 1944. Ocupou a presidncia o sr. Kiyoo Yamanouchi, que prosseguiu nos esforos para o desenvolvimento da Kdsha, com a fiel observncia dos princpios do caminho dos sditos do Imperador (shind) e a firme obedincia ao esprito japons. A surgiu no seio dos associados a opinio de que o nome Kdsha era por demais inexpressivo diante do (grandioso) novo movimento poltico dominante no Japo. Por isso, em maio de 1945, mudou-se o nome para Shindo Renmei (Liga dos Seguidores do Caminho dos Sditos). Tendo sido o sr. Junji Kikkawa (detido em agosto de 1944) posto em liberdade em setembro de 1945, o sr. Kiyoo Yamanouchi renunciou ao cargo de substituto, desligando-se ao mesmo tempo da Shindo Renmei. Em setembro mesmo, ele organizou a Zaihaku Zaig Gunjin-kai (Associao de Ex-Militares Japoneses do Brasil), integrada, como indica o nome, por antigos militares das foras imperiais. A nova entidade tinha sede em So Paulo e estabeleceu filiais e sees no interior." Tal como sucedia no interior do Estado, tambm nos subrbios de So Paulo os lavradores nipnicos se beneficiavam, no terreno econmico, da alta cotao de seus produtos. E aqui igualmente havia quem condenasse a leviandade daqueles patrcios que viviam contentes, esquecendo-se dos sofrimentos da me-ptria em guerra. E havia organizaes patriticas que procuravam a "purificao" do modo de vida daqueles compatriotas. A propsito, Sadamu Tanabe, morador de Mogi das Cruzes, escreveu o seguinte 2 .
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Manuscrito de Sadamu Tanabe. Documento do Museu da Imigrao, PB 16.

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"Grupo de Estudos da Conjuntura. Os lavradores nipnicos da colnia de Mogi das Cruzes estavam eufricos com a boa situao econmica resultante da constante elevao dos preos de ovos, frutas, legumes e verduras. Em sua maioria, pareciam indiferentes em relao extrema gravidade da situao da ptria. Por 'outro lado, naquela colnia organizava-se um grupo destinado a estudar o Movimento de Apoio Poltica Imperial e o Movimento da Nova Ordem(*). Com a finalidade de impulsionar um movimento de purificao da vida cotidiana da colnia, o grupo enviava alguns companheiros a reas suburbanas de Ferraz de Vasconcelos, Itaquera e Suzano, onde promoviam (com moradores locais) mesas-redondas para propagar aquelas idias. Expandindo-se, a organizao estendeu suas atividades at a Capital, fundando-se ento a Kdsha, sob a orientao do coronel Wakiyama. Quando a guerra findou, o grupo cindiu-se em duas faces antagnicas, da seguinte maneira: Kazuo Yamada (aparentemente 'esclarecido'), capito Yakushijin (vitorista), Ozaki (Shindo Renmei), Tanabe (esclarecido), Chuji Tsubouchi (esclarecido), Kiyoo Yamanouchi (capito do Exrcito Imperial, participou da guerra russo-japonesa de 1904-5, figura central do Grupo de Estudos da Conjuntura na fase final da guerra; no ps-guerra, levado por vitoristas se torna um dos prceres da Shindo Renmei)" (corte da parte final). Ordem do dia da inaugurao do Grupo de Estudos da Conjuntura. (Com incio s 9 horas do dia 22 de julho de 1945.) 1. Discurso inaugural 2. Hino Nacional Japons 3. Reverncia distncia ao Palcio Imperial(**); saudao respeitosa 4. Homenagem alma dos mortos na guerra 5. Leitura respeitosa do Edito Imperial sobre a Educao 6. Leitura Respeitosa do Edito Imperial(**) 7. Explicao do representante sobre a fundao do Grupo de Estudos

(*) Na verdade, o Movimento de Apoio Poltica Imperial resultou do Movimento da Nova Ordem. Comeou em 1940, liderado por Fumimaro Konoye e visava implantar um regime do tipo fascista para enfrentar a crtica situao do Japo, h muitos anos em guerra com a China e s vsperas de entrar em conflito armado com os Estados Unidos e seus aliados. Os partidos polticos se dissolveram para aderir ao movimento. Formou-se assim um partido nico, o Taisei Yokusan-kai (Sociedade de Apoio Poltica Imperial), que, como o nazi-fascismo europeu, acabou por controlar toda a vida poltica e social do pas, at o fim da guerra. No Brasil, o Estado Novo dissolveu os partidos polticos em 1937. (**) Estes rituais de reverncia ao Imperador eram observados em todas as solenidades pblicas (nas colnias, associaes, entidades civis e militares, empresas, clubes, etc).

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8. Proposta de participao no Movimento da Prtica do Caminho de Sditos 9. Leitura do folheto "O Caminho do Shindo" (editado pelo Ministrio da Educao do Japo) 10. Exposio sobre Tonari-gumi (grupos de vizinhos) 11. Mesa Redonda sobre: I A Situao do Japo e do mundo; II Discusso sobre a orientao futura do Grupo 12. Reverncia ao Palcio Imperial 13. Discurso de Encerramento Coube a Sadamu Tanabe pronunciar o discurso de abertura: "O nico meio que nos resta , por meio de livros, jornais e revistas mais recentes publicados no Japo e que esto ao alcance de nossos irmos, selecionar os escritos relacionados com os movimentos da Nova Ordem, de Apoio Poltica Imperial e de Concretizao do Caminho de Sditos e fazer deles livros de texto, estud-los e analis-los sob todos os ngulos, com a participao de todos. E assim introduziremos em nossas vidas, as idias orientadoras com fundamentos (nos ideais) daqueles movimentos. Assim agindo, muito embora com atraso, trilharemos o melhor caminho para aprender a seguir o caminho de sditos". Repetimos que, residindo em pas inimigo, era impossvel escapar s presses como sditos do Imperador. No entanto, no campo econmico, como j vimos, no poucos lavradores japoneses estavam muito satisfeitos com os bons resultados colhidos. provvel que tenham existido outras organizaes, alm das aludidas, que consideravam esse comportamento absolutamente antipatritico, e portanto imperdovel. Pode-se inferir que tais grupos uniram-se para formar a organizao chamada Kdsha, de cuja transformao resultou a Shindo Renmei, conforme vimos. E verificamos tambm que as figuras centrais dessas entidades eram militares. Os idealizadores de tais grupos devem ter julgado que, para reestruturar o sistema de controle da comunidade japonesa do Brasil, cuja cpula desaparecera com o repatriamento dos agentes do governo de Tokyo (diplomatas e outros elementos representativos), e reorientar e reunificar o pensamento dos compatriotas desorientados, o melhor seria excluir os membros da antiga elite (cuja maioria aceitava a derrota japonesa) e colocar militares no comando da comunidade. Como a Kdsha era uma sociedade clandestina, adotou-se um disfarce na legalizao de suas atividades: instalou-se uma mercearia com o nome de Casa Paulista no nmero 178 do Parque Dom Pedro, em Sc Paulo. Seus empregados (representantes) faziam-se passar por viajantes para percorrer o interior e recrutar novos scios e ao mesmo tempo leva:

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avante a campanha de combater aqueles que se dedicavam a atividades produtivas que favoreciam interesses inimigos. Quando as palavras no bastavam para convencer os produtores, recorriam ; ao direta de destruio e incndio de casas de criao de bicho-da-seda. Esses ativistas pertenciam Kdsha3. De fato, logo aps a fundao da Kdsha, por volta de abril de 1944, sucederam-se casos de destruio ou incndio de usinas de menta e criaes de bicho-da-seda no interior de So Paulo. Tais atentados chegaram ao conhecimento das autoridades e, em agosto do mesmo ano, o presidente Junji Kikkawa foi recolhido priso pela Secretaria de Segurana Pblica, sob a acusao de estar dirigindo atos de sabotagem. Kikkawa s foi libertado em novembro do ano seguinte, depois do trmino da guerra. Ningum pensava sequer na hiptese da derrota japonesa. A notcia da rendio do dia 14 de agosto de 1945 chocou visceralmente todos os sditos nipnicos da comunidade radicada no Brasil. Tendo como marco o momento da divulgao da fatdica informao, elementos pertencentes s mesmas organizaes patriticas, e que no duvidavam da vitria do Japo, se cindem abruptamente em duas correntes antagnicas, conforme consta do manuscrito h pouco citado. Reconhecer honesta e imediatamente a derrota ou acreditar cega e teimosamente na vitria da ptria: eis a encruzilhada que dividiu de modo implacvel os japoneses do Brasil em duas alas hostis e irreconciliveis (esclarecidos e vitoristas) durante muito tempo. f) A essncia da Shindo Renmei O que era em essncia a Shindo Renmei, que consolidou sua estrutura como a maior organizao entre os grupos vitoristas e cuja designao, ainda hoje quase meio sculo depois , sinnimo de vitorista? Existem diversas verses a respeito da data da fundao da enti-

Seiichi Tomari (depois um dos mais ativos dirigentes da Shindo Renmei), fundador do Sekiseidan, que se incorporou Kdsha, era um orientador dos elementos ativistas. Os atos terroristas que culminam em assassnios foram por ele idealizados e dirigidos. Ao mesmo tempo que se organizava a Kdsha, Tomari se transfere para So Paulo, adquire um aparelho de confeccionar chapu, percorre freqentemente o interior, levando chapus para vender, aliciando companheiros para a causa, chegando a comandar atos incendirios (ver Dirio de Seiichi Tomari, p. 270). Por outro lado, no manuscrito de Tanabe, h pouco citado, consta que, "por ocasio da visita deste moo", etc. e se acrescenta: "o moo com jeito de vendedor viajante que se hospedara (em sua casa) mediante a apresentao do capito Yamanouchi (posteriormente dirigente da Kdsha), fazia declaraes radicais como 'a cultura da menta e a criao do bicho-da-seda constituem atividades que favorecem o inimigo, por isso preciso tocar fogo nelas".

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dade 1 . Como j expusemos, ela resultou da absoro e fuso de organizaes patriticas japonesas do Brasil. A sua antecessora imediata foi a Kdsha e o dia do incio de atividades com o nome Shindo Renmei foi 22 de julho de 1945, pouco antes do fim da guerra 2 . A chamada "Plataforma da Shindo Renmei", divulgada nessa data, era a seguinte: "Plataforma da Shindo Renmei. 1. Ns somos sditos do Grande Imprio do Japo. Ns japoneses residentes no Brasil devemos manter firme o orgulho de sditos do Imprio e nos dedicar ao culto do esprito japons. E o meio de alcanar esse objetivo consiste em desenvolver as seguintes virtudes herdadas de nossos antepassados: respeitar a integridade moral, concretizar o patriotismo e a lealdade ao imperador, mediante diligncia, esforo, pacincia e auto-estima.

1 1 De acordo com o relatrio sobre a Shindo Renmei apresentado pelo delegado Alfredo Assis, titular da Delegacia de Segurana Pessoal da Polcia Central de So Paulo, a entidade precursora da Shindo Renmei teria sido a Utai Dkkai (Associao de Amadores de Utai) [Utai, gnero de canto que acompanha o teatro clssico N], fundada em 11 de fevereiro (data da fundao do Japo) de 1946, e reunida em torno do tenente-coronel da reserva Junji Kikkawa, cujos membros consideraram no haver outro caminho para a concretizao do "Caminho dos Sditos" (Shindo). Por isso convocaram correligionrios e procuraram difundir seus propsitos (Documento do Setor de Defesa dos Interesses do Japo da Legao da Sucia). II Segundo a edio de 4 de abril de 1946 do Dirio de S. Paulo, no dia 20 de outubro de 1942, no Hotel Sawaya (parece tratar-se do Hotel Sawai) de Marlia, reuniram-se japoneses de Marlia, Tup, Pompia, Bastos e outras localidades e decidiram iniciar um movimento de sabotagem, espionagem e resistncia contra o Brasil. Estranhamente, o delegado local permitiu essa reunio, mas a populao no. Cerca de 200 cidados atacaram o hotel e expulsaram os japoneses. Essa reunio marcou o crescimento da Shindo Renmei diz a notcia. III Entre as resolues tomadas pela Terceira Reunio de Confraternizao da Alta Paulista (20 de janeiro de 1946) figuram: 1) enfatizar que ns somos sditos do Grande Imprio do Japo; 2) adotamos como princpio fundamental o "Esprito Kikkawa"; 3) a data da fundao da Shindo Renmei o dia 9 de setembro de 1944 (mas no est esclarecido qual o motivo da escolha desse dia). IV- 23 de setembro de 1945 tido como a data da fundao da Shindo Renmei, como consta de Imin no Seikatsu no Rekishi (Histria da Vida do Imigrante Japons, de Tomoo Handa) e em Sengo Jnenshi (Histria dos Dez Anos do Ps-Guerra), edio do Jornal Paulista, tambm sem esclarecimento dos motivos da escolha da data. 2 Ryotaro Negoro, que se tornou diretor-superintendente da Shindo Renmei, informa, na fl. 198 do inqurito do DOPS, que "foi fundada no dia 22 de julho de 1945 em Marlia". A iniciativa partiu de Masanobu Sato, Seiichi Tomari, Sakuzo Kawashima, Kanji Aoki, Ryotaro Negoro, Kiyoo Yamanouchi, Tooru Kubo e Junji Kikkawa, tendo tomado parte da reunio cerca de 80 pessoas. No comeo de setembro de 1945, a Renmei se transferiu para So Paulo. A sede central funcionou dividida nas casas de Negoro e Tomari. Nessa poca, Yamanouchi separou-se da Shindo Renmei, para fundar a Zaig Gunjin-kai (Associao de Reservistas). Nessa fase a Shindo Renmei contava com 20 mil associados. Estas informaes esto no depoimento de Negoro. Nessa ocasio, Kikkawa ainda estava na priso. A propsito da mudana do nome de Kdsha para Shindo Renmei, Kiyoo Yamanouchi explica: "O nome Kdsha no serve para a zona rural. Por sugesto de Nobuyoshi Ozaki, ento morador de Mogi das Cruzes, considerou-se mais apropriado algo que soasse prximo expresso muito em voga no Japo: Shindo Jissen (tem o sentido aproximado de 'cumprimento fiel dos deveres de sditos de imperador'). Da surgiu o nome Shindo Renmei (Liga do Caminho dos Sditos)." Do livro Kyshi (Fanatismo), de Toshiro Takagi, p. 163.

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2. Aspiramos apoiar a obra de construo da Grande sia Oriental(*). Para ns japoneses residentes no Brasil colaborarmos na construo da Grande sia Oriental, devemos primeiramente executar um programa de ensino apropriado para tal fim. Isto , enaltecer a idia de reverncia aos deuses e de culto aos antepassados, promover a educao fsica e, para que nossos filhos se tornem sditos do Imprio, devemos nos esforar no ensino da lngua japonesa e dedicar esforo especial educao moral dos adultos. 22 de julho do ano 20 da Era Showa (1945). Sede Central da Shindo Renmei" (selo autenticador). Serviu de linha mestra dessa orientao fundamental da Shindo Renmei o escrito de Junji Kikkawa, que, ao que tudo indica, foi elaborado em outubro de 1944, ainda na priso 3 . Ei-lo na ntegra: "Os compatriotas do Brasil no ps-guerra devem permanecer aqui ou devem retornar ptria ou rea da Esfera da Co-prosperidade da Grande sia Oriental (Dai Ta Kyoei-ken)? No momento, no dispomos de meios de saber a inteno do Japo. Entre os patrcios que ficaram privados da proteo das representaes diplomticas, essa considerada a questo mais importante do momento. Sobre o problema, no s devemos desde j realizar os devidos estudos como proceder aos preparativos necessrios, conforme o resultado da deciso (a ser tomada). E se esse resultado for contrrio orientao do nosso governo, precisamos nos levantar para promover resolutamente um movimento capaz de influir na opinio nacional (do Japo). Considero essa atitude nosso dever natural. Razo porque, com a permisso dos companheiros, vou expor aqui minha opinio pessoal, a fim de submet-la apreciao de todos. Deciso: Os japoneses residentes no Brasil preferem regressar ptria ou Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental. Exposio de Motivos. 2. A emigrao para o Brasil no constitui uma poltica fundamental do Japo. Trata-se de uma medida desesperada, tomada para abrandar os efeitos do rpido crescimento demogrfico do pas. Deve ser considerada uma poltica de carter temporrio destinada a 'soltar tudo o que for

Documento do Museu de Imigrao, PB 8.

(*) Esfera da Grande sia Oriental, grandiosa meta estabelecida pelo governo de Tokyo para justificar a guerra contra a China, e posteriormente os Estados Unidos e seus aliados. Alegava que a luta armada visava criar uma grande regio poltico-econmica reunindo pases da sia Oriental. A Guerra do Pacfico e a Guerra da China englobadamente eram chamadas oficialmente pelo Japo de Guerra da Esfera da Grande sia Oriental.

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possvel soltar' e 'sem perda de tempo', visando um alvio imediato para o problema. Ns viemos para o Brasil, dentro desse pensamento. Se no ps-guerra, o Japo mantiver sua influncia ora conquistada nos Mares do Sul, dever abandonar imediatamente a poltica temporria. Considero natural, ento, marchar na direo da realizao da construo da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental, que a poltica fundamental do Japo. Quer dizer, como a situao do ps-guerra dever ser totalmente diversa daquela da poca em que viajmos (para o Brasil), no seria nosso dever natural erguermo-nos, acompanhando e apoiando a poltica fundamental do Imprio? 3. Como ser humano, como povo e em particular como sditos japoneses, no devemos nos limitar a planejar o aperfeioamento de uma gerao, e sim, ao mesmo tempo, pensar na evoluo de nossos descendentes. Na verdade, o aperfeioamento de uma gerao constitui a base da evoluo dos vindouros, portanto no seria natural planejar (tal evoluo) como parte da humanidade? Em especial, aqueles que malograram no aperfeioamento de sua gerao, devem educar seus sucessores, filhos e netos, no sentido de que eles herdem o seu esprito. preciso que estejam decididos a formar descendentes capazes de servir ptria como bons sditos do Imperador. Aqueles que, depois de chegar ao Brasil, conseguiram construir bases relativamente boas no terreno material, seria realmente lamentvel que tivessem de abandonar seus bens para regressar ptria ou Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental. Mas, se tal deciso representar o melhor caminho para o plano (de vida) dos descendentes, devem mudar decididamente a sua rota. 4. O governo imperial vem dedicando o mximo de esforo na educao do povo e no ensino das crianas e, ainda, no s dentro da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental, como at em relao aos filhos de compatriotas espalhados nas Amricas do Sul e do Norte. natural considerar, do ponto de vista educacional, dar prioridade em primeiro lugar ao Japo, em segundo Esfera de Co-prosperidade da sia Oriental e aos demais em terceiro e quarto lugar. Por outro lado, no obstante as mltiplas dificuldades nacionais e econmicas, o governo de Tokyo dedicou no poucos recursos educao de filhos de patrcios residentes no Brasil. E no entanto, os resultados no s no foram satisfatrios como acabaram contribuindo para agravar disputas pelos subsdios educao na colnia. A maior parte dos subsdios no foi consumida no pagamento de salrios de funcionrios da Fuky-kai (Sociedade de Difuso do Ensino dos Japoneses do Brasil), dando margem crtica de que haviam 'colocado o carro diante dos bois?' Disseram-me que muito fraco o grau de conhecimento da lngua

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japonesa das jovens que ingressam na Escola de Corte e Costura So Paulo(*). Se filhas de famlias que criam seus filhos com certo zelo, temos tal resultado, fcil imaginar como so as demais. Esses resultados podem ser considerados frutos parciais do desempenho da Fuky-kai. impossvel prever qual orientao o governo nipnico adotar a respeito da educao de filhos de patrcios residentes no Brasil, no ps-guerra, mas no se deve esperar muito. 5. A lei brasileira estabelece que filhos de imigrantes estrangeiros nascidos no Brasil devem ser considerados cidados brasileiros. Por conseguinte gozaro do direito de cidadania brasileira e ao mesmo tempo, tero de cumprir seus deveres. Ento, forar o ensino de carter japons a esses filhos, que, pela lei do pas so brasileiros, merecer a reprovao por parte do governo brasileiro, alis coisa natural para uma nao formada de imigrantes. Impor educao nipnica a esses filhos no s provocaria antipatia do governo brasileiro como representaria uma atitude contrria aos princpios expostos no Edito Imperial, citado no final do pargrafo 1, desta exposio de motivos(...) Na presente grande guerra, nipo-norte-americanos e nipo-brasileiros participantes do combate nos campos de batalha, acabaram entrando em luta de extermnio contra os pais. Acontecimentos to trgicos devem ser evitados para sempre no futuro, como providncia humanitria. Em outras palavras, aqueles que nasceram nas duas Amricas e em outros pases estrangeiros e tm a nacionalidade do pas onde nasceram, precisam voltar nacionalidade do pas dos pais. 6. A educao dos filhos comea com a educao no lar e tem como princpio primordial assimilar a natureza sagrada do kokutai (carter fundamental da nossa ptria), aps aprender a venerar os antepassados, respeitar os idosos, herdar as grandes obras dos ancestrais e dos mais velhos avanando nos estudos da histria ptria. Para isso necessrio, desde a infncia, visitar os tmulos dos antepassados e visitar e estudar profundamente os monumentos histricos. No presente, graas ao desenvolvimento dos meios de transporte e comunicao, no difcil conseguir tais oportunidades, mesmo para aqueles que se encontram em terras as mais distantes. Todavia, se tivermos a oportunidade de educar nossos filhos no Japo ou dentro da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental, os resultados sero naturalmente melhores. 7. Por acaso, tive oportunidade de ler, recentemente, o livro Nan-y

(*) At fins da dcada de 30, eram muito raros os imigrantes japoneses do interior em condies econmicas de mandar filhas estudarem em cursos secundrios ou escolas normais. As poucas oportunidades de estudo para mocinhas eram oferecidas pelas escolas de corte e costura.

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Tokuhon (Leitura dos Mares do Sul) de autoria de Ichiro Tachibana. A obra revela o seguinte. Vassalos sobreviventes da Dinastia Sul(*), planejando colocar o sagrado trono imperial em terras seguras, andaram invadindo e assolando o sul da China e Mares do Sul. No tempo do Taik(**), o seu nmero alcanava cento e tantos mil. Eles solicitaram ao Taik a conquista das terras dos Mares do Sul. Na ocasio o Taik estava empenhado na guerra contra a dinastia Ming da China, enviando um grande exrcito expedicionrio Coria, no podendo por isso expandir suas tropas at os Mares do Sul. Como se sabe, o Taik faleceu durante a segunda expedio pennsula coreana (1598). Depois, no tempo do Xogunato Tokugawa, adotou-se a poltica de isolamento do pas. Aquelas foras perderam completamente o apoio do Japo metropolitano e deixaram de dar notcias ao pas de origem. O livro conclui dizendo que hoje restam apenas alguns epitfios(***). Qual teria sido o destino dos mais de cem mil patrcios? Pensando bem, nem todos devem ter perecido, sem deixar rastro. Com o passar do tempo, devem ter sido naturalmente absorvidos na mestiagem com as nativas. Em apenas pouco mais de trezentos anos, cento e tantos mil patrcios desaparecem, no temos nenhum vestgio deles. No ser um fato por demais trgico e lamentvel, mesmo levandose em conta que lhes faltou apoio da me-ptria? 8. O estado catico em que se encontram os compatriotas japoneses do Brasil, com suas feias disputas, o aparecimento de indivduos unicamente interessados em lucros pessoais, sem considerao s conseqncias que podero ter na ptria; 'no me importa que o Japo perca a guerra', 'ouso atirar flecha contra o imperador' com temor reverenciai que tomo conhecimento dessas frases de desrespeito para com Sua Majestade. Pressinto uma sombra escura no futuro dos compatriotas do Brasil. Devemos reconhecer que mais de uma dcada de esforos dedicados ao ensino e treinamento foram perdidos de uma hora para outra. O estado
(*) Refere-se ao perodo das Duas Cortes (1336-92), quando a corte japonesa se cindiu em duas, a do Norte e a do Sul. A luta entre as duas faces durou 56 anos, durante a qual a corte do Sul funcionou em Yoshino e a do Norte em Kyoto. Em 1392, houve a reunio das duas cortes, patrocinada pelo Xogunato de Muromachi. A histria aqui contada pura fico, sem nenhuma base na realidade. Veja (**) Taik ttulo honorfico dado a Hideyoshi Toyotomi (1536-98), que ocupou o poder central do Japo na fase final do perodo das guerras feudais. Ttulo atribudo a ex-ministros-presidentes ou a ex-regentes na corte do imperador. (***) A verdade histrica: nos fins do sculo XVI e comeo do XVII, havia muitos bairros japoneses nas Filipinas, Sio, Indochina (atual Vietn), Macau, etc. devido grande expanso do comrcio internacional do Japo. Mas, com o fechamento do pas, culminado com o decreto do Xogunato Tokugawa, que vedava rigorosamente a sada e entrada de navios de longo curso em portos japoneses, os nipnicos residentes nesses pases no puderam mais voltar ptria. Seu nmero atingiria alguns milhares de almas, segundo fontes histricas nipnicas.

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catico em que se encontra a comunidade nipnica do Brasil indivduos entregues busca de interesses particulares, outros agindo no sentido de conspurcar a imagem da guerra santa travada pelo Japo, olvidando o fato de que o Imprio est lutando pela justia e libertao da humanidade. Onde a causa imediata dessas atitudes condenveis? O embaixador e os cnsules que deveriam ser os supremos orientadores, tinham a obrigao de, assim que se consumou o rompimento das relaes diplomticas, instruir os patrcios residentes no Brasil, de modo concreto, como agir em tempo de guerra e tambm adequada orientao frente s possveis presses e dificuldades. Deveriam ter orientado na direo certa os patrcios, completamente perdidos. Mas, deixando apenas um comunicado abstrato, ao receberem a ordem de repatriamento, esconderam-se atrs do elegante fraseado do direito internacional, retirando-se depressa como quem foge. Agora os nossos oficiais e soldados das frentes de batalha se transformaram todos em pelotes especiais de ataque (tokktai) e tambm a populao civil de 100 milhes enfrenta a grave situao com o mesmo esprito das unidades especiais de ataque. Nesse momento, eles (os representantes diplomticos) fugiram, retornando ao Japo, deixando aqui abandonados os seus protegidos. Como se sentiro eles, num momento de reflexo sobre os seus atos? Se fossem samurais antigos de verdade, assim que recebessem a ordem de regresso, deveriam se demitir de seus cargos e, na qualidade de simples imigrantes, acompanhariam o destino dos trezentos mil compatriotas. E no caso em que isso fosse impraticvel, teriam feito o haraquiri, como bons samurais. O fato de serem tratados como altas autoridades para, em caso de emergncia, retriburem com o sacrifcio da prpria vida s sagradas benesses imperiais. Devem saber que no para usufruto de 'privilgios especiais de sua carreira'. Em outras palavras, no por causa do embaixador e dos cnsules que foram despachados emigrantes e sim, por causa dos emigrantes compatriotas, so nomeados embaixador e cnsules. Outrossim, aqueles que se consideravam pertencer elite dirigente dos compatriotas residentes no Brasil, como os senhores administradores de empresas como Bratac, Kaik, Tozan, Tomen e Brascot, o que esto fazendo no momento? Ns no desejamos usar palavras radicais. A verdade, porm, que nunca ouvimos qualquer medida de orientao desde o comeo da guerra, por parte desses auto-intitulados elementos da elite dirigente. E no caso de denncia sobre o cultivo de menta e bicho-da-seda, motivo de agitao entre japoneses, no conseguiram at agora dar uma orientao adequada, no ?

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P E R O D O E M B R A N C O E DISTRBIOS N A C O M U N I D A D E J A P O N E S A

Ao tomar conhecimento do emprego blico do mentol, o sr. X assustou-se, e tentou saber furtivamente qual seria a opinio do governo de Tokyo, pondo assim mostra a sua ignorncia e indignidade. Ridculo. Na conjuntura atual, o governo japons deveria interferir e dar orientao em casos como este? Os governantes e os cem milhes de japoneses limitar-se-o a se preocupar profundamente e manifestar sua simpatia pelo modo como os patrcios residentes no Brasil superaro esta difcil conjuntura. Julgo no caber a eles dar orientao sobre tais assuntos neste momento. Efetivamente, passados seis meses daquela consulta, no se obteve nenhuma resposta, o que natural. precisamente em ocasies como esta que os senhores que se julgam classe dirigente deveriam deixar de lado seus dios pessoais e se unirem para estudar e encontrar a melhor orientao. E se por causa dessa orientao sofrerem hostilidade por parte das massas e, por motivo de abuso de poder, forem demitidos de suas empresas, ou ainda forem detidos por ferir suscetibilidades do governo brasileiro, no seria tudo isso motivo de real satisfao para um homem japons? Somente tornando-se paradigmas, podero esperar que sucessores capazes de sacrifcios pessoais para herdar a vontade dos nossos maiores, passem a agir. Desejar inutilmente ter uma vida sossegada e despreocupada e reprimir movimentos de jovens, seria uma atitude que no se esperaria nem de um campnio ignorante (A propsito cito aqui o caso de dois jovens lavradores que moraram na minha casa: Takasugi de tal e Fukuoka de tal. Eles cresceram no Brasil, mas preocupados com a atitude dos patrcios nos casos de mentol e seda, se levantaram com deciso, na condenao dessas atividades). O exposto at aqui parece por demais franco e rude, mas lembremos que mesmo no Japo, a fuga responsabilidade e o no-engajamento constituram, at h alguns anos, motivos de elogios como boa arte de viver. Os que no agiram assim eram tidos como tolos. No entanto, tais tendncias provocaram os incidentes (revoltas) como o Incidente de 15 de Maio, de 26 de Fevereiro, da Liga da Aliana de Sangue e do Partido do Vento Divino(*). Esses incidentes tiveram o dom de despertar a Nao para tomar a deciso de entrar na guerra. Portanto intolervel que tais tendncias obsoletas de antes da guerra sejam seguidas aqui no Brasil. Refletindo bem sobre os fatos apontados, em duas ou trs dcadas habituamo-nos a uma vida de facilidades e sem guerra, caindo natural(*) Aluso a levantes militares, tentativas de golpes de Estado e atentados terroristas, contra instituies e polticos da velha guarda. Os "incidentes" da dcada de 30, inspirados ou promovidos por elementos extremistas da direta ou ultranacionalistas, marcaram a fase preparatria da entrada do Japo na guerra.

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mente na licenciosidade, faltando s pessoas em geral a seriedade de se entregar, com sacrifcio pessoal, s suas funes e deveres. Sentimos uma grande distncia, nessas circunstncias, at que os compatriotas, no futuro, assumam a liderana dos demais povos, orientando-os no sentido de entenderem o verdadeiro significado da atual guerra santa. Nas condies presentes podem at provocar mal-entendidos(*). 'Aqueles que partem so esquecidos a cada dia que passa', diz um ditado. Ns devemos reciclar nosso corpo e esprito, regressando o quanto antes, juntamente com nossas famlias, para reas sob a proteo da bandeira do Sol Nascente. L promoveremos peregrinao aos recentes campos de batalha, visita a locais onde dezenas de milhares de compatriotas pereceram e verificaremos os vestgios da valorosa luta travada pelos civis. No tenho a menor dvida de que doravante o povo de Yamato, com redobrado esforo e fundamento no grande esprito de Hakk Ichiu (O Mundo sob um Teto), contribuir para a implantao da justia mundial e paz permanente. Para tanto, o povo nipnico deve mostrar o seu exemplo como padro de todos os povos do mundo(*). Ns (do Brasil) devemos arcar com uma parte dessa tarefa, colaborando na grande obra. No se deve ficar apegado a bens e direitos j adquiridos. 9. Originariamente, no nosso pas, as famlias de filhos numerosos necessitavam de boas posses para dar-lhes educao adequada e preparlos para a vida. Ns prprios emigramos para o Brasil devido impossibilidade de suportar tais despesas, para que todos se dedicassem lavoura. Entretanto (no Japo), com a entrada em vigor do novo sistema educacional, as crianas so educadas sob a viso de que os filhos no somente pertencem s famlias como tambm, ao mesmo tempo, so os futuros sustentculos da Nao. Baseando-se nessa concepo, mesmo no sendo formado em curso superior, aqueles que adquirem boa tcnica profissional recebem tratamento incomparavelmente melhor do que nos tempos passados. Cientes dessa nova realidade, ficamos deveras satisfeitos. Assim sendo, acreditamos que mesmo em famlia abaixo da classe mdia, a situao de educao e emprego de seus filhos ser atualmente muito satisfatria. Eis o que corresponde vontade dos cus e orientao dos deuses: cada indivduo ocupar o seu lugar na vida. 10. No caso de introduo de plantas, em particular de hortalias do Japo neste pas, observamos que elas se transformam e degeneram em poucos anos. Entre nossos compatriotas residentes no Brasil, observamos tendncia evidente no mesmo sentido. Falando genericamente, no Brasil o grau de cultura se acha ainda em nvel muito baixo, em particular
(*) Os escritos de lderes vitoristas so caracterizados por um estilo obscuro, cheio de complicados termos e fraseados grandiloqentes, de difcil traduo.

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devido s facilidades de vida, clima temperado com relativamente escassos estmulos ( luta pela vida). Alm disso, no presente temos uma extrema decadncia moral e queda da disciplina pblica. Nessa situao ser virtualmente impossvel evitar a degenerescncia.Logo aps minha chegada ao Brasil, ensinei crianas na zona rural, durante cerca de um ano. Dessa experincia conclu: 1) aqueles que tiveram algum grau de educao no Japo; 2) aqueles nascidos no Japo e que se tornaram adultos aqui; 3) os nascidos no Brasil. Espantei-me de encontrar forte diferena de capacidade em raciocnio matemtico juntamente nesta ordem. Depois, ouvindo experincias de outras pessoas, pude confirmar esse resultado. 11. A propsito do esprito de Hakk Ichiu (O Mundo sob um Teto), vejo em uma conferncia feita por volta de 1930-31 por um professordoutor da Universidade Imperial de Tokyo, na sede da Kaik-sha, Tokyo, o seguinte resumo: 'Os sditos japoneses, graas s augustas virtudes de Sua Majestade o Imperador, tm a funo de enaltecer em todo o orbe o grande esprito (exposto no pargrafo 1 da Exposio de Motivos deste trabalho) e que no tm nenhum sentido de agresso'. Cabe a cada um dos japoneses integrar o esprito de O Mundo sob um Teto, servindo de paradigma aos cidados de todos os pases do mundo e orient-los. Mas, ponderando imparcialmente a situao dos japoneses do Brasil, no podemos reconhecer neles mesmo considerando-os com olhar benevolente capacidade de entender de fato o esprito de Hakk Ichiu e convencer estrangeiros. 12. No caso de a poltica nacional do Japo e a vontade dos compatriotas do Brasil se decidirem pela volta ( sia), como problema prtico razovel supor que entre 30 ou 40 por cento devero ser forados a permanecer no Brasil, por motivos diversos. natural que em relao a estes compatriotas remanescentes sejam dispensados mais esforos de educao e treinamento, dentro das possibilidades nacionais. Adendo (corte). Outubro do ano 19 da Era Showa (1944). Escrito atenciosamente por Rosei (O Velho) Kikkawa"(*). Este manuscrito constitui a forma literria da tese "Volta de todas as famlias para as terras que esto sob a proteo da bandeira japonesa", j sustentada reiteradas vezes. A Shindo Renmei, entretanto, transformou
(*) Entre idosos japoneses letrados costuma-se usar pseudnimos como Rsei (O Velho), uma forma de demonstrar atitude de modstia.

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este documento em sntese do "Esprito Kikkawa", seguindo-o religiosamente. A opinio de Kikkawa, exposta nesta Exposio de Motivos, representa a expresso do sentimento (vitorista) de muitos dos japoneses residentes no Brasil poca. A fora avassaladora com que no ps-guerra a Shindo Renmei aumentou o nmero de adeptos prova que numerosos compatriotas concordavam com o "Esprito Kikkawa". E, para manter vivo esse esprito, era condio sine qua non que o Japo tivesse vencido a guerra. O reconhecimento da derrota significava a perda da vontade de continuar a viver, o colapso total do movimento. Quando a 14 de agosto de 1945 se divulgou a notcia da rendio nipnica, imediatamente circulou a informao contrria, dando conta da grande vitria do Japo. A sede central da organizao forjou conscientemente as falsas notcias triunfalistas. Ao mesmo tempo que divulgava tais informaes por intermdio de publicaes oficiais da entidade, como Asahi Shinp, Shind e outras entre os scios do interior4, os diretores percorriam ativamente as "colnias" japonesas, para a conquista de novos associados e instalao de novas filiais. Graas a essa intensa atuao, em poucos meses o nmero de filiais ultrapassou seis dezenas e o de scios mais de cem mil3. Isamu Matsumoto, que a pedido da sede central organizou a filial de Tup e se tornou seu diretor, conta o seguinte 6 : "Em setembro do ano passado (1945), realizou-se uma reunio com a presena de Tomari. Naquele momento em que os japoneses residentes no Brasil estavam desanimados e sem vontade de trabalhar, por causa da falsa notcia da derrota do Japo, Tomari e seus companheiros organizaram a Shindo Renmei e desmentiram a informao. O Japo um pas invencvel, a melhor prova de que o pas triunfou na guerra o fato de o imperador estar vivo. Se por acaso o Japo tivesse sido derrotado, o imperador teria se matado e portanto no estaria vivo; do mesmo modo,
4 Idem. Segundo os autos relativos a Negoro, "A Shindo Renmei publicou oito pequenos jornais de algumas pginas e distribuiu aos scios de So Paulo e interior, sem periodicidade. Eram editores dos jornais Masanobu Sato e Hiroaki Izumi, cabendo a Mitsuo Maruyama traduzir o noticirio colhido em O Estado". 5 Nos documentos apreendidos na busca feita pela polcia na sede central da Shindo Renmei no dia 2 de abril de 1946, o nmero de filiais era de 51. Havia 12 mil scios em Marlia, e igual nmero em Pompia e 8 mil em Tup, as maiores filiais, num total de 104.250 membros. Esse total inclui os familiares dos associados. No depoimento prestado nos autos do DOPS, Negoro revela que o nmero de scios somava 20 mil. Tomari, por seu turno, informou que havia 64 filiais e os scios normais efetivos eram 30 mil, havendo mais 120 mil que apoiam a Shindo Renmei, por meio de contribuio em dinheiro ou outra forma de apoio (Doe. DOPS, fl. 44). 6 Doe. DOPS, fl. 354.

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nenhuma das altas autoridades nipnicas continuaria viva. Tomari solicitou que se organizasse a filial da Shindo Renmei aqui (Tup) e se comunicasse o fato a todos os patrcios. Desde a instalao da filial, o nmero de associados foi crescendo, alcanando 250" (corte do restante do depoimento de Matsumoto). Igualmente, Masaru Okabe, da filial de Luclia, expe o seguinte: "Em setembro do ano passado (1945), chegaram a esta cidade Ryotaro Negoro, Tomari de tal, Yamanouchi de tal, e promoveram uma reunio na casa de Sakuzo Kawashima. Tomaram parte nela cerca de dez pessoas, Negoro e Tomari expuseram os objetivos da Shindo Renmei. Integrar todos os patrcios do Brasil, elevando cada vez mais o esprito de amor ptria; esforar-se para engrandecer a Shindo Renmei, j que o Japo venceu a guerra contra os Estados Unidos; fortalecer mais ainda a f na invencibilidade do Japo; difundir os objetivos da Shindo Renmei, declararam. Como resultado da reunio, decidiu-se organizar a filial de Luclia da Shindo Renmei, arrecadando de dois a cinco cruzeiros de contribuio de cada scio; da quantia arrecadada, dois cruzeiros por scio eram recolhidos sede central, sendo o restante destinado s despesas de manuteno da filial. Negoro comprometeu-se a enviar as diretrizes da organizao, inclusive notcias da vitria nipnica. Organizada a filial, eu fui escolhido encarregado de redao e superintendente da filial. Assim que recebia o material de propaganda da sede central, tirava vinte a trinta cpias manuscritas, fazendo o trabalho promocional. Como resultado, Luclia conquistou cerca de cem scios. Entretanto, ainda hoje Luclia tem cerca de 20 japoneses que no acreditam no triunfo japons. Eles mal entendem os ttulos do noticirio de jornais que anunciam a derrota nipnica. Caso tivessem capacidade de ler bem os demais informes, verificariam que pases da sia esto sendo libertados, fato que comprova a vitria japonesa. Porque, de fato, o Japo sustentou a presente guerra para libertar povos asiticos; a libertao deles nada mais do que o resultado da vitria do Nippon. E outro ponto que apoia a crena na vitria nipnica o fato de que tanto o imperador como os altos dirigentes do pas continuam vivos. Se realmente o Japo tivesse sofrido revs, o imperador e altas autoridades j teriam morrido, em combate ou praticando o suicdio. Se de fato o Japo tivesse perdido a guerra, eu mesmo no estaria vivo" 7 . Se verdade que eram numerosas as pessoas que ingressavam nos quadros da Shindo Renmei, concordando e aceitando a propaganda e os
7

Doe. DOPS, fl. 352.

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princpios da entidade, como seria a situao real do movimento de expanso dessa organizao, vista por um terceiro? O j citado Hashiura registra o seguinte no seu dirio. "30 de novembro (de 1945). Fui assistir conferncia de dirigentes de uma sociedade chamada Shindo Renmei que teve lugar na residncia de Tojima, na cidade de A. (Araatuba). A direo central da entidade est formada pelo diretorpresidente, tenente-coronel da cavalaria Kikkawa, diretor-superintendente prof. doutor em fsica Negoro, conselheiro prof. dr. em filosofia Kubo. No momento o diretor-presidente se encontra em tratamento de uma paralisia, razo porque informaram os dois professores doutores Negoro e Kubo esto fazendo a viagem de conferncias, tendo como cicerone o sr. Masao Sato. O movimento Shindo Renmei comeou assim. H trs anos, cinco patriotas de Marlia, desejando fazer algo pela ptria, comearam por tentar interromper atividades produtivas que favoreciam o inimigo, como a sericicultura e a cultura da menta. O resultado, porm, foi muito pequeno, motivo porque procuraram o tenente-coronel Kikkawa em So Paulo. Na ocasio, o sr. Kikkawa estava irritado com o destino duvidoso dado ao fundo de socorro pelo sr. Miyakoshi e grupo, fundo esse confiado pelas autoridades brasileiras. Por isso aprovou a atuao dos moos de Marlia e, unidos, fundaram a Shindo Renmei. Como meio de divulgar a entidade, estabeleceram uma casa de comrcio atacadista em So Paulo, enviando viajantes ao interior para buscar adeses de pessoas da mesma opinio. Infelizmente, o sr. Kikkawa esteve encarcerado durante cinco longos meses, sendo posto em liberdade a 13 de novembro ltimo. Nessa oportunidade (da visita) combinaram apelar intensivamente massa de compatriotas. Os princpios da entidade so: o Japo obteve uma vitria espetacular, inimaginvel; os japoneses residentes no exterior, devero ser, em futuro prximo, ordenados a reemigrarem para a Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental. Para isso preciso estarem preparados, tanto na ao como na formao moral, a fim de no passar vergonha. Quer dizer, promover a ajuda e cooperao entre vizinhos, excluindo o pensamento derrotista, falando exclusivamente o idioma nipnico em famlia, dedicando-se com entusiasmo ao seu trabalho at o ltimo momento, etc. E os dirigentes da Shindo Renmei devem estar decididos a permanecer no Brasil at a partida do ltimo compatriota. Com o exposto, acredito ter feito um retrato da Shindo Renmei. A seguir, vou expor minha impresso sobre a conferncia. A entidade agiu clandestinamente no comeo de sua organizao, convidando elementos do interior para diretores e, depois das palestras, tratava de arranjar

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novos scios. Parece um procedimento muito natural. Mas o que mais falta nessa sociedade a modstia. Dando ttulos falsos aos conferencistas de professores-doutores (afirmo-o com a minha intuio), convidando os ouvintes do auditrio a ficarem em posio de sentido (frente) ao sagrado retrato de Sua Majestade, dando assim um falso sentido solene sesso, na hora de nomeao de dirigentes. Quanto 'performance' dos conferencistas, tive boa impresso da atitude de sbio adotado pelo sr. Negoro e da franqueza de patriota do sr. Sato. No entanto, senti asco quanto superficialidade dos argumentos e leviandade do sr. Kubo. Seus gestos e palavras cheios de baixezas e muito exclusivistas, no so compatveis com a categoria de um lder. Pode-se tolerar certas falhas nas cerimnias de reverncia distncia (ao imperador) e de homenagem aos mortos; porm extremamente lamentvel o tratamento intimidante dos novos dirigentes em relao ao pblico. Fao a seguir algumas crticas s realizaes da Shindo Renmei (por sugesto de outras pessoas). 1. O processo de inscrio, inicialmente clandestino, tornou-se de repente ostensivo, o que resultou na mistura de bons e maus elementos; por essa razo apresenta-se tudo confuso, dificultando a compreenso (do que seja a entidade). 2. Distribuir bandeira filial e conferir distintivos aos scios s servir para chamar a ateno das autoridades brasileiras, parece mais uma brincadeira. 3. Gostaria de considerar um avano o fato de a Shindo Renmei ter mudado o seu objetivo de caa aos traidores da ptria para a orientao das massas; todavia, no investiga os antecedentes dos que contribuem com dinheiro; protege indevidamente atos criminosos; no hesita em insultar mesmo homens virtuosos s porque no participam do movimento so atitudes condenveis e malcheirosas. Mesmo em relao nomeao de diretores da filial da cidade de A., verificamos que dos dois vice-diretores, um tinha sido sericicultor at o ano passado e o outro, intermedirio comprador de hortel. Ao mesmo tempo, declaram que no permitiriam o ingresso no quadro social, daqueles que se dedicavam produo de mercadorias que favoreciam o inimigo. So fatos que depem contra a sociedade. 4. Ouvi dizer que por causa de notcias fantsticas da Shindo Renmei acontecera algo infausto, mas como no disponho de prova da origem de tais rumores, no posso criticar"8.
8 Dirio j citado de Hashiura. Nessa altura ele j est longe da Shindo Renmei, mas no comeo de 1950, depois de mudar-se para Paulicia, na regio de Luclia ltima filial da Renmei que restou ingressou nas fileiras da organizao, declarando: "Desejo que ela termine de modo glorioso a sua obra".

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Em outubro de 1945 foi trazido para o Brasil, atravs da Cruz Vermelha Internacional, o Edito Imperial sobre o fim da guerra. O documento foi distribudo pelas mos de lderes da colnia em muitas localidades, (veja p. 282 e seguintes). Ento a Shindo Renmei colocou-se contra, considerando traidores da ptria aqueles que estavam encarregados da distribuio e os que aceitavam como autntico o Edito e reconheciam a derrota nipnica. E passou a intensificar suas atividades contra os esclarecidos. E verdade que a partir da distribuio do Edito Imperial surgiram em vrias localidades outras entidades vitoristas que se proclamavam organizaes nacionalistas 9 . Desde a sua fundao em julho do mesmo ano (1945), at a poca em apreo, a Shindo Renmei mantinha a seguinte linha de orientao: "Manter firme o orgulho de sdito japons, cultivando o esprito japons", dentro da conjuntura de viver em pas estrangeiro, e mais ainda numa nao como o Brasil, que se tornara inimiga do Japo. Examinando a sua plataforma, verificamos que objetivava "conservar a postura que deve ter um japons e aguardar o dia de voltar ptria". Pode-se afirmar que se tratava de uma organizao moral destinada a defender a preservao dos valores ticos do povo nipnico. Sua organizao seguia a linha dessa plataforma, no se encontrando nela, at ento, nada condenvel. No entanto, como conseqncia da distribuio do Edito Imperial, a derrota do Japo se tornou um fato irreversvel. Portanto cabia aos sditos nipnicos agora, como seu dever patritico, reconhecer a derrota e, "suportando o insuportvel", trabalhar pela reconstruo da ptria. E os lderes esclarecidos apregoavam esse caminho. Foi a que a Shindo Renmei mudou radicalmente sua orientao. Eliminar os "derrotistas" intolerveis (nome dado pelos vitoristas aos esclarecidos, repetimos) 10 se transformou em seu objetivo primordial. O
9 O diretor-tesoureiro da Associao Patritica Japonesa de Alvares Machado, Kazuma Hatanaka, informa: "Em outubro de 1945, Miyakoshi visitou Alvares Machado e declarou em seu discurso que o Japo fora derrotado na guerra. Esse discurso perturbou completamente os japoneses. Por isso, havia necessidade de explicar que o Japo sara vencedor do conflito, para acalmar os nimos. Foi assim criada a Associao Patritica Japonesa" (Doe. DOPS, fl. 6.099). 10 Negoro, que trabalhava no Departamento de Minerao da Tozan como engenheiro de minas, "ao iniciar-se a Grande Guerra, desejando ardentemente retornar ptria, requereu por duas vezes permisso de embarcar no navio do repatriamento, mas no foi atendido. Atribuindo a recusa parcialidade e ao favoritismo do encarregado do servio de repatriamento, guardou profundo rancor no fundo de sua alma. Expressava sua revolta em todas as oportunidades, clamando: 'Sem destruir a antiga elite dirigente da comunidade nipnica, esta sofrer destruio depois da guerra'". E continuou a se atormentar e agitar o esprito das pessoas com quem tinha contato. Por isso no de estranhar que a Shindo Renmei, sob sua orientao, tenha se desviado dos objetivos iniciais, passando aos poucos a concentrar e dirigir suas energias na destruio das tradicionais elites dirigentes da comunidade (Documento da Legao da Sucia, j citado). Como se v, partindo de um dio pessoal, afastou a linha de orientao da Shindo Renmei dos seus objetivos iniciais, desviando-a para a rota da liquidao de antigas lideranas.

330 PERODO EM BRANCO E DISTRBIOS NA COMUNIDADE JAPONESA corpo principal da organizao comeou a se inclinar fortemente nessa direo. No momento do trmino da Guerra do Pacfico, a Shindo Renmei tinha como seu diretor-presidente Junji Kikkawa e antigos diretores da Kdsha: Ryotaro Negoro e Kiyoo Yamanouchi. Como porm o diretorpresidente Kikkawa encontrava-se, desde o ano anterior, na priso, Negoro atuava como dirigente principal. Apesar de ocupar um cargo central, Yamanouchi no gostou de ser relegado a segundo plano por Negoro e outros. Deixou a entidade no ms seguinte, ao fim da conflagrao, para organizar a sociedade patritica, centrada em antigos militares, a Zaigo Gunjin-kai (Associao dos Reservistas). A partir da, sob a batuta e estrutura de comando organizada por Negoro, a Shindo Renmei cresce rapidamente "tal como fogo que se alastra avassaladoramente", conforme a palavra dos prprios dirigentes da entidade. Ela se transformava rpida e radicalmente de uma organizao de carter tico para outra, com finalidade poltica destinada a destruir lideranas "antigas" que reconheciam a derrota nipnica11. Ao lado de Negoro e com maior poder que ele dentro da organizao, e ainda gozando da confiana de Kikkawa, estava Seiichi Tomari. Ele foi um dos fundadores da Sekisei-dan (Grupo de Leais Servidores do Imperador) da regio de Marlia. Foi ele quem convenceu Kikkawa a fundar a Kdsha. Tambm cabe a Tomari a instigao para a execuo de atos radicais como incendiar secretamente culturas agrcolas, reunindo partidrios favorveis exterminao de atividades produtivas que favoreciam o inimigo. Mais ainda, com a mesma idia com que fundou a Kdsha e a Sekisei-dan, ele idealizou a criao da Shindo Renmei. Era a eminncia parda na direo da Shindo Renmei12.
11 Existe o seguinte registro no dirio de Tomari, referente ao dia 12 de maio de 1944, sobre uma conversa com Shingo Shibuya: "Tomari: Parece que o Japo est enfrentando uma luta penosa nesta guerra. Por isso, como as medidas tomadas clandestinamente no deram resultado razovel, penso em adotar a fora para acabar com a produo da menta e bicho-da-seda. Shibuya: O problema das atividades econmicas que favorecem o inimigo pouco relevante, comparado ao do repatriamento" 12 Os escritos que constam do dirio de Tomari como "Da necessidade de Sekisei-dan [Grupo de Servidores Leais ao Imperador]" e "Objetivos da Sekisei-dan", em forma de memorando, no oferecem clareza de redao, apesar de o autor ter experincia de professor da lngua nipnica. Todavia, no fundo, o que ele queria dizer est por inteiro nas frases do "Esprito Kikkawa". Tambm a estruturao da Shindo Renmei nasceu de uma idia (esboo) original de Tomari, aperfeioada por Kikkawa, para a redao final da plataforma da organizao. Tomari demonstrava profundo respeito por Kikkawa ("No h ningum fora Kikkawa, ele a nica pessoa a quem adoro. Kikkawa, mande-me uma graa, da [da priso]" (Do dirio de 1. de fevereiro de 1945). Por sua vez, Kikkawa tinha Tomari em alta considerao. Enquanto Kikkawa esteve preso, acusado de ato de sabotagem, foi substitudo por Seiichi Tomari (inclusive parte do perodo da Kdsha). Mesmo no crcere, Kikkawa enviou, por intermdio da filha Takako, instrues a Tomari, com relao s linhas bsicas da Renmei depois do trmino da guerra, depe ele (Doe. DOPS, fl. 81).

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Mediante a combinao de Negoro, que visava a derrubada de lideranas antigas (de antes da guerra) na comunidade, e Tomri, que no recuava diante de quaisquer atos radicais, a Shindo Renmei acabou praticando at aes de terrorismo. Sobre a real situao da Shindo Renmei, que visava rpida ampliao de sua fora, possvel apreender algo do dirio j citado de Hashiura. E a respeito de qual seria a real personalidade de seus dirigentes, podemos constatar alguns dados sugestivos nos numerosos relatrios ento apresentados sede central da organizao. Um exemplo: "E possvel que acontea a mesma coisa em outras filiais, mas sondando o real estado de esprito de nossos companheiros daqui de Duartina, verificamos o seguinte: Acham que no caso de retornar Grande sia Oriental, bastaria estar filiado a organizaes como a Shindo Renmei para escolher o melhor lugar em qualquer parte daquela ampla regio; ou se consideram de repente importantes s por terem ingressado no quadro social da Shindo Renmei, julgando ser suficiente falar no esprito japons... (corte parcial). No possuem aquele entusiasmo sincero e incoercvel de lutar at a morte pela ptria, pela prosperidade do povo japons e pelos nossos princpios fundamentais" (corte da parte final). A Sede Central, a) Takeo Muto 13 . Nas publicaes oficiais da sede central encontram-se, com freqncia, matrias relativas situao de vrias regies do Sudeste da sia, com base no chamado "Esprito Kikkawa", que prega o retorno sia Oriental. "O Estado de Minajas na ilhas Clebes, Verdadeiro Paraso para Japoneses", "Problema de Imigrantes Agrcolas em Java" (revista Shindo, janeiro de 1946), so amostras de artigos que explicam a situao dessas regies. Como se v, existiu da parte dos diretores da entidade interesse em atrair novos scios mediante uma persistente propaganda, dando a entender que seus membros teriam prioridade no regresso a sia Oriental. Alis isso se percebe tambm no dirio de Hashiura. Os chamados "crentes na vitria", que seriam a prpria expresso de patriotismo, na realidade, em sua maioria, no passavam de scios, como os mencionados h pouco, unidos por interesses imediatos. A sede central da Shindo Renmei, alm de arrecadar dois cruzeiros de mensalidade dos scios, no tinha escrpulo em receber contribuio em dinheiro daqueles que tinham feito fortuna explorando "indstria favorecedora do inimigo", e alguns eram alados a cargos de diretoria. Com isso, a sede central conseguiu melhorar consideravelmente a sua situao financeira
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Documento DOPS.

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e os seus dirigentes, que at ento se empenhavam na "campanha patritica", suportando agruras de pobreza, passaram a perceber polpudos vencimentos 14 . Graas a essa melhoria financeira, a sede da Shindo Renmei, at ento distribuda em dois lugares, as casas de Negoro e Tomari, em janeiro de 1946 transferiu-se para uma grande casa na rua Paracatu, 82 e 96, no bairro de Jabaquara, transformando-se numa complexa central combinada da entidade. E para poder ouvir as transmisses da radioemissora do Japo, foi instalado um aparelho receptor de alta qualidade 15 . At ento, "quando houver necessidade de ir at a sede central, procurem a Casa Nakaya (uma importadora de artigos japoneses muito conhecida desde antes da guerra), na esquina da rua Conselheiro Furtado com a Praa Joo Mendes. Se revelar que deseja contato com a Shindo Renmei algum conduzir voc at ns" 16 , era a instruo dada aos interessados. Essa precauo era tomada para conservar seu carter clandestino. Mas com a instalao da nova sede, aumentou o nmero de pessoas que entravam e saam abertamente. E logo aps a mudana, em janeiro teve incio o processo para legalizar a Shindo Renmei, junto s autoridades brasileiras. Como respaldo a essa movimentao, havia a fora de mais de cem mil pessoas, a maioria da comunidade nipnica do Brasil.

Toyozo Mamiya depe:" A 28 de outubro de 1945, por intermdio de um conhecido e a convite de Ryotaro Negoro tornei-me membro da Shindo Renmei. Atendi ao convite porque disseram tratar-se de uma associao cultural. Logo fui encarregado da secretaria particular (do presidente). Depois compreendi que a verdadeira finalidade da entidade consistia em tirar dinheiro de compatriotas malinformados. Por isso, a 1." de novembro, devolvi a Negoro a importncia em dinheiro no valor de 34.440 cruzeiros, que estava sob a minha responsabilidade e apresentei meu pedido de demisso" (Doe. DOPS, fl. 1.459). Hiroaki Izumi, que foi encarregado do servio de divulgao e tesoureiro, depois da sada de Mamiya, revela: "Ficou determinado, por deciso dos diretores, receber um salrio. Assim: Masanobu Sato 700 cruzeiros, Seiichi Tomari 1.000, Jinsaburo Asakawa 700, Tsuneyoshi Sawada 500, Hiroaki Izumi 500, Kanekichi Siotsu 700, Mitsuo Maruyama 300. Tomari percebia um salrio excepcionalmente alto" (Doe. DOPS, fl. 1.335). 15 De acordo com o livro Rdio Tokyo, de Setsuro Kitayama, do servio internacional da NHK (a radioemissora oficial do Japo), as irradiaes internacionais em idioma nipnico eram permitidas at o dia 10 de setembro de 1945, quando foram rigorosamente proibidas. A 11 de setembro, o governo japons solicitou ao GHQ o "restabelecimento da autorizao das transmisses para alm-mar em lngua japonesa, a fim de acabar com as inquietaes dos japoneses residentes no exterior". "A autorizao foi negada. S em 1952, a transmisso foi reiniciada", informa (p. 327). Assim sendo, no teria sido possvel ouvir as transmisses da emissora de Tokyo, mesmo dispondo de aparelho receptor de alta capacidade. Quer dizer, toda a chamada transmisso da Rdio Tokyo, depois do dia 10 de setembro de 1945, no passava de notcias forjadas. No entanto, nas publicaes da Shindo Renmei apareciam muitas "notcias da Rdio Tokyo", mesmo muito tempo depois. 16 Depoimento de Iwaki Matsui, encarregado da contabilidade da filial de Araatuba (Doe. DOPS, fl. 275).

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Aproveitando o impulso, Tomari instruiu secretamente as filiais no sentido de acelerarem as medidas necessrias eliminao total do grupo esclarecido, que eles, vitoristas, chamavam de derrotistas(*). Na estrutura da organizao das filiais existia a chamada Suishinbu (Seo de Propulso ou Promoo), com a funo de "agir obedecendo s ordens da sede central". Na realidade, era o rgo planejador e executor de atividades terroristas. Tomari era o chefe da Seo de Propulso da sede. Nessa qualidade ordenou s sees de Propulso das filiais do interior que elaborassem listas negras de elementos derrotistas e, ao mesmo tempo, ressuscitou o plano que havia elaborado no tempo da Kdsha para pr fim s atividades produtivas favorecedoras do inimigo, orientando-as no sentido de "exterminar os infames derrotistas". Existe um chamado Manual do Patrulheiro da Kdsha (explicao do prospecto escrito por Tomari)17. Nesse documento consta a instruo dada s filiais dizendo que se deve despertar (os lavradores) e faz-los entender, a comear dos mais prximos, do erro em se dedicar produo favorecedora do inimigo, convencendo-os a mudar de ramo de atividade e, ainda, advertindo-os da necessidade de se evitar o luxo e a ociosidade. E, avanando mais, ''chegada a ocasio propcia, organizar unidades de ao, seguida da eliminao de lderes canalhas e punio de atividades antipatriticas". Orientava no sentido de que deveriam ser sumariamente executados os "infames que no despertassem dos seus erros e no se arrependessem". Em outro documento, igualmente elaborado por Tomari, chamado Juramento do Patrulheiro da Kdsha, "escrito numa sala da sede central de So Paulo em 1. de setembro de 1943"18, ele diz: "Aproxima-se o fim da Grande Guerra Mundial. A obra de construo da Grande sia Oriental, igualmente, prossegue firmemente. Uma parte dos propsitos da Kdsha se concretizou. Neste momento, ns, patrulheiros, devemos agir com maior determinao, sem o que o nosso objetivo final ser procrastinado e mais difcil (de alcanar). Razo por que fazemos o seguinte juramento de sangue:

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Doe. DOPS, manuscrito de Tomari. Doe. DOPS.

(*) A expresso derrotista, aplicada aos elementos esclarecidos, foi criada pelos vitoristas, que na poca representavam a maioria esmagadora da colnia japonesa do Brasil. E acabou passando para a histria, com prejuzo para a campanha esclarecedora, pois a palavra makegumi (grupo derrotista) tinha uma conotao depreciativa, dando a impresso de que os esclarecidos eram favorveis derrota do Japo. Na verdade, todos os japoneses queriam naturalmente a vitria de sua ptria. Mas, uma vez que aconteceu a derrota e o prprio imperador declarou aceitar os termos da Declarao de Potsdam, no havia outra opo seno aceitar a dura realidade e batalhar pela reconstruo nacional, "suportando o insuportvel". Esse era o verdadeiro caminho de japoneses patriotas e leais servidores do imperador no caso, os esclarecidos.

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1. Agiremos de acordo com os propsitos da Kdsha, com base no Esprito do Caminho Imperial. 2. Mesmo que acontea uma crise na Kdsha, os seus membros executaro os objetivos at o ltimo sobrevivente. 3 . 0 ingresso de um novo membro ser feito mediante aprovao da maioria dos companheiros. 4. Na ao, obedecer rigorosamente s ordens superiores. 5. Cada um deve expor sem acanhamento a sua opinio, desde que sem interesse particular. 6. Responsabilidade coletiva, em caso de acidente, molstia ou desgraa de um companheiro. 7. A responsabilidade das despesas cabe ao chefe da Patrulha. 8. Chegada a ocasio, deve renunciar ao cargo na Kdsha, agindo decididamente, na clandestinidade, a fim de propulsionar o movimento destinado a atingir o nosso objetivo". No resta dvida de que "atividades produtivas favorecedoras do inimigo" eram atribudas aos derrotistas. Como veremos adiante, aqueles que participaram dos atentados contra a vida de Nomura e Wakiyama e outros apenas mudaram o nome de "patrulheiros" para membros das "unidades ou pelotes de execuo" (Tokktai). Executaram a sua misso depois de fazer o juramento de sangue, conforme o Juramento mencionado linhas atrs, revelando que os assassnios foram praticados por orientao de Tomari. Os elementos pertencentes Seo de Propulso constituam a vanguarda mais ativa dentre os membros da Shindo Renmei, os quais chegavam a exigir ao efetiva (prtica) da Seo de Propulso da sede central. Nas correspondncias enviadas por filiais sede central, encontravam-se alguns que propunham a ao decisiva da sede19. Amostras: Resoluo da filial de Luclia: " 1 . Queremos que seja mobilizada a Unidade Propulsora da sede central contra os defensores da tese de que o Japo foi derrotado". Assunto de resoluo da filial de Lins. Informao de Kiichiro Yoshii, 24 de janeiro de 1946: "Solicitamos avisar as filiais de todo o Brasil da convocao de diretores das filiais e tambm da convocao das Unidades de Propulso".

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Doe. DOPS.

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Da filial de Mirandpolis, 21 de fevereiro de 1946: "Fuzilamento dos defensores da rendio incondicional e da derrota, condenao priso perptua, exlio numa ilha, esterilizao, linchamento, etc. Acreditamos que tambm ns devemos participar, por todos os meios, do expurgo de sangue de nosso povo". Como resposta a essas exigncias, a sede central da Shindo Renmei, que havia iniciado as providncias para sua legalizao, se viu forada a apagar o incndio que ela prpria havia provocado na mente dos seus associados mais radicais. Para tanto, expediu correspondncia s filiais. Uma das mais representativas a seguinte: "Achamos excelente o texto de sua proclamao, mas existem fatos como os j noticiados e, por outro lado, a ala derrotista no parece ter despertado do seu erro, pelo contrrio, verifica-se uma tendncia de fortalecer o seu movimento cego. Como nipnicos, melhor dizendo como membros da Shindo Renmei, no resta dvida de que uma vez desembainhada a espada, devemos eliminar o mal pela raiz, revelando a verdade e destruindo a falsidade. Todavia importante saber escolher o momento oportuno. A Shindo Renmei se encontra a um passo de seu registro legal. E o advogado est trabalhando com extraordinria boa vontade. Julgamos por isso mais apropriado evitar, a todo custo, por enquanto, qualquer gesto capaz de provocar as autoridades ou eles (esclarecidos). A Filial de Mooca, 8 de maro". Desobedecendo presso da sede central, a 7 de maro acontece a morte de Mizobe por um membro da Shindo Renmei, dando incio srie de atentados terroristas. Em novembro do ano anterior, libertado depois de um ano e trs meses de vida carcerria, Kikkawa20, que havia declinado de aceitar a presidncia, alegando motivo de sade, voltou ao cargo. Mas assustou20 "Depois de longo tempo, recebi a visita do sr. Tomari, no leito de enfermo da priso. Por intermdio dele, soube que se organizou uma poderosa associao, o que me provocou lgrimas de alegria (corte de uma parte). A organizao de uma entidade to forte fruto do trabalho realizado por todos os senhores que deixaram de lado seus interesses pessoais e familiares para a concretizao do nosso objetivo. Nessas circunstncias, acreditei que eu deveria declinar do cargo de diretor-presidente e colaborar com todas as minhas foras, fora da direo da organizao. No seria essa a verdadeira realizao das aspiraes de um homem? Pensava que, cedendo sugesto dos senhores, se aceitasse o cargo de diretor-presidente, no estaria agindo corretamente. Consultei em carter privado o sr. Tomari; queria ouvir a sua opinio a respeito do que eu deveria fazer. Ento ele me declarou: 'O senhor no pode recusar. O senhor o nosso chefe, o idealizador da nossa organizao. Todos ns trabalhamos com toda dedicao (pela causa da Shindo Renmei) graas ao chefe, o senhor. O que fazer, se o senhor que o nosso chefe, fugir da responsabilidade?'. Refletindo bem diante dessa reao, achei razovel, motivo por que retirei o que declarei antes e aceitei a incumbncia (de presidir a entidade)". De "Impresses Vrias", de Junji Kikkawa, em Shindo (revista), nmero 1, dezembro de 1945.

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se com as transformaes ocorridas durante sua ausncia na estrutura da Shindo Renmei, sob o comando de Negoro e Tomari. Tentou coloc-la na posio do tempo de sua fundao. J era tarde. Alm disso, havia o problema de sua convalescena. Sem fora para repor as coisas no lugar, foi sendo empurrado pela tremenda nova fora que dirigia a Shindo Renmei71. Nesse nterim, Negoro, Tomari e seu grupo distriburam fotos de Kikkawa em uniforme militar, em grande nmero, entre os associados, com a finalidade de faz-los acreditar que se tratava de um oficial do servio secreto japons... Transformaram Kikkawa numa autoridade representando a ptria, aproveitando-o nas manobras de controle da organizao 22 . "(1946). A 8 de janeiro, ao chegar sede central, deixando a residncia de Kikkawa, aguardavam-me o sr. Sunohara, bastante animado. Na qualidade de responsvel pelas relaes externas, prope a questo da minha demisso. E critica a minha 'atuao abusiva'. Chegou afinal a hora, pensei. Pois j havia me ocorrido essa idia. O que pressentia, sinto agora que verdade, apontada claramente. Diz-me que no obstante ser eu um rapaz inexperiente, estava com poder superior ao do superintendente. Disse-me: 'Voc deixa de lado o superintendente' e acrescenta outros despropsitos. E possvel que as suas observaes estejam at corretas, mas se eu no agir, como fazer a Renmei andar, pois sem essa ao ela no avana?" Estas observaes constam do dirio de Tomari. Ele exercia um poder superior ao de Negoro dentro da Shindo Renmei e assumia essa atitude. Entretanto, Tomari e seu grupo, que enganaram os scios da entidade, transformando Kikkawa em agente incumbido da execuo de
Consta que, preocupado com a tendncia de radicalizao da Shindo Renmei, Kikkawa chegou a pedir, por intermdio de uma pessoa, uma entrevista, para consulta, ao sr. Chibata Miyakoshi, lder da ala esclarecida (Relatrio sobre a Shindo Renmei, da Legao da Sucia). 22 Kuniichi Kobayashi, ex-membro da filial de Mirandpolis, no seu longo manuscrito de 1950, analisando e criticando os pontos fracos da Shindo Renmei, diz: "A falta de ao e de iniciativa da Shindo Renmei est sendo causada pela supervalorizao de um antigo oficial da Era Meiji que o tenentecoronel Kikkawa, pensando que ele est no Brasil em misso secreta. Por isso acha-se que basta acreditar nele e dele depender, no se hesitando em coloc-lo na alta posio de Amida Nyorai (um santo budista)". E acrescenta:" Em 1946, realizou-se a festa de Ano Bom, com a cerimnia de reverncia distncia ( Famlia Imperial) na casa do chefe do grupo (corte parcial)... Depois do ritual, um dos presentes, dizendo haver trazido uma fotografia do diretor-presidente, tenente-coronel Kikkawa, passou-o de mos em mos para que todos vissem (corte parcial). Antes de olharem para a foto, os presentes faziam reverncias, como se tratasse de um augusto retrato de Sua Majestade. Uma desagradvel sensao passou pela minha mente" (Manuscrito de Kuniichi Kobayashi, 1950). Existem numerosos depoimentos de que os scios prestavam a mxima reverncia fotografia do diretorpresidente Junji Kikkawa.
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ordens secretas de Tokyo, foram, por sua vez, iludidos com muita facilidade por um indivduo que se dizia agente secreto, ou tokumu (agente de misso especial), como costumavam chamar na poca. No dirio do dia 20 de maro de 1946, Tomari escreve: "Conferenciei com o sr. Tanita e o agente secreto". Esse agente secreto, esperado h muito pelos vitoristas, se dizia chamar tenente Enatsu, ou capito Nang. Tratava-se na verdade do malandro Sanzo Kawasaki, que havia praticado falcatruas em vrias localidades 23 , aproveitando a crena na "vitria". O resultado dessa conferncia foi aproveitado em forma de narrativa contada por Nang e distribuda cpia mimeografada pela sede central com o ttulo de Yume Monogatari (Histria Fantstica)24, de autoria de Yumeno-sei (pseudnimo), com data de 20 de maro de 2.606(*)(1946), ou seja, o mesmo dia da conversa com Tomari. "Minha alma chegou a Tokyo novamente hoje. Um canto de bairro daquela capital. Ali se encontrava o homem que devia falar comigo, o sr. Nang", o Yume Monogatari comea assim. O seu contedo revela a habilidade do trapaceiro, que, por meio de artimanhas, sugeria haver o Japo ganhado a guerra. Os dirigentes da sede central da Shindo Renmei ficavam como que hipnotizados, acreditavam que o falso capito Nang era de fato um agente secreto que veio ao Brasil, cumprindo ordens secretas do exrcito japons. Que os dirigentes da Shindo Renmei foram iludidos durante muito tempo por Kawasaki, est evidente no escrito de um membro da mesma organizao. "Que ele (capito do servio secreto Nang) seja verdadeiro ou falso no sei. Os vitoristas chamam-no Maru-Maru san(**), evitando o seu nome por extenso com o ttulo. Ele foi chamado tambm de Shirobukuro (Saco Branco). Foi ele, Maru-Maru san, o responsvel pela negligncia e inao do diretor-presidente e seu grupo, induzindo-os e mantendo-os nessa

(*) Segundo a mitologia da fundao do Japo, o primeiro imperador, Jinmu, teria ascendido ao trono no ano 660 a.C. At 1945, o calendrio oficial japons adotava essa data, tanto assim que em 1940 foram celebradas as comemoraes do aniversrio dos 2.600 anos da fundao do Imprio. (**) Maru, redondo, esfera, bolinha. Tcnica usada pela imprensa japonesa no regime autoritrio: empregavam-se bolinhas (maru-maru), em lugar de nomes ou fatos que no podiam ser publicados.
23 Posteriormente, Sanzo Kawasaki associou-se a Takuji Kato e fantasiou-o de "Prncipe Asaka", enganando muitos vitoristas que prestavam respeito ao falso prncipe. Temos a o chamado "Caso do Falso Prncipe". 24 Aquilo (Histria Fantstica) foi escrito depois de se ouvir a conversa de Kawasaki. Foi a sede central da Shindo Renmei que mandou imprimir, testemunhou o ex-terrorista (que atacou Isamu Miura em Marlia), Shusui Nakamura, Toshiro Takagi, autor de Kyshin (Fanatismo), (Kyshin, p. 408).

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situao. Se fosse escrever tudo, poderia facilmente formar um livro" (Kuniichi Kobayashi)23. Como conseqncia do assassnio de Nomura, o diretor-presidente Kikkawa e outros diretores, bem como outros membros da Shindo Renmei da capital e do interior, foram detidos em grande nmero, sendo a maioria enviada para a priso da ilha Anchieta. Mesmo depois, Kawasaki freqentou a sede central da organizao, continuando a enganar os dirigentes remanescentes, como se torna claro pelo registro abaixo. "Correspondncia recebida de Kawabata e Asakawa que defendem a sede da Shindo Renmei na ausncia de seus titulares,... A respeito deles est tudo s escuras, no se podendo prever nada no momento. Recentemente mantive vrios contatos com o chamado agente secreto de nome Nang ou Kawasaki e dele ouvi sobre informaes sigilosas. Segundo sua conversa, o atual escndalo (refere-se a priso em massa de vitoristas) poder provocar a interveno do Japo. Acrescenta que viu notcias da vitria completa do Japo, etc. Como no me preocupo com o ttulo de agente secreto, no vou registrar com pormenores a sua conversa. Por qu? Durante minha deteno em Lins, h anos, foram divulgadas informaes atribudas ao servio secreto sobre a vinda ao Brasil do prncipe Asaka, chegada de navios de guerra nipnicos no Rio, desembarque de fuzileiros navais japoneses, etc, que produziram falsa alegria nos patrcios. Toda vez, verifiquei que no passava de cheque sem fundo. Por isso no acredito no tal de agente secreto (Hekisui Yoshii)"26.

25 Manuscrito de Kuniichi Kobayashi (14 "Servio Secreto Japons no Brasil"). No se esclareceu se de fato chamavam Maru-Maru-san ao suposto agente secreto, ou por que chamavam-no de Shirobukuro. 26 Hekisui (Kiichiro) Yoshii: Gokuchu Kaiko-roku (Memrias da Priso). Ele chama a priso em massa de vitoristas e seu confinamento na ilha Anchieta de "escndalo". Explica por que: "O nosso confinamento atual na Ilha Anchieta o resultado do extremo temor das autoridades brasileiras diante da disputa entre japoneses. At encontrar uma soluo poltica (isto , at uma soluo poltica mediante negociaes entre o Japo vitorioso e o governo brasileiro), precisava deter um dos dois grupos (vitoristas e derrotistas), sem o que no seria possvel manter a ordem pblica. Desse ponto de vista, aprisionar derrotistas seria igual a tacitamente comunicar de pblico que o Japo sara vitorioso na guerra. Por isso, no estaramos ns na situao de mrtires (pois o 'escndalo' no aponta claramente o nosso delito)?" (p. 212). Ele prprio escreve que foi detido e confinado apenas porque era membro da Shindo Renmei, sem ter cometido crime algum. Todavia, nos autos do DOPS (fl. 808) est registrado que Yoshii, quando diretor da filial de Lins, escreveu carta a Genko Noda, viva do antigo cnsul em Bauru, sra. Tarama, e outros, num total de oito pessoas, "advertindo-as do risco que corriam por falarem publicamente na derrota do Japo", acrescentando que, no caso de no se arrependerem, enviaria "pelotes suicidas" ou "pelotes de execuo". A ameaa de morte motivou a sua deteno

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Havia aqueles como Yoshii, que duvidavam. Mas, como, a comear de altos dirigentes da Shindo Renmei, muitas pessoas pertencentes ao grupo vitorista acreditavam e eram enganadas com tanta facilidade por indivduos que no passavam de vigaristas, s porque eles se diziam elementos do servio secreto? Kuniichi Kobayashi, citado antes, escreve: "No entanto, no vou pensar que a ligao entre os japoneses do Brasil e o governo de Tokyo seja feita apenas por intermdio de embaixador e cnsules. Quem poder negar a existncia de elementos do servio secreto entre os 300 mil compatriotas residentes no Brasil? Ressalte-se que aqui um pas inimigo. Mesmo durante a guerra, as perseguies oficiais e do povo brasileiro (contra japoneses) chegavam imediatamente ao conhecimento do governo nipnico. E toda vez Tokyo mandava vigoroso protesto e palavras de estmulo para ns como: 'tenham pacincia, compatriotas do Brasil. apenas por mais um pouco de tempo. Sobrevivam, cuidando da sade"' 27 . Acreditavam pois na iluso de que existiam, ocultos subterraneamente, os chamados elementos do servio secreto nipnico. Hayashi descreve o estado psicolgico dos patrcios que esperavam o aparecimento de tais figuras. O fato de at dirigentes vitoristas acreditarem nessa balela significa que j haviam perdido a capacidade de discernimento baseada na razo. Membros da Shindo Renmei e de outras organizaes lideradas por tais pessoas perderam a capacidade de raciocnio. E, alegando motivos patriticos, chegaram a praticar ou apoiar atos terroristas. Por sua f absoluta na vitria nipnica, foram vtimas tambm de vigaristas de outra espcie, que vendiam iene falso, terras nos pases dos Mares do Sul, "asseguravam" viagem de volta ao Japo, etc. Isso aconteceu at mesmo muitos anos depois do fim da guerra. No foi sem razo que se tornaram presas fceis de espertalhes, por to longo tempo.

No h nenhum elemento comprobatrio de que diversas vezes o governo nipnico tivesse protestado (junto ao governo brasileiro) e que tivesse mandado palavras de encorajamento (aos japoneses residentes no Brasil). Parece-nos tratar-se de mais uma das notcias falsas propaladas durante e depois da guerra pelos vitoristas.

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ORGANOGRAMA DA SEDE CENTRAL DA SHINDO RENMEI


Diretor-Presidente Diretor-Superintendente Dir. Secretaria Geral (a) Dir. Departamento Educao (b) Dir. Departamento Relaes Externas (c) Diretor Departamento de Comunicao (d) Assuntos Gerais Propulso Tesouraria Espiritua1 Lngua japonesa Artes Marciais para Adiil tos

(a) Secretaria Geral

(b)
Educao

(c)

Relaes Externas

[ Estreitamento de rela6es entre o Japo e o Brasil


Imprensa Correspondncia Lazer e Recreao

(4
Comunicao

ORGANOGRAMA DE FILIAL
Espiritual

Educao Japons

Artes Marciais .DIRETOR E VICE-DIRETOR Ed. Adultos

procurar difundir o esprito de reverncia aos deuses cuidado na seleo do professor, orientao e fiscalizao orientar grupos esportivos esprito de grupos de vizinhos

Secretrio

Servio Geral Secretaria

(De um manuscrito do diretor-presidente Kikkawa)

Propulso Correspondncia Recreao e Lazer - Fiscaliza~o

pesquisa, servios de secretaria e tesouraria ordens na sede central

Fonte: Documento do etor de Interesses Japonesesda Legao da Sucia.

g) A Shindo Renmei e os homicdios terroristas


"Considera-se o ato de matar um semelhante condenvel e censurBvel, uma ao brbara. No entanto, conforme as circunstncias, um ato que precisa ser praticado, com deciso e coragem. No se trata de

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racionalizar ou teorizar. E um estado emocional inexplicvel pela razo. O meio adotado pode ser ilegal, mas acho que o sentimento que comanda a ao merece compreenso. H uma expresso: 'O senhor ofendido, morte do sdito'. Em relao aos elementos nocivos nao, traidores da ptria, natural que sejam tomadas medidas drsticas. Deve-se aconselhar tais elementos a refletir (sobre suas atitudes), e se mesmo assim no derem ouvidos, continuando a sua atividade antinacional, natural que, como povo, se recorra ao concreta, por excesso de indignao Ns reconhecemos essa ao. Elogiamos tal ao como expresso de verdadeiro patriotismo, movida por legtimo amor ptria. Ao refletir profundamente sobre as causas da disputa existente na comunidade nipnica do Brasil, evidencia-se quem tem razo e quem no tem. Por mais que os elementos da Tokktai sejam jovens radicais exaltados, de sangue quente, no assassinaro pessoas que no tenham apresentado motivo para isso. indispensvel levar em considerao que existia um motivo profundo exigindo a execuo" (corte da parte final)1. Trata-se de um manuscrito datado de 1953, transcorridos sete anos dos atentados terroristas, quando a comunidade nipnica comeava a mostrar sinais de acomodao e calma. Verifica-se, nesse documento, que entre os duros da ala vitorista os atos terroristas se haviam tornado objeto de tentativa de racionalizao, justificativa e at de embelezamento, como virtudes patriticas. Sobre a causa dos atos terroristas, a maioria dos vitoristas considera que os jovens animados de fervoroso patriotismo passaram ao homicida levados pela indignao e revolta diante de "atividades de derrotistas que no pensam em sua terra natal como ptria". Mas, atrs dos terroristas encontravam-se Tomari e outros elementos radicais da Shindo Renmei, instigando-os e orientando-os. Por ocasio dos trgicos acontecimentos, tanto os delinqentes como a diretoria da Shindo Renmei diziam que os crimes no tinham nada que ver com a organizao. E a maioria dos scios da entidade acreditava nessa verso. Todavia, que a srie de atos terroristas fora cometida por determinados membros da Shindo Renmei est claramente demonstrado nos depoimentos e testemunhos dos prprios criminosos e de elementos a eles ligados.

Apresentao: "Esperamos muito dos moos", pelo redator-chefe Seikichi Kuwabara. Revista Seinen (Os Moos), nmero 1, publicado a 1. de maio de 1953.

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Como exemplos, temos os autos do DOPS relativos aos casos do assalto a Furuya, assassinato de Nomura e de Wakiyama. Reunindo e sintetizando as declaraes dos interessados, temos o seguinte resumo. A fim de levar avante o plano j mencionado no Manual do Patrulheiro da Kdsha, elaborado por Seiichi Tomari, que dizia entre outras coisas: "Chegada a ocasio propcia, organizar unidades de ao, seguido da eliminao de lderes canalhas e punio de atividades antipatriticas" (ver p. 333), levou membros da sede central, como Kamegoro Ogasawara, Kotaro Komaba, Seijiro Mihara, Tsurutaro Ushizawa (alis Tenjo Sawai) a se demitirem da Renmei. Eles receberam ordem de organizar grupos de execuo com nomes sugestivos de Jissitai (Grupo de Execuo), Suishintai (Grupo de Propulso), Shuishinbu Kesshitai (Grupo Suicida do Departamento de Propulso), Tokktai (Grupo Especial de Ataque) ou ainda Kokusuikai (Grupo Nacionalista), Ketsumeidan (Grupo de Unio pelo Sangue), Tenchugumi (Grupo de Castigo Celeste). Tais nomes foram copiados de unidades especiais do exrcito japons e de associaes da extrema direita do Japo da dcada de 30, ou do tempo da guerra, quando os sentimentos ultranacionalistas chegavam exacerbao incontrolvel. Masami Tsuji, diretor da filial de Pompia, Massao Sato, diretor regional e ex-membro da Renmei, Sunao Shinyashiki e outros, ao receberem a ordem, foram aliciar secretamente elementos para compor os grupos de assassinos de Tup, Pompia, Quintana, a partir aproximadamente de novembro de 1945 at fevereiro de 1946. Como resultado do trabalho de aliciamento, ingressaram no grupo homicida Tatsuo Watanabe, Tokuichi Hidaka, Mitsuru Ikeda, Kazunori Yoshida e Taro Mushino. Nos dias 5 e 6 de maro os membros do grupo de matadores se dividiram em dois subgrupos. Um destes se escondeu na chcara de Tsurutaro Ushizawa, mais conhecido como Tenjo Sawai, na Alameda Paz, no bairro de Indianpolis, enquanto o outro se ocultava na rua Vergueiro, 724, Tinturaria Oriente, pertencente a Kamegoro Ogasawara. Os demais dois ou trs elementos se dispersaram em tinturarias conhecidas de Ogasawara. Receberam treinamento para matar, sob a orientao de Ogasawara. Sawai, por sua vez, orientou os delinqentes abrigados em sua chcara. Ajudaram-no nessa tarefa Komaba e Mihara. No dia 30 de maro, todos se reuniram novamente na chcara de Sawai, onde receberam ordem urgente de: "Matem Chibata Miyakoshi". Com a determinao de "apagar o cara", 11 elementos se dirigiram residncia de Miyakoshi na rua Pamplona. Todavia, esta se encontrava sob forte vigilncia policial, impossibilitando o ataque. Shinyashiki desistiu de atacar Miyakoshi. Ordenou aos seus comandados que retornassem chcara de Sawai. Voltaram um a um, separadamente.

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Na noite de 31 houve nova reunio, organizando-se dois grupos 2 sob as ordens de Shinyashiki. O primeiro grupo foi chamado de Kesshitai (Grupo Suicida), chefiado por Tatsuo Watanabe. O segundo grupo, denominado Tokktai (Grupo Especial de Ataque), ficou sob o comando de Masaki Taniguchi. O primeiro foi formado por Tatsuo Watanabe, Shinpei Kitamura, Tokuichi Hidaka, Mitsuru Ikeda e Kazunori Yoshida. O Grupo Especial de Ataque tinha como componentes Masakichi Taniguchi, Masao Honke, Fumio Ueda, Hiromi Yamashita e Taro Mushio. O primeiro atacaria Furuya e o segundo visaria Chuzaburo Nomura. O primeiro grupo deixou a chcara de Sawai s 3 horas da madrugada do dia 1. de abril; o segundo saiu uma hora depois, na direo da casa de Nomura, que morava perto da chcara de Sawai. O primeiro grupo fracassou no atentado contra Furuya, e Ikeda e o chefe Watanabe foram detidos no local por policiais. Pouco antes do incio do ataque, os membros do grupo haviam recebido de Watanabe uma capa de cor caqui e 500 cruzeiros como dinheiro necessrio para a fuga. Taniguchi, o comandante do grupo que matou Nomura, e seus comandados, Honke e Yoshida, foram presos no dia 3 de abril, na Tinturaria Arakaki, de Santo Amaro, onde haviam se homiziado. Os demais elementos do grupo se esconderam em chcaras de membros da Shindo Renmei ou simpatizantes de Osasco, Suzano e So Caetano. A 2 de junho, ou seja, dois meses depois, Kitamura, Hidaka, Yoshida e Yamaguchi, que por convocao de Ogasawara deixaram seus esconderijos, receberam ordem de assassinar Wakiyama. Levaram o "conselho para suicidar-se", o punhal para haraquiri e uma bandeira japonesa. Sob o comando de Kitamura, pelas 19,30 horas do mesmo dia, o grupo se dirigiu casa de Wakiyama, onde pediram um encontro. E entregaram o "conselho para matar-se", escrito por Mihara, e o punhal. Depois de dar uma lida no "conselho", Wakiyama declarou: "Eu no sou traidor, por isso no vou me matar. Prefiro morrer gloriosamente como patriota". Ante a recusa, Kitamura e a seguir Hidaka dispararam seus revlveres. Wakiyama teve morte instantnea. Os quatro terroristas se entregaram polcia. Relatamos como foram perpetrados os crimes contra, principalmente, os lderes esclarecidos que ocupavam posio de relevo na comunidade japonesa e que subscreveram o Edito Imperial sobre o fim da guerra, justamente preocupados com a proliferao das manifestaes vitoristas. Os terroristas que participaram dos crimes apresentaram, cada
2 Taniguchi, Ueda e Ikeda declararam que, na mesma noite, Shinyashiki no compareceu reunio e por isso foi chamado de traidor. Mas a funo de Shinyashiki consistia em aliciar novos scios. Parece ter sido essa a razo de sua ausncia no ataque.

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qual sua maneira, depoimentos minuciosos no inqurito policial. A. seguir citamos partes resumidssimas de tais depoimentos. Tatsuo Watanabe (Autos DOPS, fls. 1.783,1.345). Conta que foi convidado por Sunao Shinyashiki para ingressar no grupo de homicdio em fevereiro de 1946. Consultou o diretor da filial de Pompia, Masami Tsuji, que apoiou a idia e o estimulou a entrar no grupo. Disse-lhe ento que precisava de verba. "Ele me entregou sem recibo nem comprovante de qualquer espcie, a quantia de 5 mil cruzeiros, da tesouraria da filial, como um fundo necessrio ao grupo. Ao que parece, Tsuji parecia haver j recebido instrues da sede central a respeito do assunto." A ordem de Tsuji mandava matar primeiro Kenkiti Simomoto, diretor-gerente da Cooperativa Agrcola de Cotia, um dos mais ativos e influentes lderes dos esclarecidos; em segundo lugar vinha Chibata Miyakoshi, ex-diplomata japons, e em terceiro o antigo ministro plenipotencirio do Japo em Buenos Aires, Shigetsuna Furuya. Watanabe procurou a residncia de Simomoto, que diziam ficar ou em Pinheiros ou Caxingui. Como no conseguiu descobrir o endereo certo, desistiu de matar Simomoto e mudou o alvo para Miyakoshi, cuja residncia achou na lista telefnica. Mas este se encontrava sob forte proteo policial, motivo por que mudou de novo o alvo. Desta feita, Shigetsuna Furuya. Kazunori Yoshida (Autos DOPS, fl. 1.802) "Fui convidado a tomar parte do grupo de moos organizado por Shinyashiki por ordem superior. Shinyashiki sabia que eu era membro da Shindo Renmei, qual aderi em novembro de 1945. Aceitei o convite, mas ele me exigiu que jamais revelasse que eu era scio. Kamegoro Ogasawara foi o idealizador do grupo de matadores e tambm seu financiador. Ele tinha capacidade de comando. Os scios acatavam suas ordens com muito respeito." Hiromi Yamashita (Autos DOPS, fl. 1.800) "Ogasawara era um dos organizadores do grupo e seu financiador. Recebi treinamento sob suas ordens. A sua maior preocupao consistia em ocultar o fato de que todos os membros do grupo pertenciam filial da Renmei. Ele me ordenou severamente que o que amos fazer constitua uma misso sagrada do grupo de assassnios. E no caso de cairmos nas malhas da polcia deveramos declarar que agimos movidos por fervoroso patriotismo de moos, e que deveramos negar a todo custo a nossa filiao Shindo Renmei. Mas na realidade sou associado Shindo Renmei desde novembro do ano passado (1945). Entretanto, por pertencer ao

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Grupo de Moos estava isento de qualquer contribuio, inclusive da mensalidade. A ltima ordem de Ogasawara era de nunca revelar que sou membro da Renmei. Deve manter o segredo at a morte, se necessrio, disse-me." Tokuichi Hidaka (Autos DOPS fl. 1.806) "Recebi treinamento dirio na casa de Ogasawara, fui instrudo como agir no caso de ser preso pela polcia. Foi-me ordenado que jamais, em qualquer circunstncia, deveria por mais sacrifcio que me custasse admitir minha condio de scio da Renmei. Eu pertencia Seo de Moos da filial de Tup. Como era arriscado pagar a contribuio social (revelando a condio de scio), no pagava. Na realidade, porm, sou membro ativo da Seo de Moos." Todos os criminosos do terror confessaram sua filiao Shindo Renmei, mas tinham recebido ordens terminantes para negar essa condio. So os seguintes os depoimentos dos elementos ligados organizao e treinamento de grupos de execuo de atos terroristas: Kamegoro Ogasawara (Autos DOPS fl. 1.817) "12 de maro de 1946. Tsurutaro Ushizawa (Tenjo Sawai) apareceu com trs moos, pedindo-me que os aceitasse como aprendizes de tinturaria. Aceitei. Uma semana depois, Ushizawa procurou-me de novo, dizendo ter algo importante a conversar. Revelou-me ento que os trs jovens que ele trouxera anteriormente formavam o grupo para assassinar os traidores da ptria que assinaram o falso Edito Imperial da derrota. Eram eles Shinpei Kitamura, Hiromi Yamashita, Masakichi Taniguchi. Eu os acolhi na minha casa e ao mesmo tempo ensinei-lhes o servio de tinturaria". (corte do meio). "Visitei vrias vezes Wakiyama que era meu amigo, investiguei seus hbitos, a estrutura da casa, a inexistncia de vigilncia policial, etc. Passado um ms, julguei chegado o momento azado, chamei Shinpei Kitamura, nomeei-o comandante do grupo, instruindo-o como matar Wakiyama. Disse-lhe: dirija-se residncia dele, entregue-lhe o 'conselho para se suicidar' e instigue-o a praticar o haraquiri. Em caso de recusa, mate-o. A seguir, apresente-se polcia e declare ter assassinado Wakiyama porque ele trara a ptria sagrada. E sustente at o fim que no recebeu ordem de quem quer que fosse, nem se apoiou em plano de terceiros, que agiu movido por puro sentimento de amor ptria. Essa orientao destinava-se a permitir que eu, em liberdade, pudesse prosseguir nas aes de vingana contra os traidores e lavar a glria da ptria deshonra-

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da, enquanto a polcia seria distrada com a apresentao dos criminosos 3 . Mas acabei sendo preso e por isso no consegui levar avante o meu plano" (corte parcial do meio). "A funo de Shinyashiki era atrair moos para formar o grupo de matadores. Tenjo Sawai, tal como eu, protegia os moos e simultaneamente os orientava e treinava (na misso de matar). Todos os ataques partiram da chcara de Sawai. Eu sou o organizador da Tokktai (Grupo de Ataque Especial) e de Kesshitai (Grupo Suicida) e tambm dirigente e financiador desses grupos." Seijiro Mihara (Autos DOPS fl. 1.812) "Fui chamado por Kotaro Komaba. Dirigi-me Tinturaria Oriente onde fui apresentado ao dono Kamegoro Ogasawara, como 'intelectual e jornalista'. Ogasawara parecia satisfeito. Ele declarou que a nica punio para os traidores da ptria que assinaram no Edito Imperial sobre a derrota era a morte. Em fins de maio fui urgentemente chamado casa de Ogasawara, recebi ordens dele (que falou de modo autoritrio e coercitivo) para redigir o 'conselho para suicidar-se'. Pedi tempo para pensar. Ogasawara redargiu que o comandante no pede e sim ordena, insistindo para que eu redigisse o 'conselho'. Temendo pela minha vida, tive que escrever a nota. Dias depois, fui novamente chamado por Ogasawara e tive que redigir nova nota, sem saber quem era o destinatrio.
A lista de condenados morte continha os 23 nomes seguintes. Se no tivessem sido detidos, Ogasawara e sua turma teriam perpetrado os homicdios terroristas, obedecendo ao plano estabelecido. Lista de nomes de pessoas a serem mortas. 1." lista: 1) Suetaka Hayao, encarregado de interesses japoneses da Legao da Sucia. 2) Chibata Miyakoshi, diretor da filial brasileira da Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha (Companhia de Fomento Industrial do Alm-Mar S.A.), conhecida pelo nome abreviado de Kaik. 3) Antigo ministro japons na Argentina, Shigetsuna Furuya. 4) Kiyoshi Yamamoto, gerente-geral da Fazenda Tozan. 5) Kenkiti Simomoto, diretor-gerente da Cooperativa Agrcola de Cotia. 6) Jinsaku Wakiyama, antigo diretorpresidente da Cooperativa Central Agrcola. 7) Sen-ichi Hachiya, presidente da Cmara de Comrcio Japonesa. 8) Kunito Miyasaka, representante da Sociedade Colonizadora do Brasil Bratac. 2." lista: 1) Chuzaburo Nomura, antigo secretrio-geral da Bunkyo Fukyukai (Sociedade de Difuso do Ensino dos Japoneses do Brasil). 2) Eng. Takeo Kawai, chefe da Seo de Engenharia da Cooperativa Agrcola de Cotia. 3) Eiji Kikuchi, chefe da Seo de Kend da Federao Brasileira de Jud e Kend. 4) Seigui Fujihara, diretor da Federao de Atletismo da Colnia. 5) Kiyotaka Emi, antigo chefe da Seo de Economia do Nippak Shinbun. 6) Terumi Tanigaki, chefe da Seo de Pessoal da Cooperativa Agrcola de Cotia. 7) Kameiti Yamashita, diretor do Departamento de Orientao da CAC. 8) Takeshi Hasegawa, chefe de Assuntos Internos da Kaik. 9) Yasushi Sakamoto, chefe da Seo de Imigrao da Kaik. 10) Masao Kinoshita, advogado. 11) Takeo Goto, subgerente da Fazenda Tozan. 12) Fumio Ishikawa, chefe da Seo de Orientao da Cooperativa Central Agrcola. 13) Paulo Yoshikazu Morita, do setor de Interesses Japoneses do Consulado da Sucia. 14) Akira Otani, antigo funcionrio do Banco Espcie de Yokohama, filial do Rio de Janeiro. 15) Kanji Shirato, do comrcio internacional. 4 Antigo jornalista do Burajiru Jih (Notcias do Brasil), Mihara morou depois da guerra na casa de Komaba. Divulgou notcias de rdio s por ele ouvidas. "Ouve-se, se ouvir com f", dizia ele, falando sempre da vitria nipnica. Mihara ficou famoso pelo seu rdio, logo chamado de "Rdio Mihara" (Kyshin, p. 96).
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H cerca de dez dias, recebi nova ordem de redigir a carta de ameaa, mas desta vez criei coragem e me neguei a escrever a mensagem. Por saber do resultado das notas de ameaa anteriores. Tive oportunidade de ver Ogasawara dar instrues aos moos do grupo assassino. Nessa ocasio tive a impresso de que Ogasawara era membro executor da Renmei e que obedecia s ordens da organizao." Kotaro Komaba (Autos DOPS fl. 1.822) "Ogasawara e Mihara falavam muito sobre o Japo. Mihara um intelectual que respeito. Fui eu quem apresentou Ogasawara a Mihara. Mihara culto, intelectual, de modo que julguei seria uma personalidade til a Ogasawara. Sei que Ogasawara orientador de grupos criminosos e que tem ainda a funo de cuidar da parte financeira dos mesmos. Sei quantos assassinos de Nomura se reuniram na casa de Ogasawara para receber suas instrues sobre como agir na execuo do plano e que receberam certa quantia em dinheiro de Ogasawara para seu sustento no esconderijo, depois da fuga. E sei que os grupos de matadores foram instigados e encorajados pela Renmei. Esta alega nada ter a ver com os moos terroristas, procurando fugir sua responsabilidade, mas todos so membros da entidade. Eles prprios declaram no pertencerem Renmei, porque receberam ordens severas de Ogasawara nesse sentido. Presenciei Ogasawara dizer aos moos que preferia v-los mortos pela polcia do que os mesmos confessando sua filiao Shindo Renmei. O prprio Ogasawara havia pedido demisso da entidade, para desviar a ateno da polcia. Os criminosos so todos da Renmei, mas ao invs de procurarem a organizao (no pressuposto de que no pertenciam a ela), apoiavam-se em Ogasawara que estava livre de qualquer preocupao, dele recebendo as instrues para os ataques. Ogasawara era membro oculto da Renmei, recebendo verbas para a organizao de grupos assassinos. Finalmente declaro que eu fui associado da Shindo Renmei de setembro a novembro de 1945, mas ao verificar que se tratava de uma organizao ilegal e clandestina, retirei-me do seu quadro social." Pelos depoimentos mencionados torna-se evidente que os grupos de ao terrorista, sob o comando direto de Ogasawara, seguiram fielmente as clusulas do Juramento de Patrulheiros, inspirado por Tomari, e passaram ao. Diretores da Shindo Renmei prestaram as seguintes declaraes a respeito de Seiichi Tomari, o idealizador e planejador da ao terrorista. Ryotaro Negoro (Autos DOPS, fl. 1.298). "Na realidade Seiichi Tomari era o orientador terico da Shindo

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Renmei, foi ele quem estabeleceu as diretrizes bsicas de atuao da entidade. Normalmente os planos passavam execuo aps sua aprovao por Kikkawa. Por vezes, porm, executava-se um plano por deciso exclusiva de Tomari, sem passar pela aprovao do diretorpresidente. Isso era possvel entre os membros da Renmei, por causa do prestgio e influncia de Tomari. Quanto a este plano de terrorismo reconheo que foi escrito por Tomari (Doe. DOPS n. 33), mas dele eu s tomei conhecimento agora. Neste plano esto includos atos de sabotagem e terrorismo, mas eu jamais aprovei previamente tais planos. O prprio diretor-presidente os ignorava. Reconheo que os atos de homicdio terrorista foram praticados com o planejamento e a instigao de Tomari. Por fim, declaro que fui contrrio aos atos de sabotagem e violncia fsica, porm, aprovei integralmente os demais planos de Tomari." Masanobu Sato (Autos DOPS fl. 1.316) "Seiichi Tomari ocupava o cargo de diretor do Departamento de Propaganda da Renmei e ao mesmo tempo era assessor do diretorpresidente Kikkawa. E verdade que ele traou planos e programas de execuo da entidade. Depois da aprovao pela diretoria, os planos estabelecidos por Tomari eram remetidos s filiais para a sua execuo. Entretanto, alguns de seus planos foram remetidos s filiais sem o meu conhecimento e de outros diretores. E foram levados execuo. Este plano (Doe. n. 33) que me foi apresentado agora, elaborado por Tomari, um deles. Tomari era velho amigo de meu pai Masao Sato, que ocupava o cargo de diretor regional da Renmei. Acredito que ele recebia orientao direta de Tomari. Eu era encarregado de imprimir as instrues destinadas s filiais. E havia casos em que, sendo urgentes, o prprio Tomari mimeografava." Junji Kikkawa (Autos DOPS fl. 1.296) "O chamado Departamento de Propulso foi criado para ajudar patrcios em situao difcil. Reconheo entretanto que sob seu teto havia os Grupos de Moos. Ignorava que entre tais grupos existiam aqueles denominados Grupos de Castigo Divino, Matadores, Fora Violenta ou Voluntrios da Propulso. A verdade que os mais velhos no conseguiram controlar esses grupos. Reconheo essa possibilidade. Reconheo que o Manual do Patrulheiro foi escrito por Tomari, mas s agora tomei conhecimento dele. Embora tenha examinado todos os documentos relacionados com a Renmei escritos por Tomari, no sabia at agora que ele fala em 'eliminar os lderes canalhas, depois da organizao de grupos de ao' (ver p. 333). Reconheo que os patrulheiros pertenciair

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Renmei, todavia a execuo destes planos de Tomari teve lugar depois da minha deteno. O plano de execuo aqui citado foi elaborado desobedecendo minha determinao e abrange atos que violam as leis brasileiras. Contudo, elogio o fervoroso sentimento patritico de Tomari que transparece no documento." Pelos exemplos expostos, a comear pelo diretor-presidente Junji Kikkawa, todos os diretores da organizao declaram que no sabiam da existncia de planos de assassnios. Mas, Yoshii, que era diretor de filial do interior, depe o seguinte sobre o incriminado Departamento de Propulso. Kiichiro Yoshii (Autos DOPS, fl. 808) "Nada sei a respeito do assassnio de Mizobe, mas segundo rumores correntes, teria sido morto por um jovem pertencente ao Grupo de Moos Nacionalistas ou Grupo de Unio pelo Sangue. Ele foi morto porque fazia parte do grupo derrotista e falava publicamente na derrota do Japo. Na carta que enviei a Genko Noda, adverti-o de que na Shindo Renmei existia um Departamento de Propulso, cuja misso consistia em no admitir que se falasse da derrota do Japo. Nessa carta usei o nome Teishin Suishintai (Grupo de Voluntrios da Propulso), em vez de Kesshitai (Grupo Suicida). Esse nome quer dizer sacrificar-se pela realizao de um ideal. Pode ser chamado ainda de Kesshitai (Grupo Suicida) ou Jiketsutai (Grupo de Auto-Imolao). O comandante da Kesshitai, que funcionava com o nome de Suishintai Seiichi Tomari, da sede central da Shindo Renmei. Ele o comandante geral de todos os departamentos de Propulso das filiais do interior. No caso de elementos do grupo derrotista se negarem a aceitar a advertncia do Grupo Suicida do Departamento de Propulso, caber diretoria da sede central tomar a deciso final. Quanto minha priso e de dirigentes da Shindo Renmei de Lins, haver a vingana de associados e familiares que somam 500 pessoas. Devero tomar a deciso de vingar-se, paralisando a produo agrcola da regio de Lins." Por sua vez, Seiichi Tomari, tido como o comandante geral das atividades terroristas, fez a respeito o seguinte depoimento. Seiichi Tomari (Autos DOPS, fl. 740) "Ouvi dizer que existiam organizaes chamadas Grupo Nacionalista, Grupo de Unio pelo Sangue, Grupo de Castigo Celeste. Os que se achavam na posio de chefia do primeiro grupo eram Komaba de tal, Moriyama de tal e do ltimo grupo no sei quem eram. O segundo grupo,

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P E R O D O E M B R A N C O E DISTRBIOS N A C O M U N I D A D E J A P O N E S A

Unio pelo Sangue, tinha como diretor Matsuzaki de tal5, segundo acredito. Esclareo que os elementos componentes desses grupos eram indivduos no recomendveis pelo seu carter ou do ponto de vista moral, e haviam deixado ou foram expulsos da Renmei. Obedecendo ao planejado, reuni e orientei japoneses e me esforcei no sentido da fuso da Kdsha com a Shindo Renmei, porm, ignoro qual seja o objetivo desses grupos decididos a morrer. Embora os crimes contra a vida de Ikuta Mizobe (de Bastos) e Chuzaburo Nomura (de So Paulo) tenham sido perpetrados por tais elementos, os mortos no tinham nenhuma influncia na vida poltica dos japoneses, de modo que o seu desaparecimento em nada beneficiou a colnia. Por isso lamento o ocorrido. No resta dvida de que tanto no caso de Bastos como no de So Paulo foram (os atos) organizados por elementos jovens dos grupos Unio pelo Sangue ou Grupo Nacionalista. O Departamento de Propulso ou Grupo de Propulso que faz parte da Shindo Renmei, tem por finalidade atender a consultas de filiais existentes no interior do Estado ou a 64 filiais de todo o Brasil. Procurase assim colocar as filiais no mesmo nvel da sede central. Outros objetivos so socorrer associados pobres, reparao de estradas da colnia ou combater incndios. Mas o Grupo de Propulso est no papel, no tendo concretizado nenhum dos objetivos citados. No sei se existem listas negras com vistas a homicdios, reconheo porm a existncia de lista negra dos derrotistas. Qual o destino desses elementos que figuram na lista negra? Respondo indagao: h duas solues possveis. Primeiro, reconhecimento da legalidade da Renmei pelas autoridades. Nesse caso, a Renmei proteger aqueles elementos. Caso contrrio, as autoridades devero proteg-los. Se a Shindo Renmei no assumir a liderana da colnia, esta enfrentar grave situao. Porque ainda no decorrer deste ano (1946), dever visitar o Brasil uma delegao japonesa trazendo a notcia da vitria. Est combinado que nessa oportunidade, sero enviados dois representantes de cada localidade (a So Paulo) a fim de recepcionar a misso. Parece-me que ser impossvel as autoridades brasileiras controlarem a exaltao de nimo desses representantes diante da comunicao da vitria nipnica. E mais ainda, no caso de ser negada a existncia legal da Renmei pelas autoridades brasileiras, todos os japoneses suspendero suas atividades e retornaro ao Japo. Aproveito esta oportunidade para solicitar que com o poder da polcia libertem os dirigentes da Shindo Renmei e prendam os maus japoneses que promovem agitao na comunidade.
5 Matsuzaki de tal Tomekichi Matsuzaki. Junto com Tomari fundou a Sekisei-dan (Grupo de Leais Servidores do Imperador). Empenhou-se na campanha de eliminar "indstrias favorecedoras do inimigo".

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Sou interrogado se possvel prender os assassinos de Mizobe ou Nomura, respondo que se tratam de casos j pertencentes ao passado, por isso no gostaria de me envolver. Todavia, se fizerem o favor de libertarme, asseguro que doravante no permitirei qualquer ao delituosa desse gnero. Perguntam-me se tenho algo a dizer a respeito do depoimento de Kiichiro Yoshii, diretor da filial de Lins da Shindo Renmei, que acabo de ouvir. Penso que ele um tolo. Deste ponto de vista, assim que sair daqui vou process-lo, para castig-lo. A razo est em que indivduos como Kiichiro andam matando gente, usando o nome da Shindo Renmei. Aproveitando esta oportunidade solicito (s autoridades) que condenem Kiichiro Yoshii pena de fuzilamento, pois ele se transformou em cancro da colnia japonesa. Garanto que a minha opinio sobre Yoshii compartilhada tanto por Junji Kikkawa como por Ryotaro Negoro. Tomei conhecimento do assassnio de Nomura atravs de jornais. Penso que o delito foi cometido por ordem de Masao Sato e Masami Tsuji. Mas desconheo os pormenores deste caso triste." Apesar de citar os nomes de seus subordinados, na qualidade de comandante direto, Tomari alega ignorar seus atos. E no entanto garante que, se for libertado, no permitir mais nenhum crime terrorista. Isso quer dizer que ele reconhece a sua condio de comandante geral dos grupos terroristas. Por outro lado, a maioria dos membros da Renmei detidos como se verifica nos autos de Yoshii e Tomari , com apoio na suposta vitria do Japo, assunte atitudes ameaadoras ou arrogantes diante das autoridades policiais. Esse comportamento ofendeu profundamente a polcia, resultando em vigilncia mais rigorosa sobre os membros da Renmei, como ainda influiu no tratamento dispensado aos detidos. E impossvel saber se todos os delinqentes do terror eram membros da Shindo Renmei. Muitos deles ocultavam a sua condio de filiados organizao, retirando-se do seu quadro social, conforme evidenciam depoimentos de criminosos j citados. Havia, na verdade, um profundo vnculo direto ou indireto entre os terroristas e a Shindo Renmei. Como foram os jovens participantes dos homicdios atrados e instigados para essas empreitadas? Quais eram os verdadeiros sentimentos dos delinqentes terroristas que deveriam "arder de sentimento de amor ptria"? Os elementos tokktai, Jiro Sakurai e Eikichi Tsuchiya que no dia 18 de julho de 1946 assassinaram Toji Horiuchi, diretor-presidente da Cooperativa Agrcola do Segundo Ncleo Uetsuka de Guaimb, na

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regio de Lins, ficaram detidos na cadeia da cidade. Kiichiro Yoshii, diretor da filial de Lins da Shindo Renmei, partilhou o crcere com os dois terroristas e registrou pormenorizadamente o que observou acerca deles 6 . "No momento em que jovens de sentimento puro aguardavam, com o sangue fervendo, a oportunidade de pr em prtica (seu ato de patriotismo), surgiu um encapuzado de nome Matsuzaki de tal, que se dizia sobrinho do marechal Hata(*)7. Trata-se pois da melhor oportunidade possvel para que os jovens agora estimulados tambm por um chamado 'elemento de ligao de Matsuzaki' de nome Akutsu de tal punam os traidores da ptria com o castigo divino. Matsuzaki disse: "Eu mantenho ligao permanente com a ptria e recebo instrues. Estava quieto no meu canto do interior (sem nenhuma atividade oficial), porm, agora vejo intensificar-se a presso dos traidores contra os que acreditam na vitria japonesa. Criou-se uma situao diante da qual no se pode mais permanecer indiferente. Vocs podero recorrer a qualquer meio ilegal, pois, com toda certeza, em fevereiro do prximo ano sero libertados da priso pela fora da ptria. Na verdade, este cometimento corajoso representa a concretizao de uma importante misso de carter nacional. Trata-se de uma gloriosa ao patritica. Por isso mesmo, com a cautela necessria preservao do sigilo, apareo e desapareo, duas ou trs vezes, sem alarde, silenciosamente. Diante disso, os moos dominados por sentimentos mais puros de patriotas decididos a agir, acreditaram piamente tratar-se realmente de algum que falava em nome da ptria. Outrossim, o tal Akutsu tambm faz a sua apario como capito do servio secreto. Endossando as palavras de Matsuzaki de tal, aconselha os moos a agirem imediatamente. A essa altura j grande o clamor pela destruio dos derrotistas. Algumas pessoas mais idosas manifestam alguma suspeita em relao s personalidades referidas. O que irrita alguns jovens, que invocam a necessidade de comear pela eliminao de 'elementos medrosos'. Foi nessa situao que se efetivou a ao (de matar os derrotistas). Todavia, por denncia de algum, s se conseguiu eliminar alguns dos
Hekisui Yoshii, Memrias da Priso, p. 275. De novo, Matsuzaki de tal o j mencionado Tomekichi Matsuzaki. Dizia que era sobrinho do marechal Hata e que tinha o ttulo de visconde. Alm disso afirmava possuir um manuscrito de Sua Majestade a Imperatriz. Fazia patrcios ingnuos reverenciar o manuscrito, cobrando uma "tarifa"... Posteriormente avanou no dinheiro da Shindo Renmei e acabou sendo expulso da organizao (Kyshin, p. 244 e 248).
7 6

(*) Marechal Shunroku Hata, influente chefe militar que ocupou o cargo de ministro do Exrcito no efmero gabinete Nobuyuki Abe (setembro de 1939 a janeiro de 1940) e no gabinete Mitsumasa Yonai (janeiro a julho de 1940). Foi comandante geral das foras expedicionrias nipnicas na China (1944-45).

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visados, caindo todo grupo nas malhas da polcia. Penso que o fracasso a meio caminho causou grande decepo aos moos (corte parcial). Entre os moos que ainda se encontram detidos, existem aqueles que acreditando piamente em Matsuzaki e Akutsu, desprezam nossos conselhos. admirvel o extraordinrio poder de acreditar em alguma coisa... Enquanto estava na ilha (priso da ilha Anchieta), ao ouvir a histria da grandiosa ao dos moos que imbudos de fervor patritico sacrificavam suas vidas, sentia por eles um profundo respeito e simpatia. No entanto, ao perceber o seu sentimento atual, lamento profundamente que, apesar de terem praticado homicdios, se acham tomados por um desejo de vangloria ou, ainda, procuram mostrar um herosmo exibicionista. um absurdo. Trata-se de atitudes que envergonham os muitos moos de sentimento puro que se ergueram movidos por fervoroso patriotismo. Somente aqueles capazes de sacrifcio pessoal, praticando o haraquiri no local (do atentado), apoiados na coragem e noo de ptria, merecem nosso respeito como possuidores do esprito tokk (ataque suicida)." Este manuscrito revela que, de novo, manipulados por indivduos que se diziam membros do servio secreto japons mas que no passavam, na verdade, de espertalhes salafrrios, havia delinqentes terroristas que praticavam crimes, julgando-se heris como os shishi(*) (patriotas) do fim do Xogunato Tokugawa. No mesmo manuscrito, Yoshii diz ainda: "Por mais que derrotistas atuem abusivamente, homicdios ilegais no so recomendveis. Seja como for, o pas deter todos com rigor para assegurar a defesa da ordem pblica. Agir contra essa realidade representa cair na armadilha dos derrotistas. Eliminar fisicamente os virtualmente inumerveis derrotistas hoje existentes uma loucura. de lamentar que mesmo tokktai levados a agir com nimo irreprimvel sejam presos sem conseguir realizar o seu intento. E o caso se agravar de modo incontrolvel, se houver algum manipulando (os tokktai) nos bastidores. E se

(*) Shishi, homens idealistas, geralmente jovens, que no conturbado perodo que antecedeu a queda do Xogunato Tokugawa (1867) praticavam atentados contra a vida de lderes polticos ou responsveis pela administrao pblica que eles consideravam inimigos de suas causas, como a restaurao plena do poder poltico da monarquia, a favor ou contra a reabertura dos portos do pas, etc. Homens decididos, enfrentavam qualquer dificuldade, como priso e perseguies, certos da justeza da causa que defendiam. No raro, depois do atentado, se imolavam, praticando o seppuku (haraquiri).

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tais acontecimentos se sucederem continuamente, os escndalos(*) se complicaro cada vez mais, com toda certeza" 8 . As autoridades policiais encararam com seriedade o manuscrito de Tomari sobre o Departamento de Propulso, em particular o trecho em que diz: "chegado o momento oportuno, eliminar os lderes canalhas, depois da organizao de grupo de ao". E ficaram apreensivas diante da sucesso de uma srie de assassnios ocorrida conforme as instrues de Tomari. Considerando a Shindo Renmei uma organizao terrorista, resolveram proceder priso em massa de diretores, scios e de todos aqueles que acompanhavam a orientao da organizao, a fim de impedir o prosseguimento de atos delituosos. A situao desenrolou-se como previa Yoshii. h) Diviso e colapso da Shindo Renmei A 2 de abril de 1946, ou seja, no dia seguinte ao do assassnio de Nomura, o Departamento de Ordem Poltica e Social, DOPS, de So Paulo, realizou uma busca na sede central da Shindo Renmei, situada na rua Paracatu e promoveu a priso simultnea de todos os dirigentes da central e das filiais. A imprensa noticiou em manchetes garrafais que entre 400 e 500 elementos foram detidos. Nos dias seguintes os jornais divulgaram os pormenores dos trgicos acontecimentos que enlutaram, entristeceram e revoltaram parte esclarecida da colnia japonesa e causaram perplexidade sociedade brasileira. E procuraram esclarecer, em amplas reportagens, o que era a Shindo Renmei, sua organizao e suas atividades. Mas, qual foi a reao dos elementos ligados Shindo Renmei em relao priso em massa de seus membros? A propsito, Hashiura escreveu o seguinte no seu dirio. "14 de abril (corte parcial do comeo). Algum espalhou o boato de que a misso japonesa desembarcaria nestes dias. Consta que na cidade de Paraso foram presos alguns nipnicos que brindavam a prxima chegada da misso. O pessoal da Renmei diz que para tratar deste assunto (a priso em massa de seus dirigentes) fora antecipada a vinda da misso ou de que a polcia no sabia o que fazer com dirigentes presos, arrogantes e muito otimistas (confiantes de que seriam libertados breve). No aprovo essas
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Hekisui Yoshii, Memrias da Priso, p. 116.

(*) Escndalo, era assim chamado o confinamento dos detidos na ilha Anchieta pertencentes ao grupo vitorista. Um termo usado entre os vitoristas.

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atitudes. possvel que no passe de boato a verso de que para essa priso em massa, derrotistas contriburam com uma quantia de 500 mil ris para subornar, mas acho natural que tenham solicitado proteo polcia. E parece verdade que os principais dirigentes da Shindo Renmei beberam brindando a sua prxima expulso do territrio brasileiro." Os membros da Renmei detidos, e enviados do interior para a polcia de So Paulo, ficavam contentes ao encontrar companheiros na mesma priso e mostravam-se muito animados, conforme se pode verificar em diversos manuscritos feitos na cadeia. A possibilidade de a priso acabar em expulso do territrio brasileiro significava para eles regressar ao Japo antes de outros compatriotas. A expulso era mesmo desejvel, pois seriam recebidos com honras de patriotas. A expulso correspondia a uma aspirao deles e valia um brinde de saudao. Muitos dos presos assumiam atitude de desprezo em relao ao interrogatrio das autoridades policiais, certamente por estarem tomados desse sentimento de arrogncia, baseado na certeza de que seriam recebidos com palmas e flores no Japo. Mas o resultado desse comportamento foi o endurecimento da atitude das autoridades 1 . 0 assassnio de Wakiyama, ocorrido depois da morte de Nomura, e o prosseguimento de ataques e homicdios de elementos esclarecidos do interior aumentaram o nmero de prises, principalmente de membros da Shindo e outros elementos do grupo vitorista. Em meio a esses acontecimentos, o DOPS enquadrou como resultado dos interrogatrios os 387 indivduos detidos no cdigo penal e ainda solicitou ao presidente da Repblica, para parte deles, sua expulso do territrio nacional como elementos que infringiram os dispositivos do decreto-lei 383/384, de 16 de abril de 1938, que probe aos estrangeiros quaisquer atividades
1 Nos escritos de membros da Shindo Renmei aparece com freqncia o chamado "Caso de pisar na imagem do imperador", como o mtodo mais cruel adotado pelo DOPS nos interrogatrios para descobrir se o detido era vitorista ou esclarecido. Alegam que esse mtodo havia sido adotado por sugesto dos derrotistas. Mas, a respeito da questo, o rgo do grupo esclarecido, Shh (O Semanrio), nmero 1, de 20 de maio de 1946, informa o seguinte: "Entre os temas de discusso da atual conjuntura, existe o problema insuportvel, para ns japoneses, que seria a exigncia, por parte de autoridades encarregadas de investigao, de praticar pelo acusado um ato de profundo desrespeito, ao qual tocamos com temerosa reverncia, em relao ao augusto retrato de Sua Majestade. Foi imediatamente apresentado um protesto s autoridades competentes, tendo havido uma explicao do delegado encarregado. Ouamos, porm, o outro lado. Um policial, revoltado com a atitude dos vitoristas presos reclamou: "Esses japoneses nos tratam como se fssemos imbecis. Dizem: 'uma esquadra nipnica chegou ao porto do Rio. O seu comandante vai tomar conta do Brasil'. Voc pode se calar diante dessa arrogncia? Devemos refletir o que sente algum que ouve um japons dizer 'Ns assumimos a soberania deste pas'. No deveriam (os vitoristas) pensar na sua responsabilidade ao provocar sentimento de revolta dos brasileiros, ao. ponto de exigirem atos de lesa-majestade (ao imperador) aos presos?"

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polticas no pas. Portanto, no mereciam a hospitalidade que lhes fora proporcionada pelo Brasil. Foi solicitada a expulso de dirigentes da sede central da Shindo Renmei e os acusados de crimes terroristas, num total de 80 indivduos. Como vimos, a expulso era desejada por eles. Enquanto aguardavam o decreto presidencial de expulso, os presos, na Casa de Deteno de So Paulo, foram enviados ao presdio da ilha Anchieta, no litoral norte do Estado 2 . A seguir, nos meses de outubro e novembro foram encaminhadas a segunda e terceira levas, somando um total de 160 a 1703. Entrementes, a sede central da Shindo Renmei, desarticulada com a priso de seus dirigentes, no conseguia nem se reorganizar. No tinha condies de orientar as filiais. Nessa conjuntura, elementos radicais remanescentes intensificam suas atividades terroristas, visando acabar de uma vez com os elementos esclarecidos at o dia 15 de agosto 4 , primeiro aniversrio do fim da guerra. Alm disso, acontecem revoltas populares como a de Osvaldo Cruz (ver p. 291), quando a cidade foi palco de violentas manifestaes antijaponeses, chegando a apresentar aspecto de uma verdadeira guerra urbana. O chamado movimento de carter espiritual, apregoado no comeo da Shindo Renmei, perde a sua fora cada vez mais. O dirio de Hashiura descreve da seguinte maneira o estado de esprito dos membros da Renmei, desorientados. "20 de junho. ... Aumenta aos poucos entre membros da Shindo Renmei, o nmero daqueles que dizem querer passar os dias sem fazer nada na cidade, depois de vender a terra de sua propriedade, suspendendo o trabalho de cultivar a terra da prxima safra, at a chegada da misso japonesa. Consta que eles declaram em alto e bom som: 'Eu sou um japons que acredita sinceramente na vitria do Japo. Aqueles que planejam o plantio da prxima safra no passam de vitoristas falsos'. E um criminoso de morte de Marlia teria dito: 'Matei por ordem de Sua Majestade o Imperador'. Os membros da Shindo Renmei exultam, achando essa res-

2 O decreto presidencial sobre a expulso do territrio nacional foi publicado no dia 11 de agosto, porm ningum sofreu a aplicao efetiva da medida. 3 No se tem certeza quanto ao nmero de presos na ilha Anchieta, por causa do movimento de entrada e sada. E a 13 de agosto de 1958, os 387 acusados, inclusive aqueles ainda na ilha Anchieta, tiveram declarada extinta a sua punibilidade, pelo juiz Dagoberto S.C. Camargo, por haver transcorrido o prazo de oito anos para a prescrio (Doe. DOPS, fls. 6.029-60). 4 Tokktai' promete eliminar mais japoneses 'traidores' at o dia 15 do corrente" "A histria do grupo terrorista de Cafelndia, autor dos ltimos atentados verificados na Noroeste" "Shishiro Ono, o chefe do bando e sua implacabilidade" "Matarei meu prprio pai, se necessrio" (Dirio da Noite, 13 de agosto de 1946).

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posta correta e espirituosa. No percebem que com tais manifestaes esto ofendendo e ferindo as virtudes imperiais. So a tal ponto levianos que talvez at meream misericrdia"... Na mesma poca jornais brasileiros estampavam em manchete: "Impelad manda; gente mata n?", reproduzindo declarao de um delinqente terrorista 5 . Conforme se pde observar na tentativa do interventor federal Macedo Soares em convencer os vitoristas da verdade, os que acreditavam na vitria nipnica haviam perdido o juzo, agiam de modo absolutamente irracional. J informamos como o comportamento dos vitoristas influiu na Assemblia Nacional Constituinte (pg. 306 e seguintes). Na mesma poca, a prpria Shindo Renmei se dividia em dois grupos e caminhava para o seu colapso, como se pode verificar num parecer apresentado por um scio sede central provisria 6 . "... Desde que foram perpetrados os atentados terroristas, todos os dirigentes da sede central e das filiais acabaram presos, ficando a Renmei sem seu tronco e seus ramos, desorganizando-se completamente. Os scios ficaram estupefatos, sem saber o que fazer ou como agir. Na minha opinio, os dirigentes do interior que escaparam da priso, deveriam ter convocado imediatamente uma reunio de emergncia dos representantes, para reorganizar a sede central. Assim, esta ficaria preparada para a segunda etapa da entidade, enfrentando a situao ento criada. E deveriam ento dar a orientao apropriada s filiais do interior, estabelecendo uma ligao ntima entre elas e a sede central, tomando medidas destinadas a evitar hesitaes e inquietaes dos associados (corte parcial). Na verdade, a sede central provisria s se organizou depois de trs meses. No entanto, depois dessa reorganizao, a entidade dividiu-se em duas alas, disputando o poder e hostilizando-se mutuamente. uma verdade indiscutvel que esse fato constituiu um grave entrave soluo do caso (da priso dos membros da Shindo Renmei). Ns no precisamos de uma sede central de duas cabeas e nem podemos reconhec-la.

Dirio da Noite, 22 de julho de 1946. Ando de tal, membro da Renmei de Marlia, escreveu: "Examinando algumas situaes de at o presente, exponho a minha opinio" (Doe. Museu da Imigrao, PB 15). Ando parte da suposio de que a Shindo Remnei no planejou nem ajudou os atos terroristas, criticando, a partir dessa premissa, as medidas tomadas pela sede central provisria. Mas acrescenta: "Entretanto, se na realidade a Renmei planejou, orientou e isso representou a vontade do diretorpresidente Kikkawa e que os srs. membros da sede central participaram desses acontecimentos, nada tenho a dizer..." Parece mesmo que na poca havia membros da Renmei que, como Ando, acreditavam que a entidade visava um movimento espiritual, nada tendo que ver com as atividades terroristas.
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Que atitude estar tomando Kawahara, o presidente da Assemblia? Penso que no ter competncia para impedir disputas internas representa no corresponder confiana do diretor-presidente Kikkawa. A pregao da ao direta por parte do grupo Imai constitui uma violao do esprito de Renmei, devendo merecer o qualificativo de rebeldes. Na sede central prosseguem as disputas internas, o que a impede de se dedicar causa da soluo do caso (da priso em massa), e de tomar medidas de ligao espiritual com as filiais. Os ocasionais relatrios sobre o caso falam exclusivamente do seu encaminhamento favorvel ( Renmei). Mas na realidade, a situao se agravou at chegar beira do abismo. Desde que comearam as prises, a transmisso das ordens da cpula para as bases e das comunicaes destas para aquela, peca pela sua ineficincia. No serei o nico a considerar que falhou a concretizao da vontade geral da Renmei. Quem persegue duas lebres, no consegue apanhar nem uma. As duas alas viram seus planos fracassarem at hoje. No ser inadequado reconhecer que ambas malograram. No podemos reconhecer uma sede central com duas cabeas. Agora se tornou claro o fracasso dos planos das duas alas, espero que acabem com as disputas e antagonismos do passado, retornando ao esprito original da sede central da Shindo Renmei e, mediante uma ntima e firme cooperao, marchem para a soluo do caso. Eu desejo e proponho, se no existir a possibilidade de cooperao entre as duas alas, se convoque uma assemblia de representantes do interior, a fim de reorganizar a entidade. Seja como for, chegamos fase em que o caso ser julgado pela justia, com a expulso dos acusados do territrio brasileiro, ou ento teremos a proteo da mo do governo nipnico. Espero que a sede central j tenha preparado os planos e preparativos para essa eventualidade. Desejo que a sede central provisria no repita os fiascos do passado. Supe-se que a misso japonesa chegar dentro em breve. Neste momento, a sede central provisria dever se unir, evitando assim exibir uma atitude vergonhosa frente misso. E desejo que todos os documentos necessrios sobre o esprito da Renmei, seu passado, pesquisas e outros sejam urgentemente preparados e do modo o mais completo possvel. E espero que os senhores da sede central no percam a sua dignidade, apresentando-se de mos vazias diante da misso" (corte da parte final) (Escrito no dia 15 de agosto, aniversrio do trmino da guerra). No dispomos de meios de saber em pormenor o que acontecia na chamada'sede central provisria da Shindo Renmei. Sabemos que ela

A COMUNIDADE ENFRENTA UM CAOS SEM PRECEDENTES 359

estava dividida em duas alas antagnicas: a radical, que preconizava a ao direta, e a outra, moderada. Alm disso, as duas alas estavam dominadas por Sanzo Kawasaki, que se dizia capito do servio secreto e chamar-se Nang. Ele dizia que o enviado especial do Japo no demoraria a chegar ao Brasil. E agiria com toda liberdade na sede central provisria, perturbando-a ao seu bel-prazer. Por outro lado, entre os quase 170 presos na ilha Anchieta, incluindose entre eles dirigentes da Shindo Renmei, havia um grupo favorvel a que se organizasse um movimento a favor da apresentao de um pedido de libertao dirigido s autoridades brasileiras; e outro que sustentava ser melhor no suscitar a questo, at que as autoridades espontaneamente soltassem os presos. Os dois grupos se hostilizavam reciprocamente. O resultado foi o seguinte: "O sr. diretor-presidente Kikkawa, profundamente preocupado com este antagonismo existente entre ns prisioneiros e tambm diante da ciso interna dos companheiros da linha-dura fora da priso, proclamou resolutamente a dissoluo da Shindo Renmei. Na sua proclamao, o diretor-presidente afirmou que o chamado movimento em prol da libertao do grupo Nakauchi que se diz legal, no passa de uma tentativa de quem sobe numa rvore para pescar. Assim sendo, deve suspender imediatamente (o movimento). insuportvel sobrecarregar os que esto fora da priso com movimentos deste gnero. Devemos manter nossa atitude serena at a chegada do momento oportuno. No devemos nos atrapalhar, neste momento, inutilmente. Embora a Shindo Renmei seja nominalmente dissolvida, a nossa unio espiritual continuar... a) Hekisui Yoshii"7. "Em fevereiro de 1947, os diretores da sede central Jinsaburo Asakawa e Saburo Kawabata, enganaram o diretor-presidente que se achava preso, fazendo-o assinar a proclamao da dissoluo do nome Shindo Renmei. No sabemos que apoio os dois senhores tinham atrs deles. Foi ento que surgiram duas alas: uma que se negou terminantemente a acatar a deciso e outra que, acreditando possuir o diretor-presidente algum plano grandioso, declarou que devemos aceitar sua deciso. Eu tomei partido da primeira ala. A Shindo Renmei cindiu-se em dois grupos. Um chamado Movimento Nacionalista, foi dirigido pelo sr. Kawabata..." (Kuniichi Kobayashi) 8 .

7 8

Memrias da Priso, de Hekisui Yoshii, p. 138. Manuscrito de Kuniichi Kobayashi, p. 147.

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A Shindo Renmei transformou-se numa entidade muito distante e diferente dos ideais e objetivos da poca de sua fundao. Seus dirigentes e membros, acusados de crime de homicdio coletivo, encontravam-se encarcerados. Diante da disputa entre antigos companheiros divididos em grupos hostis, parece que Kikkawa sentiu algo insuportvel. "Proclamo aqui a dissoluo do nome Shindo Renmei", disse, alegando: "No momento encontram-se na priso o diretor-presidente e a maioria dos diretores, sendo nestas circunstncias muito difcil tratar adequadamente os nossos assuntos e h ainda o risco de provocar uma desunio entre nossos companheiros". A seguir declara que, "quanto divulgao e o culto do esprito japons, alcanamos em grande parte os nossos objetivos. A existncia de uma organizao com o nome Shindo Renmei pode no s provocar mal-entendidos da parte do povo brasileiro", como "aprofundar o sentimento de antagonismo com os derrotistas". Apresentou quatro razes para a dissoluo da entidade, e no final do "Adendo" declarou: "No responderei a perguntas sobre esta proclamao", mostrando a firmeza da sua deciso9. Destarte, com pouco mais de um ano e seis meses da sua fundao, em julho de 1945, a Shindo Renmei, que abalou profundamente no s os compatriotas como a sociedade brasileira em geral e teve seu nome conhecido dentro e fora do pas, praticamente deixou de existir10. Na realidade, com sua dissoluo em fevereiro de 1947, as atividades terroristas terminaram, com o assassnio de Shoji Suzuki, em So Paulo, ocorrido um ms antes.

9 A "Proclamao" est datada de 11 de fevereiro do ano 22 da Era Showa (1947), e tem a assinatura conjunta de Junji Kikkawa, diretor-presidente, e Ryotaro Negoro, diretor-superintendente. 10 "O diretor-presidente Kikkawa foi posto em liberdade em fins de 1947, mas tambm nada fez, produzindo resultados piores do que quando esteve preso (corte parcial). A sede central de So Paulo entrou praticamente em colapso, o sistema de comando completamente anestesiado. Das propaladas mais de sessenta filiais espalhadas pelos trs Estados de So Paulo, Mato Grosso e Paran, em fins de 1947, sobravam apenas seis, no interior da Noroeste (corte parcial). No Estado de So Paulo, entre as filiais que no desapareceram, figurava a de Luclia, da linha Paulista. No se sabe se por acaso ou por comando de algum sbio, essa filial dedicou-se com afinco educao livresca e de artes marciais aos jovens durante cerca de quatro anos, dos fins de 1946 at meados de 1950, completamente isolada da sede central." Kuniichi Kobayashi descreve deste modo a sua marcha posterior ( sua dissoluo formal) da Shindo Renmei (Manuscrito de Kuniichi Kobayashi). Por outro lado, Satoshi (Kosetsu) Uemura escreveu: "A sede central da Shindo Renmei ficava na rua Maria das Dores Braga, nmero 4, Cidade de So Paulo. Essa sede central funcionou de 14 de abril de 1948 at maio de 1949, quando todos os elementos ligados Renmei foram libertados da Casa de Deteno e da ilha Anchieta. Ento o prprio diretor-presidente decidiu a sua dissoluo" (Nakadate, O Japo Venceu os Aliados, p. 604). Por a se torna claro que um grupo denominado Shindo Renmei continuou a existir, mesmo depois da "dissoluo do nome" em 1947. Todavia, lcito afirmar que na prtica ela entrou em colapso com a proclamao de dissoluo feita por Kikkawa.

DA CONFUSO ESTABILIDADE 361 3. DA CONFUSO ESTABILIDADE

a) O fim dos vitoristas No s a Shindo Renmei como tambm outras organizaes que preconizavam como lema o "patriotismo" seguiram o caminho do colapso, mais ou menos na mesma poca. As leis restritivas do tempo de guerra em relao aos nacionais dos pases do Eixo continuaram em vigor no imediato ps-guerra. Por exemplo, estavam vedadas as atividades associativas por parte dos sditos desses pases. Os prceres esclarecidos da colnia nipnica haviam, em ateno orientao das autoridades brasileiras, optado pela absteno quanto a promover um ativo movimento esclarecedor sobre o reconhecimento da derrota do Japo 1 . Mas, diante da ocorrncia de atentados terroristas, solicitaram medidas destinadas a controlar tais atos 2 e, ao mesmo tempo, organizaram grupos de autodefesa para impedir as aes terroristas. E alguns lderes de destaque da colnia desde antes da guerra, diante da falta de veculos de informao na comunidade, editaram por conta prpria (quase sempre com srios sacrifcios pessoais e financeiros, numa poca de profunda crise econmica) boletins e panfletos com informaes relativas ao fim da guerra e situao do Japo no ps-guerra. As publicaes eram distribudas na Capital e no interior, num esforo espontneo para levar a verdade aos que ainda teimavam em acreditar na vitria japonesa 3 .

Efetivamente, no dia 4 de agosto de 1946, reuniram-se pessoas interessadas e instalaram uma entidade denominada Comisso Tranqilizadora da Colnia Japonesa, composta de brasileiros e nipnicos, objetivando intensificar o movimento esclarecedor. Foi requerida autorizao para seu funcionamento s autoridades policiais, mas foi negada (Doe. da Legao da Sucia). 2 Com data de 10 de maio de 1946 foi requerido ao Presidente da Repblica "apelo no sentido de que sejam tomadas providncias destinadas a expurgar os indivduos responsveis pelos sinistros acontecimentos". Solicitaes do mesmo teor foram apresentadas ao interventor federal, ministro da Justia e Negcios Interiores e ao ministro da Guerra (Doe. da Legao da Sucia). 3 Alm das publicaes como Jh (Informaes), patrocinado por Chibata Miyakoshi (publicada de abril a setembro de 1946, totalizando 16 edies), e Shh (O Semanrio), da Cooperativa Agrcola de Cotia (publicada de maio a dezembro de 1946), havia ainda publicaes como Shsen-go no Okinawa Jij (Situao de Okinawa no Ps-Guerra), edio particular de Sukenari Onaga (antigo diretor-proprietrio do jornal Nipport Shinbun), ocupando-se esta principalmente de notcias de Okinawa dirigidas aos naturais dessa provncia (nmero 1, datado de 6 de junho de 1946 e o ltimo, de junho de 1948). Informativos como esse, editados por particulares, destinados a "explicar a conjuntura", ultrapassavam uma dezena. Todo esse esforo de divulgao partia de um genuno sentimento patritico de homens lcidos e esclarecidos, preocupados com o obscurantismo de patrcios levados por idias antigas e "lderes" sem escrpulos. Tais publicaes, feitas custa de grandes sacrifcios pessoais de seus editores, encerraram suas atividades, cedendo espao aos jornais de lngua japonesa que comeavam a ser ento reeditados (Doe. Legao da Sucia).

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Um deles era o Shh (O Semanrio), da Cooperativa Agrcola de Cotia. No seu primeiro nmero escrevia o seguinte sob o ttulo "Nossa Opinio": "Poderia haver algum, em alguma parte do mundo, que desejasse acreditar na derrota da ptria? E no entanto, o revs da nossa terra uma realidade implacvel. No querer acreditar nessa realidade representa um sentimento do nosso povo. Contudo, apesar disso, ns temos que reconhecer esta realidade. E que os trezentos mil compatriotas residentes no Brasil, no se desviem do seu caminho da vida e, correspondendo ao admirvel nimo dos nossos irmos do Japo, partam de novo para colaborar, em todos os aspectos, na obra de reconstruo e desenvolvimento da me-ptria encetada pelo povo de Yamato, eis o verdadeiro patriotismo e no que realmente acreditamos" (corte da parte final). Ainda no ms de maio do mesmo ano, lderes esclarecidos solicitaram, atravs da Legao da Sucia, ao consulado americano, licena para troca de correspondncia com o Japo. Visavam com isso facilitar a troca de cartas entre parentes e amigos, com o que se faria chegar (aos vitoristas) a realidade da derrota. Entre 52 japoneses que obtiveram permisso, dez pertenciam Shindo Renmei e estavam detidos. Tinha a finalidade, naturalmente, de fazer chegar a eles, atravs das cartas, a realidade reinante no Japo. E no poucos esclarecidos empenham-se na tarefa de divulgar a realidade da derrota, distribuindo, de novo atravs do consulado americano (pois os Estados Unidos estavam ocupando o Japo), peridicos ou livros, recebidos por seu intermdio. Em O Semanrio, da CAC, lemos as seguintes notcias: "Um livro de leitura indispensvel para os japoneses: Rikugun Saigo no Hi (O Ultimo Dia do Exrcito). Autor: Hiromichi Fujimoto. Junho de 1946. l. a impresso. Distribuio gratuita. Leitura indispensvel para nossos patrcios. Kfukuji no Shins (A Verdade do Momento da Rendio). Autor: Hisatsune Sakomizu, chefe de Gabinete no Ministrio Kantaro Suzuki (abril-agosto 1945). 3.a impresso. Organizado pela redao de O Semanrio. Agosto de 1946. Distribuio gratuita. Esta obra vendeu rapidamente trezentos mil exemplares, em Tokyo, apesar de ser a carncia de papel muito grande. Casualmente conseguimos um exemplar, razo por que resolvemos reedit-la, mimeografada. Embora quanto ao seu contedo possa haver muita discusso, acreditamos que se trata de documento importantssimo para tomar conhecimento da derrota um acontecimento indito na histria do Japo. Esperamos que merea a leitura atenta de muitas pessoas".

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A campanha de comunicao da realidade da derrota pelos elementos esclarecidos teve efeito negativo na linha dura dos vitoristas. Diziam: "Jornal falsificado nos Estados Unidos", "Cartas forjadas, imitando a grafia de parentes", "Propaganda perniciosa que procura impor a derrota nipnica", etc. Serviu, em parte, para irritar os duros, mas, por volta de outubro, a correspondncia com o Japo liberada parcialmente e se intensificam as trocas de cartas entre os imigrantes aqui residentes e seus parentes de l. Aumenta, paulatinamente, o contingente dos que acham foroso aceitar e reconhecer a derrota 4 . Outrossim, graas promulgao da nova Constituio do Brasil, em setembro de 1946, jornais em lngua estrangeira podiam agora ser editados sem prvia autorizao governamental. Da resultou na volta circulao de jornais editados em idioma nipnico, suspensos h cinco anos. J em dezembro de 46 so lanados So Paulo Shinbun, Brasil-So Paulo, Nanbei Jiji e o velho Burajiru Jih (Notcias do Brasil). Em janeiro de 47 surge o Paurisuta Shinbun (Jornal Paulista), o nico rgo ento declaradamente esclarecido, fundado com a finalidade de divulgar a verdade sobre o fim da guerra, a situao do ps-guerra no Japo, no Brasil e no mundo. Seguiram-se outros jornais, mas nem todos tinham o compromisso de divulgar a verdade. "Primavera da Vitria do Japo na Guerra", festejava o Burajiru Jih, na sua edio especial de 1. de janeiro de 1947, assumindo a posio dos vitoristas ou defendendo-a; outros, por interesse comercial, evitavam falar claramente do desastre militar japons. Na realidade, a ressurreio da imprensa em idioma japons no contribuiu necessariamente para a tarefa de abrir os olhos dos vitoristas. Todavia, com o passar do tempo, diante das informaes do revs nipnico que chegavam de toda parte, at vitoristas se submetiam, ainda que a contragosto, inexorvel realidade. A derrocada da frente vitorista influiu muito no crescimento do nmero de esclarecidos quanto real situao da me-ptri. No entanto, ainda se passaram longos anos at que a maioria absoluta dos japoneses da colnia se convencesse do trgico fim da suposta invencibilidade do Japo.

4 No se pode deixar de registrar como parte do esforo de esclarecimento as atividades do Comit de Socorro s Vtimas de Guerra do Japo, uma organizao de voluntrios, instalada em junho de 1947 por pessoas esclarecidas. [Como vimos, os vitoristas acreditavam que o Japo viria em auxlio dos japoneses residentes no Brasil, enviando-lhes at para transport-los de volta ptria ou terras da sia Oriental...] Suas atividades continuaram at julho de 1950, angariando fundos para socorrer as vtimas de guerra. Foram arrecadados 5.717.349 cruzeiros, com o que o Comit remeteu leite em p, macarro, acar refinado, roupa usada, etc. para ajudar os compatriotas da terra natal. Essa campanha, com o tempo, teve alguma adeso de vitoristas, que concordavam em participar como "ajuda ptria que enfrentou uma guerra". A campanha de socorro teve assim um papel positivo tambm no "esclarecimento da verdade" no sentido amplo.

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Entrementes, continuava a explorao dos que propalavam a verso do triunfo nipnico, procurando iludir e enganar os desinformados patrcios, principalmente do interior. Surgiram espertalhes, que vendiam terras "nas regies conquistadas pelo Japo no Sudeste da sia"; outros, aproveitando a falcia da volta ao Japo, tomavam dinheiro e propriedades de imigrantes incautos; outros vendiam a antiga moeda japonesa (yen papel), j sem nenhum valor. No cessavam assim as atividades dos indivduos de mau carter que exploravam os compatriotas mal-informados. Tudo aproveitando a intensa aspirao de imigrantes japoneses de ento, que desejavam viver "sob a bandeira do Sol Nascente". Delitos praticados com rara habilidade por malandros da comunidade. Temos aqui um manuscrito intitulado "Principalmente para os Moos", escrito pelo prprio Kikkawa, o chefe mximo da Shindo Renmei, antes do "Esprito Kikkawa", por ele elaborado em julho de 19445. Comea por indagar: "Por que comeou esta guerra?", seguido de "Como ficaro as relaes entre o Japo e o Brasil?", "O futuro dos japoneses residentes no Brasil", captulos nos quais Kikkawa analisa minuciosamente a conjuntura e explica o dever dos nipnicos que se encontram no Brasil. Em suas consideraes declara: "O trabalho de todos ns residentes no Brasil a agricultura. Mas para ganhar dinheiro com esse trabalho, temos forosamente que visar a produo mais lucrativa, cultivando em especial produtos que alcanam preos mais elevados. E estes produtos so aqueles de exportao, sendo escoados rumo aos Estados Unidos e Inglaterra, inimigos da nossa ptria, e conseqentemente, contribuindo para o fortalecimento do seu poderio militar defensivo". "Nesta conjuntura no deveramos abandonar o pensamento de produzir para ganhar dinheiro, dedicando-nos produo do mnimo necessrio para nossa subsistncia?" Aconselharia a todos que, refletindo bem no trabalho realizado por cada um, se eventualmente sua atividade tiver possibilidade de prejudicar o Japo, estivessem dispostos a "abandon-la imediatamente(*), mesmo que seja extraordinariamente lucrativa". E uma advertncia contra a produo que favorece o inimigo. Continuando, aduz: "Os compatriotas residentes no Brasil somente podem colaborar com a poltica nacional do Japo, retornando sia". Mas, observa: "Est evidente que, se algum patrcio residente no Brasil no compreender a poltica nacional do Japo e no conseguir se libertar do
5 Est datado de 22 de junho de 1944, assinado por um annimo; mas que foi escrito por Junji Kikkawa, est claro no "Adendo" de Tomari. (*) Grifos nossos.

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modo de pensar liberal e individualista, no poder ajudar na construo da Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental, que est sendo levado avante com enorme sacrifcio. No s isso. Prejudicar a grandiosa obra nacional, portanto gente dessa laia no ser bem recebida, caso regresse ptria". Mais adiante: "Devemos prestar muita ateno ao trabalho nosso de cada dia, procurando fazer todo o possvel para que sejamos bem recebidos pela ptria, na eventualidade de nosso retorno. No caso de se concretizar a nossa volta ptria, temos necessidade de despesas de viagem. Todavia, temos absoluta certeza de que se possuirmos a qualificao necessria para a volta (ao Japo), poderemos retornar antes de qualquer um, mesmo que no disponhamos de um tosto. Mas como ainda no chegou o momento certo, no divulgaremos as medidas prticas para a volta. Contudo, podem estar absolutamente tranqilos, pois regressaremos ao Japo, com toda certeza". Estranhamente, em todos os casos de fraudes e imposturas sobre o retorno ao Japo, acontecidos no ps-guerra, seus autores vendiam a idia de "repatriamento gratuito". Entre inmeros casos de falcatruas, citamos os seguintes: Caso da "Kokumin Zen-ei Tai" Um indivduo que se dizia chamar-se tenente Yamagishi, da polcia do exrcito nipnico, ligado ao Departamento de Informao do Exrcito Imperial e cujo nome por extenso seria Kohaku Yamagishi, dirigia a chamada Kokumin Zen-ei Tai (Grupo de Vanguarda Nacional). Esse grupo provocou agitao pblica por duas vezes (novembro de 1950 e outubro de 1952), sendo na ocasio noticiado como a "Ressurreio da Shindo Renmei" pela imprensa brasileira. Seu objetivo era a explorao da credibilidade na "Volta ao Japo". Para isso precisava pregar a vitria do Japo e, ao mesmo tempo, eliminar os esclarecidos que reconheciam a derrota nipnica. Com essa finalidade, o grupo elaborou uma lista negra com mais de cem nomes de pessoas a serem mortas. Chegou a reunir armas de vrios tipos, mas sendo nas duas tentativas descoberta antecipadamente a sua trama, ela malogrou. Caso do falso prncipe Asaka Takuji Kato, j nosso conhecido como falso prncipe Asaka, foi ao Japo, participando do primeiro grupo de visita ao Japo (do ps-guerra) em junho de 1949. L comprou no mercado negro a medalha Kinshi Kunsh (Ordem do Milhano de Ouro)(*), a preo de banana. De volta ao Brasil, vendeu a medalha a preos elevados a patrcios que no acredita(*) A medalha Kinshi Kunsh servia para condecorar heris de guerra. Instituda em 1890, somente militares que se destacavam por atos de bravura mereciam receb-la. Estava dividida em sete graus: do 1 ao 7. Com a derrota foi abolida, da a sua desvalorizao e sua apario no mercado negro naqueles dias trgicos do Japo vencido e ocupado.

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vam ainda na derrota nipnica, com o que ganhou um bom dinheiro. Fez outra viagem ao Japo e de volta adquiriu um terreno em Cip, subrbio de So Paulo. E ali reuniu vitoristas remanescentes e abriu uma fazenda coletiva, soando alto o slogan "Culto do esprito japons". E afirmava: "At a chegada do navio japons para receber os compatriotas do Brasil, procuraremos formar japoneses bons e justos". E acrescentava em manifesto: "Aqueles que querem se tornar japoneses e que no se envergonhem depois de voltar ao Japo, devem ingressar na fazenda Cip". Com essa artimanha atraiu lavradores de Bastos, Mogi das Cruzes, etc, iniciando suas atividades agrcolas. Os colonos vendiam suas terras e ingressavam no "ncleo colonial Cip", como Kato chamava a fazenda. Por sua vez, Sanzo Kawasaki, que declarava chamar-se capito Nang, do servio secreto japons, e que j havia agido em diversas falcatruas, partiu para outra. Asseverava agora que havia chegado do Japo uma nobre personalidade: "Seu objetivo consiste em trazer mensagem de conforto e consolo aos japoneses residentes no Brasil. Mas, por motivos no revelados, encontra-se oculto". "Naturalmente, ns devemos cuidar das despesas de sua subsistncia no Brasil...", acrescentava, percorrendo zonas onde ainda havia remanescentes vitoristas, recolhendo vultosas somas em dinheiro. Ao conhecer Kato, transformou-o na "nobre personalidade" (o prncipe Asaka). Alm de angariar dinheiro de companheiros de fora, dentro da fazenda explorava os lavradores. Takuji Kato, "o prncipe", vivia numa boa casa na cidade de So Paulo, junto com a "princesa" que trouxera na sua segunda viagem ao Japo. Levou uma vida principesca, at ser preso junto com Kawasaki, em janeiro de 1954. Caso "Sakuragumi Teishintai" (Grupo Sakura de Voluntrios) Em maro de 1953 foi organizado em Londrina, PR, por Tsuneo Amano, o chamado Grupo Sakura de Voluntrios. O grupo, ao mesmo tempo que requeria ao prefeito de Londrina autorizao para aliciar voluntrios japoneses para o "Exrcito da ONU de Voluntrios da Fora Expedicionria Coria", que iria combater na Guerra da Coria (195053), ento em curso, recrutava patrcios vitoristas que ansiavam retornar ao Japo. Amano alegava que para fazer parte do Exrcito de Voluntrios era preciso receber adestramento militar, sem o que o governo brasileiro no daria a necessria autorizao. E cobrava uma taxa de "despesa de treinamento". O pretexto dessa "manobra" era o seguinte: participando da campanha coreana como voluntrio da ONU, se conseguiria voltar ao Japo sem pagar a passagem de navio... Mesmo depois do trmino da guerra na pennsula coreana, em julho de 1953, o grupo prosseguiu no aliciamento de voluntrios, mudando o nome para "Fora de Cooperao das Naes Unidas". Em fins do mesmo ano, o grupo transferiu-se para Santo Andr, nas

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proximidades de So Paulo. Seus membros levavam vida coletiva e o chefe ousadamente mudou o seu objetivo para "Voluntrios Comunistas", destinados a libertar Taiwan. E apresentou um requerimento ao prefeito de Santo Andr, declarando: "So duzentas as famlias que participam da organizao do Exrcito de Voluntrios e o nmero de aspirantes ao voluntariado chega a duzentos milhes (sic). Pedimos providncias no sentido de que este requerimento encontre soluo adequada por parte das autoridades competentes". O DOPS interveio no caso e 17 dirigentes do grupo foram detidos. A essa altura, o prprio Consulado Geral do Japo em So Paulo considerou grave o caso e procurou esclarecer (convencer do seu erro) os dirigentes presos. Mas Amano e seus aliados declararam: "O nosso objetivo consiste em repatriar imediata e gratuitamente todos os 700 mil compatriotas. Ns somos comunistas. Como o governo brasileiro colocou na ilegalidade o Partido Comunista, esperamos ser expulsos do territrio brasileiro como 'elementos indesejveis'. No caso de sermos expulsos, conseguiremos alcanar o nosso objetivo, se o destino de nossa viagem for o Japo". Com tais argumentos, e com o moral elevado, no deram ouvidos ao Consulado. Posteriormente os dirigentes foram postos em liberdade pela polcia. Mas eles no se emendaram. A 3 de fevereiro do ano seguinte, ou seja, 1954, o Sakuragumi resolveu proceder a uma mobilizao geral. Num total que somava 120 a 130 membros, inclusive mulheres e crianas, reuniramse na Praa da S, centro de So Paulo, e promoveram uma demonstrao de fora. Carregando estandartes onde se liam slogans como "Regresso ao Japo de todos os 400 mil patrcios do Brasil", "Irmos Todos os Homens do Mundo", etc, marcham pelas principais vias pblicas da cidade, entoando hinos marciais e usando uniformes caracterizados por quepe militar e mangas arregaadas com tasuki(*), assustando os pacatos cidados. Seus representantes procuraram o Consulado Geral do Japo. "Durante cinco anos, ns pedimos ao governo brasileiro, Naes Unidas e governo nipnico o repatriamento geral, no s dos 400 mil japoneses do Brasil como dos 700 mil compatriotas residentes no alm-mar. Rogamos, at a nossa morte, o imediato regresso compulsrio de todos os patrcios residentes fora do territrio japons." Entregaram o documento e se sentaram no recinto do consulado, recusando-se a sair. A custo foram retirados. Outrossim, a vida coletiva do grupo em Santo Andr, mantida pela
(*) Tasuki faixa ou cordo com que se prendem as mangas do vesturio. Geralmente usada pelas mulheres japonesas para arregaar as mangas do quimono.

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contribuio dos vitoristas e simpatizantes, se tornava insustentvel pela exausto de recursos. Os seus membros entraram em greve de fome. Autoridades policiais chegaram a ordenar a dissoluo do grupo. A fim de exigir recursos para despesas da dissoluo, o grupo se dirigiu em massa ao Consulado Geral do Japo. Como no foram atendidos, recorreram violncia. Diante disso, a Secretaria de Segurana Pblica ordenou sua dissoluo compulsria. A essa altura dos acontecimentos houve interferncia da Assemblia Legislativa do Estado, onde se formou uma comisso para tratar do caso Sakuragumi. Graas aos bons ofcios dessa comisso, cerca de 150 membros do grupo foram abrigados na Hospedaria de Imigrantes de So Paulo, com a condio de completar sua dissoluo dentro de 25 dias a contar de 30 de abril. A seguir, ainda sob o patrocnio dessa Comisso e com a ajuda de figuras representativas da colnia, todos eles deixaram a Hospedaria dos Imigrantes at o dia 15 de maio e arrumaram emprego. Destarte, depois de mais de um ano, o chamado caso Sakuragumi Teishintai chegava ao fim. Alm desses casos graves, que provocaram reao da opinio pblica, prosseguiram as atividades fraudulentas relacionadas com o repatriamento de japoneses. Esses acontecimentos agitaram as pginas de jornais de lngua japonesa que h poucos anos haviam voltado a circular6.
6 O caso da venda de "yen" (iene) faz parte das atividades fraudulentas j mencionadas. A respeito, porm, convm citar os seguintes fatos histricos: a) "As notas de yen emitidas pelo governo de Tokyo antes da guerra (do Pacfico) escoaram para o alm-mar, via China. Por excesso de oferta, sua cotao despencou tremendamente, sem relao com o valor cambial da moeda japonesa", escreve Tokiya Washizuka, gerente do Banco Kaik, em seu comentrio: "Por que a compra do papel-moeda do Japo constitui um ato antipatritico" (Nippak Shinbun, 15 de abril de 1939). " poca, na China do Norte e Central, havia cado 30% em relao cotao oficial de 1 shilling, 2,5 pences por yen; na regio de Cingapura cerca de 30 yens por libra esterlina, (queda de cerca de 40%). Aqui no Brasil tambm, no ano passado (1938), do ltimo trimestre em diante, o yen estava 10 a 20% abaixo do seu valor cambial." Washizuka demonstrava no seu trabalho como o papel-moeda yen sofria desvalorizao no exterior. Esse dinheiro comeou a entrar no Brasil por volta de 1938, vindo da rea de Xangai. Nos jornais da colnia do pr-guerra aparecem notcias sobre compra de yen. O ltimo embaixador do Japo no Brasil antes da guerra, Itaro Ishii escreve no seu livro Gaikokan no Ish (Vida de um Diplomata), edio Yomiuri Shinbun, novembro de 1950, p. 368:

"Em junho de 1941, com o irrompimento da guerra entre a Alemanha e a Unio Sovitica, alguns grupos de oficiais do nosso exrcito e marinha que serviam em vrias partes da Europa, retornaram ao Japo, pela rota do Brasil, viajando em navio japons. Avidamente, eles adquiriram yen-papel encontrado no mercado local, segundo me informaram. Dominados pelo egosmo, nada os impedia: nem a legislao japonesa nem a posio de cada um". b) O imigrante que esperava regressar ao Japo e se preparava para essa eventualidade julgava no ser desvantajoso comprar yen barato. Diziam-lhe que era contraveno voltar ao Japo levando yen, mas a maioria no compreendia. Pensava que era at um ato patritico levar yen do exterior para o pas. "Ateno compatriotas: pode at ser da natureza humana, mas sem saber praticam atos antipatriticos" (Advertncia do Nippak Shinbun, 15 de abril de 1939). c) Com a ecloso da guerra prosseguiram os negcios com o yen. Os lavradores que haviam se

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O fato de tais casos terem prosseguimento mesmo depois do reatamento das relaes diplomticas entre o Brasil e o Japo, e do incio

dedicado cultura de hortel e criao do bicho-da-seda preferiram no depositar o dinheiro ganho no banco, com receio do congelamento. Por isso muitos trocavam o cruzeiro por yen, preparando-se para o dia do repatriamento. Na lista negra da Shindo Renmei (relao de nomes de esclarecidos) h um item chamado "Levantamento de Portadores de Ideologia Especial" [Refere-se evidentemente "ideologia da derrota" criada pela imaginao vitorista.], onde se l: "Apresentamos o presente relato sobre o acima citado como portador de ideologia especial. Ele o maior lder dos que desejam a derrota do Japo. [Como os fatos histricos demonstram, a palavra derrotista, usada pelos vitoristas, apresentava a conotao de 'aquele que deseja ou desejava a derrota japonesa' e no 'aquele que reconhece a denota do Japo'. Este documento da Renmei bastante elucidativo.] Na primavera passada, assim que o inimigo comeou a sua ofensiva contra Okinawa, ele aconselhava lavradores que ainda no haviam se iniciado na sericicultura, a se dedicarem a ela, pois essa atividade tinha muito futuro (corte parcial). 'O Japo no dar importncia mesmo que ns trabalhemos aqui na sericicultura. tolo aquele que no aproveita a onda do momento.' Em 1944, no sabemos como, ele se associou a um vendedor de moeda japonesa (Nomura de tal, residente em Marlia) e, trazendo-o a este ncleo colonial Tibiri, ajudou-o a vender grande volume de moeda japonesa. Esse indivduo est perfeitamente enquadrado como idelogo do antipatriotismo, basta ver a sua profisso" (corte da parte final). Este um registro que consta do aludido relato. d) Por outro lado, parece plausvel que, entre as empresas nipnicas que foram fechadas por causa do congelamento de bens ou ficaram sob fiscalizao do governo brasileiro, difcil se tornando a manuteno da companhia, houvesse quem quisesse se livrar secretamente do yen que possua no comeo das hostilidades, a fim de sobreviver situao. e) No ano seguinte ao fim da guerra, isto , a 17 de fevereiro de 1946, o governo japons baixou uma lei financeira de emergncia, decretando o bloqueio dos depsitos em yen antigo e, ao mesmo tempo, a sua substituio por um novo yen. Em conseqncia, o yen antigo sofreu uma desvalorizao completa, tornando sem valor todo papel-moeda yen em circulao na comunidade japonesa do Brasil. Mas, a maioria ignorava as medidas tomadas por Tokyo. Entre os que sabiam da situao, alguns se livravam do yen antigo. Entretanto para isso era preciso tomar a posio de quem acredita no Japo vitorioso, colaborando assim com a campanha vitorista. Como vimos, a compra e venda do yen no comeou inesperadamente no ps-guerra. Essa atividade j era intensa desde mais ou menos 1939, prosseguindo durante e aps o conflito armado. Apenas aqueles que o vendiam, apesar de ter conhecimento da desvalorizao total do antigo yen, em virtude de sua substituio pelo yen novo, podem ser considerados na mesma categoria dos vigaristas do conto "Volta ao Japo". Todavia, no tem fundamento a verso, ainda corrente em certos crculos da colnia, segundo a qual o antagonismo esclarecidos/vitoristas teria resultado da tramia de um grupo, em que havia lderes esclarecidos que queriam vender yen velho. Para conseguir esse objetivo teriam veiculado a notcia da vitria do Japo. Inexiste qualquer fundamento de verdade nessa verso. Tambm no encontramos provas que confirmem a verso de que a Shindo Renmei teria conseguido os abundantes recursos financeiros gastos em sua campanha mediante a venda de yen antigo aos prprios vitoristas. Seja como for, a compra e venda de yen no se constituiu num fulcro da disputa vitorista derrotista. As razes, em resumo, so: I antes da guerra verificou-se ingresso de papel-moeda yen barato, mas no existe prova de que o mesmo tenha continuado a entrar no Brasil durante e aps a conflagrao; II corre ainda o rumor de que pessoas ligadas a trading companies e outras empresas nipnicas dispunham de grande quantidade de yen no comeo da guerra. Mas at o final do conflito s a libra esterlina constitua a moeda usada no intercmbio comercial internacional. Era impossvel fazer negcios com o yen ou com base nele, fora do territrio nipnico. Existe a possibilidade de que aquelas pessoas dispusessem de yen em seu poder, mas deveria ser em montante pouco significativo; III o fato de a cotao do yen antigo ter subido rapidamente no ps-guerra indica que havia pouca oferta contra a crescente demanda. Os vigaristas do negcio do yen no passariam do tipo pequeno comerciante que procura lucrar apenas com a margem de juros.

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da vinda dos "imigrantes do ps-guerra", em 1953, constitui algo muito estranho e incompreensvel nos dias de hoje. Mas vamos aos fatos noticiados na poca. Com o ttulo de "Aumenta o grupo dos que retornam ptria", o Jornal Paulista, de 12 de julho de 1951, informa: "Como que ignorando o desejo de emigrar para o exterior manifestado por japoneses e do veemente anseio de patrcios aqui residentes favorvel vinda de maior nmero possvel de novos imigrantes para o Brasil, muitos compatriotas esto regressando ao Japo do ps-guerra, abandonando sua segura posio aqui construda. Em dois anos aps a reabertura das viagens ao Japo, cerca de cem famlias, representando quinhentas pessoas, retornaram ao Japo em carter definitivo (corte parcial). Entre eles existem aqueles tangidos por motivos de fora maior, mas a maioria foi iludida pelos boatos de 'Grande vitria do Japo', ou 'O Japo, o maior do mundo', o que constitui um problema srio merecedor de ateno". Os vitoristas que dispunham de recursos prprios para voltar ptria viajaram por conta prpria rumo terra natal "vitoriosa". O mesmo jornal, em sua edio de 30 de janeiro de 1953, ao noticiar o "Reinicio da imigrao do ps-guerra", informa o seguinte: "O navio Tisadane, trazendo a bordo 51 imigrantes chamados por parentes e 90 saitok (aqueles que haviam voltado ao Japo mas reemigraram para o Brasil) acostou no cais de Santos, s 10 horas do dia 18". O que o jornal chama de saitok so aqueles que visitaram a terra natal e retornaram ao Brasil, depois de verem com seus prprios olhos a terra arrasada pelos bombardeios e incndios, a destruio de centros industriais e urbanos, mais ainda, a transformao dos prprios japoneses, derrotados, famintos, muitos morando em casebres improvisados com material que sobrou da catstrofe... Os ex-vitoristas, agora convencidos da dura realidade, retornavam para o Brasil com o seu sonho destrudo. Em sua edio de 8 de outubro de 1947, o Jornal Paulista informava sob o ttulo de "Enviado secreto da Shindo Renmei confessa (reconhecer) a trgica realidade do Japo ao redator deste jornal: tudo completamente diferente do que lhe haviam dito". Trata-se de perguntas e respostas trocadas entre Yutaka Shiino, correspondente em Tokyo, e o membro da Shindo, de nome Kenzo Abe (ento residente na provncia de Fukushima): "P Com que finalidade veio agora a Tokyo? R Li num jornal que ainda hoje os japoneses do Brasil, em sua maioria absoluta, no reconhecem a derrota. Fiquei preocupado e vim tentar preparar o terreno para o esclarecimento deles (corte parcial). P Os motivos de sua sada do Brasil?

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R Pensei que indo at o Canal do Panam, ficaria bem esclarecido se o Japo venceu ou perdeu a guerra. Fugi do Brasil, decidido a ir a p at o Panam. Ao chegar a Yokohama, compreendi que realmente o Japo havia sido vencido. J no navio sentia talvez fosse verdade que o Japo havia sofrido derrota na guerra. Ao desembarcar em Yokohama, vi com meus olhos a cidade completamente destruda, fiquei aturdido sem saber o que pensar durante algum tempo. Os patrcios residentes no Brasil ignoram que todas as grandes cidades nipnicas foram destroadas. P Como v a situao de penria do Japo? R Nem em sonho pensei que a falta de alimentos tivesse chegado a tal ponto. Mesmo nas reas rurais h escassez de comida. P Alguma mensagem para os compatriotas do Brasil? R Peo que envie esta mensagem. A derrota um fato inegvel, uma realidade absoluta. Por isso, mesmo as pessoas pertencentes Shindo Renmei devem abandonar a iluso da vitria e dedicar toda ajuda recuperao econmica e reconstruo pacfica da ptria que se encontra em penosa situao sob a poltica autoritria de ocupao dos aliados". Kenzo Abe, juntamente com seu correligionrio Takeshi Torigoe, fugiu de Lins, no comeo de 1947, chegando dois meses depois a Lima, capital do Peru. Diante de seus patrcios de Lima, os dois pronunciaram discursos de pregao religiosa de sua inveno. Presos pelas autoridades peruanas como chefes da entidade chamada Aikoku Doshi-kai (Associao de Companheiros Patriotas), foram expulsos do pas e enviados aos Estados Unidos, de onde as autoridades americanas os recambiaram ao Japo. Essa era a explicao do prprio Abe. Mas, segundo outra verso, eles pertenciam Suishintai (Grupo de Propulso) da filial de Lins da Shindo Renmei e teriam sido enviados ao Peru pela organizao. No livro Zai Peru Hojin 75 Nen no Ayumi (Caminhada de 75 Anos dos Japoneses do Peru), edio do jornal Peru Shinp, 1974, encontramos o seguinte registro no captulo "'Uma Pgina Louca", referindo-se a Abe e Torigoe: "... Em maio de 1946, um tal de Kenzo Abe, acompanhado de um moo chamado Takeshi Torigoe, membros da Shindo Renmei, entidade que provocou distrbios feios no Brasil, de envergonhar o Japo, saram de So Paulo, passaram por Lins, cruzaram a selva do Mato Grosso e entraram clandestinamente, disfarados de ndios no territrio peruano, passando por La Paz, Puno, Cusco, Ica e chegando finalmente a Lima. Consta que o seu objetivo era grandioso: integrar os japoneses de diversos pases e faz-los jurar lealdade nao vitoriosa, o Japo. Na realidade, porm, Abe no passava de um grande vigarista que buscava explorar os

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vitoristas... Sabe-se que, ainda na Bolvia, por haver extorquido vinte mil pesos de patrcios de La Paz, fora detido, mas conseguiu fugir, acabando por alcanar Lima. Abe j sabia da existncia da Aikoku Doshi-kai. No dia 30 de maio, quando chegou capital peruana, hospedou-se no Hotel Lima. Ao entrar em contato com aquela associao, foi alvo de uma brilhante recepo. Ele se intitulava vice-almirante da Marinha de Guerra Imperial(!). Os 'vitoristas' pularam de alegria, diante de uma personalidade de tamanha grandeza. S lhes faltou se lanarem ao cho para cumprimentar o 'vice-almirante'. E reunidos, ouviram, com lgrimas de felicidade incontida, a conferncia sobre o glorioso 'Japo vitorioso', pronunciada por Abe (corte parcial). A crena fantica e de 'divina inspirao' dos vitoristas se tornaram mais slidas. E atenderam entusiasticamente companha de 'contribuio ao ministrio da Guerra' do Japo, que era o objetivo principal de Abe. A roupa de 'poncho' esfarrapada usada no momento da chegada foi logo substituda por um novo e elegante terno...". Com base nas palavras de Abe, seus correligionrios de Lima conseguiram uma "explicao lgica" da vitria do Japo. E dirigiram-se em caravana a outras localidades onde surgiam doshikai, como conseqncia da campanha de instigao promovida pelos vitoristas. Abe realizou nada menos do que 30 "palestras", nas localidades que visitou, sendo de 30, aproximadamente, o nmero de ouvintes em cada sesso. A Aikoku Doshi-kai expressou sua profunda reverncia e reconhecimento a Abe, ofertando-lhe uma medalha de ouro. Abe, por sua vez, mandou preparar uma lista negra dos derrotistas, enviando cartas de ameaa a 15 pessoas nela relacionadas. Consta que para cada uma, ele tinha indicado um assassino. Mas, no dia 7 de agosto (1946), Abe foi detido, juntamente com cerca de 30 vitoristas, pelas autoridades peruanas, que, h algum tempo, vinham vigiando seus passos. Eram passados 70 dias desde sua infiltrao clandestina em Lima. Os jornais da capital do Peru passaram ento a veicular, com grande destaque, notcias sobre atividades clandestinas de uma sociedade secreta nipnica. A foto de Abe ilustrava a primeira pgina. E aconteceu aquilo que os japoneses esclarecidos residentes no Peru mais temiam: notcias e comentrios antijaponeses eram veiculados diariamente, com estardalhao nos jornais: "As medidas tomadas durante a guerra, expulsando os nipnicos em grande nmero, provaram ser absolutamente certas. Vejam! Japoneses que se fingem obedientes, uma vez tirada a mscara mostram-se fanticos, violentos, um povo enigmtico que perturba a

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ordem social do pas que os recebeu generosamente. Portanto no merecem nossa confiana". Em linhas gerais, a condenao estava vazada mais ou menos nesses termos. Torigoe, igualmente foi preso em outro local, junto com cerca de trinta membros de uma Aikoku Doshi-kai. Ambos foram condenados pena de expulso do territrio peruano, por delito de entrada ilegal no pas e perturbao da ordem. Em seguida foram despachados aos Estados Unidos, e de l escoltados para o Japo. Por incitamento dos dois grandes embusteiros, os vitoristas peruanos intensificaram sua atividade, do que resultou a formao de associaes nacionalistas, uma aps outra. Essas associaes no chegaram a praticar atos de violncia como a Shindo Renmei no Brasil, mas talvez fossem mais lgubres e teimosas no seu carter, diz a notcia, que descreve pormenorizadamente o roteiro dos dois trapaceiros. Todavia, no est claro se os dois vigaristas queriam realmente confirmar a vitria japonesa com seus prprios olhos, acreditando no boato de que a marinha de guerra do Japo havia tomado o canal do Panam, ou se tinham a misso de ampliar o movimento vitorista, unindo os patrcios do Peru, ou, ainda, se visavam pura e simplesmente explorar os crentes na vitria nipnica. Se porm foram at o Panam exclusivamente como alegaram para confirmar a vitria, poderemos dizer que estamos diante da assustadora fora de uma crena. Feliz ou infelizmente os dois foram condenados pena de expulso do pas e por isso puderam pisar o solo de sua ptria. Da resultou o reconhecimento de que "a derrota do Japo constitui um fato absolutamente verdadeiro". Na verdade, tudo indica que, muito embora os vitoristas sustentassem acreditar na vitria, o seu grande desejo consistia em ver com seus prprios olhos a realidade 7 .
7 Notcias que se tm a respeito desses dois indivduos: na parte final da entrevista concedida ao Jornal Paulista, Abe diz que, "presentemente est preparando cerca de 8 mil metros quadrados de terras para lavoura em Fukushima, mas que sente muito ter deixado o Brasil". No conseguiu viajar de novo para o Brasil e morreu em sua terra natal. Quanto a Torigoe, a "Histria dos 75 anos da imigrao no Peru" informa que "aps cumprir pena no Japo, foi novamente para o Brasil e morou em Lins. Nessa localidade, por questo de obras de irrigao, angariou inimizade de seus patrcios, e teve morte violenta, agredido com p", mas na verdade "teve desavena com empregado brasileiro, e foi assassinado, e que de regresso da citada viagem, sempre se vangloriava dela", segundo testemunhas residentes em Lins. Sobre esses dois indivduos "Arde a chama sagrada", publicada pela sede da Seicho-no-i do Brasil, pgina 16, se refere do seguinte modo: "Kenzo Abe e Takeshi Torigoe, de Lins, vistos como membros da 'Tokktai', foram perseguidos pelas autoridades. Desprovidos praticamente de todas as posses, com apenas um exemplar de 'Seimei no Jiss', atravessaram as matas do continente sulamericano, e, aps muitas dificuldades, se refugiaram no Peru tendo antes passado pela Bolvia. Era no ano de 1946. Os dois eram pessoas que tinham estudado muito os ensinamentos da Seicho-no-i, tinham a plena convico da vitria do Japo, pas divino. Na poca, havia muitas pessoas no Peru que acreditavam na vitria do Japo, tendo sido organizada por essas pessoas a 'Associao dos Companheiros Patriotas Residentes no Peru'. Esta organizao recebeu as citadas pessoas como companhei-

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Entre os esteios morais dos vitoristas no ps-guerra, jornais e revistas destinados a difundir as idias triunfalistas desempenharam importante papel. Uma dessas publicaes, Asahig (Revista Sol Nascente), em sua edio de fevereiro de 1956, dirige-se "Aos senhores leitores" para declarar: "Quebrou-se o arco, esgotaram-se as flechas..." "Somos forados a informar (os leitores) de que por dificuldades de ordem financeira somos obrigados a suspender a publicao (desta revista)". (corte parcial) "A revista antecessora Kagayaki (O Luminoso)(*) teve um comeo realmente auspicioso, mas ao se transformar em Seincn (Os Moos), a partir de maio de 1953, o nmero de leitores se reduziu metade, chegando afinal impossibilidade de prosseguir sua publicao devido diminuio ms a ms da circulao (corte parcial). uma lstima que a maioria das pessoas do chamado grupo vitorista que na poca do fim da guerra demonstrava absoluto entusiasmo, tenha perdido o rumo diante da conjuntura, duvidando do seu prprio modo de pensar. O caso mais grave o daqueles que mudaram de atitude como conseqncia natural (de haver reconhecido o revs). No nos resta seno reconhecer que eram realmente muito poucos os verdadeiros crentes na vitria. A revista Kagayaki que antecedeu esta foi lanada em maro de 1949, o que significa sete anos de uma luta contra tremendas dificuldades e toda sorte de obstculos. Ao aceitar agora a paralisao de nossas atividades, sentimos, sem exagero, uma profunda tristeza e dor. Rogamos que, prosseguindo na obra que no conseguimos concluir, marchem corajosamente neste mundo de confuses ideolgicas, cheio de dificuldades... Fevereiro de 1956. Os editores da Asahi." Transcorridos mais de dez anos do trmino da conflagrao, temos aqui um comunicado de um rgo oficial do grupo vitorista, que explica, de modo eloqentemente simblico, a decadncia e o fim do seu movimento. Verificamos que, ao longo desta exposio histrica, para os crentes na vitria chegarem concluso clara e definitiva da derrota de sua ptria
ros, e realizou, por vrias vezes, palestras tendo os dois como conferencistas. Em agosto de 1946, a sua presena no pas foi descoberta pela polcia de Lima, sendo os dois presos. Na ocasio estavam presos os sr. Matayoshi e Shikko, patrcios ativistas que acreditavam na vitria do Japo, e os srs. Abe e Torigoe compartilharam da mesma cela. Deste convvio, aqueles do Peru conheceram os ensinamentos da Seicho-no-i, e se tornaram adeptos da seita... Tendo como ponto de partida as atividades dos srs. Matayoshi e casal Shikko, surgiu a prosperidade da Federao da Seicho-no-i do Peru". Assim, Abe e Torigoe so colocados como os precursores da Seicho-no-i do Peru. (*) Publicada a partir de maro de 1949. Antes dela havia Koki (O Glorioso), que comeou a circular em 1947.

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tomarem a deciso final de se fixarem no Brasil como sua residncia permanente , foi necessrio percorrer um longo e tortuoso caminho. b) A deciso de permanecer para sempre no Brasil Como j se exps, s vsperas da II Grande Guerra, a grande maioria de imigrantes nipnicos vivia sob presso da poltica de nacionalizao encetada pelo governo Vargas. Por isso era o motivo principal aspirava voltar ao Japo. Com exceo de um pequeno nmero deles, com a ecloso da Guerra do Pacfico, todos foram submetidos a uma vida ainda mais sombria, como sditos de um pas inimigo do Brasil. Na situao de guerra, a nica esperana dos japoneses era reemigrar para a "Esfera de Co-prosperidade da Grande sia Oriental", no dia em que a vitria sorrisse para eles, pois confiavam na "Invencibilidade do Pas Divino", o Japo. E l iriam viver tranqilos, sob a gide do Imprio do Japo. Nessa expectativa deviam suportar vida espartana e penosa, que no envergonhasse sua condio de sdito do Imprio. Era esse o modo de viver considerado correto, decente. No entanto, no dia 14 de agosto de 1945 (aceitao dos termos da Declarao de Potsdam das potncias aliadas), aconteceu algo inesperado e surpreendente para os japoneses residentes no Brasil, que esperavam para breve a vitria final de sua ptria: a informao da rendio caiu sobre suas cabeas como um relmpago em cu azul. A notcia chocante se espalhou rapidamente na comunidade, ento sem veculos prprios de comunicao, como jornais em lngua nipnica. Todos ficaram atnitos, pasmados, completamente desorientados, ningum sabia o que fazer. Contudo, quase sem perda de tempo, foi divulgada a notcia da grande vitria japonesa, desmentindo a anterior, agora tida como boato sem fundamento. A nova informao representava algo a que qualquer um sendo sdito do micado gostaria de se agarrar, como um recurso tranqilidade, salvao. Com exceo daqueles que j vinham acompanhando o curso da guerra com apreenso a minoria que lia jornais brasileiros e ouvia transmisses radiofnicas em portugus , todos os demais acreditaram na verso vitorista. A todo momento chegavam pormenores sobre o fim da guerra, as condies para a rendio do Japo, etc. Mas, para os japoneses que haviam recebido a educao de "sdito do Imprio" (*), baseada no
(*) O sistema educacional do Japo, implantado na Era Meiji (1868-1912), enfatizava o carter nico da histria do Japo, com uma nica dinastia de origem divina reinando desde o comeo de sua existncia. As correntes ultranacionalistas, militaristas e expansionistas reforaram essa "ideologia", sustentando que o Japo era um pas invencvel por causa das caractersticas singulares de sua histria. E que tinha a misso de construir a Esfera de Co-prosperidade da sia Oriental e at do "Mundo sob um teto" (Hakk Icliiu).

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nacionalismo mais extremado e na crena de "Japo, pas divino", e que, vivendo no estrangeiro, tinham aguada a sua conscincia de nipnicos, reconhecer o revs da ptria representava, no mnimo, uma atitude antipatritica. As atitudes e palavras dos que, reconhecendo a realidade da derrota, pregavam a necessidade de procurar o reerguimento moral e material dos japoneses, partindo dessa trgica realidade, reiniciando uma nova vida, representavam, para os elementos vitoristas radicais, gestos e pregaes intolerveis, de verdadeiros demnios... Portanto, a morte desses elementos antipatriticos que propagavam a derrota do Japo significava o cumprimento de "uma ordem do Imperador". Foi assim que, na histria dos 80 anos da imigrao japonesa no Brasil, foram perpetrados atos terroristas, em que patrcios assassinaram patrcios, acrescentando uma pgina negra, inapagvel, trgica e triste, que abalou profundamente no s a comunidade nipnica como a prpria sociedade brasileira. Entretanto, aos poucos, o transcorrer do tempo foi despertando muitos dos que seguiam cegamente a crena vitorista para a realidade da derrota. Para confirmar essa realidade, alguns tiveram de pisar o solo esturricado da ptria distante. O roteiro espinhoso por eles percorrido levou-os realidade da ptria em runas, para onde, se regressassem, no encontrariam nenhuma possibilidade de vida decente naquele momento. Essa situao fez germinar e crescer no corao d cada um a deciso de abandonar a antiga aspirao de retornar terra natal. Agora s restava escolher o Brasil como "a terra de domiclio permanente" e definitivo. No decorrer de uma dcada, abrangendo a fase do pr-guerra, quando os imigrantes sofreram presses de diversas naturezas, e o perodo de confuso do ps-guerra de que acabamos de falar, muitos dos filhos aqui nascidos, os niseis, sem ter oportunidade de receber educao japonesa, haviam crescido como adultos brasileiros. No adiantava regressar ao Japo levando esses filhos. Essa poderosa circunstncia concorreu para reforar a resoluo de viver para sempre neste pas. Os filhos aqui nascidos e educados comeavam a atuar em diversos setores da vida brasileira, inclusive na poltica. Em janeiro de 1948, surgia o primeiro vereador de origem nipnica eleito na cidade de So Paulo. Um fato impensvel antes da guerra. Chamva-se Luiz Yukishige Tamura o novo edil paulistano. Ele se elegeu deputado estadual em 1950 e, a seguir, em 1954, deputado federal. Depois de Tamura surgem, uns aps outros, parlamentares, prefeitos e outros ocupantes de cargos pblicos, em nvel municipal, estadual e federal. Como que indiferente confuso e tumultos da comunidade, cresce

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o nmero de nipo-brasileiros que atuam nos mais diferentes setores da sociedade brasileira como autnticos cidados brasileiros. J ento a comunidade nipnica no se chama mais Zaihaku Hjin Shakai (Comunidade dos Irmos Residentes). No se pode precisar a data, mas n u m dado momento tais denominaes, muito usadas entre os japoneses aqui residentes, desaparecem, sendo substitudas pelo nome "Colnia Nikkei" (nikkei quer dizer origem japonesa). Comumente, dentro da comunidade, emprega-se a forma abreviada "Kornia" (Colnia), sem o nikkei. Colnia o mesmo termo usado em portugus na designao de comunidades de origem europia aqui estabelecidas antes da nipnica. A deciso de fixar residncia permanente no Brasil (em vez de retornar ao Japo) produziu uma profunda mudana no planejamento de vida dos imigrantes. Os japoneses, que durante a guerra sofriam restries na sua movimentao, comearam, no ps-guerra, um crescente movimento migratrio dentro do territrio brasileiro. Uma parte considervel dessa migrao se verificou no sentido do interior paulista para a regio norte do Paran, em busca de novas terras agrcolas. Outra grande corrente se dirigia na direo da cidade de So Paulo e cidades vizinhas. Os migrantes deste grupo visavam, em sua maioria, aumentar seus ganhos mediante a prtica de uma agricultura intensiva, com o cultivo de hortifrutigranjeiros nas proximidades da capital paulista, ento em fase de grande expanso econmica. Paralelamente procuravam melhor oportunidade para educar seus filhos em So Paulo, j que no interior a rede de ensino tcnico ou superior era precria ou inexistente. Tambm o aumento de pequenos empreendimentos comerciais ou de servios, principalmente tintureiros, na cidade de So Paulo, refletia a aspirao dos pais em dar melhores oportunidades de educao aos filhos. Como resultado dessas tendncias, eleva-se rpida e substancialmente no ps-guerra a escolaridade de filhos de japoneses. O esforo para elevar o grau de educao escolar constitui um excelente meio de ascenso social e econmica dos filhos. Para o imigrante nipnico cuja histria recente em comparao de imigrantes europeus proporcionar estudos de nvel superior aos filhos para conseguir uma posio estvel na sociedade brasileira era o caminho certo para sua prpria estabilidade econmica. Para isso no poupavam sacrifcios nem trabalhos rduos. Essa opo provou que estava certa. Decorridos 30 ou 40 anos, temos hoje descendentes de japoneses participando ativamente da vida econmico-social brasileira, ocupando posies relativamente estveis de classe

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mdia ou superior. No poucos exercem suas atividades como elementos de confiana, dada sua seriedade e operosidade, em diversos grupos profissionais. A quase ausncia de preconceito de carter racial na sociedade brasileira contribui para esse progresso na integrao do elemento japons. A entrada de imigrantes nipnicos do perodo anterior II Guerra Mundial terminou em agosto de 1941. Ela recomeou em janeiro de 1953. Entre uma fase e outra tivemos um verdadeiro perodo .de vale tenebroso de pouco mais de uma dcada, representando o espao branco na histria da imigrao nipnica. Entretanto, preciso ressaltar o fato j referido, de que, justamente nesse perodo de escurido, cuja causa principal foi a guerra, o imigrante japons aprofundou sua deciso de deitar razes neste pas generoso e nele viver para sempre. Para ele significava, tambm, o despertar da conscincia de se tornar o " Gosenzo-sama" (santo fundador de nova estirpe no Brasil). Esta mudana radical de conscincia de dekasegi (emigrante com finalidade de ganhar dinheiro fora de sua terra e regressar ptria) para eij (permanncia definitiva) teve como conseqncia o extraordinrio desenvolvimento e expanso dos nipo-brasileiros em todos os setores de atividades do Brasil. Destarte, encarada a posteriori, a dcada do vale tenebroso pode ser considerada uma fase de testes e provao necessria para essa evoluo. (Susumu Miyao/Jos Yamashiro) BIBLIOGRAFIA Aristteles de Lima Cmara e Arthur Hehl Neiva. Colonizao Nipnica e Germnica no Sul do Brasil. Revista de Imigrao e Colonizao. Ano II. n.l, jan/1941. Asahisha. Asahi-g (Sol Nascente). 1954-56. Autor desconhecido. Jijitsu Kiroku Senp Fukisusamu Juqui-Sen (Registro da Realidade: Turbilho sobre a Linha Juqui). Abril 1951. Autos do Processo-Crime movido contra os envolvidos com SHINDO RENMEI, Secretaria de Segurana Pblica - Departamento de Ordem Poltica e Social (DOPS). So Paulo. 23 volumes. 5.754 fls., e mais 10 volumes contendo Cartas Precatrias. No texto abreviado para "Autos DOPS" ou Does. DOPS. Brasil Asahi. 1940-1941. Centro de Estudos Nipo-Brasileiros. Brasil no Imin Mondai (Problema Imigratrio do Brasil). 1954. Cooperativa Agrcola de Cotia. Shh (Semanrio). Maio-dezembro de 1946. Emlio Willems e HirosJii Saito. Shindo Renmei: Um Problema de Aculturao. Sociologia-Revista Didtica e Cientfica. Vol. IX, n. 2,1947.

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CAPITULO 5

PERODO DO PS-GUERRA
1.CORRENTES IMIGRATRIAS DO PS-GUERRA 2. FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA 3. DA COMUNIDADE JAPONESA DO BRASIL PARA A COLNIA NIKKEI 4. NASCE UMA ENTIDADE DE INTEGRAO DA COLNIA NIKKEI

1. CORRENTES IMIGRATRIAS DO PS-GUERRA

a) A continuidade do antijaponismo

caos que dominou a comunidade nipnica no imediato psguerra representado essencialmente pelo movimento "vitorista" liderado pela Shindo Renmei provocou, como no podia deixar de provocar, reao profundamente negativa na sociedade brasileira. As manifestaes antinipnicas persistiram at por volta de 1952, quando j se iniciavam movimentos a favor da reabertura da imigrao de japoneses. Mas, justamente no Estado de So Paulo, onde havia a maior concentrao de japoneses, se observa resistncia e mesmo oposio entrada de novos imigrantes dessa origem. Dentro do Conselho de Imigrao e Colonizao ento existente no governo federal, circulava at um regulamento interno vedando a imigrao de nipnicos no Estado de So Paulo. Oficialmente alegava-se que o Estado de So Paulo j havia alcanado um considervel grau de desenvolvimento, inexistindo necessidade de introduzir mais imigrantes. Na realidade, porm, a causa real residia na rejeio ao ingresso de elementos japoneses que nunca se assimilam e provocam misteriosos conflitos internos, incompreensveis para quem se achava fora da comunidade nipnica. Por outro lado, em conseqncia da derrota, o Japo teve de receber no seu exguo territrio um enorme contingente de 6,3 milhes de repatriados do alm-mar (Coria, Taiwan, Manchria, Sacalina do Sul e outros territrios ocupados antes e durante a II Grande Guerra) agravando mais ainda a j crtica situao alimentar e habitacional resultante da superpopulao. Para o governo nipnico no havia outra sada seno o caminho

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da emigrao para aliviar a tremenda presso demogrfica. Por isso, logo aps o trmino do conflito comearam os planos de emigrao para o Brasil. No entanto, sem o restabelecimento das relaes diplomticas entre os dois pases no podia haver negociaes a respeito do assunto entre Tokyo e Rio de Janeiro. O tratado de paz assinado com os 48 expases inimigos do Japo s entrou em vigor no dia 28 de abril de 1952. b) Uma vitria da iniciativa privada: os imigrantes "Tsuji" e "Matsubara" Foi significativa a contribuio da iniciativa privada de residentes japoneses no Brasil no tocante reabertura da imigrao nipnica na fase posterior ao trmino do conflito mundial. Dois nipnicos aqui residentes, agindo paralelamente linha do movimento de reabertura da emigrao do Japo, se levantaram para promover uma "diplomacia particular" no sentido de sua concretizao: Kotaro Tsuji, de Santarm, PA, e Yasutaro Matsubara, de Marlia, SP. Lembremos que o regime autoritrio do Estado Novo terminou em outubro de 1945. Apeado do poder, Getlio Vargas se retira para So Borja, RS, sua terra natal. Contudo, nas eleies de janeiro de 1951, Vargas volta Presidncia da Repblica do Brasil com uma grande votao popular. Ento Kotaro Tsuji apresentou um requerimento ao Presidente pedindo autorizao para um plano de imigrao e colonizao na Amaznia e Yasutaro Matsubara fez solicitao idntica em relao ao Centro-Oeste e Nordeste do pas. Matsubara j conhecia Vargas, e o Presidente estava muito interessado na cultura da juta empreendida por Tsuji, como uma nova indstria da Regio Norte. O curioso que, apesar dos interesses comuns, Tsuji e Matsubara no se conheciam at ento. Depois de analisar cuidadosamente os requerimentos dos dois interessados, Vargas autorizou a entrada de 5 mil famlias de imigrantes a Kotaro Tsuji e 4 mil famlias a Yasutaro Matsubara, alegando que ainda vigoravam as cotas estabelecidas antes da guerra em relao imigrao nipnica. Tratava-se de uma deciso de carter excepcional do Presidente. Como condio para a autorizao, Vargas determinava a participao e colaborao no esforo de desenvolvimento do interior do pas empenhado pelo governo. Para isso, os imigrantes deviam ingressar nas colnias federais ou estaduais adrede preparadas para essa finalidade. A primeira leva de 18 famlias, 54 pessoas, dos chamados "imigrantes Tsuji" chegou no dia 11 de fevereiro de 1953 ao Rio de Janeiro a bordo do Santos-Maru. O grupo de "imigrantes Matsubara", compreendendo 22 famlias e 112 pessoas, aportou em Santos a 7 de julho de 1953, pelo navio holands Louis. Estas 166 pessoas formam os primeiros grupos de

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3 deste captulo temos a explicao para a mudana da denominao de comunidade japonesa para colnia nikkei do Brasil) um movimento a favor da abertura de imigrao regularmente planejada para o Estado de So Paulo. O primeiro caso concreto aconteceu com a entrada de imigrantes sericicultores, trazidos pela Sociedade Paulista de Sericicultura. Isso representou o rompimento da barreira. Foi muito importante o papel pioneiro representado por esses imigrantes na nova fase da histria da imigrao nipnica no Brasil. Convm lembrar tambm que a criao do bicho-da-seda foi introduzida em 1866 por imigrantes italianos. A sericicultura praticada por imigrantes nipnicos se expandiu pelas ij-chi Bastos, Tiet, Aliana e desde Bauru at ao longo da E. F. Paulista. A produo de fios de seda nos anos antes da guerra chegava a cerca de 50 toneladas/ano. O consumo nacional alcanava 250 toneladas/ ano, de modo que grande parte era importada. Com o irromper da guerra, cessou a importao de seda crua. Mais ainda: chegam consultas para a exportao da nossa seda, provocando reverso completa das expectativas. O setor da indstria da seda, inclusive criadores de bicho-da-seda, entra numa fase de intensa atividade. Fiaes de seda surgem umas aps outras, elevando a produo. Em poucos anos esta alcanava 500 toneladas/ano. Entretanto, o produto brasileiro no estava em condies de concorrer com fios de seda de boa qualidade produzidos por tradicionais fornecedores como o Japo e a Itlia, dois ou trs anos aps o trmino do conflito mundial. Por volta de 1948, algumas indstrias do setor sofrem falncia. Torna-se crtica a situao da indstria de fiao de seda e da sericicultura brasileiras. A fim de enfrentar essa situao, em 1. de maro de 1952 funda-se a Sociedade Paulista de Sericicultura, sendo eleito primeiro presidente Francisco Toledo Piza. Noventa por cento dos associados eram agricultores nipnicos. Estes apresentaram ao presidente Toledo Piza um plano de aperfeioamento da qualidade do fio de seda mediante a introduo de novos imigrantes sericicultores do Japo, portadores de tcnica avanada. E solicitaram o seu apoio concretizao do plano. No comeo, o presidente Piza achou que o plano no seria aceito pelas autoridades. Mostrou-se hesitante. que ainda havia um forte ambiente antinipnico no pas, inclusive nas altas esferas governamentais. Em face porm da insistncia dos associados, Piza se ergueu. Levou requerimento diretamente ao presidente Getlio Vargas. O documento oferecia uma justificativa: "introduzir imigrantes sericicultores para reavivar essa nova indstria nacional". O presidente da Repblica aprovou o requerimento e o remeteu ao

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Conselho Nacional de Imigrao e Colonizao. No CNIC a proposta encontrou oposio, mas afinal o rgo decidiu acatar a vontade presidencial. Em maro de 1953, o governo do Estado de So Paulo recebia uma comunicao do Conselho Nacional de Imigrao e Colonizao autorizando a introduo de 200 famlias de imigrantes sericicultores japoneses como lavradores empregados. O recebimento dos imigrantes comeou em 1954, encerrando-se o plano com a entrada de 200 famlias, 1.251 pessoas. Terminado o ingresso do primeiro grupo, a Associao Paulista de Sericicultura requereu a vinda da segunda turma de imigrantes sericicultores at o limite de 500 famlias, o que tambm foi atendido. Todavia, o plano terminou sem completar a introduo do nmero-limite estabelecido, pois aps a entrada de 63 famlias, 367 pessoas, no binio de 1960-61, reduziu-se drasticamente o nmero de candidatos emigrao, dado o extraordinrio desenvolvimento industrial que ento se processava no pas das cerejeiras. d) Reforma dos rgos de imigrao e o Acordo de l. de julho Em outubro de 1953, o governo brasileiro decidiu reestruturar a mquina administrativa do setor imigratrio. Apresentou ao Congresso Nacional um projeto de lei criando o Instituto Nacional de Imigrao e Colonizao (INIC), unindo o Conselho Nacional de Imigrao e Colonizao e a Diviso de Imigrao do Ministrio da Agricultura, para gerir todo o servio de imigrao e colonizao do pas. O projeto de lei foi aprovado e entrou em vigor pela lei de 5 de janeiro de 1954. A 7 de junho do mesmo ano Francisco Toledo Piza foi nomeado presidente do novo rgo. Inexplicavelmente Piza renunciou em pouco mais de um ms, sendo nomeado diretor-gerente da Comisso de Financiamento Rural do Banco do Brasil. E essa comisso dissolvida com o inesperado suicdio de Vargas, a 24 de agosto de 1954. Piza deixa o cargo. Muito embora Toledo Piza permanecesse apenas um ms e pouco na presidncia do recm-criado Instituto Nacional de Imigrao e Colonizao, conseguiu oficializar os esquemas de introduo de imigrantes nipnicos autorizados pelo presidente Vargas a Kotaro Tsuji e Yasutaro Matsubara. O documento foi assinado a 1. de julho, entrando imediatamente em vigor. Assinaram o acordo Francisco Toledo Piza, o presidente do INIC, e Akira Otani, representante dos concessionrios Kotaro Tsuji e Yasutaro Matsubara, e como testemunha o conselheiro Yoshida, da embaixada japonesa no Rio de Janeiro. As cotas de imigrantes do Acordo de 1. de Julho foram a seguir

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herdadas pela Federao das Associaes Ultramarinas do Japo e pela Kaigai Iju Jigyo-dan (Associao de Empresas de Emigrao) e outras organizaes mantidas em vigor at 1965. Os imigrantes do esquema Tsuji para a Amaznia, de 1953 a 55, somaram 324 famlias com 1.957 pessoas e mais 23 jovens solteiros, totalizando 1.980. Como rgo de remessa de emigrantes do esquema Tsuji funcionou o Instituto de Estudos Industriais da Amaznia, presidido por Tsukasa Uetsuka. E a recepo ficou a cargo de Kotaro Tsuji, na qualidade de representante desse instituto no Brasil. A partir de 1955, os emigrantes dos esquemas Tsuji e Matsubara ficaram a cargo da organizao central de emigrao chamada Zaidan Hojin Nihon Kaigai Kyokai Rengokai, conhecida pelo nome abreviado de Kaikyo-ren (Fundao Federao das Associaes Ultramarinas do Japo). Ento, as relaes diplomticas j haviam sido restabelecidas entre o Brasil e o Japo, o que facilitou a unificao dos servios de emigrao nipnicos. Os imigrantes do esquema Matsubara destinados ao Nordeste e Centro-Oeste, que chegaram entre 1953 e 1961, somaram 202 famlias com 1.073 pessoas e mais 158 solteiros, num total de 1.231 pessoas, distribudas pelos estados de Mato Grosso, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e outros. Com a morte de Yasutaro Matsubara em 1960, a imigrao pelo esquema Matsubara ficou temporariamente suspensa. Akira Otani, diretor da filial do Rio de Janeiro da Federao das Associaes Ultramarinas do Japo, conseguiu transferir as cotas desse esquema para imigrao ao sul do pas. Ento os imigrantes so encaminhados para colnias dos estados de So Paulo e Paran, como lavradores empregados. E Otani consegue, ainda, autorizao para incluir 141 famlias e 32 solteiros como cotas da Federao das Associaes Ultramarinas do Japo, independentemente das cotas de Tsuji e Matsubara. E a chamada "Quota Otani". e) Jovens imigrantes da CAC Entre 1951 e 55, particulares e associaes atuam ativamente no sentido de conseguir a introduo de novos imigrantes nipnicos. Entre eles destacam-se especialmente os chamados "Jovens Imigrantes da Cotia" (Cotia Seinen Imin) e os Grupos de Jovens para o Desenvolvimento Industrial (Sangyo Kaihatsu Seinen tai), estes patrocinados pela Cooperativa Central Agrcola de Colonizao de So Paulo (Nogyo Takushoku Kyodo Kumiai Rengokai), que tempos depois exerceriam, com sua atuao criativa, forte influncia na comunidade nipnica. Para a Cooperativa Agrcola de Cotia, constituda majoritariamente

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por lavradores japoneses, introduzir continuamente mais imigrantes do Japo era uma necessidade a longo prazo, visando a formao de elementos humanos capazes de dar continuidade organizao e seu desenvolvimento em bases fiis ao ideal cooperativista. Esse objetivo representava o sincero desejo de seus diretores. Logo aps a entrada em vigor do Tratado de Paz de So Francisco, em abril de 1952, a CAC requereu a vinda de novos imigrantes na forma de "chamadas de parentes". Com isso conseguiu autorizao para a entrada de sangue novo na comunidade, mas ainda em nmero reduzido. Sob a liderana do diretor-gerente Kenkiti Simomoto, a CAC prosseguiu com tenacidade nas negociaes com o governo brasileiro no sentido de conseguir a introduo de jovens imigrantes pelo "mtodo Nokyo". Esse mtodo estabelecia o seguinte: os imigrantes seriam recebidos por lavradores cooperados da CAC e os servios burocrticos necessrios ficariam a cargo da CAC; a seleo dos emigrantes no Japo ficaria a cargo da Cooperativa Central das Cooperativas Agrcolas do Japo Nokyo, comissionada pela CAC, e o servio de emigrao, pela Federao das Associaes Ultramarinas de Emigrao. Uma diviso de trabalho combinada. As negociaes entabuladas pela Cooperativa Agrcola de Cotia chegaram a um final feliz: em 4 de janeiro de 1955, o Instituto Nacional de Imigrao e Colonizao autorizou oficialmente a CAC a introduzir 500 jovens lavradores por ano durante trs anos, no total de 1.500. O primeiro grupo dos "Jovens Imigrantes da Cotia", composto de 109 elementos, chegou dia 15 de setembro de 1955 ao porto de Santos. E at 15 de agosto de 1958 completa-se a cota de 1.500 jovens imigrantes. A seguir, a CAC requereu a vinda de um novo grupo de 1.500 jovens lavradores, conseguindo a autorizao do INIC. O segundo grupo de jovens imigrantes da Cotia termina com a chegada de 110 solteiros e nove noivas a bordo do Sakura-Maru, que chegou a 10 de janeiro de 1967. Os jovens do primeiro e segundo grupo somaram 2.508, no tendo sido completada a cota do segundo grupo. E que, com a recuperao das atividades industriais e o excelente desempenho de sua economia, o Japo j no precisava mandar emigrantes para o exterior a fim de resolver o problema da superpopulao. O seu parque fabril e outros setores produtivos absorviam toda a mo-de-obra nacional. f) Jovens para o desenvolvimento industrial Ao lado dos jovens imigrantes da CAC, temos a existncia dos jovens da Sangyo Kaihatsu Seinentai (Grupo de Jovens para o Desenvolvimento Industrial). A idia partiu do funcionrio tcnico do Ministrio de Construo do governo japons, de nome Ryota Nagasawa.

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Com base na "Concepo de Desenvolvimento Integrado do Territrio Nacional", quase inteiramente por ele elaborado, idealizou uma forma especial de emigrao para o Brasil. No se tratava de simples emigrao de jovens. Primeiramente receberiam treinamento com um grupo de tcnicos no Japo, e aps a chegada ao Brasil tambm passariam por um perodo de treinos. S depois cada qual seguiria sua atividade independente no ramo de sua especialidade, mantendo porm a ligao entre os membros do grupo. Enquanto os jovens da Cotia so orientados principalmente pela comunidade nipnica, os grupos de jovens do desenvolvimento industrial diferenciam-se por receberem orientao do Japo, mais precisamente do Ministrio da Construo desse pas. Em outubro de 1955, o tcnico Nagasawa, que esteve no Brasil procura de um terreno para instalar a escola de treinamento dos jovens imigrantes, conheceu Shuichiro Wada, industrial de beneficiamento de caf. E dele recebeu a doao de cem alqueires de terras virgens de sua propriedade, em Serra dos Dourados, PR. E decide estabelecer o centro de treinamento nesse terreno. Com a finalidade de receber os jovens foi criada a Associao Central de Cooperativas Agrcolas de Colonizao do Estado de So Paulo. Os trabalhos preparativos estavam sendo dirigidos principalmente por Kenkiti Simomoto, diretor-gerente e fundador da CAC, mas ele faleceu repentinamente pouco antes da instalao da entidade, em setembro de 1957. A Associao Central de Cooperativas Agrcolas de Colonizao foi oficialmente inaugurada em outubro de 1957 e o Centro de Treinamento do Paran em 1958. No entanto, o primeiro grupo de jovens composto de 17 elementos chegara antes, em junho de 1956. E anteriormente a essa data, 27 jovens haviam chegado dentro da cota dos jovens da Cotia, divididos em duas vezes. At o dcimo grupo de 1965, ingressou no Brasil um total de 301 jovens imigrantes do programa de desenvolvimento industrial. O Centro de Treinamento dos Jovens contou com a ajuda financeira do governo nipnico, mas esta foi suspensa em conseqncia da organizao da Ij Jigyo-dan (Empresa de Emigrao) como parte do plano de unificao dos servios de emigrao do Japo. E pouco depois foi ordenado o fechamento do Centro de Treinamento e a venda dos seus bens. Com a diminuio de imigrantes j no tinha sentido manter o Centro.

FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA 389 2. FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA

a) Imigrao planejada e imigrao livre Grosso modo, as formas de imigrao japonesa do ps-guerra podem ser divididas em duas: a planejada e a livre. A imigrao planejada aquela controlada e autorizada por rgos de imigrao do governo brasileiro. Os imigrantes dos esquemas Tsuji e Matsubara, os imigrantes sericicultores e os jovens imigrantes da CAC, j referidos, fazem parte da imigrao planejada. Essa forma, por sua vez, se divide em dois grupos: o de lavradores colonizadores autnomos, como aqueles de Tsuji e Matsubara, e os lavradores empregados, como nos casos da CAC e sericicultores. A introduo de imigrantes nipnicos depois do fim da guerra foi regulada basicamente pelo artigo 121 da Constituio Brasileira promulgada em 16 de julho de 1934, que estabelecia que somente 2% dos imigrantes que entraram e se fixaram no pas durante os ltimos 50 anos seriam admitidos. a "lei de limitao a dois por cento" como era conhecida no seio da colnia nikkei. De acordo com esse dispositivo constitucional, o nmero de imigrantes nipnicos para o ano de 1936 teria uma cota de 2.849 indivduos. Todavia, no caso do Brasil existe no raro uma diferena entre o que a lei estabelece e sua aplicao. Porque, no caso em tela, estabeleceram-se excees e casos especiais. Por isso, nunca a lei de limitao a 2% foi aplicada com rigor. Assim, entraram no pas: em 1934 21.920; 1935 9.601; 1936 5.565; 1937 5.632. No ps-guerra, o dispositivo constitucional continuou em vigor e deveria ser aplicado a todos os novos imigrantes japoneses. Mas o governo brasileiro interpretou que, no caso de imigrantes planejados, sob controle de rgos de imigrao brasileiros, no tocante s condies de recrutamento, de ingresso nos ncleos coloniais, etc, e que tinham sido previamente autorizados, no se aplicaria a lei de limitao a 2%. Em conseqncia, os imigrantes Tsuji, Matsubara, sericicultores e jovens da Cotia foram excludos da cota normal. Somente os imigrantes livres ficaram enquadrados na lei restritiva. O conceito de imigrao livre se aplicava principalmente s "chamadas de parentes prximos", dos parceiros, e os chamados na condio de lavradores empregados. Comumente, o imigrante livre, como no caso dos parceiros do sul do Brasil, tomava a forma de "chamada" por um lavrador nikkei residente no pas. Como essa forma de imigrao se enquadrava cjentro da lei, logo agentes particulares de imigrao comearam a atuar no servio de recepo de imigrantes livres. E o resultado foi positivo.

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Pelo que se viu, na imigrao japonesa para o Brasil no perodo do ps-guerra destacavam-se os imigrantes planejados como os de Tsuji e Matsubara, que resultaram da "atuao diplomtica" de particulares: os imigrantes sericicultores, os jovens da Cotia, etc. Na realidade, porm, os imigrantes livres (lavradores chamados nominalmente por interessados), vindos por intermdio de agentes particulares, representaram mais de 50% do total de imigrantes. Posteriormente, quando cessa a imigrao, muitos dos agentes de imigrao passam a exercer a funo de agentes de viagem. b) A Fundao Federao das Associaes Ultramarinas do Japo e a Empresa de Emigrao para o Ultramar SA. O governo nipnico, que considerou a emigrao como parte da poltica nacional (poltica de Estado), organizou em 5 de janeiro de 1954 a Fundao Federao das Associaes Ultramarinas do Japo (entidade de carter pblico), encarregada dos servios de recrutamento, seleo e embarque dos emigrantes no pas, e no exterior o servio atinente sua recepo. A entidade comea a funcionar oficialmente como rgo pblico para cuidar dos servios relacionados com a emigrao. A entidade constitui um rgo auxiliar do Gaimusho, no mantendo nenhuma relao organizacional com as Associaes Ultramarinas que existiam nas provncias antes da conflagrao. Na prtica entretanto os servios de recrutamento e seleo foram entregues a associaes ultramarinas organizadas pelas provncias, ficando a Federao das Associaes Ultramarinas encarregada dos servios de ps-embarque dos emigrantes. Para isso ela instalou filiais nos pases imigrantistas, organizando um sistema de apoio aos imigrantes na fase posterior ao seu desembarque. Depois de instalar a Federao das Associaes Ultramarinas, encarregada do servio de embarque e recepo dos imigrantes no pas de destino, no ms de setembro de 1955 o governo japons criou a Kaigai Ij Shinko Kabushiki Kaisha (Empresa de Fomento de Emigrao Ultramarina S.A.). Essa empresa destinava-se a adquirir terras e fundar colnias nos pases imigrantistas, vendendo lotes para os imigrantes desbravadores autnomos. No Brasil criou e organizou empresas locais, a JAMIC Imigrao e Colonizao Ltda. e a JEMIS Assistncia Financeira S. A. para fornecer financiamentos diversos aos colonos. A entidade manteve a sistemtica de colonizao da Bratac, de antes da guerra. Nos primeiros tempos, por falha na escolha das terras para os imigrantes e a inexperincia dos prprios imigrantes, a nova organizao defrontou-se com muitos problemas.

FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA 391

A seguir relao de colnias (ij-chi) fundadas mediante aquisio de terras pela JAMIC A SITUAO DAS IJ-CHI FORMAO DE PASTOS, ALIENAO (VENDA) DE LOTES E IMIGRANTES ENTRADOS
Nome de ij-chi e de pasto Comeo de Incio venda formao de lotes Formao evenda de lotes Famlias entradas Lavradores nikkei

nikkei locais soma n." de famlias pessoas Vrzea Alegre, MS 11/57 Vrzea Alegre, MS (pasto) Sto. Antnio 5/59 Funchal, RJ 7/59 Jacare, SP 7/59 Tiet, SP 2/60 3/59 venda 12/89 venda 9/70 2/61 3/61 venda 11/79 3/80 10/80 10/83 7/63 2/63 11/61 4/76 3/77 18 100 88 87 54 54 244 53

31 38

31 38

143 210

31 33

Tome-Au II, PA Pinhal, SP Guatapar, SP So Loureno, RJ Auriverde, SP Total

5/62 9/62 4/61 9/75 12/76

655 60 1.241 6 27 2.395

84 53 115 2 18 395

84 53 115 3 18 396

382 311 635 7 18 2.011

83 53 106 3 79 379

Obs.: 1) Na formao e alienao no esto includas terras de uso pblico. 2) O nmero de pessoas e de famlias de 1. de abril de 1986 (excludas as no-imigrantes).

Acordo de imigrao entre o Japo e o Brasil Como tivemos oportunidade de ver, a imigrao japonesa do psguerra para o Brasil foi reiniciada antes do restabelecimento das relaes diplomticas oficiais entre os dois pases, graas iniciativa de nipnicos residentes no pas. Por isso, depois do restabelecimento das relaes oficiais, partiram de rgos governamentais relacionados com a migrao dos dois pases movimentos no sentido de regularizar a situao, corrigindo as formas irregulares at ento adotadas, para concluir um acordo formal de migrao entre os dois pases. Diversas reunies tiveram lugar, com a participao de funcionrios dos dois pases para discusso e elaborao de um projeto de acordo. Unia vez aprovado, foi oficialmente assinado o acordo de imigrao no dia 14 de novembro de 1960, no Palcio Itamarati, no Rio de Janeiro, pelo representante do Japo, o embaixador extraordinrio e plenipotencirio Yoshiro Ando, e pelo Brasil o ministro das Relaes Exteriores, Horcio Lafer. O documento denominado "Acordo de Migrao e Colonizao entre o Japo e os Estados Unidos do Brasil".

392 PERODO DO PS-GUERRA

O documento foi ratificado pela Dieta japonesa em janeiro de 1961, mas houve atraso no processo burocrtico brasileiro. Em agosto de 61, sobreveio a repentina renncia do presidente Jnio Quadros. O vice Joo Goulart sucedeu-o na Presidncia, mas continuou a instabilidade poltica, de maneira que a ratificao do Brasil s se deu em 1962. Como a instabilidade poltica prosseguiu, a troca dos documentos de ratificao s ocorreu em 29 de agosto de 1963, entre o ministro dos Negcios Estrangeiros do Japo, Masayoshi Chira, e o embaixador brasileiro em Tokyo, Dcio de Moura. E assim o acordo de imigrao entre o Brasil e o Japo entrou em vigor. Desde ento todo movimento emigratrio do Japo para o Brasil ficava subordinado ao acordo, que reza o seguinte: "Artigo 1. O presente Acordo tem por objetivo orientar, organizar e disciplinar as correntes migratrias japonesas para o Brasil dentro de um regime de conjugao de esforos de ambas as Altas Partes Contratantes, a fim de que os problemas migratrios e de colonizao entre os dois pases tenham soluo prtica, rpida e eficaz. Artigo 2. A migrao japonesa para o Brasil poder ser dirigida ou espontnea, devendo ambas merecer todo amparo e proteo das Altas Partes Contratantes, de conformidade com as disposies do presente Acordo". Estipulava: finalidades, migrao espontnea, migrao dirigida, recrutamento e seleo, embarque e transporte, recepo, encaminhamento e colocao, estabelecimento, financiamento e auxlio, seguros, comisso mista, reviso, vigncia e denncia, constando de 13 clusulas e 50 artigos. Determinava ainda a criao de uma Comisso Mista como rgo para resolver os problemas que poderiam surgir com a entrada em vigor de seu funcionamento (artigos 43-48). A Comisso seria composta de trs membros brasileiros e trs nipnicos, reunindo-se periodicamente ou em prazo indeterminado. Quando o documento entrou efetivamente em vigor, j havia passado o pico da intensa emigrao do Japo no ps-guerra, tornando-se muito limitada sua aplicao. c) Mudana na poltica de emigrao para o ultramar Mesmo depois da instalao da Federao das Associaes Ultramarinas e da Empresa de Fomento de Emigrao para o Ultramar, o governo nipnico continuou mantendo grande interesse pela emigrao. Com a finalidade de desenvolver melhor a emigrao, criou em 1955 o Conselho de Emigrao para o Ultramar. Esse Conselho importante, pois ele

FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA 393

decide ou define a orientao fundamental da poltica de emigrao do governo de Tokyo. Em 1962, respondendo a uma consulta do primeiroministro, o Conselho apresentou um relatrio denominado: "Pensamento fundamental sobre a poltica de emigrao para o alm-mar". O "pensamento" pode ser assim resumido: 1) Fornecer (ao emigrante) espao para atividade criativa no ultramar. 2) Desenvolver a capacidade potencial do povo nipnico em atividades pioneiras. 3) Contribuir ao desenvolvimento do pas receptor e ao bem-estar do mundo. 4) No considerar a emigrao como simples transferncia de fora de trabalho e sim como deslocamento de capacidade desenvolvimentista para o pas imigrantista onde se radicaro os imigrantes. Tokyo adota uma poltica emigratria baseada nessas idias fundamentais. Mas j era tarde: o auge da emigrao para o Brasil havia atingido uma remessa de 7.041 emigrantes no ano de 1959. O movimento emigratrio comea a cair: 6.832 em 1960; 5.146 em 1961. Da em diante verifica-se um declnio vertical: 62,1.830 emigrantes; 63, 1.230; e 64, 751. Acrescente-se que em 1962 houve a reemigraao de imigrantes japoneses da Repblica Dominicana: 52 famlias (com 268 pessoas) transferiram-se para o Brasil. interessante verificar que as causas da drstica diminuio da emigrao de japoneses para o Brasil surgiram simultaneamente, nos dois pases. Do lado japons: 1) o mau resultado dos primeiros emigrantes do ps-guerra, em especial dos que foram introduzidos nas regies do interior do Brasil pelo sistema de imigrao planejada e que provocaram muitos problemas; 2) com a recuperao da economia, foi possvel absorver o excedente populacional pelo seu parque fabril; os japoneses comearam a evitar a emigrao para pases em desenvolvimento, onde havia muitos elementos de incerteza e inquietao; 3) aumento de gente que emigrava para o Canad, Austrlia, etc, que abriram suas portas imigrao. No Brasil, por outro lado, a populao crescia rapidamente, em especial da regio pobre do Nordeste, criando-se excesso de mo-de-obra para trabalhos braais, dispensando portanto a fora de trabalho representada pelo imigrante estrangeiro. Em 17 de janeiro de 1964 o Ministrio do Exterior do Brasil envia aos seus representantes no exterior a Circular n. 5.000, estabelecendo as novas normas para a entrada de imigrantes, constantes dos itensseguintes: 1) quando se tratar de imigrantes industriais, tcnicos, artesos,

394 PERODO DO PS-GUERRA

operrios especializados e profissionais qualificados que se destinam s necessidades das indstrias determinadas pelo governo brasileiro; 2) quando no se enquadrarem nos critrios acima, os imigrantes industriais devem ser portadores de recursos financeiros superiores a 10 mil dlares; e 3) quando se tratar de imigrantes agrcolas, devem ser portadores de recursos financeiros superiores a 5 mil dlares destinados ao empreendimento agrcola, por conta prpria. A edio de regulamentos como estes demonstra que o Brasil j dispensava imigrantes sem capital e sem especializao. Na prtica, porm, os imigrantes nipnicos que ainda chegavam, na poca, em nmero de muitas centenas por ano, no eram obrigados a trazer 5 mil ou 10 mil dlares de capital. Em face das transformaes das condies de emigrao, o Conselho de Emigrao do Japo, em seu relatrio ao chefe do governo, opinou que se devia unir a Federao das Associaes Ultramarinas de Emigrao e a Empresa de Fomento de Emigrao, formando uma nova entidade encarregada dos servios de emigrao. O parecer foi aprovado, e em 8 de julho de 1963 aprovou-se a lei de empresa de emigrao para o exterior. No dia 15 de julho do mesmo ano, criou-se a Kaigai Iju Jigyo-dan (Empresa de Emigrao para o Ultramar), na forma de uma pessoa jurdica especial, que absorveu as duas organizaes. d) JAM1C e JEMIS A Empresa de Emigrao para o Ultramar, pessoa jurdica especial sob a jurisdio do Gaimusho, manteve as duas empresas existentes no Brasil: JAMIC Imigrao e Colonizao Ltda. e JEMIS Assistncia Financeira S.A. So mltiplas as atribuies da JAMIC: servio de recepo dos imigrantes, preparativos para a introduo de imigrantes agricultores e industriais, consultas, pesquisas bsicas para empresas que se instalam no pas, formao de ij-chi prprias (da JAMIC) e sua administrao, alienao de lotes, ajuda geral aos imigrantes, orientao sobre a gesto da lavoura, organizao de entidade de auto-administrao, ajuda introduo de eletricidade rural, apoio e ajuda escola, pensionato para estudantes, pavilho de centro cvico e demais instalaes de carter pblico, auxlio educao dos filhos de imigrantes, assistncia mdica, etc. Quanto JEMIS, trata-se de uma empresa especializada em financiar imigrantes, dividindo-se as suas atividades em financiamento agricultura e financiamento indstria. Os servios parecem simples, porm o

FORMAS E RGOS DE IMIGRAO DO PS-GUERRA 395

volume de recursos financeiros movimentados pela JEMIS superava em muito o da JAMIC. Embora formalmente as duas empresas assumissem a forma de organizao local, na prtica constituam entidades estatais, com capital 100% fornecido pelo governo japons. Descontentamentos e crticas dos imigrantes e de terceiros no faltavam, mas a verdade que ambas muito contriburam no trabalho de apoio e sustentao dos imigrantes-colonos. Vejamos os financiamentos da JEMIS. Nos 22 anos, de 1957 at 1979, o total chegou, em moeda japonesa, a 8,7 bilhes de yens (incluindo os financiamentos feitos pela antecessora, a Empresa de Fomento Emigrao, que comeara em 1957). Os limites do valor de financiamento tambm crescem. Em 1978 chegam a 1,03 bilho de yens e em 79 a 1,18 bilho de yens. Na fase inicial os objetos de financiamento eram as ij-chi de administrao direta da empresa, porm j nos anos 70 ela deu nfase maior ao financiamento de capital para a independncia de lavradores, aqueles, entre os imigrantes em geral, que ainda no haviam alcanado autonomia econmica. Esse financiamento de ajuda independncia econmica de agricultores teve um resultado muito positivo. Os servios da JAMIC abrangem todos aqueles no englobados no financiamento. Alguns sero entregues a entidades nikkei especializadas. O sistema de visita de mdicos ao interior adotado pela Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo, por delegao da JAMIC, um servio de assistncia mdica iniciada desde o tempo da antiga Federao das Associaes Ultramarinas. Tornou-se um servio indispensvel aos imigrantes japoneses residentes no interior. A JAMIC teve ainda atuao bastante destacada no tocante aos bolsistas enviados ao Japo pela Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e na ajuda financeira prestada atravs da Aliana Cultural Brasil-Japo aos professores de lngua nipnica e elaborao do programa de ensino de japons. Mas nem tudo cor-de-rosa. Surgem discusses sobre at que ponto a JAMIC poderia interferir em assuntos que, por assim dizer, so uma espcie de projeo das atividades imigratrias. Quer dizer, uma polmica sobre os limites de atuao da entidade. Ach.ando-se o mundo atual numa fase de intensa internacionalizao, a prpria migrao passou a ser tratada como um fenmeno de internacionalizao. Acresce que existe a realidade de que o nmero de emigrantes do Japo no aumenta. Ento, os servios at ento prestados pela JAMIC e seus mtodos no se adequam mais poca. A fim de se condicionar nova situao, em agosto de 1978 o governo japons levou a efeito uma profunda reforma administrativa, reor-

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ganizando, colocando em ordem e integrando as chamadas "pessoas jurdicas especiais". Todas as organizaes relacionadas com a emigrao, no total de quatro, foram unificadas e integradas na Japan International Cooperation Agency (JICA). Em conseqncia, tambm a JAMIC e a JEMIS, pessoas jurdicas locais, ficam subordinadas JICA. Essa reforma acaba criando problemas no Brasil, que resultam, finalmente, no fechamento da JAMIC e JEMIS (sobre as circunstncias do encerramento das atividades das duas organizaes ver o item correspondente, no Captulo 6).

3. DA COMUNIDADE JAPONESA DO BRASIL PARA COLNIA NIKKEI

a) O IV Centenrio da Cidade de So Paulo A primeira atividade organizada, embora precariamente, pela colnia japonesa na conturbada fase do ps-guerra, foi a do Comit de Socorro s Vtimas de Guerra do Japo, que deu o seu primeiro passo em maro de 1947.0 Comit foi organizado com a finalidade de enviar ajuda s vtimas de guerra patrcios, em forma de artigos de primeira necessidade e dinheiro, arrecadados na comunidade. O movimento de ajuda e o prprio Comit, organizado por lideranas esclarecidas, no obtiveram, porm, apoio geral. Seus resultados foram modestos, pois muitos elementos da corrente vitorista ainda achavam que o Japo havia vencido a guerra. E a efetiva unificao embora ainda sujeita a alguns atritos e rivalidades internas s aconteceria anos depois com os preparativos do IV Centenrio da Fundao de So Paulo. A colnia japonesa organizou ento a Comisso Colaboradora da Colnia Japonesa Pr-IV Centenrio da Cidade de So Paulo, com sede na capital paulista. A capital paulista, fundada em 25 de janeiro de 1554 pelo padre jesuta Jos de Anchieta e seus companheiros, na segunda metade do sculo XIX se desenvolveu muito graas ao boom do caf, e j no nosso sculo seu desenvolvimento e expanso foram espantosos, tanto no setor comercial como no industrial. Rapidamente ela se transformou na maior cidade da Amrica do Sul. Movimentos para comemorar condignamente o quarto centenrio surgem no s na cidade e no Estado como na esfera federal. Por outro lado, havia no governo brasileiro a vontade de mostrar o grau de desenvolvimento do pas, at ento geralmente considerado pertencente ao grupo dos subdesenvolvidos. Para isso, nada melhor do que aproveitar a oportunidade do quarto centenrio da capital do Estado de So Paulo, o mais rico do pas, e a cidade mais moderna, dinmica e industrializada da Amrica Latina.

DA COMUNIDADE JAPONESA DO BRASIL PARA COLNIA NIKKEI 397

b) A colaborao oficial e do setor privado do Japo No comeo de 1952, a Comisso do IV Centenrio da Fundao de So Paulo dirigiu-se s colnias entrangeiras do Brasil e s representaes diplomticas aqui acreditadas, solicitando sua participao nos festejos. Todavia, na comunidade nipnica, ainda no inteiramente livre das agitaes do ps-guerra, no existia nenhuma organizao central, e mesmo o Consulado Geral do Japo, recentemente reinstalado, ainda no funcionava plenamente. Foi nessas circunstncias que o gerente-geral da Casa Tozan, Kiyoshi Yamamoto, visitou, em maio de 1952, o cnsul-geral Shiro Ishiguro, a quem exps a importncia da participao da colnia nikkei nas comemoraes do IV Centenrio. E solicita que o cnsul-geral seja o articulador inicial do movimento. Atendendo sugesto, o cnsul-geral Ishiguro rene, no dia 23 de junho, pouco mais de uma dezena de figuras representativas da colnia, para consulta. Nessa reunio, todos concordaram em tomar parte, mas, quanto sua forma, surgiram tantas opinies divergentes que foi impossvel chegar-se a uma concluso. Depois de muitas reunies e discusses, realizou-se afinal, no dia 8 de dezembro de 1952, a assemblia geral de fundao da Comisso Colaboradora, no Clube Sakura, com a presena de 141 pessoas. Foram eleitos 24 membros da Comisso Executiva e os seguintes dirigentes: presidente Kiyoshi Yamamoto; vice-presidente Kinroku Awazu; presidente da Comisso Executiva, Toshio Takeda. Em janeiro de 1953, completou-se a organizao da Comisso Colaboradora da Colnia Japonesa Pr-IV Centenrio da Cidade de So Paulo. a primeira entidade que engloba toda a colnia nikkei do Brasil, em toda a sua histria, abrangendo o perodo anterior e posterior guerra. Enquanto no Brasil formalizava-se a colaborao da colnia, no Japo, em novembro de 1952, Barbosa Carneiro, embaixador do Brasil em Tokyo, visitava o ministro dos Negcios Estrangeiros, Katsuo Okazaki, solicitando a participao do Japo no IV Centenrio. O governo nipnico atendeu prazerosamente solicitao. Do lado japons, o movimento em prol da participao foi crescendo. Em maro de 53, instalou-se no Gaimusho uma comisso deliberativa da participao no IV Centenrio de So Paulo, sob a presidncia do chanceler Okazaki. Em So Paulo foi criada uma secretaria japonesa do IV Centenrio, assumindo sua chefia o cnsul-geral em So Paulo, Chiba, completando-se assim os preparativos para a participao oficial nipnica. O oramento geral aprovado no Japo ficava assim distribudo: realizao da Exposio sobre a Situao do Japo e envio da Misso de

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Congratulaes e Amizade, 120 milhes de yens; subsdio do governo Exposio Flutuante, 70 milhes de yens, perfazendo um total de 225 milhes de yens. A Misso de Congratulaes e Amizade, chefiada pelo ministro do Exterior Katsuo Okazaki, chegou a So Paulo em 10 de outubro de 1954, a bordo do avio City of Tokyo da "Japan Airlines". Permaneceu at o dia 15, tendo regressado ao Japo depois de ter se desincumbido da sua significativa tarefa. Os demais eventos programados, como a Exposio sobre a Situao do Japo, Exposio Flutuante, Exposio de Selos Japoneses, Festival Nipnico, etc, sucederam-se com toda regularidade, conquistando aplausos dos paulistas e da comunidade japonesa. Tambm a Associao Central Nipo-Brasileira de Tokyo colaborou de modo ativo e valioso, fornecendo material para a divulgao da cultura japonesa, para cinemateca, exposio da pintura contempornea do Japo, envio de misso cultural e de educao fsica. E igualmente colaborou na remessa de material destinado construo do Pavilho Japons (contribuio da colnia nikkei ao IV Centenrio), e na intermediao da seleo e envio de engenheiros e operrios especializados para a importante obra. Com a chegada do Wako-Maru a Santos, em abril de 1954, transportando o material necessrio obra, foi imediatamente iniciada a construo, que, conduzida a toque de caixa, concluiu-se em apenas quatro meses. O Pavilho Japons que hoje ornamenta o Parque Ibirapuera uma obra arquitetnica de puro estilo nipnico, imitando o famoso Palcio Katsura, de Kyoto (rea de terreno: 2.251 m2; rea construda: 568 m2; custo de construo: 7.610.000 cruzeiros). A participao da colnia no IV Centenrio de So Paulo terminou com grande xito para o Japo e a comunidade nipnica radicada no Brasil. A soma de contribuies arrecadadas pelas colnias de japoneses residentes nos estados de So Paulo, Paran, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Amazonas, Par, Bahia, Rio Grande do Sul alcanou 9.160.000 cruzeiros. A participao nos festejos do IV Centenrio da Cidade de So Paulo constituiu a maior atuao coletiva e unificada da colnia nikkei do Brasil em toda a sua histria at ento, compreendendo o perodo anterior e posterior da guerra. Ela teve projeo ao lado de todas as outras colnias estrangeiras aqui estabelecidas, que igualmente se esmeraram na sua participao. Foi, alm disso, um acontecimento transcendental para os japoneses, pois serviu para recuperar sua autoconfiana e superar a crise criada pela diviso entre esclarecidos e derrotistas, abrindo caminho para sua reunificao. E verdade que ainda se levou algum tempo para se eliminar por completo o mal-estar criado entre os grupos antagnicos. Ressalte-se porm o grande significado da participao no IV Centenrio,

DA COMUNIDADE JAPONESA DO BRASIL PARA COLNIA NIKKEI 399

que propiciou uma mobilizao no sentido de uma cooperao entre os japoneses "da mesma origem", como eles costumam ressaltar. O IV Centenrio marcou tambm a mudana da denominao at ento usada pelos nipnicos de Zaihaku Hojin Shakai (Comunidade de Compatriotas Residentes no Brasil, ou seja, Comunidade Japonesa do Brasil) para Burajiru Nikkei Koronia (Colnia Nikkei do Brasil) ou simplesmente Nikkei Koronia.

4. NASCE UMA ENTIDADE DE INTEGRAO DA COLNIA NIKKEI

a) A Sociedade de Cultura e a comemorao do cinqentenrio da imigrao Em outubro de 1955 dissolve-se a Comisso Colaboradora da Colnia Japonesa Pr-IV Centenrio da Cidade de So Paulo, tendo cumprido plenamente sua histrica misso. No entanto, mesmo antes de sua extino, surgiram vozes dizendo que seria uma pena acabar com uma organizao de mbito nacional, que pela primeira vez havia promovido a unio de todos os imigrantes japoneses residentes no pas em torno de uma causa. E surgia a questo de como comemorar o cinqentenrio da imigrao japonesa no Brasil, que aconteceria em 1958, da a trs anos. Diante desses fatos, decidiu-se fundar a Sociedade Paulista de Cultura Japonesa (San Pauro Nihon Bunka Kyokai), aproveitando a prpria estrutura da Comisso Colaboradora. Foi em dezembro de 1955. A nova entidade tinha a seguinte diretoria: presidente Kiyoshi Yamamoto, vices Kumaki Nakao e Amrico Sugai, e presidente do Conselho Deliberativo Kunito Miyasaka. Logo aps sua constituio, a nova Sociedade adotou a seguinte linha bsica de atuao: 1) Campanha de esclarecimento visando o entendimento e confraternizao dos compatriotas residentes no Brasil e seu aperfeioamento cultural. 2) Obras de educao dos niseis, futuros herdeiros da colnia nikkei. 3) Intensificao do trabalho de divulgao da cultura japonesa, promoo e fortalecimento dos trabalhos de intercmbio cultural entre o Japo e o Brasil, a fim de dissipar os mal-entendidos e preconceitos que o povo brasileiro tinha em relao ao Japo, antes, durante e aps a guerra. 4) Como entidade representativa da colnia nikkei, entabular negociaes com os governos do Brasil e do Japo na defesa de interesses dos compatriotas. 5) Construo do Centro Cultural para servir de sede do rgo

400 PERODO DO PS-GUERRA

central e base da concretizao dos objetivos definidos nos pargrafos anteriores. Adotada essa linha fundamental, a Sociedade Paulista de Cultura Japonesa comeou suas tarefas imediatas visando: a) conquista de scios; b) relacionamento com organizaes similares do interior; c) obteno de subveno do governo nipnico para a comemorao dos 50 anos da imigrao e construo do Centro Cultural. No dia 18 de junho de 1958 completava-se exatamente meio sculo da chegada do Kasato-Maru a Santos, com 781 imigrantes da primeira leva. Conforme vimos, desde o tempo da Comisso de Colaborao ao IV Centenrio de So Paulo, a colnia j previa a realizao dos festejos comemorativos dos 50 anos. Assim, desde os primeiros meses de 1956 a colnia comeou os preparativos, tendo como ncleo de ao a recmfundada Sociedade Paulista de Cultura Japonesa. Em novembro do mesmo ano, forma-se a Comisso Preparatria do Cinqentenrio da Imigrao Japonesa. Na reunio de fundao da Comisso Preparatria compareceram o embaixador Yoshiro Ando, cnsul-geral Isono, de So Paulo, e 80 representantes de 20 localidades espalhadas por quatro Estados. Por unanimidade, foi aprovada a realizao dos festejos comemorativos dos 50 anos da imigrao, figurando como promotora a Sociedade Paulista de Cultura Japonesa. No foi necessrio recorrer ao registro de unia comisso separada, pois decidiu-se organizar uma comisso interna da entidade para a tarefa. A comemorao do cinqentenrio da imigrao teve um significado muito especial, de marcar poca, pelos seguintes motivos: representou o ponto final do perodo de intensos sofrimentos dos primeiros imigrantes e das fases imediatamente anterior e posterior da guerra, quando se verificou intensa campanha antijaponeses no Congresso Nacional e na imprensa brasileira; e o fim da triste poca da diviso da comunidade em duas faces antagnicas; apontou uma nova direo para o futuro da colnia nikkei, mediante a criao de uma nova entidade integrada e representativa da comunidade nipnica do Brasil. A celebrao dos 50 anos da imigrao e a subseqente construo do Centro Cultural (sede da Sociedade Paulista de Cultura Japonesa) refletiram em grande parte as idias do presidente Kiyoshi Yamamoto. Nesse aspecto, os festejos posteriores dos 60., 70. e 80. aniversrios da imigrao nipnica apresentaram caractersticas um tanto diferentes. Para os preparativos do cinqentenrio da imigrao japonesa a

NASCE UMA ENTIDADE DE INTEGRAO DA COLNIA NIKKEI 4 0 1

entidade promotora apelou a todas as concentraes de nipnicos do pas, do Amazonas ao Rio Grande do Sul, unindo assim a fora total da comunidade nikkei. Nada menos do que 422 comisses deliberativas foram instaladas nas colnias. Como realizaes comemorativas do cinqentenrio destacam-se: 1) elaborao e publicao, em livro, da histria dos 50 anos; 2) construo de um pavilho no Manicmio de Juqueri; 3) criao de um fundo para envio de estudantes ao Japo; 4) incio da construo do Centro Cultural; 5) festejos comemorativos e eventos correlatos. As contribuies reunidas na colnia nikkei alcanaram a soma de 14.360.000 cruzeiros. Por seu turno, o governo nipnico resolveu colaborar nas comemoraes do cinqentenrio, da seguinte maneira: 1) concesso de condecoraes e premiaes, entrega de taas de madeira e certificados de mrito, a pessoas escolhidas por seu merecimento; 2) envio de uma embaixada de confraternizao nas pessoas do prncipe e princesa Mikasa; 3) concesso de um subsdio de 7 mil dlares para a elaborao e publicao da histria dos 50 anos (posteriormente mudado para levantamento censitrio da colnia); 4) envio de estudantes bolsistas para estudar no Japo; 5) subsdio construo do Centro Cultural. O governo brasileiro colaborou na realizao da primeira festa comemorativa da colnia nikkei: 1) recebendo os prncipes Mikasa com honras de hspedes de Estado; 2) concedendo a condecorao da Ordem do Cruzeiro do Sul ao presidente Kiyoshi Yamamoto, da Sociedade Paulista de Cultura Japonesa; 3) incluindo uma verba especial de 50 mil cruzeiros no oramento da Unio; 4) verba especial de 10 mil cruzeiros no oramento do Estado de So Paulo; 5) verba especial de 5 mil cruzeiros no oramento do municpio de So Paulo; 6) emisso de selo comemorativo dos 50 anos da imigrao japonesa; 7) decreto do governador Jnio Quadros declarando feriado estadual o dia 18 de junho de 1958, data da comemorao. A festa comemorativa dos 50 anos foi realizada a 19 de junho no Parque Ibirapuera, com a presena de 50 mil pessoas. Na vspera, dia 18,

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promoveu-se o desfile de carros alegricos de empresas brasileiras, por iniciativa do Clube Piratininga, uma organizao de niseis. As celebraes comemorativas prosseguiram durante meio ano, de junho a dezembro, compreendendo eventos esportivos, culturais, arte de representao, etc. b) Pesquisa sobre a situao da colnia Inicialmente esta pesquisa comeou como uma das realizaes comemorativas do cinqentenrio da imigrao. Depois se transformou n u m empreendimento independente. Isso porque, planejado como parte do trabalho de elaborao da histria do meio sculo da imigrao nipnica no Brasil, ao se encetar a tarefa verificou-se que no havia nenhum dado estatstico relativo comunidade. Assim no seria possvel escrever uma histria baseada em nmeros confiveis. Resolveu-se ento proceder a uma sria pesquisa da situao real da comunidade. Organizou-se uma Comisso de Pesquisa da Situao Real dos Nikkeis do Brasil (Burajiru Nikkeijin Jittai Chosa linkai), presidida pelo Prof. Teiiti Suzuki. Os trabalhos de pesquisa comearam em 1958 e, at sua concluso e publicao dos resultados, foram necessrios seis anos de intenso labor, mobilizando um total de 6 mil pesquisadores. Transformou-se numa pesquisa de dimenso e profundidade jamais imaginadas por qualquer dos elementos engajados no projeto. Por falta de verbas, a Comisso por vrias vezes chegou crtica situao de quase paralisar a pesquisa. As dificuldades foram transpostas graas s subvenes do Gaimusho e do Ministrio da Educao do Brasil, ajuda de verba pessoal de deputados nikkei, Joo Sussumu Hirata e Yoshifumi Uchiyama, doaes de particulares e at (curioso caso) a oferta da renda conseguida nas exibies do campeo de luta livre Rikidosan, famoso na poca. Esta pesquisa sem precedentes se tornou a maior, a nica e provavelmente a ltima na histria da imigrao japonesa no Brasil. S para citar um exemplo do tamanho da obra, foram 411 os quadros estatsticos publicados. Consta que nem nas pesquisas mundiais sobre migrao existem trabalhos dessa dimenso. Os objetivos da pesquisa eram constitudos de todos os elementos informativos dos nikkei do Brasil, incluindo a situao do momento da pesquisa (populao, economia, situao social e cultural), e background histrico (situao do imigrante antes de sair de sua terra natal, e, do momento de sua chegada ao Brasil, transformaes subseqentes). Para esta pesquisa colaboraram entidades oficiais brasileiras e nipnicas, organizaes privadas, pessoas fsicas, estudiosos. Ela contou com a

NASCE UMA ENTIDADE DE INTEGRAO DA COLNIA NIKKEI 403

compreenso e cooperao ativa dos nikkeis de todas as concentraes nipnicas. Citemos o exemplo da Associao de Tintureiros de So Paulo. Os tintureiros, na poca muito numerosos, aproveitavam o seu servio em domiclio para preencher os questionrios de japoneses residentes nos diferentes recantos da grande cidade, fornecendo assim dados precisos e preciosos. O resultado da pesquisa foi publicado em duas partes: Volume de Dados e Volume Descritivo. Trata-se de uma grande obra de que se pode orgulhar a colnia. c) O Centro Cultural e os passos da Sociedade de Cultura Japonesa A Sociedade Paulista de Cultura Japonesa, criada por ocasio do cinqentenrio da imigrao nipnica, passa a funcionar cada vez mais como uma entidade integradora da comunidade nikkei, desempenhando efetivamente o papel de um centro cultural. Suas principais realizaes da dcada de 60 foram, entre outras, a construo do edifcio do Centro Cultural (sede da entidade), a visita de Suas Altezas Imperiais, os Prncipes Herdeiros (atual imperador e imperatriz) Akihito e Michiko, e a construo do auditrio comemorativo da visita dos prncipes herdeiros. Os grandes acontecimentos da colnia, assim como a obra de construo do Centro Cultural, ficam centralizados ou so dirigidos pela entidade. A fim de assegurar a sua posio de organizao central e representativa da comunidade nipnica do Brasil, de fato e de direito, em setembro de 1968 mudou-se o nome de Sociedade Paulista de Cultura Japonesa para Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (Burajiru Nihon Bunka Kyokai Bunky, nome abreviado pelo qual mais conhecida). Ela evolui ento para uma espcie de rgo central e integrador das associaes de japoneses e sociedades culturais e outras entidades similares existentes em muitas localidades brasileiras. d) Aliana Cultural Brasil-Japo Alm da Sociedade Paulista de Cultura Japonesa, outra organizao teve origem na Comisso Colaboradora da Colnia Japonesa Pr-IV Centenrio. Foi a Aliana Cultural Brasil-Japo, de caractersticas diferentes da outra. Realizou-se a 16 de outubro de 1955, no Pavilho Japons construdo no Parque Ibirapuera e oferecido cidade de So Paulo pela colnia nikkei, a sesso de encerramento das atividades da Comisso Colaboradora. O representante oficial da Comisso do IV Centenrio expressou sua gratido colnia japonesa com a entrega de um ofcio de agradecimentos Comisso Colaboradora. No almoo comemorativo do evento, o jurista e

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professor Jos Stevenson opinou: "seria lamentvel que uma entidade que conseguiu realizar um trabalho to importante nas relaes de amizade entre o Brasil e o Japo fosse simplesmente dissolvida. No haveria possibilidade de organizar uma associao tipo 'Sociedade Amigos do Japo', a fim de promover o intercmbio cultural e de amizade entre os dois pases?" Essa manifestao deu origem fundao da Aliana Cultural Brasil-Japo. Por motivos diversos, os trabalhos preparatrios sofreram procrastinaes sucessivas. Em maro de 1956 ressurgiu a idia de se fundar uma organizao tipo Sociedade Amigos do Japo. Ela teve imediatamente o apoio do poeta Guilherme de Almeida, que presidira a Comisso do IV Centenrio, e do empresrio e fundador do Museu de Arte de So Paulo (MASP), Francisco Matarazzo Sobrinho. Organizou-se uma comisso preparatria da qual faziam parte figuras de niseis influentes como Joo Sussumu Hirata, Gervrio Inoue e Fbio Yassuda. O movimento contou com decidido apoio de lderes da colnia, como Kiyoshi Yamamoto, Kunito Miyasaka, Kenkiti Simomoto e outros. Com os bons ofcios do cnsul-geral Isono, realizou-se a reunio de fundadores de que resultou a Aliana Cultural Brasil-Japo (Nippaku Bunka Fukyukai), com a aprovao de seus estatutos. Como fundadores figuram Kiyoshi Yamamoto, Joo Sussumu Hirata, Amrico Sugai, Gervsio Tadashi Inoue, num total de 19 por parte da colnia, e do lado brasileiro 12 pessoas, entre elas Ccero Augusto e Mrio Botelho de Miranda. A sesso oficial de fundao da Aliana Cultural Brasil-Japo teve lugar no Pavilho Japons, no dia 17 de novembro de 1956. Nasce assim uma entidade destinada a promover o intercmbio e desenvolvimento cultural entre o Brasil e o Japo. Em resumo seus objetivos so: 1) Manter cursos de japons e portugus, literatura brasileira e nipnica e cursos relacionados com o intercmbio cultural entre os dois pases. 2) Organizar conferncias, grupos de estudos, reunies literrias, visando a difuso da cultura em geral. 3) Concesso de bolsas de estudos para a realizao de pesquisas tecnolgicas e cientficas no Brasil e no Japo. 4) Promover pesquisas culturais por brasileiros no Japo e por japoneses no Brasil e viagem de estudos e pesquisas destinadas a promoo do intercmbio cultural. 5) Proporcionar oportunidades a japoneses que visitam o Brasil de apreender a situao brasileira, sua cultura e seus usos e costumes. 6) Instalar bibliotecas, filmotecas e discotecas, e promover colees

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que contribuam para a entidade alcanar seus objetivos. 7) Procurar aproximao para estabelecer relaes de amizade entre ambas as partes, mediante entendimento espiritual entre estudantes universitrios brasileiros e nipnicos. No momento da fundao, a Aliana Cultural Brasil-Japo contava com 17 pessoas jurdicas e 450 pessoas fsicas no seu quadro social, num total de 467, sendo 70% pessoas no nikkei e apenas 30% nikkeis. No comeo as realizaes da Aliana foram relativamente modestas, evoluindo porm com firmeza. No primeiro ano abriu os cursos de lngua e cultura nipnicas, promoveu sesses oratrias, vesperal de msica japonesa, apresentao de danas japonesas, curso de cha-no-yu, noite de cinema japons, etc. No segundo ano (1958) lanou o rgo oficial Aliana Cultural BrasilJapo; instalou a biblioteca, o curso de portugus e o de ikebana; promoveu uma sesso musical em homenagem aos prncipes Mikasa no Teatro Municipal; fez apresentao de msica e danas japonesas para entidades culturais e beneficentes brasileiras; participou de exposies de bonecas, cermica, fotografia, etc. No terceiro ano comeou a publicao de livros didticos (oito volumes) para ensino do idioma nipnico/ financiada totalmente pela Editora Teikoku Shoin do Japo. Pela primeira vez editavam-se livros didticos de japons, no Brasil, por iniciativa de uma entidade local. A comisso encarregada da elaborao dos livros didticos dissolveu-se em agosto de 1964, aps concluir a publicao dos volumes. Instalou-se a Sociedade de Difuso de Ensino do Idioma Japons, com a finalidade de promover o ensino do idioma japons. O primeiro presidente da nova sociedade foi Kunito Miyasaka. Os esforos da Aliana acabam sendo reconhecidos pelo governo de Tokyo. No segundo ano de funcionamento recebeu subsdio de 54 mil cruzeiros, e no terceiro e quarto a importncia de 185 mil cruzeiros anuais. O primeiro presidente da Aliana Cultural Brasil-Japo foi o poeta Guilherme de Almeida. No segundo ano ascendeu presidncia o vice Kiyoshi Yamamoto. Contando com a participao de intelectuais nisei e jun-niseis nas suas principais atividades, ela conseguiu estabelecer fortes ligaes com elites brasileiras, abrindo caminho para o desenvolvimento das relaes entre o Brasil e o Japo. Organizacionalmente a Sociedade de Difuso da Lngua Japonesa pertencia Aliana Cultural Brasil-Japo, mas em junho de 1969 separouse com o nome de Sociedade Brasileira de Difuso da Lngua Japonesa. Nove anos depois, em 1978, ambas se uniram de novo, mantendo-se no entanto a denominao de Aliana Cultural Brasil-Japo (em japons o nome passou de Nippaku Bunka Fukyukai para Nippaku Bunka Renmei).

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Em 1963 a Universidade de S Paulo criou o curso de Lngua Japonesa, dentro do Departamento de Estudos Orientais. Professores do curso preconizaram a instalao de um instituto de estudos japoneses destinado a pesquisar e divulgar amplamente a cultura nipnica. O movimento resultou na implantao, em junho de 1969, do Instituto de Estudos Japoneses da USP, na rua Mrio Amaral, So Paulo. Foi nomeado seu diretor Teiiti Suzuki, que j lecionava idioma nipnico nessa universidade. e) Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo (Enkyo) Por volta de 1958, quando se comemorou o meio sculo da presena nipnica no Brasil, chegavam muitos imigrantes. Era a fase mais intensa do movimento emigratrio japons do ps-guerra, recebendo o Brasil quase 5 mil imigrantes/ ano. Em sua grande maioria, os imigrantes desembarcavam no porto de Santos. A inspeo sanitria era rigorosa e demorada, no raro levava dias, causando aborrecimentos e sofrimentos aos recm-chegados. Diante dessa situao, concretiza-se a idia de prestar assistncia aos imigrantes, oferecendo-lhes local de repouso e hospedagem. Quem teve a idia e promoveu sua concretizao foi Daisaku Osawa, ento diretor da filial da "Federao de Associaes Ultramarinas do Japo. Graas ao seu empenho foi adquirido o imvel que veio a ser a "Casa do Imigrante de Santos", que contou com subsdio fornecido pelo governo nipnico, ainda como parte das realizaes comemorativas do cinqentenrio. Apesar de a Casa do Imigrante de Santos pertencer Federao de Associaes Ultramarinas do Japo, Osawa decidiu entregar sua administrao e operao colnia. Para atender a essa condio, foi criada a Nihon Imin Engo Kyokai (Associao de Assistncia aos Imigrantes Japoneses), que posteriormente ser transformada na Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo (San Pauro Nippaku Engo Kyokai), mais conhecida pelo nome abreviado de Enkyo. A fundao data de janeiro de 1959 e o primeiro presidente foi Moriji nze. Nos primeiros tempos, a funo da Engo Kyokai era a de principalmente administrar e executar as atividades operacionais da Casa do Imigrante e receber imigrantes que chegavam ao porto de Santos. Logo a seguir passou a tratar dos servios de assistncia mdica e sanitria. Tratava-se de um servio idntico ao prestado comunidade pela extinta Dojinkai antes da guerra, acrescida de visita de mdicos ao interior para atender doentes. Os imigrantes do ps-guerra tal como seus predecessores do prguerra desejavam ser atendidos por mdicos compatriotas por causa

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do problema de comunicao. Por isso, a Engo Kyokai, por delegao da Federao de Associaes Ultramarinas, comeou a enviar mdicos ao interior em viagens de consulta e assistncia aos imigrantes. Yoshinobu Takeda, Shizuo Hosoe e Cho Kihara eram os mdicos que atendiam a esse servio, muito conhecidos por sua atuao dedicada comunidade. Com a posse de Gen-ichiro Nakazawa na presidncia, a Engo Kyokai, ou Enkyo, expande suas atividades em muitos ramos. Pode-se dividir esse perodo em duas fases: Primeira fase (1959-68). Corresponde ao tempo em que o movimento emigratrio japons do ps-guerra alcana seu auge. A principal tarefa da Enkyo era a assistncia aos imigrantes recm-chegados. A Administrao da Casa do Imigrante de Santos, visitas mdicas ao interior, instalao de ambulatrio mdico para atendimento a preo de custo e at o servio de emprego, transferido da Sociedade Paulista de Cultura Japonesa exigiam intenso trabalho. Devido ao grande nmero de imigrantes que chegavam, surgiram problemas de diversas naturezas. Jovem que abandonou o servio por ter brigado com o patro, famlia desempregada perambulando na rua por ter perdido o chefe, imigrante repatriado por sofrer das faculdades mentais, jovem desempregado que vaga pelo bairro da Liberdade, embriagando-se e provocando brigas, etc. Eram os imigrantes "fracassados", que passam a ocupar a ateno e tempo dos funcionrios da Enkyo. Em 1963, a Enkyo reconhecida como entidade de utilidade pblica pelo governo do Estado de So Paulo. E o governo nipnico concede uma subveno de 450 mil yens. Em 1968, o nmero de associados chega a cerca de 5 mil. E o Sanatrio Francisco Xavier, de Campos do Jordo, instalado antes da guerra, pela Dojinkai, tambm passa para a gesto da Enkyo. Segunda fase (1969-78). Com o acentuado declnio do movimento imigratrio procedente do Japo, diminui correspondentemente os problemas relacionados com os novos imigrantes. Em contrapartida, crescem assustadoramente problemas resultantes de envelhecimento dos imigrantes antigos. Nessa fase aparecem idosos solitrios e economicamente em precrias condies, velhos doentes, deficientes fsicos e doentes mentais, cuja assistncia e bem-estar se tornam os trabalhos mais prementes da organizao. A fim de solucionar esses problemas, a Enkyo instala, entre outros, os seguintes estabelecimentos de assistncia: Santos Kosei Home (Casa de Reabilitao Social de Santos), resultante da converso da antiga Casa do Imigrante de Santos. Asilo de idosos. Guarulhos Yasuragi Home (Centro de Reabilitao Social de Gua-

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rulhos) (doenas mentais). Reabilitao familiar e social, para a faixa etria acima de 18 anos. Suzano Ipelndia Home (Casa de Repouso Ipelndia de Suzano). Atende faixa etria acima de 60 anos. Ambulatrio Mdico, em So Paulo. Servio de assistncia mdica e odontolgica. Em 1972, a entidade mudou seu nome, de Nihon Imin Engo Kyokai (Sociedade de Assistncia aos Imigrantes Japoneses) para San Pauro Nippaku Engo Kyokai (Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo), continuando a usar o nome abreviado de Enkyo. Em 1973 foi reconhecida de utilidade pblica pelo governo federal, consolidando as bases para se tornar uma organizao assistencial destinada a contribuir para o bemestar da sociedade brasileira, e no apenas uma associao beneficente centrada na comunidade nikkei. A construo do moderno Hospital NipoBrasileiro constitui um passo importante dessa abertura. f) Associaes de provncia e Federao das Associaes de Provncias(*) Como organizaes peculiares da colnia nikkei do Brasil, citamos as kenjinkai (associaes de provncia). Cada kenjinkai formada por naturais de uma provncia. Os imigrantes de antes da guerra dispunham de um restrito crculo de relaes sociais. O nmero de imigrantes ainda era pequeno, por isso no havia associao de provncia contando com muitos scios. J existiam associaes kenjinkai, mas no passavam de restritos grupos de imigrantes originrios de uma provncia que se reuniam para confraternizao, sem objetivos mais ambiciosos. No ps-guerra, a situao sofre radical transformao. J vimos que no fim da conflagrao o Japo recebeu cerca de 6,3 milhes de repatriados procedentes de antigos territrios ultramarinos. Para solucionar o agudo problema de superpopulao o governo de Tokyo teve de recorrer emigrao. Ento foram organizadas as Associaes Ultramarinas razo de uma para cada provncia. Elas serviram como agentes executores da poltica emigratria do Japo. Torna-se necessria a organizao de associaes de provncias que funcionassem no recebimento dos imigrantes e informassem Associao Ultramarina de sua provncia

(*) Kenjin quer dizer natural de uma provncia ou provinciano, provincial. Kai associao ou sociedade. Logo kenjin-kai, ou kenjinkai, significa associaes de provincianos (naturais de provncias). Na prtica muitas dessas associaes usam nomes de "culturais", "culturais e esportivas", ou semelhantes. Por comodidade, aqui adotamos a denominao de associaes de provncias.

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sobre a situao no Brasil, e, quando necessrio, procurassem notcias de co-provincianos aqui residentes e envi-las a essa entidade ou seus parentes. A partir da segunda metade dos anos 50 organizam-se sucessivamente associaes correspondentes s provncias que contavam com emigrantes no Brasil. Era natural que elas mantivessem fortes ligaes com os governos das respectivas provncias. Existiam associaes que funcionavam como se fossem agentes do governo provincial respectivo. No comeo entregavam-se mais ao trabalho de acompanhar os imigrantes depois de sua chegada ao Brasil (verificar se tudo estava bem, tomar providncia em caso de alguma reclamao, ou ajudar na comunicao dos imigrantes com seus parentes na provncia natal). Todavia, com a reduo da corrente emigratria, j na dcada de 70 as funes dessas entidades so outras: enviar bolsistas (filhos de imigrantes) custeados ou subsidiados pelas provncias; organizar viagens de co-provincianos ao Japo; ciceronear visitantes do governo da provncia, das cidades, vilas e aldeias rurais; receber estudantes estagirios; publicar rgos oficiais ou livros comemorativos, etc. Existem diferenas entre elas, mas quase todas as associaes de provncias so subsidiadas pelos governos das respectivas provncias. Muitas possuem sede prpria; h diferenas quanto ao quadro social e suas atividades; na maioria so dirigidas por japoneses natos, os isscis. Temos de nos referir ainda Burajiru To Do Fu Kenjinkai Rengokai (Federao das Associaes de Provncias) (*), geralmente conhecida pelo nome abreviado de Kenren. Comeou a funcionar em abril de 1966, tendo como primeiro presidente Kumaki Nakao. Mas sua origem no est diretamente relacionada s kenjinkai. Tratava-se de uma organizao nascida como contraparte da Associao de Famlias de Emigrantes ao Ultramar do Japo (presidente Tatsuo Tanaka). Explicando melhor: era uma entidade que objetivava a defesa dos interesses e direitos de japoneses que haviam reemigrado para o Brasil depois de repatriados no fim da guerra. Japoneses que antes da guerra haviam emigrado para a Manchria, Monglia e outras regies da sia Oriental, e depois da guerra reemigraram, tinham o direito de receber um auxlio em dinheiro do governo nipnico. No entanto, os que reemigraram para o Brasil foram deixados
(*) Devido s caractersticas peculiares da diviso administrativa regional do Japo, temos, ao lado de Ken, outras unidades como To (metrpole, como a cidade de Tokyo); Fu (provncia especial, como as de Kyoto e Osaka); e Do, aplicada exclusivamente a Hokkaido, a ilha setentrional, uma das quatro principais que formam o arquiplago nipnico.

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de lado, no recebendo a ajuda a que tinham direito. Informado dessa realidade, Tatsuo Tanaka, presidente da Associao de Famlias de Emigrantes, requereu ao Ministrio da Previdncia do Japo o restabelecimento desse direito. Reconhecendo a justeza da reivindicao, o governo japons decidiu fazer um levantamento dos reemigrados com direito de perceber o auxlio, pedindo a criao de um rgo para proceder ao necessrio arrolamento. A colnia japonesa, que recebeu a solicitao atravs do consulado geral em So Paulo, organizou a Federao das Associaes de Provncias para realizar o levantamento dos conterrneos com esse direito e promover o processo de recebimento do valor estipulado. Ocorreram manifestaes contrrias organizao da Federao das Associaes de Provncias para essa finalidade. Mas no havia outra entidade para a incumbncia. A Kenren passou, ento, a funcionar como rgo central das Associaes de Provncias. Tratou, por exemplo, da viagem ao Japo dos primeiros imigrantes que chegaram ao Brasil, construo e manuteno do Cenotfio dos Imigrantes Pioneiros. Kumaki Nakao, o primeiro presidente da Kenren, organizou e pagou de seu bolso a viagem dos primeiros imigrantes ao Japo (uma homenagem aos pioneiros), durante cinco anos, num total de 83 pessoas. Era necessrio institucionalizar o processo, retirando-lhe o carter de ato de generosidade pessoal do dirigente da entidade. Assim, em 1972 o terceiro presidente, Shuichiro Wada, conseguiu, aps negociao com o governo nipnico, subveno integral das despesas de viagem dos primeiros imigrantes sua terra natal. Desde ento a viagem desses imigrantes feita todos os anos dentro da cota de 20 pessoas. Todas as despesas de transporte de ida e volta e mais a hospedagem de sete dias so pagas pelo governo japons. O sistema funciona desde 1973 at hoje. O Cenotfio resultou da constatao por Tatsuo Fujikawa, secretrio geral da Associao de Famlias de Emigrantes ao Ultramar, da existncia de numerosos tmulos de japoneses sem parentes no Brasil. Para que eles os mortos annimos no ficassem esquecidos, construiu-se o Cenotfio, cuja inaugurao se deu a 22 de agosto de 1975, com a presena do presidente da Associao de Famlias de Emigrantes, Tatsuo Tanaka, e do vice-primeiro-ministro Takeo Fukuda (que posteriormente ocupou o cargo de primeiro-ministro), vindos do Japo especialmente para essa finalidade. O Cenotfio de granito preto, tem um epitfio em japons, com a caligrafia do ento primeiro-ministro Kakuei Tanaka: Cenotfio em Homenagem Memria dos Desbravadores Falecidos. A peregrinao ao Cenotfio, que se realiza todos os anos no Dia do Imigrante (18 de junho), constitui parte dos rituais oficiais da colnia.

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g) Outras entidades nikkei e suas atividades Afora as conhecidas organizaes, como a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (Bunkyo), Beneficncia Nipo-Brasileira (Enkyo), Cmara de Comrcio e Indstria Japonesa do Brasil, etc, existem outras entidades em grande nmero, quase todas surgidas depois da guerra. 1) Entidades de confraternizao So as nossas conhecidas associaes de japoneses, chamadas muitas vezes de Sociedade Nipo-Brasileira de Cultura (Nippaku Bunka Kyokai), com o seu departamento feminino chamado de Sociedade de Senhoras (Fujinkai). So as mais numerosas. Suas denominaes variam muito. Em qualquer parte do Brasil onde haja residentes japoneses e nikkei existem associaes de nipnicos. O total dessas entidades ultrapassa 500. H casos em que tais organizaes se congregam em blocos regionais formando, por exemplo, a Federao de Sociedades Nipo-Brasileiras de Cultura de Mato Grosso do Sul, Federao Noroeste de Sociedades Nipo-Brasileiras de Cultura, Associao Nipo-Brasileira Pan-Amazonense, e assim por diante. A Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, conhecida pelo nome abreviado de Bunkyo, sediada em So Paulo, apresenta caractersticas de entidade central de todas essas agremiaes. Mas estruturalmente no constitui um sistema vertical, a Bunkyo no se posiciona no topo da pirmide. Quando necessria uma ao conjunta abrangendo grande nmero, ou todas as colnias.japonesas do pas, cabe Bunkyo tomar a iniciativa de solicitar a colaborao das entidades regionais. Em muitos casos sociedades de cultura regionais esto filiadas Bunkyo, como scias. Quanto s sociedades de cultura, embora de dimenses diferentes, seus objetivos so mais ou menos padronizados: confraternizao entre associados, ajuda mtua, atividades culturais, ensino de idioma japons aos descendentes, atividades esportivas, etc. Muitas dessas organizaes possuem sede prpria, oferecendo condies de se promover exposies, conferncias, manifestaes artsticas, festas de casamento, etc. At a dcada de 70, essas organizaes visavam quase exclusivamente a confraternizao e ajuda mtua entre os scios. Com a gradual diminuio de isseis, sua direo passa aos poucos para as mos de niseis, o que resulta em transformao do carter das entidades. Paulatinamente suas atividades ficam mais centralizadas em assuntos culturais e atividades esportivas, adquirindo caractersticas de clube. Todavia, atividades

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coletivas como undokai (reunies poliesportivas, com participao de todos, homens, mulheres, velhos e crianas e no s de esportistas), engeikai (festa ltero-musical, com apresentao de canto, dana, teatro amador, etc), Bon-odori (dana em homenagem aos mortos), introduzidas e desenvolvidas pelos isseis, no desaparecem. No caso do undokai, que atrai o interesse geral, no raro contam com a participao de no-nikkeis, e existem localidades onde esse tipo de festa popular japonesa est prosperando mais do que nos tempos idos. 2) Entidades beneficentes e assistenciais Alm da Beneficncia Nipo-Brasileira, j focalizada, existem no setor, entre outras, as seguintes organizaes: Assistncia Nipo-Brasileira da Amaznia (mantm o Hospital Amaznia); Assistncia Social Dom Jos Gaspar, mantm o asilo de idosos Jardim de Repouso So Francisco Xavier (Ikoi-no-Sono); Associao Pr-Excepcionais (Kodomo-no-Sono); Kibo-no-Ie (Sociedade Beneficente Casa da Esperana) asilo de excepcionais; Nihon Jizen Kyokai (Associao Beneficente do Japo) assistncia gratuita a pessoas carentes; Central Rojin Home, asilo para idosos; Ogata-home (Casa de Repouso Ogata) atende a pessoas carentes; Paran Rojin Fukushi Wajunkai, assistncia a idosos carentes; Sociedade Beneficente Humanista, d assistncia s vtimas do mal de Hansen. Esses servios de assistncia e beneficncia so mantidos por entidades religiosas, por organizaes civis ou por particulares. Todas foram criadas para atender os necessitados, de modo que suas atividades so altamente meritrias. Contudo, quase todas enfrentam um srio e crnico problema: a falta de recursos financeiros. Como solucion-lo, a chave do seu futuro. 3) Entidades educacionais e culturais Nesta rea, afora a Aliana Cultural Brasil-Japo, j mencionada, existem escolas de lngua japonesa mantidas por sociedades de cultura japonesa das diferentes regies, e escolas administradas por outras entidades e por particulares. Todas essas organizaes e pessoas fsicas se achavam congregadas na Burajiru Nihongo Gakko Rengokai (Federao das Escolas de Lngua Japonesa). Essa organizao comeou suas atividades em 1954 e ocupou posio destacada no ps-guerra na rea do ensino do idioma nipnico, realizando cursos de professores de japons, divulgao dos resultados escolares dos alunos, envio de misso de amizade de meninos e meninas ao Japo, etc. Com 150 escolas filiadas e mais 150 scios pessoas fsicas, constitua uma grande entidade educacional. Posteriormente se funde com outras

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organizaes do ramo para constituir o Centro de Estudos de Lngua Japonesa (Nihongo Fukyu Center). Alm dessas entidades existem outras, no setor de ensino e de cultura, entre as quais: So Paulo Gakuseikai (Sociedade Amigos dos Estudantes de So Paulo) mantm a Casa de Estudantes Harmonia, construda em Rudge Ramos, municpio de So Bernardo do Campo, para alojar estudantes colegiais e universitrios. A Casa de Estudantes Harmonia no se limita a hospedar estudantes: ensina japons e ingls e faz treinamento de disciplina de grupo. Associao Cultural e Esportiva Piratininga, fundada por estudantes e intelectuais niseis, promove atividades culturais, alm de esportivas, sociais e assistenciais. Nihon Ryugakuseikai Associao de Ex-Estagirios no Japo. Prepara os candidatos a estgio no Japo a fim de que possam aproveitar melhor seus estudos nesse pas. Centro de Estudos Nipo-Brasileiros (San Pauro Jinmon Kagaku Kenkyusho). Sua origem foi um grupo de intelectuais nipnicos preocupados com os problemas surgidos no ps-guerra na comunidade, que se reuniam para discutir temas adrede escolhidos. Assim, em 1948 formou-se, com apoio de empresrios esclarecidos, a Sociedade de Estudos Nipo-Brasileiros de So Paulo. Promove ampla gama de estudos e pesquisas tendo como temas centrais a histria e a sociedade brasileiras e a comunidade nipnica do Brasil. Em 1965 mudou seu nome para Centro de Estudos Nipo-Brasileiros. J publicou um bom nmero de trabalhos em portugus e japons. Abeta (Associao Brasileira de Estudos Tcnicos de Agricultura). Destina-se a contribuir para o aperfeioamento tcnico do setor agropecurio do Brasil. A partir de 1965 atribui o Prmio Kiyoshi Yamamoto a tcnicos e produtores que tenham se destacado em pesquisas e prticas destinadas a elevar o nvel tcnico da agricultura do pas. Associao Pr-Colaborao Internacional de Agricultura do Brasil (Kokusai Noyukai). Organizada pelas duas maiores cooperativas agrcolas do pas, Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central e a Cooperativa Central Sul-Brasil, visa preparar estagirios da zona rural que vo se aperfeioar no Japo, Estados Unidos e outros pases de agricultura adiantada. Objetivo: formar lideranas rurais do setor agrcola.

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4) Entidades de amadores das artes em geral(*), artes cnicas, diverses e hobbies um campo vasto e frtil. Existe a Federao Nipo-Brasileira de Belas Artes, Sociedade de Artistas e Artes Aplicadas, Sociedade NipoBrasileira de Msica, Sociedade Paulista de Orqudeas, Sociedade de Haijin do Brasil, Clube de Fotografia da Liberdade, etc. Existem grupos artsticos que contam com a participao de brasileiros no nikkei. Todavia, as entidades mais numerosas so aquelas que atuam quase somente dentro da comunidade nikkei: arte culinria (hoje se difunde no meio brasileiro), go, shogi, teatro, canes populares, rkyoku, declamao de poesia, danas, msica, cha-no-yu, yokyoku, ikebana, haiku, senryu, tanka, etc. Algumas artes, como o haiku (mais conhecido como haicai entre brasileiros), a arte culinria japonesa, o ikebana, por sua internacionalidade possuem horizontes mais amplos, onde podero se desenvolver. No geral, entretanto, so pobres nessa qualidade, de modo que, com o desaparecimento de orientadores e lderes isseis e afeioados da arte, tendem a fenecer em pouco tempo. Acresce que entre essas organizaes existem disputas entre grupos e escolas, havendo mais de uma entidade em torno de uma mesma arte. 5) Organizaes esportivas Aqui igualmente temos uma relao imensa de organizaes: Associao At a Vista, Federao de Japoneses de Tnis de Mesa do Brasil, Federao Brasileira de Tnis, Federao Brasileira de Kend, Federao Paulista de Beisebol, Federao Paulista de Jud, Federao Brasileira de Sumo, Sociedade de Karat, Filial da Amrica do Sul de Aikid Inter-nacional. Na comunidade nipnica de outrora, os ases do esporte eram o atletismo e o beisebol, ambos com tendncia decadncia desde os anos 70. Entre os clubes desportivos nikkei destacam-se o Nippon Country Club, o Clube Nikkei Anhangera e outros. Recentemente prosperam clubes esportivos organizados por funcionrios de empresas multinacionais nipnicas aqui estabelecidas. Entre os clubes de golfe criados depois da guerra figuram Aruj Golfe Clube, P.L. Golfe Clube, que contam entre seus membros funcionrios de empresas nipnicas multinacionais e nikkeis locais. 6) Entidades de grupos profissionais Nesta rea podemos citar a Associao Paulista de Tintureiros, Associao de Feirantes e Sociedade de Avicultura. Temos ainda a Burajiru Sogo Kyokai (Sociedade de Assistncia Mtua do Brasil), que
(*) Neste item figuram algumas artes tpicas japonesas, s entendidas e apreciadas por iniciados.

NASCE UMA ENTIDADE DE INTEGRAO DA COLNIA NIKKEI 415

atende a consultas jurdicas de empresas e pessoas fsicas, e a Associao de Comrcio e Indstria da Liberdade, que congrega casas comerciais japonesas do bairro. So organizaes que tm como principais objetivos a confraternizao entre elementos do mesmo grupo e a defesa de seus interesses. Verifica-se tendncia de declnio dessas entidades devido ascenso da gerao de niseis e sanseis que atuam em espaos cada vez maiores. 7) Entidades de assistncia mtua e confraternizao O prottipo deste grupo de entidades a kenjinkai, j descrita. Existem alguns grupos especiais como a Cotia Seinen Renraku Kyogikai (Associao de Imigrantes Jovens da Cotia), reunindo jovens imigrantes trazidos pela Cooperativa Agrcola de Cotia no ps-guerra; Associao de Imigrantes Industriais do Brasil; Associao Juvenil de Desenvolvimento Industrial, etc. H ainda grupos que renem elementos vindos ao Brasil no mesmo navio; idem de naturais de mesma aldeia; dos que freqentaram a mesma escola (colgio, universidade), e outros. Todos objetivam a aproximao e confraternizao dos membros do grupo, havendo porm excees como a Associao de Jovens Imigrantes da Cotia, que tem como finalidade a realizao conjunta de empreendimentos empresariais, educao e treinamento de filhos, etc. Outro agrupamento diferente a Burajiru Nodaikai (Associao de Ex-Alunos da Faculdade de Agronomia de Tokyo), pessoa jurdica devidamente registrada e que no se limita a promover reunies de colegas de escola. Tem sede prpria, realiza pesquisas de tcnicas agrcolas e cuida da formao de sucessores na rea. Conforme se pode verificar pela sucinta exposio, a quase totalidade das entidades da colnia nikkei atua dentro da prpria comunidade. Ser interessante especular de que forma elas evoluiro daqui para frente. Em poucas palavras poder-se- dizer que aquelas que possuem caractersticas de universalidade, isto , que possam se adaptar e integrar sociedade brasileira, sobrevivero. Alm das entidades citadas existem as sociedades religiosas que vieram do Japo. No entanto, elas no podem ser consideradas ao lado das demais, porque no surgiram espontaneamente dentro da comunidade. As entidades religiosas de origem japonesa so tratadas no final deste volume. (Tetsuo Nakasumi/ Jos Yamashiro)

416 PERODO DO PS-GUERRA BIBLIOGRAFIA Guia da Cultura Japonesa em So Paulo. Aliana Cultural Brasil-Japo, 1989. Handa, Tomoo Burajiru Nikon Imin-shi Nenpyo (Cronologia da Histria da Imigrao Japonesa no Brasil). Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, 1976.

CAPITULO 6

O FIM DA ERA DE IMIGRAO E A CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI


1. DA IMIGRAO AO INTERCMBIO INTERNACIONAL 2. RADICAIS TRANSFORMAES NA COLNIA NIKKEI 3. CRESCE O INTERESSE PELA CULTURA JAPONESA 4. A VOLTA PTRIA DE IMIGRANTES E O FENMENO DEKASEGI 5. O PAPEL DESEMPENHADO PELOS JORNAIS NIKKEI

1. DA IMIGRAO AO INTERCMBIO INTERNACIONAL

a) O fim da JAMIC e da JEMIS

OS dias 17 e 18 de dezembro de 1979 realizou-se em Braslia a 13.a reunio da Comisso Mista Brasil-Japo de Imigrao para discutir problemas relacionados com a imigrao. Tratava-se de uma reunio de rotina. Nessa sesso, a delegao brasileira apresentou uma declarao do seguinte teor, para espanto da representao japonesa: "As atividades da JAMIC Imigrao e Colonizao Ltda. e da JEMIS Assistncia Financeira S.A. constituem infrao ao Cdigo Civil Brasileiro, razo por que desejamos sejam elas imediatamente suspensas e as duas empresas fechadas". Como vimos no captulo anterior, a Comisso Mista de Imigrao foi estabelecida pelo Acordo de Imigrao firmado entre o Japo e o Brasil, tendo realizado reunies anuais desde 1966 (2.a reunio) e nunca o problema da existncia da JAMIC e da JEMIS foi questionado. Resumindo os argumentos da representao brasileira: "A fim de atender s transformaes da economia e da situao social e o acelerado aumento da populao do pas, pretendemos considerar para o futuro a imigrao com nfase no capital e na tecnologia. Para isso, desejamos reexaminar o Acordo de Imigrao assinado entre o Brasil

418 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

e o Japo, reformulando toda a poltica imigratria. A JAMIC e a JEMIS so rgos fundados e administrados pelo governo nipnico, e sua prpria existncia constitui uma ilegalidade, face ao nosso Cdigo Civil, no sendo possvel autorizar a sua continuidade". O sentido do pargrafo 2, Artigo 11 do Cdigo Civil citado pela representao brasileira, o seguinte: "Governos e rgos de governo estrangeiros ou instalaes administradas por governo estrangeiro ou ainda rgos com caractersticas oficiais de governo estrangeiro esto impedidos de adquirir imveis e instalaes passveis de desapropriao pelo governo brasileiro". O governo brasileiro manifestava assim claramente a sua posio oficial na reunio da Comisso Mista, apontando o fato de que as duas pessoas jurdicas, JAMIC e JEMIS, estavam ferindo dispositivo do Cdigo Civil brasileiro. A delegao nipnica no tinha argumento para contestar. Foi obrigada a aceitar a proposta brasileira. Na poca a autorizao de funcionamento das duas entidades jurdicas, JAMIC e JEMIS, era renovada anualmente pelo Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria INCRA. At ento podia haver atraso, mas jamais a autorizao foi negada. A apresentao da questo Comisso Mista, depois de 23 anos desde a organizao das duas entidades, pode ser atribuda s duas causas seguintes. Primeiro, o regime militar brasileiro se aproximava do fim, antevendo-se a prxima democratizao e implantao de governo civil, no qual o Congresso exerceria poder muito grande. E, nesse caso, existia a possibilidade de partidos de oposio denunciarem casos de ilegalidade luz da legislao nacional. Era, pois, necessrio cortar o mal desde j, a fim de se prevenir contra essa possibilidade. Outra causa pode ser atribuda transferncia de matriz da JAMIC e da JEMIS da Organizao de Empresas de Emigrao para a Kokusai Kyoryoku Jigyo-dan, mais conhecida pela denominao inglesa Japan International Cooperation Agency JICA. Atribuindo Organizao de Empresas de Emigrao a administrao da JAMIC e da JEMIS, poderia ser facilmente explicada s autoridades brasileiras que ela tinha justamente a finalidade de fixar, ajudar a independncia e financiar com o capital necessrio as atividades agrcolas dos imigrantes, tudo como parte dos servios de assistncia imigrao. Entretanto, no havia como explicar a transferncia desses servios a uma entidade como a JICA, rgo do governo japons cujas atribuies compreendiam uma ampla gama de funes. Todavia, a questo da legalidade da JAMIC e JEMIS em face da legislao brasileira j havia sido comentada por parte de alguns elementos ligados imigrao. Era natural que se suspeitasse de empresas que,

DA IMIGRAO AO INTERCMBIO INTERNACIONAL 419

sem ser bancos, com capital 100% fornecido pelo governo nipnico, tinham competncia de (sem nenhuma relao com as leis bancrias e financeiras ou qualquer outra legislao nacional) fornecer financiamento a imigrantes japoneses no Brasil, formar ij-chi (ncleos coloniais) e vender lotes aos imigrantes, estabelecendo normas prprias de resgate, juros, etc. As autoridades brasileiras haviam percebido essa irregularidade, porm adotaram a orientao de autorizao tcita. E as duas empresas em questo limitavam-se a atuar exclusivamente junto aos imigrantes nipnicos, sem manter qualquer relacionamento direto com brasileiros. Sua atuao favorecia o desenvolvimento econmico do pas, no apresentando nenhum fator negativo ou prejudicial, razo por que no se denunciava sua ilegalidade. Depois da representao da delegao brasileira propondo a cessao das atividades da JAMIC e da JEMIS, mais precisamente de 1979 a 1980, as condies para a introduo de imigrantes no Brasil se tornaram cada vez mais severas. Nessa fase o Departamento de Imigrao do Ministrio do Trabalho recusou, aps examinar a qualificao dos interessados, 14 pedidos de entrada de imigrantes tecnoindustriais apresentados pelo governo japons, alegando no preencherem as condies necessrias. At ento, apesar do rigor das condies do exame de qualificao do imigrante, nunca havia sido negado um pedido. Muito embora a causa direta fosse o aumento do desemprego em conseqncia da recesso na economia brasileira, o fato importante que se verificou profunda mudana na tradicional poltica imigratria do pas. Ficava claro que o Brasil j no constitua um pas imigrantista. Depois desses acontecimentos, a 29 de setembro de 1981, a JAMIC Imigrao e Colonizao Ltda. e a JEMIS Associao Financeira S. A. encerraram suas atividades. Contados desde o tempo da Federao das Associaes Ultramarinas e da Organizao de Fomento de Emigrao, havia transcorrido um quarto de sculo. Caa a cortina pela ltima vez sobre entidades de emigrao do governo japons que haviam apoiado e sustentado os emigrantes do ps-guerra para o Brasil. b) Formao de rgos receptores e a Notakukyo A reduo do nmero de imigrantes casa de dois dgitos no representava naturalmente a cessao completa do movimento imigratrio. Por isso continuavam indispensveis os rgos encarregados de seu recebimento. E continuavam necessrios servios de apoio aos novos imigrantes e aos seus filhos no tocante educao e ajuda sua independncia econmica, assistncia mdico-hospitalar, etc. Todos esses

420 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

servios estavam anteriormente a cargo da JAMIC e da JEMIS. Tornavase portanto necessrio criar rgos sucessores dessas entidades. Sobre a transferncia dos servios da JAMIC e da JEMIS, j estava em marcha um entendimento com entidades da colnia a eles relacionadas. Ficou decidido que os servios da rea de recebimento dos imigrantes seriam transferidos para a Cooperativa Central Agrcola e de Colonizao do Estado de So Paulo, conhecida pelo nome simplificado de Notakukyo na comunidade; o Banco Amrica do Sul se encarregaria dos servios de financiamento no lugar da antiga JEMIS. Regionalmente houve a seguinte diviso de servios: Sociedade Nipo-Brasileira da Amaznia Ocidental (sede em Manaus, sade e educao); Beneficncia Nipo-Brasileira da Amaznia (Belm, assistncia mdica); Sociedade Nipo-Brasileira Pan-Amazonense (Belm, educao); Sociedade Recifense de Cultura Japonesa (Recife, educao); Sociedade Nipo-Brasileira de Cultura de Salvador (educao); Federao Cultural e Esportiva do Rio de Janeiro (educao); Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo (sade); Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (So Paulo, educao); Sociedade Sul-Brasil de Cultura e Assistncia (Porto Alegre, assistncia mdica, educao). A Notakukyo (Cooperativa Central Agrcola e de Colonizao), que sucedeu JAMIC no servio de recebimento de imigrantes, havia sido criada em 1971, originariamente pelo Ministrio da Construo do Japo, para o servio de recepo dos jovens imigrantes de desenvolvimento tecnoindustrial. Com o fechamento do Centro de Treinamento de Jovens em 1967, a entidade, sem uma funo efetiva, ficou numa situao de hibernao por tempo indeterminado. Mas com o desaparecimento da JAMIC, a Notakukyo ressuscita e reabre suas portas. Em estreita cooperao com a Federao de Cooperativas de Colonizao do Japo (chamada abreviadamente de Zentakuren) ela se reorganiza para atuar na chamada de imigrantes e servios necessrios ao seu recebimento no Brasil. Na parte financeira recebe subsdios da JICA. Todavia, com o nmero reduzidssimo de imigrantes, o volume de servio de sua recepo estava reduzido ao mnimo. Por isso no foi possvel reativar as atividades da Notakukyo, reaberta depois de um perodo de hibernao. Diante dessa realidade, a Notakukyo se associa JICA e planeja novos empreendimentos de colonizao com aproveitamento de capital fornecido por essa organizao. Temos ento o chamado Projeto Notakukyo concretizado em fevereiro de 1986. Na prtica o projeto funciona assim: a JICA financia o plano elaborado pela Notakukyo a fim de realizar os projetos elaborados pelas cooperativas filiadas Notakukyo ou por particulares.

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O projeto n. 1 foi a formao de ncleos de produtores no municpio de Mucuri, BA, pela Cooperativa Central Sul-Brasil. Ingressaram no ncleo de produo dez famlias de imigrantes do ps-guerra. O segundo coube Cooperativa Agrcola de Cotia: o Projeto Teixeira de Freitas n. 2, igualmente na Bahia. Esses projetos da Notakukyo caracterizam-se pelo fato de limitar os colonos a imigrantes do ps-guerra e seus filhos, e por constiturem uma continuao dos empreendimentos colonizadores da antiga JAMIC. c) Mudana no conceito de imigrao Depois do fechamento da JAMIC e da JEMIS, avana a liquidao dos bens da primeira. Em janeiro de 1984, o Centro de Imigrao TecnoIndustrial existente no Parque Novo Mundo, So Paulo, passa para a Beneficncia Nipo-Brasileira; em abril do mesmo ano, o Centro de Imigrantes Agricultores vendido para a CAC. As instalaes, equipamentos, reas de lazer, etc. das colnias diretamente administradas pela JAMIC so paulatinamente cedidos gratuitamente ou mediante pagamento de um preo acordado entre as partes, para as associaes de japoneses das diversas localidades (ij-chi). Outrossim, a Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo, que recebeu o Centro de Imigrao Tecno-Industrial, resolveu construir ali o Hospital Nipo-Brasileiro. O hospital foi concludo em 1988, aniversrio dos 80 anos da imigrao japonesa no Brasil, e comeou a funcionar no mesmo ano. Com o fechamento da JAMIC e da JEMIS, a JICA desistiu completamente de tratar dos servios diretos de imigrao. Ento a Kogyo Ijusha Kyokai (Associao dos Imigrantes Tecno-Industriais do Brasil), que trata especificamente da imigrao de tcnicos industriais, obtm em 1985 autorizao do Departamento de Imigrao do Ministrio do Trabalho como entidade de recebimento de imigrantes, e a Notakukyo se encarregam dos servios ligados ao recebimento dos imigrantes. Independentemente do sistema de imigrao anterior, a JICA organiza o sistema de emigrao de jovens para o desenvolvimento no almmar. Essa organizao comea a operar em fevereiro de 1986, com a chegada ao Brasil do primeiro grupo de jovens. Este sistema estimula empresas japonesas aqui estabelecidas a receber jovens imigrantes do programa Jovens para o Desenvolvimento. A profisso dos jovens variada: agricultura, indstria manufatureira ou comrcio. A JICA rene os pedidos dos interessados e os envia ao Japo, onde a matriz da entidade faz o recrutamento e a seleo segundo a profisso, e envia os aprovados para o Brasil. No se trata de imigrante para permanecer definitivamente no Brasil, mas pelo prazo de trs anos

422 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

de treinamento. No caso de lavrador, porm, ele tem a vantagem de poder fixar residncia permanente no pas. Os demais retornam ao Japo aps o trmino do prazo contratual. Ento podem optar: ficar no Japo ou emigrar de novo para o Brasil. Parece tratar-se de uma imigrao experimental. Todavia, mais fcil compreender essa forma de imigrao, se a considerarmos como um exemplo de internacionalizao de emprego. Outra entidade, a Associao de Intercmbio Brasil-Japo adota o sistema de estagirios, lanado em 1981 com apoio do Gaimusho, o Ministrio do Exterior japons. O sistema popular entre jovens japoneses, aumentando a cada ano o nmero de jovens estudantes selecionados que permanecem um ano no Brasil. Trabalham e estudam cada qual em sua especialidade em empresas ou organizaes diversas. O objetivo principal da entidade formar elementos capazes, no futuro, de estreitar as relaes entre o Brasil e o Japo, por meio de aprofundamento do conhecimento recproco. A Associao de Intercmbio Brasil-Japo envia estudantes brasileiros para rpido estgio (30 dias) no Japo. Pretende no futuro ampliar o prazo de estgio para um ano. Pelo exposto, percebe-se que, dentro da onda de internacionalizao que avana em todo o mundo, j no possvel o deslocamento de homens entre naes, sob as noes antigas de imigrao. Entramos numa nova era. A emigrao nipnica para o Brasil no ps-guerra, at o dia em que os imigrantes deixaram de viajar de navio nos famosos marus , no diferia substancialmente daquela do pr-guerra. Entretanto, depois da viagem do Brasil-Maru, que chegou a Santos em janeiro de 1973, e do Nippon-Maru, em maro do mesmo ano, como ltimos navios de transporte de imigrantes, toda a questo imigratria mudou de figura. No s o meio de transporte passou de navio para avio; a prpria natureza da imigrao se modifica. Em especial quando, na dcada de 80, o Japo apresenta uma extraordinria prosperidade econmica e conseqente aumento de prestgio internacional, os termos imigrao e colonizao, entendidos segundo a noo tradicional, tornam-se palavras mortas. Isto , transferir a residncia para o exterior quer dizer agora um deslocamento do homem promovido espontaneamente, por vontade prpria do cidado, a fim de trabalhar ou gozar a vida em outras plagas. Com ou sem presso de fatores econmicos ou sociais ou outros quaisquer. Trata-se de um movimento de homens em mbito internacional. Ou de movimento internacional de homens. Um fenmeno de internacionalizao.

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Essa tendncia se torna mais clara, se considerarmos o fenmeno da volta ptria de imigrantes e dos dekasegi de niseis e sanseis, que tambm podem ser includos como parte da corrente de internacionalizao observada neste final de sculo. Pode-se prever que a forma de deslocamento ou movimentao do homem se tornar cada vez mais complexa. d) Mudana da populao nikkei e sua rea de residncia No obstante haver alguma diferena segundo a fonte, o nmero oficial de imigrantes nipnicos que entraram no Brasil antes da II Grande Guerra de 196.737 pessoas. Depois da guerra, at 1988, ano do 80. aniversrio da imigrao, 53.555 japoneses emigraram para o Brasil. Nem todos os imigrantes aqui permaneceram. Mesmo no perodo pr-guerra, na fase de 1937 a 41, quando se intensificou o movimento antijapons, cresceu o nmero dos que se repatriavam. Merece registro especial o ano de 1939, quando, para o ingresso de 1.546 imigrantes, saram 2.011, superando as entradas. Tambm no ps-guerra, a partir de 1970 aproximadamente, aumenta o nmero dos que retornam ao Japo, e depois de 1985, quando comea a crescer o movimento dekasegi, nmero considervel de isseis repatriamse. Como impossvel conhecer o nmero exato de imigrantes repatriados que permanecem definitivamente no Japo, no se tem dados certos sobre quantos imigrantes do ps-guerra se fixaram para sempre no Brasil e quantos retornaram de modo definitivo para o pas de origem. Entre os dados estatsticos da colnia do perodo posterior guerra, os mais confiveis so os nmeros apurados na Pesquisa da Situao Real da Colnia, lanada por ocasio das comemoraes do cinqentenrio da imigrao nipnica no Brasil (1958). A primeira tabela dessa pesquisa trata da distribuio da populao nikkei por Estados. Quadro 1 DISTRIBUIO DA POPULAO NIKKEI POR ESTADOS
So Paulo Paran Mato Grosso Rio/Guanabara Par/Amazonas Minas Gerais Gois Outros Ignorado Total 325.520 78.097 8.886 5.803 5.227 2.878 1.793 1.765 166 430.135 75,68% 18,16% 2,06% 1,35% 1,21% 0,67% 0,42% 0,41% 0,00% 100,00%

Fonte: Recenseamento da Colnia Japonesa, 1958.

424

FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

Quadro 2 - NMERO DE IMIGRANTES DO PS-GUERRA, SEGUNDO SUA CATEGORIA


Ano/Categoria Lavoura Tcnicos Comrcio c outros Vindos por chamadas nominais 14.124 8.406 Total

1952-59 1960-69 1970-79 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988. Total

16.191 8.191 1.564

251
1.365 3.377

67 80 13 58 44 19' 31 23 25
26.424

58 32 16 5 0 0 0 0 1
3.105

44 539 41 7 4 0 0 1 4 0 0 0

628 56 45 32 21 15 22 20 17 0
23.386

30.610 18.619 3.610

188 161 61 84 60 45 51 40 26
53.555

640

Fonte: Estatstica de Emigrao Ultramarina. JICA.

Como antes da guerra quase todos os imigrantes japoneses ingressaram no Estado de So Paulo, mesmo em 1958 havia concentrao da populao nipnica nesse Estado. O deslocamento posteriormente observado apresentava duas correntes principais: a de lavradores que deixavam a agricultura do interior e se dirigiam cidade de So Paulo ou aos seus subrbios; e a dos que se deslocavam na direo dos estados vizinhos do Paran, Mato Grosso, Minas Gerais, Gois, etc. O norte do Paran merece registro especial. Graas construo da estrada de ferro ligando Ourinhos (SP) a Maring (PR), e ao incio da venda de loteamentos quase simultaneamente, muitos nikkei de So Paulo adquiriram terras e as colonizaram. Para lembrete: a populao nikkei da capital paulista em 1958 somava cerca de 70 mil ou 16,27% da populao nikkei total. Temos a seguir dois quadros relativos situao demogrfica dos nikkeis. O quadro 3 foi resultado de uma pesquisa promovida em 1977 pela JICA (Agncia de Cooperao Internacional do Japo); o quadro 4, pelo Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, em 1988.

DA IMIGRAO AO INTERCMBIO INTERNACIONAL 425 Quadro 3 PESQUISA DA POPULAO NIKKEI, SEGUNDO REAS DE JURISDIO DAS REPRESENTAES DIPLOMTICAS JAPONESAS (EM 1. DE OUTUBRO DE 1977) Longa permanncia(*) Populao Nikkei Nacionalidade japonesa Isseis naturalizados, niseis e sanseis 627.466 5.700 604.440 4.408 2.189 8.527 1.116 1.086 765.710 8.700 727.605 8.028 4.542 12.366 2.443 2.026 Total

Todo o Brasil Braslia So Paulo Belm Porto Alegre Rio de Janeiro Recife Manaus

7.102 62 4.555 171 106 1.809 382 117

138.244 3.000 123.165 3.620 2.353 3.839 1.327 940

(*) Refere-se aos funcionrios de empresas japonesas estabelecidas no Brasil que, regra geral, permanecem alguns anos, depois retornam matriz. (Pesquisa da JICA, 1. de outubro de 1977.)

Quadro 4 POPULAO POR REGIO SEGUNDO O SEXO Regio Norte Nordeste Cidade de So Paulo Grande So Paulo(*) Estado de So Paulo(**) RJ, ES e MG Total Sudeste Regio Sul Centro-Oeste Total Geral Masculina 18.000 11.000 163.000 90.000 204.000 39.000 496.000 72.000 28.000 625.000 % 1,4 0,9 13,3 7,3 16,6 3,2 40,4 5,8 2,3 50,9 Feminina 15.000 17.000 159.000 78.000 187.000 48.000 472.000 71.000 19.000 595.000 % 1,2 1,4 13,0 5,4 15,2 3,8 38,5 5,8 1,5 48,5 Total 33.000 28.000 326.000 170.000 391.000 87.000 968.000 143.000 49.000 1.228.000 % 2,7 23 26,5 13,8 31,8 7,1 79,2 11,6 4,0 99,8

(*) Exclusive cidade de So Paulo. (**) Exclusive cidade de So Paulo e Grande So Paulo. Pesquisa realizada em junho de 1988 pelo Centro de Estudos Nipo-Brasileiros.

Podemos combinar o Quadro 1 com o 4 para comparar a populao nikkei de 1958 e 1988 (Quadro 5).

426 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

Quadro 5 COMPARAO DA POPULAO NIKKEI DE 1958 E 1988 (SEGUNDO REGIES)


Regio Norte Nordeste Cidade de So Paulo Grande So Paulo Estado de So Paulo RJ, ES e MG Total Sudeste Sul Centro-Oeste Total Geral 2958 % 2988 33.000 28.000 326.000 170.000 391.000 87.000 974.000 143.000 49.000 1.228.000 % 2,7 2,3 26,5 13,8 31,8 7,1 79,3 11,6 4,8 99,8

1,27 5.488 1.765 0,41 70.000 16,27 50.000 11,63 205.520 47,78 2,06 8.847 334.367 77,74 79.091 18,39 2,48 10.679 430.135 100,00

Verifica-se por este quadro a seguinte evoluo na situao demogrfica dos nikkeis do Brasil: 1) Maior concentrao na regio da Grande So Paulo. 2) Reduo da populao rural nos estados de So Paulo e Paran. 3) Aumento da populao nikkei nas regies Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Estado de Minas Gerais. e) Nova forma de agricultura nikkei Da segunda metade dos anos 70 em diante, acelera-se o movimento de migrao interna de elementos nikkei para o sul de Minas, estados da Bahia, Gois, norte de Mato Grosso, Rondnia. No mais como os antigos imigrantes, que avanavam e enfrentavam a mata virgem sem nenhum capital ou mesmo conhecimento tcnico. Agora possuam suficientes conhecimentos e experincias, dispunham de novas tcnicas e de mecanizao moderna, do apoio financeiro de rgos oficiais do Japo e do Brasil e de forte apoio das cooperativas agrcolas nikkeis. E uma forma completamente diferente de desbravar a terra, uma nova agricultura. O modelo tradicional da agricultura brasileira, mesmo at a metade do nosso sculo, era a monocultura, da maior simplicidade. Haviaento grandes plantaes (plantations) de cana-de-acar ou caf e a pecuria, que consistia em criar o gado soltando-o em imensas reas de terras. Agricultura de plantation soa como agricultura moderna; na prtica no passava de lavoura predatria. Derrubava-se a mata virgem de solo frtil e procedia-se queimada para depois semear ou plantar. A cultura ficava a cargo de trabalhadores pouco ou nada instrudos. Com a prtica

DA IMIGRAO AO INTERCMBIO INTERNACIONAL 427

predatria a terra se esgotava, perdia sua fertilidade. Ento abandonavase a terra cansada, procurava-se outra, repetindo-se a operao derrubad a / queimada/ semeadura. Embora em escala menor, os ndios j praticavam esse tipo de cultura nas suas plantaes de mandioca, por exemplo. Praticava-se tambm agricultura predatria no interior paulista, onde foram introduzidos os imigrantes nipnicos. E mesmo presentemente o mtodo empregado na vasta regio amaznica, motivo de crtica por parte dos ecologistas, porque ele destri o ambiente natural. No entanto, durante sculos, no Brasil era essa a agricultura que predominava. Os imigrantes japoneses igualmente praticavam a lavoura predatria, como j vimos em outra parte. Com o passar do tempo, foram mudando de orientao, principalmente quando comearam a pensar em sua radicao no pas, abandonando o esprito dekasegi dos primeiros tempos. E a crtica de lavrador predatrio foi sendo paulatinamente substituda pelo reconhecimento do verdadeiro valor do homem do campo nipnico, cuja operosidade e cuidados com a terra uma antiga tradio em sua ptria foram consolidando sua posio de destaque. Outra causa que conduziu melhoria maior da reputao do lavrador nikkei foi o aproveitamento do cerrado (at ento tido como terra imprestvel para a agricultura) para a produo agropecuria. O cerrado campina tropical correspondente savana. No Brasil encontra-se amplamente espalhado, na Amaznia, no Nordeste, no Planalto Central e um pouco no Sul-Sudeste. Caracteriza-se por uma vegetao de arbustos retorcidos, de casca grossa, sobre uma terra coberta de gramneas. Solo arenoso e pobre. Encontra-se principalmente nos estados de Gois, Minas, Mato Grosso e Piau, numa rea calculada em 1,6 milho de km 2 (cerca de cinco vezes a superfcie do Japo). Ningum, a no ser alguns estudiosos, sequer pensava na possibilidade de aproveitamento do cerrado para a agricultura. O primeiro plano de aproveitamento racional do cerrado partiu da Cooperativa Agrcola de Cotia. A CAC comeou em 1973, em torno do municpio de So Gotardo, MG, o Programa de Assentamento Dirigido do Alto Paranaba Padap. Aps verificar sua viabilidade e reconhecendo seu valor econmico, o governo federal baixou em janeiro de 1975 um decreto presidencial criando o Polocentro (conhecido como Plano Qinqenal do Cerrado), visando a explorao de uma rea de 3,7 milhes de hectares para a agricultura. O projeto Padap se desenvolve em So Gotardo, MG. So Gotardo se transformou num nome-smbolo do desenvolvimento do cerrado. Constatando o sucesso do Padap, o governo brasileiro elaborou um

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grande plano de desenvolvimento do cerrado entabulando negociaes com o Japo, em nvel governamental. Decidiu-se criar o PRODECER I (Programa de Desenvolvimento dos Cerrados I). Como rgo executivo do plano criou-se a empresa de capital misto brasileiro-japonesa, Companhia de Desenvolvimento Agrcola Brasil-Japo Campo. As culturas adequadas para o desenvolvimento do cerrado so essencialmente gros, como arroz, soja, milho, trigo, feijo, sorgo, e secundariamente caf, legumes e pecuria. Quanto aos cereais merece destaque o seguinte. As sementes selecionadas para o cerrado, produzidas pela estao experimental agrcola da CAC de So Gotardo, so distribudas aos seus associados. Com isso foi possvel colher excelentes resultados. Alm da CAC participam do projeto de desenvolvimento do cerrado a Companhia de Desenvolvimento Agrcola do Cerrado CD AC, a Cotia Seinen Paracatu Agropecuria S.A. (dos Jovens Imigrantes da CAC), entre outras. Influenciados pelo xito dos planos de desenvolvimento do cerrado, muitos lavradores nikkei se entusiasmaram com a idia de abrir novas fronteiras agrcolas. Como resultado, temos o desenvolvimento da regio de Barreiras, BA, do sul de Minas, a lavoura irrigada de Pirapora, MG, o desenvolvimento do Mdio So Francisco e do interior da Amaznia (Alta Floresta), entre outras. Todos esses projetos comeam a dar resultado a partir da segunda metade do decnio de 80. Trata-se de uma agricultura moderna e racional, completamente diferente da praticada outrora pelos imigrantes nipnicos. Uma das caractersticas mais notveis dos novos planos de desenvolvimento do cerrado a adoo do sistema de Ein-danchi ou Ncleos de Produtores. Cada ncleo de produtores funciona como uma empresa, adotando um sistema que estabelece e acompanha rigorosamente todas s condies para assegurar o sucesso do empreendimento: solo, topografia, clima, volume pluviomtrico, abastecimento de gua, pragas, mo-de-obra, assim como outros fatores que influem na produo: armazenagem, beneficiamento, transporte e outras condies de circulao de mercadoria; eletricidade, gua, estradas, escolas, hospitais e outras instalaes de infra-estrutura: condies de mercado interno e exportao; financiamento da produo, e tudo o mais que contribua para assegurar boa produo e sua colocao no mercado. Depois da verificao de todas as condies, examina-se a capacidade tcnica e gerencial dos candidatos ao ingresso na colnia local. Instalam-se ainda no ncleo de produtores aparelhamento de armazenagem, secagem, depsito refrigerado, mquina selecionadora, embaladora, ensacadeiras, etc. Procura-se acelerar todo o processo de produo, visando reduzir seu custo. A gesto da lavoura conta com a orientao de

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especialistas. Os lavradores dos ncleos de produtores se dedicam a certo nmero de culturas aplicando a mesma tcnica. Em suma, aplica-se o planejamento que grandes empresas adotam quando decidem realizar investimentos em projetos de vulto. E verdade porm que, em se tratando de agricultura, mesmo com todas as providncias e cuidados tomados, sempre se est sujeito a fatores imprevisveis, como condies climticas (chuva em excesso ou seca), ocorrncia de pragas, queda na cotao na hora de vender os produtos, etc. No resta dvida, entretanto, de que esta uma agricultura muito mais segura do que a lavoura praticada individualmente, sem nenhum tipo de apoio tcnico e financeiro. Nesse sentido; a iniciativa das cooperativas nikkei no cerrado, formando os ncleos de produtores, representa uma decisiva contribuio ao desenvolvimento da agricultura brasileira, somando pontos altos para sua modernizao. f) O que fizeram os imigrantes e empresas do ps-guerra Cerca de 53 mil imigrantes japoneses entraram no Brasil no psguerra. Desse total 95% vieram antes de 1973; os que imigraram depois de 1974 so em nmero insignificante. Antes do segundo conflito mundial, haviam ingressado no pas 190 mil nipnicos em nmeros redondos. Na comunidade japonesa do Brasil coexistem os imigrantes do pr e psguerra, fenmeno que no se observa em comunidades nikkei de outros pases. Os Estados Unidos, o primeiro pas a receber trabalhadores japoneses, fecharam logo suas portas a essa imigrao. O Peru, que comeou a introduzir imigrantes nipnicos em 1899, nove anos antes do Brasil, no recebeu a imigrao dessa origem depois da guerra. Contrariamente, o Paraguai e a Bolvia, que quase no contavam com imigrantes japoneses na fase anterior guerra, no ps-guerra receberam um nmero relativamente grande. J a Argentina, que em 1986 comemorou o centenrio da imigrao nipnica, adota rigorosa poltica restritiva, de modo que tanto antes como depois do conflito os imigrantes l so em nmero muito reduzido. Verifica-se portanto que o Brasil foi o pas que recebeu o maior nmero de imigrantes japoneses nos dois perodos. Quando a comunidade de antes da guerra havia consolidado sua posio econmica (j vimos que, apesar da guerra e de suas conseqncias funestas, a colnia nipnica conseguiu melhorar sua situao econmica no perodo), recebeu sangue novo com a chegada de novos compatriotas. Temos por isso hoje uma comunidade nikkei nica e dinmica, de dimenses inexistentes em outros pases. a maior comunidade de japoneses fora do Japo.

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Na realidade, os imigrantes do ps-guerra puderam aproveitar os alicerces construdos por seus antecessores do pr-guerra, podendo por isso evitar a repetio das trgicas experincias dos primeiros imigrantes. Por isso sua independncia econmica foi muito mais rpida, contando com apoio e ajuda de entidades oficiais e privadas. Todavia, estas consideraes valem somente para os estados de So Paulo e Paran e em alguns pontos de outros estados, onde os imigrantes anteriores j haviam construdo slidas bases econmicas e sociais. Por outro lado, para os antigos imigrantes, os conhecimentos e tcnicas trazidos pelos novos constituram instrumentos de grande estmulo, resultando da um efeito multiplicador. fato, ainda, que isso teve tambm o seu lado negativo: incompreenso e desentendimentos entre antigos e novos, por diferena de mentalidade; incidentes entre jovens recm-chegados e jovens niseis, etc. Mas tratava-se de atritos e incidentes passageiros que o tempo resolveria. Quando o jovem que veio no ps-guerra casa com uma nisei e a seguir tem filhos, as diferenas entre novos e antigos forosamente desaparecem. A populao total de nikkeis do Brasil em 1988 somou 1.228.000. Nesse nmero haver a presena dos imigrantes do ps-guerra como de seus filhos. Com um nmero j respeitvel de nikkeis, intensifica-se o intercmbio de toda espcie com o Japo. At o antes impensvel intercmbio de meninos e meninas se tornou um fato corriqueiro. Como conseqncia da espetacular expanso da economia japonesa, numerosas empresas nipnicas vieram se estabelecer no Brasil. Tais empreendimentos ampliam o mercado de trabalho e contribuem para o desenvolvimento econmico do pas. No qinqnio de 1968 a 73, a economia brasileira teve um extraordinrio desenvolvimento, com crescimento anual de 11 % no seu PIB. Tal resultado se deveu poltica ento adotada de estimular e favorecer o ingresso do capital estrangeiro, o que abriu portas para a vinda de muitas empresas que investiram na indstria de bens de capital e bens de consumo durvel. As grandes instalaes de energia eltrica, comunicaes, etc, que formam a infra-estrutura econmica do pas, foram iniciadas, ampliadas ou completadas nessa fase. Lanaram-se grandes projetos nacionais de desenvolvimento, resultando da o chamado "milagre brasileiro". A partir de 1973 cresce de modo extraordinrio a vinda de empresas nipnicas para o Brasil. Muitas delas investiram em grandes projetos mistos de governo-iniciativa privada. Entre os maiores projetos de cooperao nipo-brasileira dessa fase destacam-se:

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Projeto de expanso da Usiminas. Projeto de construo da Usina Siderrgica de Tubaro. Usina de beneficiamento de alumnio na Amaznia. Projeto de fabricao de papel e celulose (projetos Cenibra e Flonibra), e Projeto de desenvolvimento agrcola do cerrado. Segundo uma pesquisa feita em 1988 pela JETRO (Organizao de Comrcio Exterior do Japo), o nmero de empresas japonesas instaladas no Brasil somava 430, mas acredita-se que no auge de sua expanso, entre 1977 e 80, o nmero delas tenha alcanado mais de 500. difcil conhecer com segurana a situao real dessas empresas, porquanto existem as que se retiraram em pouco tempo e outras que permanecem. No entanto, temos um meio de aferir aproximadamente a movimentao dessas empresas, por meio do crescimento e diminuio do nmero de classes em escolas japonesas (veja o quadro da pgina seguinte). As chamadas escolas de japoneses so aquelas criadas com apoio do governo japons. Os alunos nelas formados gozam dos mesmos direitos dos seus colegas de escolas de ensino bsico do Japo. Foram especialmente criadas para filhos de funcionrios aqui residentes das empresas japonesas. Tais escolas, alm de So Paulo, funcionam no Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitria, Recife e Belm. A escola de So Paulo foi instalada em 1967. No quadro temos a variao do nmero de crianas, alunos e professores no perodo de 1967 a 1988. Naturalmente, o primeiro mrito das empresas nipnicas que vieram se estabelecer aqui o efeito econmico resultante de suas atividades produtivas. No se pode esquecer que elas contribuem para a criao de empregos, para a transferncia de tecnologia e do sistema de TQC (Total Quality Control), um dos segredos da expanso de produtos Made in Japan no mercado mundial. Outra contribuio consiste no seu esforo para harmonizao e integrao de duas culturas diferentes, pertencentes a dois povos antpodas. No caso das empresas nipnicas seu encontro com uma cultura diferente provocou desorientao, choque cultural e perplexidade. Na realidade, nos primeiros tempos de sua presena entre ns, sofreram srias crises. Entre 1957 e 62, aconteceu o primeiro boom da entrada de empresas nipnicas no Brasil no ps-guerra. Comeou com a Indstria de Pesca Taiyo, com sede em Santos, seguida da joint-venture Usiminas, Ishikawajima, Howa, Toyobo, Kanebo, Kurabo, Canetas Pilot, Ajinomoto, Nippon Reizo, Yanmar Diesel, Kubota Tekko, e outras indstrias e empresas do setor comercial e financeiro.

NMERO DE CRIANAS(*), ALUNOS E PROFESSORES DE ESCOLAS DE JAPONESES DE SO PAULO

Fonte: Escolas de Japoneses de So Paulo (Perfil das escolas, 1988). (*) Crianas so alunos que estudam no curso primrio; e alunos, os secundaristas.

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Como era de esperar, nessa fase foram admitidos, nas empresas nipnicas recm-chegadas, muitos niseis conhecedores dos idiomas portugus e japons. No entanto, os resultados no foram satisfatrios. Os funcionrios vindos do Japo no conheciam quase nada ds peculiaridades culturais brasileiras e os niseis desconheciam totalmente o sistema empresarial japons. O incidente mais grave aconteceu na Usiminas. Os funcionrios niseis boicotaram por unanimidade o servio da empresa. Num dado momento, o caso chegou a ameaar at as boas relaes entre o Brasil e o Japo. Muitos niseis que trabalhavam na Usiminas eram intelectuais, formados em nossas escolas superiores. Sua desconfiana e seu descontentamento em relao atitude dos funcionrios nipnicos para o que deve ter contribudo, como j foi apontado, a insuficincia de conhecimentos recprocos, quanto cultura do outro produziram neles profunda desiluso e revolta em relao terra de seus ancestrais. E aqueles que ainda buscavam sua verdadeira identidade chegavam concluso de que s lhes restava viver como brasileiros, rompendo os liames culturais e sentimentais com o Japo. Contudo, com o correr do tempo, as empresas japonesas comearam a compreender as peculiaridades culturais brasileiras. Elas diferiam dos imigrantes pelo fato de terem obrigao de apresentar lucros em determinado perodo de tempo. Por isso no podiam simplesmente cruzar os braos, alegando como obstculo intransponvel a diferena de culturas. Graas reflexo e esforos mormente de alguns dirigentes bastante cultos e clarividentes j na fase do segundo boom de ingresso de empresas japonesas no Brasil, iniciado em 1970 e que culminou em 72, no se registrou mais a reao de desconfiana por parte de niseis, como na primeira fase. A essa altura aumentava o interesse de crescente nmero de niseis e sanseis em estudar a lngua japonesa e conhecer a cultura de Yamato. Alis, no mundo todo crescia a atrao pelo Japo, que, ao lado do seu dinamismo moderno, conservava suas tradies seculares. Quanto s empresas japonesas, observou-se melhoria no fato de que os funcionrios que acreditavam na sua cultura como a melhor e a nica reconhecem a existncia de outras diferentes culturas. Na prtica ainda subsiste algum descontentamento de funcionrios niseis e sanseis e brasileiros no nikkeis situados no escalo mdio das empresas. Observadores acreditam entretanto que a situao marcha paulatinamente para um entendimento e harmonia, com a compreenso e assimilao das duas culturas.

434 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI 2. RADICAIS TRANSFORMAES NA COLNIA NIKKEI

a) O avano dos niseis e a diversificao profissional Entre 1972 e 73 comeam a ocorrer profundas transformaes, tanto no Brasil como na colnia nikkei. O Brasil alcanava a fase do "milagre brasileiro'' com a construo de hidreltricas, usinas de alumnio, siderrgicas na costa martima, ferrovias, minerao, explorao do cerrado, plano de reflorestamento destinado produo de papel e celulose e outros grandes projetos desenvolvimentistas. Eram projetos nacionais executados com a colaborao de capital estrangeiro. Acontece ento a segunda corrida de investimentos nipnicos. Nas eleies municipais de 1972, verificou-se aumento da participao de niseis na vida poltica brasileira. Foram eleitos 13 prefeitos municipais, 14 vice-prefeitos, 137 vereadores municipais nipo-brasileiros. Nos pleitos municipais de 1968 haviam sido eleitos seis prefeitos, trs vice-prefeitos e 19 vereadores, num total de 28. O avano foi bastante significativo, para satisfao da comunidade. Entre os polticos niseis o primeiro a se eleger vereador foi Lus Yukishige Tamura, eleito em 1948 para a Cmara Municipal de So Paulo. Em 50 passou a deputado estadual e em 54 a deputado federal. Foi o primeiro nisei a se eleger para esses cargos. A seguir elegem-se deputados federais Joo Sussumu Hirata, por So Paulo, e Antnio Yoshio Ueno pelo Paran. Em 1972 contavam-se os seguintes polticos niseis eleitos para a Cmara Federal: Joo Sussumu Hirata e Diogo Nomura por So Paulo e Antnio Yoshio Ueno pelo Paran. Na Assemblia Legislativa de So Paulo: Shiro Kyono, Antnio Morimoto, Jihei Noda, Hachiro Shimomoto; em Mato Grosso: Masao Tadano. O primeiro nikkei a ocupar cargo de ministro de Estado foi Fbio Yassuda, nomeado para a pasta de Comrcio e Indstria em 1969; o segundo, Shigeaki Ueki, conduzido ao Ministrio das Minas e Energia em 1974. O ltimo navio de imigrantes, Nippon-Maru, aportou em Santos em maro de 1973, trazendo a bordo 285 imigrantes. Com essa leva, encerrase a era de imigrao transportada por navio. A colnia nikkei, at ento de forte predomnio de imigrantes isseis, muda aos poucos para uma comunidade muito diferente, com crescente maioria de niseis, sanseis e mestios. Naturalmente no fcil detectar de pronto essas transformaes que ocorrem paulatinamente, no decorrer de dcadas. A verdade que se verificou radical mudana nas caractersticas da colnia nikkei. A mais profunda transformao aconteceu na diversificao profissional e no envelhecimento e recuo dos isseis na vida da comunidade.

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De acordo com dados do Recenseamento da Colnia Japonesa, de 1958, a agricultura ocupava 57% das profisses de nikkeis. Era natural, pois haviam ingressado no pas como imigrantes lavradores. J na pesquisa realizada pela Beneficncia Nipo-Brasileira de So Paulo em 1978, a pedido do Consulado Geral do Japo em So Paulo, dos 75.151 japoneses (incluindo-se os de dupla nacionalidade e naturalizados), residentes nos estados de So Paulo e Paran, Mato Grosso e Minas Gerais, s 14.538 eram lavradores, ou 19,3%. Nesses nmeros no esto includos nikkeis sem nacionalidade japonesa. Mas mesmo que estes fossem includos, a relao numrica no se alteraria, podendo at diminuir a porcentagem de lavradores. O fenmeno do afastamento da lavoura e a diversificao profissional dos imigrantes nipnicos, que havia comeado em 1960, acelera-se depois de 70. Em grande parte essa transformao decorreu do fato de os pais imigrantes terem se deslocado do interior para a Capital ou subrbios, ou outras cidades importantes, a fim de poder educar os filhos em cursos de 2. e 3. grau. Na dcada de 70 cresce o nmero de estudantes universitrios nikkei. Em 1982, dos 7.748 estudantes que se matricularam na Universidade de So Paulo USP, 978 (13%) eram de origem nipnica, uma porcentagem alta. Da a diversificao profissional, com expanso de nikkeis em todos os setores de atividades do pas. Nos anos 50 e mesmo nos 60, no grande o nmero de nikkeis formados em curso superior, e quase todos buscavam realizar seu sonho de melhorar de vida, em poucos cursos profissionais: medicina, farmcia, direito, agronomia, veterinria, contabilidade, arquitetura e outros ramos da engenharia. Eram profisses que permitiam comear a ganhar dinheiro logo depois da formatura. Os pais isseis queriam que os filhos seguissem carreiras profissionais que permitissem sucesso material rpido. Eles ainda no tinham suficientes bases econmicas nem disposio espiritual de custear estudos em cursos que formassem literatos ou artistas, e achavam que essas profisses no serviam para ganhar dinheiro. Entretanto, j na dcada de 70 acentua-se a entrada de estudantes niseis e sanseis em cursos de lnguas, letras, psicologia, biologia, astronomia, meteorologia, geografia, geologia, paleontologia, etc. Existe tambm o reverso da medalha: aparecem nomes de nikkeis em noticirio do submundo do crime, fato antes sequer imaginado. b) A grandiosa festa dos 70 anos As mais importantes realizaes da colnia nikkei depois de 1973 foram a grande festa dos 70 anos da imigrao japonesa, celebrada no dia

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18 de junho de 1978, com a presena de Suas Altezas Imperiais Prncipe Akihito e Princesa Michiko, e a construo do Museu Histrico da Imigrao Japonesa, mais conhecido como Museu da Imigrao. Pode-se dizer que essa festa representou a grande celebrao que teve o issei como principal promotor e participante. J nas comemoraes dos 80 anos foi bem reduzida sua participao. Os prncipes herdeiros visitavam o Brasil pela segunda vez, sendo a primeira em 1967. Desta vez visitaram So Paulo, Braslia, Paran, Salvador, Belm e Manaus. Grande nmero de nikkeis ao lado de outros brasileiros os recepcionaram. Para os festejos dos 70 anos, alm do casal de prncipes imperiais, veio uma misso oficial de congratulaes (chefe Tatsuo Tanaka e vice Michiyuki Isurugi), representantes dos governadores e vice-governadores de provncias de todo o Japo (chefe: o governador da provncia de Nara, Ryozo Okuda), da JICA (presidente Shinsaku Hogen), Associao Cultural Nipo-Brasileira (presidente: antigo embaixador no Brasil Keiichi Tatsuke) e representantes de numerosas entidades e particulares, somando 1.200 pessoas. Outro fato que caracterizou a festa dos 70 anos foi a presena de muitos jornalistas dos veculos de comunicaes de massa do Japo. Entre eles, o Mainichi Shinbun, um dos trs grandes dirios japoneses, patrocinou o simpsio intitulado "Nova Era nas Relaes NipoBrasileiras e o Intercmbio Internacional", realizado nos dias 8 a 10 de junho, no salo do Centro Cultural, reunindo cientistas e intelectuais do Brasil e do Japo. Os trabalhos estiveram a cargo de trs subcomisses. Pela primeira vez no Brasil houve um simpsio internacional numa festa comemorativa de aniversrio da imigrao nipnica. Na primeira subcomisso o tema era "Papel da Comunidade Nikkei no Intercmbio Cultural entre o Japo e o Brasil"; a segunda subcomisso discutiu "Relaes Econmicas entre o Japo e o Brasil: sua avaliao e perspectivas"; a terceira subcomisso, "Brasil e Japo do Sculo XXI busca de objetivos comuns". O presidente do simpsio, Prof. Tadao Umesao, diretor do Museu Nacional de Etnologia do Japo, pronunciou a conferncia de abertura "Em Prol da Contribuio com a ndole Nipnica". Os festejos dos 70 anos da imigrao japonesa encerraram-se com sucesso absoluto. Pela primeira vez a colnia nikkei do Paran realizou a comemorao independente da comunidade de So Paulo. Convidou o casal de prncipes herdeiros e o presidente Ernesto Geisel para a principal cerimnia das celebraes, que consistiu na inaugurao do Centro Agrcola de Rolndia. No Paran as principais obras comemorativas do 70." aniversrio

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foram: Museu de Agricultura Pioneira do Paran, Jardim Japons, Jardim Botnico, Monumento do Imigrante, Cenotfio dos Pioneiros Mortos. A promotora central foi a Federao das Sociedades Nipo-Brasileiras de Cultura Japonesa do Paran. A Comisso de Festejos esteve sob a presidncia de Antnio Yoshio Ueno. Uma iniciativa original foi a construo do Museu de Agricultura Pioneira do Paran, o qual conserva todo o material documentrio relativo agricultura e pecuria do Estado e tambm exibe grficos, estatsticas, fotografias e amostras dos produtos. Uma visita ao Museu propicia um bom conhecimento da histria do desbravamento das terras e desenvolvimento da agricultura paranaenses. Na frente do Museu foi construdo um jardim japons, onde foram plantadas 36 espcies de plantas nipnicas, num total de 900 ps. Dos 16 alqueires pertencentes ao Centro Agrcola, 5 alqueires foram destinados ao Jardim Botnico. c) Museu Histrico da Imigrao Japonesa O Museu Histrico da Imigrao Japonesa foi construdo como a grande realizao comemorativa do 70. aniversrio da imigrao nipnica. Cinco anos antes, em 1973 instalara-se na Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa a Comisso de Conservao de Material Histrico da Colnia. Em janeiro de 1976, a Comisso de Construo do Museu Histrico da Imigrao Japonesa (presidido por Gen-ichiro Nakazawa, tambm presidente da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa) dava os primeiros passos para a concretizao do plano. Decidiu-se transformar a construo do Museu na obra maior dos festejos dos 70 anos. Os objetivos da construo esto claramente expostos no prospecto divulgado por Gen-ichiro Nakazawa, presidente da Comisso de Construo. Vamos transcrever uma parte do documento: "... O eixo das atividades (dentro da colnia) est passando dos isseis para os niseis e sanseis. Sentimos que ns isseis temos a responsabilidade de registrar e conservar tudo que sirva para contar a vida, e os feitos dos imigrantes nipnicos, no s em forma de documentos escritos como todo material histrico, em outras palavras, os objetos usados por eles no seu dia-a-dia, instrumentos de trabalho, fotografias, cartas, impressos, retratos, etc. Construindo o Museu Histrico da Imigrao Japonesa no Brasil, pretendemos lembrar os passos dados pelos imigrantes para os descendentes de japoneses e a sociedade brasileira no seu todo. Grande parte dos imigrantes isseis j se acham em faixa etria avanada e no poucos faleceram. Nessa conjuntura, devemos levar avante, sem perda de tempo, o projeto de construo, caso contrrio grande parte dos documentos histricos ser desperdiada e desaparecer...".

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O Museu Histrico foi instalado nos dois (stimo e oitavo) dos cinco andares do edifcio do Centro Cultural acrescidos na ocasio. O Museu conta com 950 m 2 de espao para exposies e mais 500 m 2 de salas de acervo histrico e depsito. Sua construo contou com subveno do governo nipnico e contribuies de particulares, doao da Associao de Desenvolvimento de Navegao do Japo e coleta feita na colnia. O custo total da construo somou 370 milhes de yens. A inaugurao, que representou o ponto alto das festas dos 70 anos, se realizou com a presena dos prncipes herdeiros e do presidente Ernesto Geisel. O Museu da Imigrao teve sua concepo geral a cargo do Prof. Tadao Umesao, diretor do Museu Nacional de Etnologia do Japo; o detalhamento foi feito pelo Prof. Hiroshi Saito, seu primeiro diretor. A construo ficou a cargo da firma Tanseisha, especialista em edificaes de museus do Japo. Graas a todo esse cuidado desde a concepo e planejamento, o Museu oferece um sofisticado espao de exposio. Existe ainda um aparelho de projeo com tela mltipla. Os documentos e objetos expostos esto divididos de acordo com os seguintes temas: Tema A Do Japo ao Novo Continente. Emigrao de japoneses. Comeo das Relaes entre o Brasil e o Japo. Brasil, o novo mundo. Intercmbio entre o Brasil e o Japo. Japoneses que se tornam fundadores de nova famlia. Os imigrantes do Kasato-Maru. Vencendo vagalhes dos oceanos. Imigrantes-colonos. Princpio de uma nova vida. Desbravando florestas virgens. Construo de colnias. Criatividade no modo de viver. Lazer dos imigrantes. Tema B O imigrante japons e a agricultura. Expanso da agricultura do tipo interiorano. Criao da lavoura do tipo suburbano. Fomento da agricultura tropical. O imigrante e a inovao tcnica. Introduo e cultivo de novas culturas agrcolas. Exemplos: a) ch preto, b) junco, c) rami. Surgimento da lavoura intensiva. Participao na modernizao do Brasil. Primrdios do movimento cooperativista e seu desenvolvimento. Comeo da vida urbana (So Paulo e cidades do interior). Crescimento de indstrias locais. Tema C Superando as aflies do perodo de transio. Um tnel escuro chamado guerra. poca de violentas convulses e busca de sada da escurido. A nova gerao entra em cena.

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Imigrao do ps-guerra e a chegada de empresas japonesas. Reinicio da imigrao. Aspectos da imigrao do ps-guerra. A corrida de empresas nipnicas para o Brasil. O vo da nova gerao. Desbravando terras novas (pioneiros da nova era). Em muitas profisses. Vida social e o lar. Os objetos expostos somam cerca de mil itens, porm no depsito existem mais de 10 mil objetos que podem ser examinados por pesquisadores. Na sala especial de exposio do oitavo andar existem dois grandes murais do pintor Seiji Togo. d) Comemorao dos 80 anos A festa comemorativa dos 80 anos da imigrao japonesa realizouse no dia 18 de junho de 1988, com a presena de Sua Alteza o Prncipe Ayanomiya Fumihito. O evento ficou muito parecido com os festejos realizados por ocasio dos 70 anos. Tendo como presidente de honra o presidente da Repblica Jos Sarney e na presidncia da Comisso dos Festejos Masuji Omi (presidente da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa), cerca de 80 mil nikkeis se reuniram no Estdio Municipal do Pacaembu numa grandiosa cerimnia comemorativa. Como atraes especiais destacaram-se o coro de 2.500 vozes, grupo de 1.600 danarinos, grupos de canes populares vindos do Japo, um letreiro humano de saudao formado por 10 mil membros da sociedade religiosa Nichiren Shoshu, todos muito aplaudidos pelo pblico. A televiso e outros meios de comunicao de massa veicularam os aspectos mais expressivos da festa, com boa repercusso entre brasileiros. Tal como nos festejos de uma dcada antes, o Japo enviou uma delegao especial chefiada pelo antigo primeiro-ministro Takeo Fukuda e com participao de Tatsuo Tanaka, j nosso conhecido presidente da Associao Japonesa de Famlias de Emigrantes e os parlamentares Saburo Kanemaru e Tokusaburo Tamazawa. Muitos governadores de provncias e vice-governadores e parlamentares provinciais visitaram nosso pas no decorrer do ano. Promoveram-se muitas conferncias de carter cultural e apresentao de artes japonesas. Repetiu-se o Simpsio Internacional Nipo-Brasileiro realizado com sucesso no 70. aniversrio, promovido novamente pelo jornal Mainichi Shinbun. Presidiu o Simpsio, cujo tema era "O Papel dos Nikkeis na Era do Pacfico", o antigo ministro do Exterior Saburo Okita. O certame contou com duas subcomisses: 1) Problemas Econmicos Nipo-Brasileiros, e 2) Relaes Culturais. Ainda dentro das comemoraes do aniversrio, tivemos a visita da equipe de beisebol da tradicional Universidade de Keio e realizou-se em

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So Paulo o Campeonato de Gateball. Obteve grande sucesso popular a exibio de fogos de artifcios japoneses em homenagem amizade nipobrasileira. A Secretaria de Turismo do Estado de So Paulo promoveu a "Expo-Banzai", reproduzindo a chegada do navio Kasato-Maru no porto de Santos, igualmente muito comentada. Se a obra que marcou a comemorao dos 70 anos foi a inaugurao do Museu Histrico da Imigrao Japonesa, a cerimnia de inaugurao do Hospital Nipo-Brasileiro foi o maior destaque do 80. aniversrio. No vizinho Estado do Paran a celebrao dos 80 anos aconteceu tambm tal como nos festejos dos 70 anos, no Centro Agrcola de Rolndia, com xito. Embora formalmente a festa dos 80 anos se assemelhasse muito de dez anos antes, no se repetiu aquela forte emoo e entusiasmo. Pois em 78, ao receber os prncipes herdeiros, toda a colnia se ergueu emocionada. Acontece que agora o nmero de isseis havia diminudo para apenas 12,5% da populao nikkei. A essa altura, uma dcada representava muita diferena para os velhos imigrantes isseis. No entanto, uma comemorao como esta no podia ser promovida s por niseis, deixando de lado os isseis. A festa era essencialmente destes velhos lutadores. Nesse fato residia a causa de certa repetio do que foi feito um decnio antes. No obstante a festa dos 80 anos no fosse to brilhante nem historicamente to significativa, certo que serviu como um elo de continuidade com a prxima gerao. e) Tornam-se imprecisas as fronteiras da colnia O Japo apresenta um raro exemplo de sociedade homognea: ela constituda de homens de uma s raa, falando a mesma lngua, tendo os mesmos costumes e hbitos, as mesmas tradies histricas e culturais. Os emigrantes japoneses que vieram para o Brasil possuam naturalmente aquela cultura homognea. E, mais que isso, acumularam comuns e idnticas experincias na condio de imigrantes, o que serviu para fortalecer seu sentimento de homogeneidade. Por outro lado, porm, em relao ao "mundo exterior", tornavam-se etnocentristas e exclusivistas, fechando-se dentro da prpria comunidade. Tomoo Handa, pintor e escritor muito conhecido e respeitado na colnia, observou certa vez que "os imigrantes japoneses se reuniam e uniam como as folhas cadas se juntavam quando sopradas pelo vento...". O isolamento dos japoneses que tm razes profundas na histria (mas no cabe aqui entrar nessa complexa rea), visto por pessoas de

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uma sociedade heterognea e aberta, constituda por elementos de raas e culturas diferentes, parecia caracterstica de uma comunidade exclusivista, formando um quisto racial, inassimilvel. A crtica estava certa, mas da parte dos imigrantes no havia conscincia desse fato, pois uniam-se entre eles como um meio de defesa prpria e por necessidade. Havia a grande barreira da lngua que os imigrantes levariam muitos anos para superar, e na prtica a maioria no chegava a dominar o portugus, justamente por viver entre patrcios. Havia natural e forte tendncia de se fecharem em seu mundo particular, s deles, fortalecendo a guarda quanto mais adversas fossem as condies externas. No s no Brasil, como nos EUA e no Peru, o antagonismo e conflitos entre uma sociedade homognea e outra heterognea constituam causas de movimentos antinipnicos. Em outras palavras, faltava a compreenso das verdadeiras causas dos atritos e conflitos entre duas sociedades de culturas diferentes. Na poca em que prosperou o movimento antijapons quase no havia polticos e lideranas nacionais que compreendessem as disputas e rivalidades como resultado de conflitos e choques culturais. Muitas vezes fatores econmicos contriburam para intensificar movimentos antijaponeses. Mas, limitavam-se a tratar o assunto como de cunho racial ou econmico apenas, no chegando ao fundo da questo. No Brasil atual o antiniponismo no representa problema. Mas no se pode dizer que o pensamento antijapons tenha desaparecido. Ainda em 1984 foi publicado um livro com o ttulo de Cerrado, a Ocupao Japonesa, eivado de preconceitos e distoro dos fatos. Na colnia nikkei do Brasil existe ainda alguma preocupao com relao a qualquer manifestao antijaponesa, devido s amargas experincias da dcada de 30 e do perodo de guerra, quando o antijaponismo atingiu seu clmax. Destaque-se a posio de niseis, em especial estudantes que na poca se achavam na idade de formao de sua personalidade. Eles esforavam-se e at se afligiam (nem todos, claro) em busca de sua identidade. Conforme se viu no Captulo 3, os niseis sofriam a presso do nacionalismo brasileiro e do japons. Universitrios e secundaristas mais bem informados, e que tinham conscincia de sua nacionalidade brasileira, discordavam da orientao ultranacionalista, etnocentrista e militarista adotada nas escolas de lngua japonesa. Da a sua "rebeldia" contra essa orientao. Por isso elementos radicais da comunidade, que seguiam a orientao oficial de Tokyo, ento dominado pelo militarismo, diziam que esses niseis eram contra o ensino da lngua japonesa, e de tudo que era japons. O que evidentemente era um exagero, erro de interpretao ou fruto de m-f.

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Deve-se ponderar, entretanto, que numa conjuntura de extrema tenso internacional, como aquela da segunda metade da dcada de 30, ferviam paixes nacionalistas e havia elementos extremados em todos os campos. possvel que alguns niseis revoltados diante da presso do nacionalismo japons tivessem se declarado contrrios ao ensino do idioma nipnico. Na prpria colnia havia isseis que discutiam a necessidade de se auto-restringir o ensino de japons. Todavia, os niseis e os sanseis nascidos depois da guerra so diferentes. Esto livres da aflio que castigou niseis mais velhos, diante do movimento antinipnico, ou do caos criado na comunidade pelo conflito esclarecidos x vitoristas. Identificam-se como brasileiros descendentes de japoneses ou nipo-brasileiros, ou simplesmente brasileiros, sem se preocupar com a diferenciao de origem. Com a sucesso de geraes e a crescente miscigenao, o resultado final ser a sua participao na formao tnica ltima do povo brasileiro. Na realidade ainda existem problemas relacionados a grupos tnicos. Ainda h poucos anos surgiu uma divergncia de opinio entre grupos de niseis e sanseis com relao participao na Conveno PanAmericana de Nikkei. Essa entidade, segundo seus fundadores, visa a amizade e confraternizao dos nikkeis do continente americano unidos pelas mesmas razes. Sem cor poltica. Houve oposio, com a alegao de que no havia necessidade de uma organizao constituda s de nikkeis, o que poderia provocar malentendidos, pois o sentimento antinipnico no est extinto. Mais ainda argumentavam os oposicionistas , o pan-americanismo j existe nas Amricas. um estado de esprito dos povos da Amrica, independe e est acima de qualquer considerao de ordem poltica, econmica ou racial. Ento por que formar um movimento parte, s de descendentes de japoneses? Pode ser necessrio talvez em pases onde existe ainda forte preconceito racista o que no o caso do Brasil , argumenta a corrente contrria. Apesar da oposio, a primeira reunio se realizou em julho de 1985, em So Paulo, com a presena de 135 nikkeis dos EUA, 30 do Peru, e a Argentina, Uruguai, Colmbia e Canad mandaram cada um 20 representantes, a Bolvia 15 e o Brasil teve 300, totalizando 565. A Conveno se realiza em sistema de rodzio, sendo cada vez num pas. Com os recentes desenvolvimentos extraordinrios da tecnologia de transporte e meios de comunicao, estreitam-se cada vez mais as relaes entre os povos. A informao circula com abundncia nunca antes vista, em toda parte. A facilidade dos transportes intensifica o intercm-

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bio de homens, discutem-se problemas de diferena cultural entre povos. Isso proporciona entendimento entre povos, e a compreenso de caractersticas culturais diferentes constitui um passo decisivo para a aproximao entre as naes. Pases como o Japo, que por motivos histrico-culturais sempre manteve atitude de reserva e retrao nos contatos internacionais, comeam a falar em internacionalizao e globalizao, no s no campo econmico como no social e cultural. Quanto comunidade nikkei do Brasil, sua contribuio, especialmente na agricultura, e em outros setores da vida brasileira, um fator positivo importante para a aproximao entre o Brasil e o Japo. No psguerra tivemos tambm a contribuio do capital e da tecnologia nipnicos no desenvolvimento brasileiro. Dentro desse contexto, argumentos ou campanhas antijaponeses sem fundamentos slidos no so mais aceitos sem crticas. O preconceito de carter racista est sendo combatido em todo o mundo civilizado. Por outro lado, na comunidade nikkei diminui o nmero de isseis, cresce o de descendentes. E com o correr dos anos aumentam os casamentos com pessoas no nikkei (veja quadro). At o nisei podia haver o freio dos pais para impedir o matrimnio de filhos com pessoas de outras etnias. J no tempo dos sanseis e yonseis (quarta gerao) no mais existe esse empecilho (os japoneses os isseis no nosso caso so etnocentristas, devido justamente sua homogeneidade racial e cultural, muito embora sua origem tenha resultado da miscigenao de diversas raas, conforme ensinam historiadores). Como resultado, cresce o nmero de mestios, o que torna cada vez mais imprecisas as fronteiras da colnia japonesa. Fenmeno bem brasileiro, que impede a formao de grupos raciais isolados dentro de suas imensas fronteiras. PORCENTAGEM DE CASAMENTO INTERTNICO SEGUNDO AS REGIES
Regio Nikkei com nikkei 37,5 100,0 57,3 61,5 51,4 52,3 76,7 30,8 54,1 Nikkei com no-nikkei 62,5

Norte Nordeste Cidade de So Paulo Grande So Paulo Estado de So Paulo Total parcial Sul Centro-Oeste Total Geral

42,7 38,5 48,6 47,7 23,3 69,2 45,9

Fonte: Pesquisa da Populao de Descendentes de Japoneses Residentes no Brasil, 1988. Centro de Estudos Nipo-Brasileiros.

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Dizer que esto se apagando as fronteiras da colnia nikkei significa que a expresso colnia nikkei j no define a comunidade como um grupo tnico. A colnia perde a linha demarcatria de suas fronteiras tnicas. Isso quer dizer tambm que os mestios perdem sua identidade nikkei. De outro lado, surge tambm o fenmeno da aproximao entre mestios e no-nikkeis, e a comunidade nikkei. Talvez se possa dizer "aproximao da cultura japonesa" em vez da "comunidade nikkei". Ao ingressarmos nos anos 80 d-se um "boom" ou moda da comida nipnica entre brasileiros no nikkei. No se trata de um efmero gosto pelo extico, mas de uma tendncia de pratos japoneses se integrarem refeio cotidiana de brasileiros, como alguns pratos tpicos italianos, portugueses, alemes ou rabes, por exemplo. E o shoyn j entrou no vocabulrio da nossa arte culinria. Desde suas origens o Brasil um pas onde se unem povos de raas e culturas diferentes, heterogneas. No h aqui resistncia introduo de culturas estranhas e tradicionais de outros povos. Na realidade, certos rituais introduzidos do Japo pelos imigrantes, como o Festival Tanabata (do stimo dia do stimo ms, do calendrio lunar), o Festival de Aniversrio de Buda, e diversas outras festas populares do velho Yamato, e at mesmo a cerimnia de preparar o arroz para fazer o bolo de arroz (mochi), parecem ter adquirido cidadania brasileira, pelo menos em So Paulo, ou mais precisamente no bairro oriental da Liberdade. J nos referimos s transformaes ocorridas na colnia nikkei. Vimos que a mudana do meio de transporte (de navio para avio) aconteceu na mesma poca em que diminua o fluxo imigratrio, porque o Japo j prescindia de emigrao para enfrentar o problema de sua superpopulao. Com a espetacular recuperao no ps-guerra e o acelerado desenvolvimento de seu parque fabril, se absorvia toda a mode-obra excedente at ento existente principalmente na zona rural. E nessa poca, por volta de 1973, que aumenta o nmero de imigrantes que viajam ao Japo, no chamado satogaeri (volta terra natal para uma visita). A inaugurao do vo regular da JAL para o Brasil s aconteceu em 1977, mas j em 1973 comearam as viagens charters promovidas por um grupo de agncias de viagens com avies da JAL. Esses vos continuaram at junho de 1978, quando comearam a funcionar as linhas de vos regulares da empresa nipnica. Os vos fretados somaram 140 viagens ida e volta, em quatro anos, transportando cerca de 30 mil passageiros. Esse transporte em massa intensifica o intercmbio de toda espcie entre o Japo e o Brasil. Tal tendncia acentua-se com o incio dos vos regulares da JAL seguidos da

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entrada da Varig no Japo e o funcionamento do sistema de comunicao via satlite. As informaes que circulam entre os dois pases alcanam um volume impressionante. Com essa facilidade de comunicao via satlite e de viagens, a colnia nikkei tambm fica mais prxima do Japo. No tempo em que essa comunidade formava um grupo social fechado, no qual entravam poucas informaes, era igualmente difcil viajar ao Japo. As condies econmicas dos imigrantes no permitiam as viagens demoradas de navio. S em caso de extrema necessidade, ou os mais abastados, visitavam a terra natal. A maioria passava anos sonhando um dia poder visitar o Japo e morria de saudades da me-ptria. Agora a situao outra. Ela permite que muitos imigrantes isseis visitem sua terra de origem. Por outro lado, parentes domiciliados no Japo visitam com mais facilidade o Brasil. Com isso os nikkeis do pas ficam atualizados no tocante aos seus conhecimentos a respeito do Japo de hoje. A difuso de aparelhos de videocassete nos lares de imigrantes que possibilita naturalmente a projeo de videoteipes sobre o Japo constitui outro elemento que ajuda a acompanhar o progresso japons. f) Obras beneficentes e assistenciais em primeiro plano Segundo a pesquisa sobre a situao de japoneses do Brasil realizada pela JICA em 1977, havia 138.244 pessoas de nacionalidade japonesa (com exceo dos com "permanncia de longo prazo" na maioria funcionrios de empresas nipnicas enviados do Japo e que servem alguns anos no exterior). O total de nikkeis ento somava 765.710; os imigrantes isseis (inclusive os de dupla nacionalidade) representavam apenas 18,05%. Desde ento diminui de ano para ano o nmero de imigrantes isseis. E de acordo com o resultado da pesquisa de populao nikkei realizada em ,1988 pelo Centro de Estudos Nipo-Brasileiros, como obra comemorativa dos 80 anos da imigrao nipnica, a populao total dos nikkeis alcanava naquele ano 1.228.000 almas. Os 153.000 imigrantes isseis representavam 12,51% do total No se podia mais falar em fase de transio. A era dos isseis havia passado. Em conseqncia da diminuio de imigrantes isseis e elevao da faixa etria dos sobreviventes e tambm dos niseis mais velhos, tornamse agudos os problemas de assistncia social e mdica aos idosos. A colnia nikkei do ps-guerra se preocupou em ressaltar o lado cultural desde a Comisso da Colnia Japonesa Pr-IV Centenrio da Cidade de So Paulo. Ela construiu o Pavilho Japons no Ibirapuera, o

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Centro Cultural, fundou a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, a Aliana Cultural Brasil-Japo, inaugurou o Museu Histrico da Imigrao Japonesa. Todas essas obras apresentaram excelentes resultados. Todavia, depois da festa dos 70 anos, foi necessrio colocar em primeiro plano a assistncia mdica e social aos idosos. A colnia j havia organizado entidades beneficentes e de assistncia; elas so ampliadas e melhoradas medida que crescem as necessidades. Vejamos primeiro as obras e servios da maior organizao assistencial da comunidade, que a Beneficncia Nipo-Brasileira (Enky). Sanatrio So Francisco Xavier (Campos do Jordo, SP). Para tratamento de tuberculose pulmonar, instalado em 1936 pela extinta Dojinkai, passou para a gesto da Beneficncia Nipo-Brasileira em 1965. Graas ao progresso da medicina e das condies de vida da comunidade, reduziu-se o nmero de tuberculosos. Todavia, a comear de 1981, o sanatrio atende tambm os asmticos, com bons resultados de cura. Capacidade de internao: 70 pessoas. Santos Kosei Home (Casa de Reabilitao Social de Santos). Atualmente acolhe idosos e valetudinrios carentes e sem famlia. Recebe apoio e colaborao da cidade de Santos. Capacidade: 60 pessoas. Instalada em 1971, transferida para o endereo atual em 1974. Guarulhos Yasuragi Home (Centro de Reabilitao Social de Guarulhos). Cuida da reabilitao e volta ao convvio social de indivduos que sofrem de doena mental, dos que repetem o caminho de internao e alta, dos que,' embora curados da doena, no se adaptam vida em sociedade, estimulando-os a readquirir autoconfiana, mediante tratamento. Fundado em 1977, capacidade: 77 pessoas. Suzano Ipelndia Home (Casa de Repouso Ipelndia de Suzano). Instalada em 1983 num canto da colnia Fukuhaku, situada a 10 km da cidade de Suzano. Conta com apoio da colnia japonesa de Suzano. H fila para atendimento. Capacidade: 22 pessoas. Outras entidades, no ligadas Beneficncia Nipo-Brasileira: A organizao assistencial mais antiga da colnia, a Assistncia Social Dom Jos Gaspar, dirigida por Margarida Watanabe, mantm o asilo Jardim de Idosos So Francisco Xavier (Ikoi-no-Sono). Visando aperfeioar a assistncia aos velhos, fundou em 1982 o Grupo de Pensar o Futuro. Com ajuda da JICA, em janeiro de 1988 realizou a cerimnia de lanamento da pedra fundamental de um pavilho especial para idosos. Associao Pr-Excepcionais Kodomo-no-sono. Assistncia a excepcionais, funciona em Itaquera. O prdio principal foi construdo em 1982. A Kib-no-Ie. Sociedade Beneficente Casa de Esperana. Asilo para

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excepcionais. Recebe ajuda do governo japons, entidades beneficentes do Japo e da colnia nikkei. Ogata Home. Atende idosos e conta agora com uma entidade de apoio. Quase todas as entidades beneficentes e assistenciais aqui mencionadas foram focalizadas no Captulo 5. Percebe-se que, apesar das dificuldades de diversas naturezas, principalmente financeiras, elas esto se expandindo e atendendo s necessidades da comunidade. g) Hospital Nipo-Brasileiro At aqui as atividades das organizaes assistenciais e beneficentes visavam atender membros da colnia nikkei. Isso era lgico, pela sua prpria natureza e origem. No entanto, observa-se, a partir da dcada de 80, que tais entidades tendem a romper com essa orientao do passado, transformando-se de organizaes assistenciais exclusivas da colnia nikkei em entidades nikkeis destinadas a servir tanto a colnia como a sociedade brasileira em geral. Torna-se necessria uma nova orientao. Transformar-se em entidades universais, sem limitaes de carter racial ou nacionalidade. Uma entidade brasileira aberta a todos os interessados e necessitados. O mesmo poder ser dito em relao a entidades no-assistenciais da colnia. Essa tendncia de abertura comea a se tornar realidade. O tempo se encarrega dessa transformao. Um exemplo que a simboliza a construo do Hospital NipoBrasileiro a principal obra da comunidade nikkei, inaugurada na festa dos 80 anos da imigrao nipnica. O prospecto distribudo pela Beneficncia Nipo-Brasileira sobre a construo do hospital diz num trecho: "... Servindo s pessoas que sofrem de enfermidade, por meio de uma boa organizao mdico-hospitalar, pretendemos estreitar mais ainda as relaes de amizade entre japoneses e brasileiros. Com esta declarao queremos dizer que buscamos servir no s aos nikkeis como, atravs desta iniciativa, expressar o nosso sentimento de gratido nossa segunda ptria, o Brasil, que nos propiciou a atual prosperidade. A sublimao desse sentimento impulsionou esta obra...". Sente-se a decidida inteno de servir o Brasil, erigindo um hospital bem provido tanto em pessoal como em equipamento. O Hospital Nipo-Brasileiro teve os preparativos de construo iniciados em 15 de janeiro de 1984, com a compra JICA do antigo terreno do Centro de Imigrao Tecno-Industrial. Em junho de 1985 realizou-se a assemblia geral da organizao da Comisso de Construo do Hospital. Com a contribuio do governo e de entidades privadas do

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Japo e total apoio da colnia nikkei, as obras comearam em junho de 86. A cerimnia de inaugurao se realizou a 18 de junho de 1988, dia em que se celebrava o 80. aniversrio da imigrao, com a presena de Sua Alteza, o Prncipe Ayanomiya. A 19 de setembro do mesmo ano comea a funcionar. O Hospital Nipo-Brasileiro conta com os seguintes servios: gastroentorologia, cirurgia, ortopedia, pediatria, ginecologia, neurocirurgia, geriatria, of talmologia, otorrinolaringologia, dermatologia, urologia, anestesiologia, radiologia, exames clnicos, check-up mdico, cardiologia, psiquiatria, etc, num total de 23 clnicas. Um hospital policlnico. O custo da construo somou 5.020.000 dlares incluindo-se 100 milhes de yens do governo nipnico. Modernos e sofisticados aparelhos mdicos, no valor de 2.900.000 dlares, se acham instalados, pagos com a colaborao de instituies oficiais e privadas japonesas. O edifcio do hospital tem um subsolo e sete andares; a rea construda mede 8.162 m2. Conta 120 leitos, de modo que no entra na categoria de um hospital grande. Mas os aparelhos mdicos modernos doados por entidades nipnicas e mais os adquiridos fazem-no situar-se entre os hospitais mais bem equipados do pas. Cento e vinte mdicos, enfermeiros e outros funcionrios atendem os pacientes. Como que por ironia da histria, quase ao mesmo tempo que se inaugurava o Hospital Nipo-Brasileiro, comeava um movimento pela recuperao do Hospital Santa Cruz (antigo Hospital Japons) para a colnia japonesa. O estabelecimento fora colocado durante a guerra sob o controle do governo federal como propriedade de pas inimigo, e por isso sua posse havia escapado da organizao nikkei que o mantinha. Todavia, esse movimento independente das atividades da Beneficncia Nipo-Brasileira que construiu o Hospital Nipo-Brasileiro. Esta entidade presidida por Tadashi Takenaka, que sucedeu a Gen-ichiro Nakazawa em 1975. Sem contar o Hospital Japons (atual Santa Cruz), a construo do hospital na colnia nikkei do Brasil no ps-guerra comeou na Amaznia. Em novembro de 1969 teve lugar na cidade de Belm a festa comemorativa dos 40 anos da imigrao nipnica na regio, sob o patrocnio da Sociedade Pan-Amaznica Nipo-Brasileira de Cultura. Na ocasio, realizou-se simultaneamente a inaugurao do Hospital Amaznia. Esse estabelecimento hospitalar foi erigido atendendo aos anseios da comunidade japonesa da regio, que desejava a construo de clnicas mdicas e de um hospital. O hospital foi construdo no terreno da Sociedade PanAmaznica Nipo-Brasileir de Cultura, na cidade de Belm. De dimenses modestas, tinha apenas 16 leitos.

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Um pavilho separado do original Hospital Amaznia inaugurouse dez anos depois, em novembro de 1979, quando se festejou meio sculo da imigrao nipnica na Amaznia. Sua construo, comeada em junho de 76, contou com a contribuio de 100 milhes de yens da Associao de Desenvolvimento de Navegao do Japo, presidida por Ryoichi Sasakawa. O governo de Tokyo contribuiu doando modernos equipamentos mdicos. O novo prdio tem quatro andares. Somando os anteriormente existentes, o nmero de leitos chega a 64. Tornou-se um hospital geral e est designado como hospital de pronto-socorro. Um grupo de mdicos nikkcis nele trabalha com dedicao e eficincia, merecendo confiana dos que procuram o estabelecimento.

3. CRESCE O INTERESSE PELA CULTURA JAPONESA

a) Nasce o Centro de Estudos da Lngua Japonesa No dia 22 de fevereiro de 1988 foi inaugurado, no Centro Cultural, um novo rgo de ensino do idioma nipnico o Centro de Estudos da Lngua Japonesa. A nova entidade resultou da fuso do Centro de Difuso da Lngua Japonesa, criado em 1985 como um departamento da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa (Bunkyo), com o Departamento de Ensino da Lngua Japonesa da Aliana Cultural Brasil-Japo e a Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Brasil. O nome oficial Nihongo Fukyu Center Centro de Estudos da Lngua Japonesa. Tem na presidncia Fujio Tachibana. Concretiza-se assim a unificao dos rgos de ensino de japons da colnia nikkei do Brasil. Representa o acontecimento mais importante de toda a histria da imigrao nipnica no campo do ensino da lngua japonesa. Para se alcanar esse objetivo contriburam vrios fatores: Como conseqncia do esplndido desempenho da economia nipnica na dcada de 80, cresce o interesse pelo estudo da lngua e da cultura japonesa em todo o mundo. A Fundao Japo de Tokyo promoveu uma pesquisa sobre mtodos de melhor difundir o idioma nipnico no mundo; e, em 1985, chegou concluso de que se tornava necessrio organizar Centros Internacionais de Estudos da Lngua Japonesa. O Escritrio da Fundao Japo em So Paulo funciona desde 1975. O rgo solicitou Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa a criao de um centro de estudos da lngua japonesa. Da resultou a instalao, em 1985, do Centro de Difuso da Lngua Japonesa, h pouco citado.

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Nessa poca existiam como rgos de ensino de japons a Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Brasil e a Aliana Cultural BrasilJapo, esta resultante da fuso em 1978 da Associao de Difuso da Lngua Japonesa do Brasil com a Associao Nipo-Brasileira de Difuso da Cultura Japonesa. Desde quando se instalou o Centro de Difuso da Lngua Japonesa, na Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa j se discutia a necessidade da unificao de entidades congneres. A Fundao Japo e a JICA, igualmente, precisavam contar com uma instituio unificada, para o envio de professores bolsistas ao Japo e o recebimento de professores enviados do Japo. Resultou da a criao do Centro de Estudos da Lngua Japonesa, entidade agora independente da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa. Algumas informaes sobre a Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Brasil, uma das entidades que integraram o Centro de Estudos da Lngua Japonesa. Com o trmino da II Grande Guerra foi liberado o ensino da lngua nipnica no Brasil. Quase todas as escolas de lngua japonesa que existiam antes da guerra voltaram atividade. Reunindo essas escolas a fim de lhes dar uma unidade de orientao quanto ao ensino de japons, foi criada a Hakkoku Nichigo Gakko Rengokai (Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Brasil, conhecida pelo nome abreviado de Nichigakuren). Criada em janeiro de 1955, foi registrada em 1960 como entidade legalmente reconhecida. Em 1970 existiam 350 escolas de lngua japonesa (particulares, mantidas pelas associaes de japoneses ou de pais, entidades religiosas, etc), com 22 mil alunos de curso primrio e secundrio, e 400 professores. A maioria de alunos primaristas e secundaristas tinha idade de 5-6 anos e 12-13 anos. Entre as atividades da Nichigakuren constavam: exposio de trabalhos escolares, sesses de msica, dana e sesses de contar histria (ohanashitaikai); curso para professores de toda a comunidade, publicao e distribuio do rgo oficial Nichigaren-Tayori (Notcias da Nichigakuren). Os cursos de aperfeioamento de professores so a funo mais importante da entidade. Desde 1958 at sua fuso com o Centro de Difuso da Lngua Japonesa promoveu 30 desses cursos. Trata-se de uma organizao de ensino que nasceu e cresceu na colnia nikkei. So muitas as atividades do Centro de Estudos da Lngua Japonesa instalado em 1988: pesquisa da situao das escolas, exame de habilitao em lngua japonesa, cursos de formao de professor, seminrio intensi-

CRESCE O INTERESSE PELA CULTURA JAPONESA 451

vo, cursos de professores para aperfeioamento no Japo, reunio de estudos de professores de todo o Brasil, da Amrica Central e do Sul, reunio rotineira de professores, elaborao de livros didticos e de material escolar, administrao da Escola Anexa do bairro de Jabaquara, viagem de estudantes ao Japo para aperfeioamento, viagem de grupos de jovens ao Japo para intercmbio cultural, sesso oratria em japons, sesso de contar histrias (ohanashitaikai), aula de pintura, aula de caligrafia, orientao por professores itinerantes, conferncias, cursos diversos, etc. A JICA (Agncia de Cooperao Internacional do Japo) e a Fundao Japo cooperam enviando professores do Japo para o Centro de Estudos da Lngua Japonesa do Brasil. Alm disso fornecem ajuda financeira aos estudantes que viajam ao Japo para aperfeioamento, e subveno construo da sede, etc. O exame de habilitao realizado em todo o mundo desde 1984, pela Fundao Japo, conta com o maior nmero de participantes do Brasil, com excelentes resultados. b) Instalao do Centro de Estudos Japoneses da USP Data de 1963 a criao do Curso de Lngua e Literatura Japonesa do Departamento de Lnguas Orientais da Faculdade de Filosofia, Letras e Cincias Humanas da Universidade de So Paulo. Trata-se do primeiro curso de japons numa universidade brasileira.,O da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo foi instalado em 1982.Assim que comeou a funcionar o Curso de Lngua e Literatura Japonesas, vozes se levantaram reclamando a necessidade de um rgo destinado a pesquisar de modo abrangente a cultura nipnica. Graas aos esforos dos interessados, em junho de 1969 instalou-se na rua Mrio Amaral o Centro de Estudos Japoneses, tendo como primeiro diretor o Professor Teiiti Suzuki. O Centro foi instalado em prdio preexistente, no adequado s suas finalidades. Surge ento o movimento pela construo de um prdio prprio para o Centro de Estudos Japoneses. Aps negociaes conduzidas pelo Prof. Suzuki e seus colaboradores com a USP, esta decidiu ceder um terreno de 3.500 m 2 dentro do campus da Universidade para a construo do edifcio do Centro de Estudos Japoneses. A seguir completa-se o plano de construo, que recebe forte impulso com a doao de 120 milhes de yens pela poderosa Keidanren (Federao das Organizaes Econmicas do Japo). Em novembro de 1974 foi lanada a pedra fundamental. A construo do prdio do Centro de Estudos Japoneses foi includa entre os empreendimentos conjuntos acordados durante a visita do presidente Geisel ao Japo. O presidente brasileiro e o primeiro-ministro

452 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

Kakuei Tanaka assinaram o acordo que facilitou muito a participao de entidades nipnicas na obra, mediante contribuio em dinheiro. Alm da contribuio de 1.750.000 cruzeiros da Keidanren, a Fundao Japo entrou com 3.750.000, o Fundo da Expo-70 com 750.000, e a coleta na colnia com 2.000.000, totalizando 8.250.000 cruzeiros, recebidos pela Comisso de Construo. O edifcio foi inaugurado em abril de 1976. Tem quatro andares, com rea construda de 2.736 m2. Desde ento o Centro de Estudos Japoneses se tornou o espao destinado aos japonologistas e formou muitos especialistas competentes. Em 1982 chegou do Japo o Prof. Kensuke Tamai, da Universidade de Waseda, para ocupar o cargo de diretor do Centro de Estudos Japoneses, em substituio ao Prof. Suzuki que se aposentou. O Prof. Tamai permaneceu no cargo durante cinco anos, exercido crn muita proficincia, conseguindo excelentes resultados, e at auxiliou na formao de dois professores-doutores em literatura nipnica. O Prof. Tamai, que lecionou tambm na Princeton e na Sorbonne, deixou marcada sua atuao no s no mbito universitrio como fora dele, orientando e ajudando estudiosos da cultura japonesa.

4. A VOLTA PTRIA DE IMIGRANTES E O FENMENO DEKASEGI

a) Regresso de imigrantes Os imigrantes japoneses de antes da guerra eram originariamente em sua maioria dekasegi (emigrante que vai trabalhar por pouco tempo no exterior a fim de ganhar dinheiro e regressar ptria). A maioria, entretanto, teve de permanecer para sempre no Brasil. Evidentemente existem imigrantes do pr-guerra que retornaram ao Japo. Salvo excees, eles podem ser considerados como os que conseguiram o objetivo dos dekasegi, embora seu tempo de permanncia aqui variasse muito e em geral tenha sido mais longo do que esperavam. No entanto, seu nmero dentro do conjunto no passa de uma minoria. At a dcada de 60, poucos imigrantes voltavam em carter definitivo para o Japo. Entre os que regressavam havia os repatriados com ajuda governamental, por se acharem doentes ou em situao de penria. Tais imigrantes davam a imagem de fracassados na tentativa de ganhar dinheiro como dekasegi. J na dcada de 70, aparecem alguns imigrantes vindos no psguerra que voltavam ao Japo. Uma das causas era o fato de que no se podia ganhar muito dinheiro no Brasil. Nessa fase ainda no se verificava diferena muito acentuada na situao econmica do Brasil e do Japo.

A VOLTA PTRIA DE IMIGRANTES E O FENMENO DEKASEGI 453

Ambos marchavam por uma rota de intenso desenvolvimento. Entre os imigrantes do ps-guerra, que se repatriavam, muitos o faziam mais por motivos de ordem cultural: diferena de lngua, hbitos e costumes, alimentao, moradia, etc, tal como os imigrantes-colonos do pr-guerra. Embora nem sempre estas duas causas no-econmicas sejam devidamente consideradas, seu peso no pode ser ignorado. algo incompreensvel para nikkeis que moram nas capitais e cidades de So Paulo e Paran e outros Estados: os imigrantes do psguerra introduzidos em colnias federais e estaduais do interior longnquo sofrem tremendamente com o gap de civilizao, logo que chegam. O choque cultural resulta do embate entre culturas diferentes. Mas, para os imigrantes conduzidos quelas regies afastadas de centros urbanos, antes do choque cultural havia o gap de civilizao. O imigrante no raro defrontava-se com situaes desagradveis resultantes da ignorncia de alguns caboclos locais, que ameaavam, invadiam a terra ou mesmo a casa de imigrantes, roubavam e demonstravam uma estranha curiosidade em relao aos forasteiros. Eram homens rsticos, analfabetos. E verdade que h regies onde a populao local, mesmo cabocla, e analfabeta, mais civilizada e at corts, procurando conviver em harmonia com os elementos vindos de fora. Quase sempre o relacionamento entre moradores antigos de uma localidade com novos elementos depende muito da boa vontade, compreenso e tato de ambas as partes. Os imigrantes de antes da guerra, em particular os das primeiras levas, suportaram piores situaes. Ento no era aconselhvel regressar ao Japo, porque suas condies econmicas no ofereciam boas perspectivas para aqueles que quisessem voltar devido s diferenas culturais com a populao local. Veteranos imigrantes achavam que os do ps-guerra se deixavam desanimar por muito menos sofrimento do que eles, os de antes da guerra, haviam enfrentado e superado. b) O boom dekasegi At a segunda metade da dcada de 70, havia o regresso de imigrantes japoneses desiludidos com a vida no Brasil, mas inexistia o chamado dekasegi. Chama-se dekasegi aquele que deixa aqui a base econmica da famlia para trabalhar temporariamente no Japo, a fim de conseguir um ganho salarial melhor. No comeo, o dekasegi estava restrito a imigrante issei ou de pessoas de dupla nacionalidade. Por causa do problema da faixa etria e tambm pela diminuio cada vez maior do nmero de isseis disponvel, os niseis passam a ser objeto de aliciamento para o trabalho no Japo, onde desde

454 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

1984 falta mo-de-obra em todos os setores. Em especial no setor de "operaes simples" a escassez de trabalhador muito sria, chegando a provocar a falncia de empresas. Em conseqncia, o salrio convidativo para o nosso padro. Por isso, por volta da segunda metade de 1986 explode um verdadeiro "boom" do movimento dekasegi de isseis e niseis. O fenmeno no se limita colnia nikkei do Brasil; acontece igualmente em outras comunidades nikkeis como as da Argentina, Paraguai, Bolvia, Peru e outras. O Japo aceita no apenas isseis como niseis porque o pas tradicionalmente adota a orientao de jus-sanguinis, reconhecendo que "filhos de japoneses nascidos no exterior so tratados como se fossem japoneses" . O nisei que viajar com passaporte de turista ao Japo pode facilmente troc-lo por visto de trabalhador. Embora no se tenha nmero exato, estima-se que at o fim de 1988 cerca de 30 mil nikkeis (cerca de 30% isseis) se dirigiram do Brasil ao Japo na condio de dekasegi. Dada a escassez de mo-de-obra, muito intenso o esforo das empresas nipnicas para atrair dekasegi. amplo o espao ocupado por anncios de "procura-se empregado" em jornais de lngua japonesa editados no Brasil. Por falta de estatsticas impossvel saber o valor de dinheiro remetido pelos dekasegi nikkeis. Segundo a estimativa de um banco nikkei, no ano de 88 a remessa seria de 12 milhes de dlares mensais, totalizando 140 milhes no ano, reunindo-se as remessas bancrias e por outros meios. Acredita-se que muitas remessas so feitas por vias irregulares. o chamado underground money que os japoneses abreviam para anguraman, no registrado oficialmente. O resultado positivo do movimento dekasegi um polpudo ganho em dlares, argumento de defesa dessa imigrao s avessas adotado por muitos. Na realidade, presentemente impossvel ganhar tanto dinheiro no Brasil, onde reina uma crnica inflao e crise econmica. Outra conseqncia, esta indireta, reside no fato de dezenas de milhares de nikkeis, ao viverem dois ou trs anos no Japo, acabarem conhecendo muitas peculiaridades do povo japons, e at alguns dos seus aspectos culturais. Tudo somado, acredita-se, os dekasegi podero contribuir para estreitar as relaes entre o Brasil e o Japo. Mas h o lado negativo: a diminuio da produo das reas de onde eles saem para trabalhar no Japo. Sabe-se que nas concentraes de nikkeis, com a partida de muitos de seus membros ativos, s restam associados idosos nas associaes de japoneses locais, influindo negativamente no seu funcionamento. Em especial muito srio o efeito sobre as escolas de lngua japonesa mantidas pelas associaes de japoneses. Aumenta o nmero de alunos

A VOLTA A PTRIA DE IMIGRANTES E O FENMENO DEKASEGI 455

desejosos de estudar o idioma nipnico, porm falta professor, o que tem causado at o fechamento de escolas em diversas localidades. Verifica-se a reduo de feirantes nikkeis nas feiras livres que abastecem a capital paulista de gneros de primeira necessidade. O mesmo sucede com hortifrutigranjeiros dos subrbios de So Paulo. Diminuindo o volume de produo, sobem os preos. Somem at funcionrios de empresas nipnicas aqui estabelecidas, atrados pelo movimento dekasegi. Essa "desero" acontece tambm em firmas da prpria colnia. As vagas so preenchidas por empregados brasileiros no nikkei, quando se encontram elementos capacitados. O curioso que essa substituio de mo-de-obra nipnica ou nikkei por brasileiros est acontecendo com certa freqncia nos restaurantes japoneses, nos quais cozinheiros, gares e garonetes nikkeis so substitudos por brasileiros. Estes, com a sua conhecida versatilidade, aprendem depressa a arte culinria japonesa, fato at pouco tempo impensvel. Outro problema srio: quando o chefe de famlia se ausenta por longo tempo, corre-se o risco de separao e disperso da famlia. Notase ultimamente a tendncia de viajarem famlias inteiras a fim de evitar esse problema. Evita-se a separao da famlia, mas cria-se um novo problema: a adaptao de esposas e filhos cultura nipnica. O mesmo que os imigrantes japoneses enfrentaram quando vieram para o Brasil. impossvel prever o fim do movimento dekasegi enquanto perdurar a inflao no Brasil. Para o Japo virtualmente s seguem nikkeis. Mas numerosos brasileiros no nikkeis esto indo para o exterior em busca de atividade econmica mais rentvel. N u m pas como o Brasil, que tradicionalmente recebia grande nmero de imigrantes, o regresso destes aos pases de origem, ou a sada de dekasegi em massa, representa um problema srio. por essa razo que o governo brasileiro considera a agenciao de dekasegi atividade ilegal e adota orientao de disciplinar o assunto. No Japo tambm existem os exploradores de dekasegi, que a ttulo de comisso para arrumar emprego extorquem parte do salrio. Diversos exploradores j foram denunciados. Entretanto, enquanto continuar a existir a diferena na situao econmica dos dois pases, e vigorando a lei da oferta e procura, ser impossvel impedir a sada de dekasegi. Mas, como o nmero de nikkeis do Brasil tem um limite, ser impossvel que a corrente inversa de imigrao continue sem parar. Prev-se, isto sim, a possibilidade de concretizao do "fenmeno reverso de imigrao", com a radicao permanente de nikkeis no Japo. Para normalizar e legalizar o movimento dekasegi indispensvel promover um entendimento entre os governos brasileiro e japons. Mais

456 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

uma ironia da histria teremos se for concludo um acordo Brasil-Japo sobre dekasegi o reverso do Acordo de Imigrao Nipo-Brasileiro assinado em 1960.
5. O PAPEL DESEMPENHADO PELOS JORNAIS NIKKEI

Em 1988 existiam trs jornais dirios na colnia: So Paulo Shinbun, Jornal Paulista e Dirio Nippak. Todos lanados no ps-guerra. O So Paulo Shinbun em 12 de outubro de 1946; o Jornal Paulista em 1. de janeiro de 1947 e o Dirio Nippak em 1. de janeiro de 1948. Outros jornais foram publicados, alm de um jornal de antes da guerra que voltou a circular por certo tempo, porm no tiveram continuidade. Jornais de diversas tendncias inundaram a comunidade nikkei, refletindo a situao catica do imediato ps-guerra. Um s rgo, o Jornal Paulista (o Dirio Nippak foi lanado depois), apoiado por grupo esclarecido, assumiu a posio de informar a verdade sobre o fim da guerra. Contudo, com a paulatina melhoria da situao e o fim da confuso na colnia (ver Captulo 4), consolida-se a posio dos trs dirios, ainda hoje em circulao, disputando o mercado. Tal como no perodo que antecedeu guerra, a influncia dos jornais da colnia grande. impensvel a existncia da colnia nikkei sem os seus jornais. Os imigrantes isseis, em geral (h excees honrosas), no conseguiam entender bem o portugus, por isso dependiam dos rgos editados em japons para se informar sobre os acontecimentos da colnia, do Japo, do Brasil e do mundo. As relaes da colnia nikkei com sua imprensa apresentam mltiplas facetas. At a dcada de 70, quando se generaliza o uso de avio nas viagens de ida e volta ao Japo, a colnia constitua uma espcie de comunidade fechada. A comunicao com o Japo, regra geral, era demorada: jornais e revistas do Japo transportados de navio levavam de dois a trs meses para chegar ao Brasil. Como fonte de noticirio dirio existiam e ainda funcionam as transmisses da rdio estatal NHK para a Amrica do Sul. Alm das dificuldades de recepo apresentavam o inconveniente do horrio (s primeiras horas da manh). Na prtica, poucos podiam ouvir. Posteriormente apareceu o programa de informes urgentes, destinado, porm, s empresas japonesas instaladas no Brasil, ou, mais precisamente, na cidade de So Paulo. No interessava colnia. Por tudo isso, os jornais em lngua nipnica constituem os nicos veculos de informao sobre o Japo, a situao brasileira e mundial para a colnia, em especial para os isseis do interior. A caracterstica principal dos jornais de lngua japonesa est no seu

O PAPEL DESEMPENHADO PELOS JORNAIS NIKKEI 457

relacionamento direto com a comunidade. Sem falar na sua funo de veculos de comunicao, representavam a liderana da opinio pblica da colnia e funcionavam na formao do consenso da comunidade. Por outro lado, constituam o espao onde leitores expressavam sua opinio, e enviavam colaboraes literrias como haiku, tanka, poesia, prosa e outros gneros da literatura japonesa. Serviam ainda como um campo de batalha entre grupos antagnicos, seja em assuntos relativos a toda a comunidade ou parte dela. As "batalhas" de declaraes travadas entre as partes, em forma de anncios, proporcionavam receitas extras s empresas editoriais dos jornais. E havia notcias que alegravam ou entusiasmavam os leitores, ao lado de outras que os entristeciam, irritavam ou revoltavam. Os jornais, por sua vez, nem sempre satisfaziam os leitores. s vezes veiculavam informaes tendenciosas ou eivadas de parcialidade, ou ainda notcias erradas ou precipitadas. Chegavam casos raros a ferir direitos humanos. Tudo isso e mais alguma coisa includa, os jornais nikkei constituam uma peculiaridade da colnia. Talvez por terem sido fundados por imigrantes, apresentavam certas caractersticas comuns de rgos de oposio, colocavam-se ao lado dos fracos e perseguidos, assumiam atitude crtica em relao s representaes diplomticas e entidades de emigrao do Japo. Em todos os grandes acontecimentos e realizaes dos imigrantes, a "imprensa colonial" teve um papel muito valioso. Os grandes empreendimentos e movimentos coletivos tiveram seus planos e motivos divulgados e discutidos, as contribuies e coletas para obras de vulto da comunidade, tudo era noticiado nas colunas dos jornais, formando assim uma corrente ou tendncia favorvel s iniciativas de interesse coletivo. No obstante constiturem iniciativas privadas, os jornais apresentavam e ainda apresentam caractersticas de rgos oficiais da colnia nikkei. Todavia, com a diminuio de imigrantes isseis aumenta o nmero de niseis e sanseis que no lem japons. Debilita-se a razo de ser e o poder de influncia dos jornais de lngua nipnica. Eles mantm uma seo em lngua portuguesa para atrair leitores de novas geraes. Mas os niseis e sanseis dispem de veculos mais completos, que so os jornais brasileiros, dispensando portanto a leitura de pginas em portugus de jornais da colnia. Desde alguns anos, importantes jornais do Japo imprimem suas edies internacionais utilizando os satlites, possibilitando sua leitura quase sem diferena de fuso horrio. Destarte, reduz-se muito at mesmo a dependncia de funcionrios de empresas nipnicas aqui estabelecidas da imprensa nikkei.

458 FIM DA IMIGRAO E CONSOLIDAO DA NOVA COLNIA NIKKEI

Os jornais de lngua japonesa de uma comunidade de imigrantes tm o implacvel destino de acompanhar as vicissitudes dos imigrantes isseis. Quando estes desaparecem, os jornais perdem sua base de sustentao e acabam acompanhando a sorte dos seus leitores. o que se observou em pas que receberam imigrantes japoneses antes do Brasil: Estados Unidos (Hava, Los Angeles), Peru e Argentina. perfeitamente previsvel a mesma marcha no caso da imprensa da colnia nikkei do Brasil, a no ser que ela encontre um caminho novo para sua sobrevivncia. (Tetsuo Nakasumi/Jos Yamashiro)

PARTE II

CONTRIBUIES DOS IMIGRANTES JAPONESES NO BRASIL

CAPTULO 1

PAPEL DESEMPENHADO NA AGRICULTURA BRASILEIRA


1. INTRODUO E DESENVOLVIMENTO DE NOVAS CULTURAS 2. IMPLANTAO DA AGRICULTURA INTENSIVA 3. DESENVOLVIMENTO DE NOVA AGRICULTURA 4. FUNDAO E DESENVOLVIMENTO DAS COOPERATIVAS AGRCOLAS

S imigrantes japoneses entraram no pas como trabalhadores agrcolas contratados nas fazendas de caf no perodo que antecedeu a II Guerra Mundial, e no ps-guerra, tambm como lavradores na sua grande maioria. Assim, praticamente todos os imigrantes japoneses passaram pela experincia agrcola no Brasil. Entretanto, nesses ltimos 20 anos essa situao sofreu grandes mudanas. Com o desenvolvimento do pas, passando de agrcola para industrial, os japoneses no Brasil tambm viveram transformaes visveis. Os imigrantes cederam os seus lugares na famlia e no trabalho aos filhos e netos; os niseis e sanseis, educados nos estabelecimentos de ensino superior, se ocupam das profisses mais variadas, residindo em grande nmero nas cidades. Desta maneira, o percentual da populao de origem japonesa que se dedica agropecuria decresceu visivelmente em cotejo com os tempos idos. Presentemente, calcula-se que apenas 15% dos 1,28 milho de japoneses e seus descendentes se dedicam aos trabalhos do campo. Essa diminuio da populao voltada para a produo agropecuria est de acordo com a tendncia geral brasileira, no significando decrscimo da participao dos lavradores de origem japonesa nesse setor produtivo. Levando-se em conta a expanso significativa verificada na rea trabalhada per capita, graas adoo de tcnicas modernas, eles continuam representando uma fora expressiva na agropecuria brasileira. Na dcada de 50, no Estado de So Paulo, e nos anos 60, no Estado do Paran, as matas virgens praticamente j haviam desaparecido, e a partir dos anos 70 se iniciou a expanso dos agricultores de origem japonesa pelas terras dos estados de Minas, Mato Grosso e outras regies. Nessa poca se processa a transio da primeira gerao para niseis, o

462 PAPEL DESEMPENHADO NA AGRICULTURA BRASILEIRA

incio do xodo rural, as mudanas nas profisses, a urbanizao. Verifica-se a diminuio do nmero de agricultores, mas a escala de produo de cada lavrador se eleva. Essa ampliao da escala de produo agrcola foi incrementada ainda mais com a introduo de mquinas mais potentes. Hoje em dia no so raros os estabelecimentos que possuem "piv central", instalao que permite irrigar 100 hectares com uma nica mquina. Existem estabelecimentos que contam vrias dessas unidades que permitem o planejamento das culturas para o ano todo, minimizando-se as influncias do perodo das secas. A contribuio dos agricultores de origem japonesa no foi, porm, no aspecto da ampliao das reas de cultura: a diversificao das culturas foi uma de suas preocupaes constantes. Os esforos de introduzir novas culturas se intensificaram principalmente a partir da dcada de 30. A avicultura, as culturas de rami, juta e pimenta-do-reino, e a produo do ch preto so as mais conhecidas. Essa tradio continua at os dias de hoje, enriquecendo as variedades dos produtos agrcolas, podendo apontar-se quase 3 dezenas delas entre frutas, verduras e hortalias, alm da consolidao da posio econmica da floricultura. Sua participao na introduo de novas culturas, de variedades melhoradas e renovaes tcnicas permitiu tornar mais rica e variada a oferta no mercado domstico, e tambm ensejou a conquista da condio de "exportvel" para alguns produtos. Outro aspecto que deve ser considerado a expanso dos lavradores de origem japonesa em vrias regies do pas. At a dcada de 60, os agricultores de origem japonesa se encontravam, com poucas excees, nos estados de So Paulo, Paran e Rio de Janeiro, e em algumas reas do Rio Amazonas. A partir dessa poca, os agricultores localizados na Regio Sul do pas comearam a deslocar-se para o Estado de Minas Gerais e regies mais ao norte, e da em diante passaram a estabelecer-se em todo o territrio nacional. Lavradores de origem japonesa j se acham instalados nos cerrados dos estados de Minas Gerais, Bahia, Maranho e Piau, nas caatingas do Vale do So Francisco, na Zona da Mata do Nordeste, e estendem suas atividades ao alto Amazonas. Acompanhando os agricultores do sul do pas que se dirigiram para as regies de clima tropical do Nordeste e de cerrado da parte interior do pas, os lavradores de origem japonesa comearam pela coleta de dados climticos e por familiarizar-se com as mincias das condies naturais da regio, efetuando testes com variadas culturas para poder encontrar as mais adequadas s respectivas regies. Por exemplo, no Estado de Gois j se formou uma boa rea de arrozal irrigado contribuindo para o aumento da produo desse gro; no Vale

INTRODUO E DESENVOLVIMENTO DE NOVAS CULTURAS 463

do So Francisco se produzem diversos tipos de frutas e hortalias, propiciando at o aparecimento de indstrias de seu processamento e conservas. E na Zona da Mata comeam a surgir reas de produo de papaia, melo, nozes macadmia e de especiarias. As cooperativas agrcolas fundadas por imigrantes japoneses, como a Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central e a Cooperativa Agrcola Sul-Brasil, vm desempenhando papel importante nessa expanso das reas de produo. Suas contribuies vm sendo decisivas nos aspectos da formao de ncleos produtivos, na assistncia tcnica, na circulao de mercadorias, no escoamento da produo, no fornecimento de insumos e maquinaria. Pode-se dizer que a modernizao da agricultura brasileira teve incio nos anos 70. Nesse processo, imperioso o crescimento do nmero de agricultores com capacidade empreendedora, com amplo conhecimento, tanto de tcnica como de administrao, para trabalhar a terra dadivosa. Nesse aspecto, os imigrantes japoneses cuidaram desde cedo de formar os agricultores da gerao seguinte. Como parte desse esforo, as citadas cooperativas agrcolas atuaram para facilitar o estgio de jovens agricultores nos pases de agricultura avanada como os EUA, Holanda e Japo. Esses estagirios esto se dedicando s produes agrcolas, inclusive nos campos do cerrado, nas lavouras irrigadas margem do Rio So Francisco, exercendo importante funo de liderana regional. A contribuio dos japoneses agricultura nacional, iniciada em 1908, certamente tender a ampliar-se atravs de seus sucessores. Ter, com certeza, o seu lugar na agricultura brasileira, que dever tornar-se um dos importantes centros de fornecimento de alimentos para o mundo no sculo XXI, com 5 bilhes de homens.

1. INTRODUO E DESENVOLVIMENTO DE NOVAS CULTURAS

Ainda no fim do sculo XVIII, era restrito o nmero de produtos agrcolas no Brasil, podendo-se nomear como os principais a mandioca, milho, feijo, banana, manga, laranja, goiaba, mamo, abacaxi, cebola, abbora, inhame, alho, batata-doce, couve, etc, apontando-se, ainda, como produtos agrcolas especiais, o caf, cacau, algodo, tabaco, canade-acar, coco, etc. No eram mais de 20 os produtos cultivados. Essas produes ficam mais variadas e ricas com a chegada dos imigrantes estrangeiros. Eles trouxeram, cada qual, produtos bsicos do seu cotidiano, passando a enriquecer a variedade dos produtos agrcolas. Os imigrantes que mais contriburam para isso foram os italianos e os japoneses. Estes no s se esforaram por trazer novos produtos de sua

464 PAPEL DESEMPENHADO NA AGRICULTURA BRASILEIRA

terra, como tambm se empenharam em introduzir novas culturas e desenvolveram continuados trabalhos de melhoria das variedades existentes no pas, conseguindo at mesmo o cultivo econmico de variedades consideradas nativas. A seguir, enumeraremos esses produtos, excluindo os de menor expresso econmica. Para cada item, mencionada a quantidade recebida pela Ceagesp So Paulo no ano de 1988, sendo que batata, cebola, alho e ovos, os quais a Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central e a Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil recebem e comercializam em separado, foram assinalados parte. 1) Frutas Abacate (Persea americana Mill) Originrio da regio que abrange a Colmbia, Equador e Mxico, foi trazido para o Brasil por volta de 1541-42, entrando na Amaznia atravs do Peru. Foi se disseminando cada vez mais, avanando para o sul, passando a ser muito conhecido na poca do Imprio. Em 1921, o Prof. Henry, da Universidade da Flrida, deu orientao tcnica sobre sua cultura na Escola de Agricultura de Viosa. O Instituto Agronmico de Campinas e alguns viveiros importaram dos EUA variedades mexicanas, guatemaltecas e outras variedades cruzadas, ao todo quase 55 variedades, das quais foram selecionadas as que so cultivadas presentemente no pas. O agricultor Taizo Ito, estabelecido no municpio de Itapetininga, So Paulo, fez a seleo, no seu pomar, da variedade "Coringa", de fruto grande (cerca de 800 g), de excelente qualidade. Formou cerca de 160 mil mudas e se empenhou na sua divulgao para o pas todo, sendo a "Coringa" considerada, atualmente, a melhor variedade comercial. Em 1972, a Cooperativa Agrcola de Cotia trouxe dos EUA uma variedade de fruto pequeno para exportao, procedendo ao trabalho de experimentao. Comprovada sua qualidade, recentemente comeou a distribuio de mudas. No Estado do Paran, os Makiyama, pai e filho, fizeram a seleo da variedade "Margarida", adequada para o cultivo em regies mais frias. Durante o ano de 1988, as entradas na Ceagesp-So Paulo foram de 1.618.132 caixas de 22 kg. Abacaxi (Ananas comosua Linn) O abacaxi, tido como originrio das regies norte e central do Brasil, j era cultivado neste pas no sculo XVI. Os tipos mais conhecidos so o branco e o amarelo. Em 1935, Toyokichi Imai adquiriu de Yoshizo Ando, estabelecido

INTRODUO E DESENVOLVIMENTO DE NOVAS CULTURAS 465

em Sete Barras, SP, mudas da variedade "Smooth-Cayenne" (sem espinho, adequada para grandes cultivos e industrializao), trazida de Cingapura, e passou a produzir mudas e divulg-la. Atualmente, essa variedade est substituindo amplamente as variedades tradicionais nas culturas dos estados de So Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso. As exportaes se referem exclusivamente a essa variedade. Entre os grandes exportadores se encontram os produtores de origem japonesa, Satoru Yoshiura e Junsuke Oda, estabelecidos em Bauru, SP. A produo de abacaxi est sendo cogitada como promissora na lavoura do cerrado. Entradas no ano de 1988: 205.980 caixas de 15,5 kg e 94.598 caixas de 17 kg. Ameixa (Prunus salicina var. japonesa; Prunus domestica var. europia) Existem ameixas de trs origens diferentes: a japonesa, vinda do Japo/China; a de origem europia, trazida da Europa/Oeste asitico; e a de origem americana. Presentemente, no Brasil so cultivadas as variedades de origem europia (para industrializao) e japonesa (para consumo "in natura"). No Brasil, h tempos se plantou a variedade japonesa introduzida atravs dos EUA, conhecida como "Santa Rosa", "Kersy Paulista", mas no passava de plantao de quintal, sem valor comercial. Os imigrantes japoneses conseguiram desenvolver sua produo fazendo o trabalho de seleo e melhora dessa variedade. A variedade mais cultivada atualmente a "Carmesim", melhorada no Instituto Agronmico de Campinas em 1969, sendo que os agricultores de origem japonesa, estabelecidos em diversas regies do Estado, colaboraram nos trabalhos de cruzamento, seleo, fixao e divulgao da variedade. Entradas em 1988: 377.691 caixas de 7,3 kg; 11.022 caixas de 25 kg; 1.933 caixas de 2 kg. Importao: 294.433 caixas de 10 kg. Caqui (Diospyros kaki Linn. f) O caqui originrio do Japo. Existem cerca de 200 variedades, sendo que quase todas so encontradas nesse pas. Pereira Barreto trouxe-o da Frana, primeiro em semente e depois na forma de muda, por volta de 1890. Veio do Japo passando pela Frana. Tratava-se de variedades "Zenjimaru", "Hachiya", "Emon", "Fuji myotan", "Mino", etc, variedades adstringentes. As variedades de caqui doce foram introduzidas pelos imigrantes japoneses. Matsumoto, em 1916, e Yoshioka, Nishioka, Watanabe e outros, em 1923, trouxeram do Japo, respectivamente, as variedades "Fuy" e "Jir". Yoshioka introduziu ainda os caquis adstringentes "Mino" e "Aizu mishirazu", e Kurihara trouxe as variedades "Hachiya melhorada" e "Hira tanenashi".

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Fruta nostlgica para os imigrantes japoneses, a divulgao da cultura de caqui foi rpida. Ao se tornar lavrador independente, o p de fruta caseira que o imigrante japons plantava era o caquizeiro. Entretanto, por causa do costume brasileiro, de s chupar o caqui maduro, mole, a produo de caqui doce, duro, se tornou comercial s a partir dos anos 50. Ultimamente o consumo desse tipo de caqui aumentou bastante e a plantao se estendeu a vrias regies. Apesar de pequena, j se exporta a variedade "Fuy" para a Europa. Em 1988, Ceagesp-So Paulo recebeu 1.278.845 caixas de 4,5 kg e 357.139 caixas de 27 kg. Goiaba (Psidium guajava Linn) Considerada originria da Amrica tropical, a introduo no Brasil se diz ter ocorrido aps a descoberta. A goiaba encontrada em estado nativo em muitas regies do territrio nacional. Foi Sakuzo Sawabe o primeiro a realizar a cultura econmica da goiaba. Em 1939, ele conservou as goiabeiras encontradas em sua terra e dispensou o mesmo trato dado aos seus pessegueiros. Mandou as goiabas colhidas ao mercado e conseguiu vend-las a 2 mil ris a dzia (a dzia de ovos na poca era 2 mil ris). Achou interessante e fez propaganda do sucesso. Atualmente, a cultura da goiaba para consumo tomou alento nos estados do Rio e So Paulo, tendo sido implantada a tcnica de frutificao durante o ano todo. Shin-ichi Ogawa, produtor do Estado do Rio, foi bem-sucedido na seleo das variedades "Santa Alice melhorada", "Ogawa branca n. 1", "n. 2 vermelha", "n. 3 vermelha", que, bem recebidas no mercado do Rio e So Paulo, esto sendo plantadas em diversas regies. Outrossim, Haruo Kumagai, em Campinas, e Nishimori, em Atibaia, conseguiram selecionar e fixar variedades que so designadas, respectivamente, pelos seus sobrenomes, com boa aceitao. A Cooperativa Agrcola de Mirandpolis, no interior do Estado de So Paulo, possui instalaes de industrializao dessa fruta. As entradas em 1988 na Ceagesp-SP foram: 132.491 caixas de 20 kg, 2.657.794 caixas de 3,7 kg. Mamo (Carica papaya Linn) Originrio da Amrica Central, o mamo cultivado em extensas reas das regies tropical e subtropical no mundo inteiro. No Brasil, disseminada a sua cultura, do Par ao Estado do Paran, no se tem informaes sobre o plantio dessa fruta no pas, como no se tem notcia digna de destaque de melhora da cultura.

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Em 1971, Maruoka, Ooya, Yamase e outros, cultivadores de pimenta-do-reino no Estado do Par, s voltas com o problema de doenas (fusrio) nessa cultura, com a ajuda de Akihiro Shirakibara, sacerdote da seita Tenry-ky, trouxeram sementes de mamo havaiano, melhorado pelo departamento de agronomia da Universidade do Hava. Posteriormente introduziram tambm o mamo de Taiwan (Formosa). Hoje em dia, essa cultura se estende do Norte ao Estado da Bahia, e a fruta aceita pelos consumidores de So Paulo, Rio de Janeiro e outras cidades do interior. E exportado tambm para o mercado europeu. Os recebimentos pela Ceagesp-SP em 1988 foram de 1.968.794 caixas de 34 kg de variedades comuns e 7.468.271 caixas de 6 kg de papaia havaiana. Pec (Canja -pecam Engler et Graebner) Esta noz foi introduzida pelos imigrantes americanos no ano de 1865 no Brasil. Entretanto, a sua plantao no se disseminou. Masayuki Terabe, de Ura, PR, em 1942, e Yoshiji Kakihara, de Presidente Prudente, SP, em 1948, iniciaram amplas plantaes de peca, e em 1950, Toyohiko Kagawa, conhecido pregador protestante japons, veio ao Brasil trazendo mudas e sementes de peca, distribuindo-as nos ncleos de imigrantes japoneses no interior de So Paulo e do Paran. Recentemente, foram desenvolvidas variedades resistentes a doenas ("Morokawa n. 1" e "n. 2"), sendo difundida principalmente no municpio de Ura. Melo (Cucumis melo L) O melo foi trazido para o Brasil pelos imigrantes europeus. H muito tempo vem sendo cultivado no Estado do Rio Grande do Sul. Este Estado foi, at o ano de 1966, o maior produtor brasileiro de melo. A partir de 1967, o interior do Estado de So Paulo passou a ocupar o lugar de maior produtor do pas, mas os estados da Bahia, Pernambuco, Par, e demais estados nordestinos, a partir de 1981, comearam a ter grande produo, e atualmente o Estado do Rio Grande do Norte o maior produtor brasileiro. Em 1968, Onishi, de Presidente Prudente, colaborando com o corpo tcnico da Cooperativa Agrcola de Cotia, conseguiu realizar um trabalho de seleo de uma variedade de melo espanhol, que a partir de 1972 passou a ser distribuda nacionalmente com o nome de "Amarelo CAC". Hoje em dia, praticamente toda a produo comercial de melo nacional dessa variedade. Com essa divulgao, a importao de melo da Europa e da Argentina, que na dcada de 60 atingia 120 mil caixas anuais, ficou reduzida a zero. Presentemente, com o aumento substancial da produo nordestina, o melo brasileiro comea a tomar o rumo da Europa, e o Brasil j apresenta condies de se tornar um dos maiores

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produtores dessa fruta no mundo. de se destacar a grande participao dos agricultores de origem japonesa nessa produo. Em 1988, as entradas na Ceagesp-SP foram de: 2.600.010 caixas de 13 kg, 157.157 caixas de 22 kg e 51.364 caixas de 6 kg. Ma (Malus pumila Mili var. domestica schneil) A ma foi trazida pelos imigrantes europeus para o Brasil. No comeo ela foi cultivada nos trs estados do Sul, mas nenhuma variedade trazida se adaptou ao clima. Com pouca frutificao, a produo no chegou a ser econmica. Apenas a variedade selecionada por Erwin Brucknel, no municpio de Piedade, SP, adequada para regies mais quentes, conseguiu se sobressair, passando a ser cultivada em pequenas reas na regio da Serra do Mar, no Estado de So Paulo. Tratava-se, entretanto, de produo reduzida, e com qualidade que deixava muito a desejar. O mercado de mas foi por muito tempo inteiramente ocupado pela ma argentina. Em 1964, dentre as variedades selecionadas e desenvolvidas pelo rgo governamental em Fraiburgo, SC, foram escolhidas "Star Krinson" e "Golden Delicious", iniciando seu cultivo em terras com altitude acima de 1.000 metros nos estados de Santa Catarina, Paran e Rio Grande do Sul. Chegando ao Estado de Santa Catarina no ano de 1971, o especialista em ma, Dr. Kenshi Ushirozawa, enviado pela Japan International Cooperation Agency JICA, a par da orientao tcnica aos plantadores de ma desse Estado, durante seis anos tratou da seleo de variedades trazidas do Japo, escolhendo, afinal, a variedade "Fuji" como a principal. Trabalhou ativamente na formao do ncleo de produo de ma da Cooperativa Agrcola de Cotia, no municpio de So Joaquim, SC, onde orientou a implantao de cerca de 500 hectares, e em 1984 conseguiu uma produo de 720 mil caixas de ma "Fuji". Com esse sucesso, a cultura de ma teve um impulso acentuado, acompanhada de aumento no consumo. Em 1986, a produo alcanou 300 mil toneladas, e em 1989 subiu para 360 mil, com o que a importao dessa fruta foi diminuindo. Em 1986 foram importadas 80 mil toneladas e em 1989 diminui para 54 mil toneladas. J se exporta ma para o hemisfrio norte, que tem poca de colheita defasada da nossa. Os recebimentos na Ceagesp-SP em 1988 foram: 5.274.035 caixas de 21 kg. Nspera (Eriobotrya japonica Lindley) A nspera conhecida de h muito no pas. Existem grandes ps nas

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matas do Rio Grande do Sul. Presume-se que marinheiros portugueses tenham trazido suas sementes para estas bandas. Originria da China, e existindo desde a antigidade no Japo, so numerosos os cultivadores dessa fruta em escala comercial entre descendentes de japoneses. Variedades denominadas "Mogui", "Kusunoki", "Tanaka", etc, trazidas pelos imigrantes japoneses j nos primrdios de sua vinda para o Brasil, em forma de mudas, foram as primeiras cultivadas. Posteriormente, a variedade "Itaquera precoce", selecionada da "Mogui", foi a que mais se difundiu no Estado de So Paulo. Atualmente, as variedades cultivadas so as introduzidas do Japo "Mizuho" e "Ofusa" prevalecendo acentuadamente a primeira. A produo de nspera demanda muita mo-de-obra, como desbaste e colocao de saquinhos de papel, o que faz com que a difuso de sua plantao seja lenta e a quantidade do produto relativamente pequena. Assim, a nspera continua sendo uma fruta nobre. Nos ltimos anos, j se exportam quantidades reduzidas para a Europa. Entradas na Ceagesp-SP em 1988: 276.326 caixas de 5 kg. Pra (Pyrus communis L. var. sativa D.C) No Brasil, existe pra de origem europia, presumivelmente trazida por imigrantes, mas no tem boa frutificao. Os agricultores de origem japonesa trouxeram do Japo, particularmente ou atravs de rgos governamentais, variedades hbridas de pras europias, chinesas (" Yari"), cruzamentos de variedades ocidentais e orientais, japonesas. Recentemente, foram introduzidas as variedades japonesas "Shinsui" e "Ksui" para plantio no Estado de So Paulo, cuja produo, j em curso, est obtendo boa aceitao como frutas nobres. A cultura de pra no Brasil ganhou um grande alento pela adoo da enxertia, usando-se como cavalo p de marmelo de pequeno porte. Com isso, a produo acelerada e o trato fica muito mais fcil, prevendo-se o desenvolvimento acentuado na produo dessa fruta. Como acontecia outrora com a ma, presentemente so importadas cerca de 2 milhes de caixas de pra, o que confere um grande futuro para essa cultura. A maior parte dos produtores de pras nobres constituda de agricultores de origem japonesa. Deram entrada na Ceagesp-SP em 1988: 45.260 caixas de 17 kg. Pssego (Prunus prsica L. Batseh) Apesar de o nome cientfico registrar a Prsia, ultimamente passouse a considerar o planalto do norte da China como a terra originria dessa fruta. Para o Brasil, presume-se que foram os primeiros imigrantes portugueses que a trouxeram. Hoje em dia, existem pessegueiros nativos desde a regio norte do Estado de Minas Gerais at o Rio Grande do Sul,

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mas foi o fruticultor de origem japonesa quem efetivamente comeou a cultura comercial do pssego no pas. Assim, essa cultura tem apenas 60 anos de histria. A maioria das variedades cultivadas advm das selees procedidas pelos agricultores de origem japonesa a partir das plantas abandonadas. As principais variedades presentemente cultivadas tiveram origem nos trabalhos de seleo desenvolvidos pelos irmos Yoshioka, de Itaquera, SP. So as variedades "Giichi", "Taichi", "Rosa de Itaquera", "n. 4.911", "n 5.014" e "Sawabe", desenvolvida pelo agricultor de mesmo nome. Essas variedades representam cerca de 40% dos pessegueiros do Estado de So Paulo. Quanto rea plantada, a participao dos fruticultores de origem japonesa diminuiu para cerca de 20%. As entradas na Ceagesp-SP em 1988 foram: 2.582 caixas de 2,3 kg, 386.383 caixas de 10 kg e 3.191 caixas de 25 kg. Ponc (Citrus reticulata Blanco) Originrio do norte da ndia, est disseminado na ndia, sul da China, Hava, Malsia, Filipinas, etc. No Brasil, o ponc foi trazido do Japo pelos imigrantes japoneses. Em 1929, Kyujiro Kuwabara enxertou as duas mudas de ponc que trouxera do Japo em limoeiro nativo, e da comeou a reproduzi-lo. Dessa cepa originaram as de copas alta e baixa. Inicialmente as plantaes se difundiram entre os japoneses da vizinhana, ganhando terreno no Estado de So Paulo. Presentemente, existem grandes plantadores nodescendentes de japoneses. Entraram na Ceagesp-SP em 1988: 1.626.519 caixas de 27 kg. Morango (Fragaria chiloensis Duch. var. ananasa Bail) A cultura de morango no Brasil data de apenas 50 anos. A produo comercial para valer s foi implantada aps a II Guerra Mundial. Keijiro Honda, selecionando variedades existentes, conseguiu fixar a "Honda" em 1946, que passou a ser cultivada pelos agricultores descendentes de japoneses estabelecidos em Itaquera, SP. Posteriormente, do campo experimental da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, de Piracicaba, SP, surgiram, seguidamente, mudas de excelente qualidade. As cooperativas agrcolas de Cotia e Sul-Brasil passaram a distribuir mudas isentas de vrus, e graas aos esforos de seus cooperadoscultivadores, foram implantadas as tcnicas de formao de mudas e cultivo em altitudes mais elevadas. Hoje em dia, as reas de cultivo de morango se estendem, alm das redondezas de So Paulo, s cercanias das cidades do Rio de Janeiro, Braslia, Curitiba, Porto Alegre, etc. Em 1988, a Ceagesp-SP recebeu: 2.580.619 caixas de 3,2 kg.

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Uvas "Itlia", "Kyoh" grande a contribuio dos agricultores de origem japonesa na produo de uvas "Itlia" e "Kyoh" no Brasil. Em 1940, Susumu Usui, estabelecido em Ferraz de Vasconcelos, SP, desenvolveu, a partir de mudas importadas da Itlia, por Luciano Forenti, a tcnica de cultura de uva "Itlia" e tratou da sua divulgao. Atualmente, esse tipo de uva cultivado nos estados de So Paulo, Paran, Pernambuco e tambm na Bahia, e tem uma slida posio como uva de mesa. Em 1973, Kotaro Okuyama notou uma variao colorida de uva itlia na sua plantao em Bandeirantes, PR. Conseguiu multiplic-la e, nomeando-a "Rubi Okuyama", trabalhou para sua divulgao. Essa variante da uva itlia pode ser tratada como a original, e possui, praticamente, o mesmo sabor, forma e peso, mas tem a vantagem de colorir-se ao iniciar o amadurecimento, tornando-se vermelho-carregado no seu ponto de maturao completa, o que permite conhecer a poca adequada de colheita, sem qualquer erro. Obteve-se at mesmo o registro da variedade no Japo, e a sua produo est aumentando. A variedade "Kyoh", desenvolvida e muito conhecida no Japo, foi trazida para o Brasil pelos viticultores de origem japonesa. Apesar de exigir maiores estudos sobre o desprendimento dos bagos, apreciado como uva de mesa nobre. Noventa por cento da produo de uvas de mesa nobres se deve aos viticultores de origem japonesa, e as exportaes para a Europa j esto regularizadas. As entradas da Ceagesp-SP em 1988 foram: uva "Itlia" 1.757.400 caixas de 8 kg, e "rubi" 665.077 caixas de 8 kg. Melancia (Citrullus vulgaris, Schrad) Originria da frica, segundo consta, foi trazida pelos imigrantes americanos, que vieram s terras brasileiras aps a Guerra da Secesso (1861-65) e plantaram-na em Americana, SP, para seu consumo. Depois da II Guerra Mundial, agricultores de origem japonesa de Bastos, SP, trouxeram do Japo a variedade "Daimuru Yamato", a qual, pela excelncia da qualidade e boa armazenabilidade e resistncia s condies de transporte, suplantou a variedade "Santa Brbara", at ento predominante. Hoje em dia, quase toda a produo da variedade "Yamato". Recentemente, tambm do Japo, foram introduzidas variedades de frutas pequenas, sendo bem-sucedida a variedade "New Kodama", que j se acha no mercado. As entradas na Ceagesp-SP foram de 74.683.550 kg.

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Um (Prunus mume Sieb et Zucc) Originria da China, tambm encontrada no Japo, para o Brasil veio junto com os imigrantes japoneses, mas no vingou. A ameixa-brava de Taiwan (Formosa) foi trazida em 1967, crescendo no municpio de Botucatu, SP. Foi reproduzida nesse municpio e as mudas vendidas para muitos agricultores. Nas cercanias da cidade de So Paulo j se produz certa quantidade para a fabricao de conserva e licores. Castanha (Castanea crenata Sieb et Zucc) H cerca de cem anos, segundo consta, Pereira Barreto, ao trazer da Europa plantas frutferas de clima temperado, trouxe tambm a castanheira do Japo. Quando os imigrantes japoneses chegaram ao Brasil, j existiam castanheiras abandonadas no sul do pas. Em 1958, Keiichi Matsumoto introduziu do Japo muitas variedades e testou-as no seu pomar em Itaquera, SP, como tambm em outros lugares, contando com a colaborao de muitos agricultores. Conseguiu selecionar algumas variedades adequadas s terras brasileiras. Como a castanha cresce naturalmente em regies compreendidas entre 30 e 45 latitude norte, ao redor da linha isotrmica de 12 C, ela exige uma boa tcnica na cultura bem como no seu armazenamento em terras brasileiras, de alta temperatura e umidade. Em virtude de no se poder efetuar a colheita antes do Natal, quando a demanda grande, a plantao da castanheira no conseguiu ampliar-se. 2) Verduras e Hortalias Alface (Lactuca sativa L) So muitas as variedades de alface. considerada originria do interior da Pequena sia, Cucaso, Oriente Mdio e orla do Mediterrneo. No Brasil, a variedade "Butterhead" apresenta melhor desempenho econmico. Trata-se de uma variedade precoce, podendo ser colhida em 60-80 dias, relativamente fcil de cultivar, mas, por causa da fragilidade no transporte, a sua produo se limita aos arredores dos centros de consumo. Uma outra variedade muito cultivada a "White Boston", com pouca resistncia ao calor e aos vrus. Y Nagai, do Instituto Agronmico de Campinas, partindo dessa variedade conseguiu desenvolver a "BrasilTipo 48", resistente aos vrus e com a vantagem de ser cultivvel na primavera e no vero. Os agricultores de origem japonesa so os grandes produtores de alface. Em 1988, as entradas na Ceagesp-SP foram: 2.435.426 engradados de 12 kg, 144.584 caixas de 4 kg.

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Alho (Allium sativum L) O alho foi introduzido no Brasil h muito tempo, atribudo aos primeiros colonizadores portugueses, sendo um condimento importante desde os primrdios da colonizao. Como a produo do alho no se faz pela semente e sim por multiplicao vegetativa, torna-se difcil a criao de uma variedade adequada para as condies brasileiras. Para contornar essa dificuldade, vem sendo feita a introduo de variedades mais renomadas de muitos pases e testadas repetidas vezes para a'seleo das mais adequadas ao clima brasileiro. Os produtores da Colnia Ramos, no Estado de Santa Catarina, em 1974, conseguiram fixar uma variedade j existente no pas, a qual, com o nome de "Chonan", conseguiu a medalha de ouro na exposio nacional de alho, passando, da para diante, a ser a variedade mais cultivada nos estados sulinos. Em 1988, as entradas na Cooperativa Agrcola de Cotia foram de 284.589 caixas, na Cooperativa Agrcola Sul-Brasil de 146.342 caixas e na Ceagesp-SP de 219.561 caixas de 10 kg. Batata (Solanun tuberosum L) Por volta de 1913, os imigrantes japoneses que se mudaram das fazendas de caf, no interior do Estado de So Paulo, para os arredores da capital paulista comearam a dedicar-se cultura de batata, que era produzida pelos agricultores portugueses e espanhis. Comearam a preocupar-se com a seleo das sementes, no que foram bem-sucedidos, conseguindo obter a "Paran-ouro", de maior produtividade. Adotaram, ainda, a adubao e passaram a aplicar "venenos" contra as pragas. Foram, pois, os pioneiros da produo econmica da batata em So Paulo. Esses lavradores no s implantaram um estilo de lavoura intensiva de produo batatcola, como foram os propulsores da fundao de poderosas cooperativas agrcolas, como a Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central, a Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil, a Cooperativa Agrcola de Mogi das Cruzes. Posteriormente, a cultura da batata, iniciada nos arredores da cidade de So Paulo, se espalhou para as regies da Alta Sorocabana, E. F. Mogiana e Bragana, no Estado de So Paulo, ao sul dos estados de Minas Gerais e do Paran. Nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, pela presena de imigrantes europeus, desde a poca de sua fixao havia a plantao de batata, principalmente para o consumo prprio, mas o abastecimento do mercado batateiro do pas vem sendo feito pelos produtores de origem japonesa. A Cooperativa Agrcola de Cotia recentemente inaugurou a produo

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de semi-industrializados da batata, conseguindo ganhar rapidamente importante parcela do mercado. Em 1988, as entradas foram: 3.601.915 sacas na Ceagesp-SP; 3.321.460 sacas na Cooperativa Agrcola de Cotia; 373.455 sacas de 60 kg na Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil. Berinjela (Solanum melongena L) A ndia considerada a terra de origem da berinjela. No se tem informao precisa sobre a poca de sua introduo no Brasil. Presumese que tenha sido trazida pelos imigrantes turcos ou libaneses. Na sua produo, foram trazidas diversas sementes dos Estados Unidos, mas como o mercado dava maior preferncia s variedades existentes de h muito no pas, Hiroshi Ikuta, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, desenvolveu, a partir dessas variedades, os hbridos "Piracicaba 41", e "Piracicaba 100". Tambm os agricultores de origem japonesa, no seu esforo de encontrar variedades adequadas e produtivas nas suas respectivas regies, conseguiram obter resultados satisfatrios. Uma das mais conhecidas, a variedade "Embu", foi desenvolvida por Shinohara e outros, na localidade do mesmo nome, nos arredores da cidade de So Paulo. Ultimamente, muitos produtores esto trazendo sementes do Japo, mas berinjelas de tamanho pequeno, as preferidas pelos japoneses, no tm, ainda, receptividade geral entre o pblico nacional. Em 1988, deram entrada na Ceagesp-SP: 2.001.502 caixas de 12 kg. Alcachofra (Cynara scolymus L) Originria da orla do Mediterrneo, tem-se notcia de sua existncia no municpio de So Roque, SP, trazida pelos imigrantes italianos. A sua produo em escala comercial, entretanto, data de uns 30 anos para c, empreendida pelos lavradores de origem japonesa. Ultimamente, conseguiram desenvolver tcnica de colheita durante o ano todo, e se tornou um produto representativo da citada regio. Grande parte da produo se deve a agricultores de origem japonesa. As entradas na Ceagesp- SP em 1988 foram: 6.900.940 maos de 0,1 kg cada. Cenoura (Daucus carota L) Originria do Afeganisto, at a II Guerra Mundial a semente da cenoura era importada da Frana. No ps-guerra, vieram as sementes da "Nantes", melhoradas nos Estados Unidos, e recentemente as produes passaram para as variedades americanas. Em 1963, Hiroshi Ikuta, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, de Piracicaba, SP, trouxe do Japo vrias sementes de cenoura. Uma dessas variedades, a "Kuroda-gosun", de ponta fina, de bom

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tamanho e colorao excelente, por apresentar resistncia queima de folha, mereceu especial ateno desse pesquisador. Trabalhou ele na seleo, estabelecendo como meta a obteno do formato aproximado da "Nantes", conseguindo produzir a "Kuroda melhorada". Com boa aceitao no mercado, essa variedade tem grande importncia principalmente nas semeaduras de vero. O produtor de Londrina, Yoshio Uwasa, fez o cruzamento da variedade existente no pas, como a "Nantes", e conseguiu a "Londrina", que se presta colheita exatamente na entressafra do vero, sendo cultivada em diversas regies do pas. Em 1988, a Ceagesp-SP recebeu: 3.297.082 caixas de 25 kg. Pimento (Capsicum artnuum L) O pimento originrio da Amrica do Sul. Conta com grande nmero de variedades. Nos estados de So Paulo, Minas Gerais e do Paran se plantam algumas das variedades mais produtivas e adequadas para as condies dessas regies. Entretanto, no Nordeste e no Estado do Rio Grande do Sul so usadas sementes importadas dos Estados Unidos. Por volta do ano de 1955, produtores estabelecidos em Suzano, SP, conseguiram selecionar a variedade designada "Casca Dura", que mais resistente a viroses. De boa produtividade e durabilidade, teve boa divulgao nos estados de So Paulo, Minas Gerais e do Paran. Toranosuke Ikeda, estabelecido no municpio de Campinas, SP, aps sete anos de trabalho consecutivo de seleo de sementes dos ps de pimenta isentos de doenas de vrus no fim do ciclo vegetativo, em 1958 conseguiu selecionar, entre a "Casca Dura", plantas mais resistentes a virose, s quais deu o nome de variedade "Ikeda". Em 1965, a Cooperativa Agrcola de Cotia realizou trabalho de produtividade comparada e chegou concluso de que a "Casca Dura" era trs vezes mais produtiva do que "Rubi King", e a "Ikeda" trs vezes mais do que a "Casca Dura". A variedade "Ikeda" tem o mesmo valor de mercado da "Casca Dura", tornando-se muito indicada para o plantio em regies onde h alta incidncia de vrus. A variedade "Avelar", conseguida por K. Watanabe, no Estado do Rio, bastante resistente ao vrus Y e tem alto valor de mercado, comparvel "Ikeda", sendo, pois, muito difundida sua cultura nesse estado. Atualmente, as variedades mais difundidas no pas so: "Casca Dura", "Ikeda", "Avelar", "Agronmio IOG", "Margareth" e "Cangarem". A participao dos agricultores de origem japonesa na produo de pimento em nosso pas grande. As entradas na Ceagesp-SP em 1988 foram: 2.793.928 caixas de 12 kg.

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Mandioquinha (Arracacia xanthorrhiza Bank) Consta que originria da parte leste da Cordilheira dos Andes. No Brasil, cultivada na Regio Sul, de clima ameno. Ainda no est includa no consumo mundial, mas no mercado de So Paulo constitui um produto importante. Sua produo no Estado de So Paulo se concentra nos municpios de Piedade, Ibina e So Paulo (Santo Amaro) onde se localizam ncleos de agricultores de origem japonesa. Eles conseguiram selecionar variedades mais produtivas a partir das plantas cultivadas nessas regies e implantaram sistema de rodzio com as culturas de batata e tomate. Em 1988, foram recebidas pela Ceagesp-SP: 555.062 caixas de 25 kg. Pepino (Cucumis sativus L) Considera-se originrio da regio montanhosa dos Himalaias, na ndia. A sua introduo no Brasil antiga, mas pouco conhecido o histrico, presumindo-se que foi trazido pelos imigrantes europeus. A variedade mais conhecida no mercado, " Aodai", foi trazida pelos imigrantes japoneses nos anos 30. Pela repetio dos plantios, a "Aodai" produzida entre ns j apresenta caractersticas diferentes da do Japo, e, em virtude de seu alto valor de mercado, os plantadores, as cooperativas agrcolas e as estaes experimentais desenvolvem esforos no sentido de selecionar as melhores sementes, com resultados compensadores. Desde a dcada de 60, os agricultores de origem japonesa tm trazido muitas variedades de pepino do Japo, conseguindo cativar, pouco a pouco, o pblico consumidor brasileiro. As entradas na Ceagesp em 1988 foram: 1.809.669 caixas de 24 kg. Tomate (Lycopersicum esculentum Mill) Encontrando-se plantas nativas de tomates nas encostas da Cordilheira dos Andes, principalmente no Peru, considera-se essa regio como a terra de origem dos tomateiros. Assim, a histria da cultura de tomate no continente sul-americano bem antiga, imaginando-se que a sua difuso na Amrica Central e no Mxico tenha acontecido com a migrao dos ndios antes da era crist. No Brasil, a produo e o consumo aumentaram no comeo deste sculo com a elevao do nmero de imigrantes italianos no Estado de So Paulo. Os imigrantes japoneses que se tornaram lavradores independentes, com pouco capital, trataram de incluir entre as suas produes a plantao de tomate. Introduziram mtodos modernos de plantio e, ajudados pela expanso populacional das grandes cidades como So Paulo e Rio de Janeiro, tiveram as suas produes aumentadas atravs dos anos.

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A cultura de tomate apresenta algumas dificuldades tcnicas e o seu custo de produo relativamente elevado, mas o retorno compensador. Os agricultores de origem japonesa vm dando preferncia a essa produo e, para tanto, tm feito esforos continuados na seleo de variedades mais resistentes a pragas, mais produtivas e de melhor aceitao no mercado. H cerca de 60 anos, quando foram iniciadas as culturas econmicas para valer, as variedades disponveis eram as existentes de h muito, como as de origem italiana "Rei Humberto", "Chacareiro", "Campineiro", cujas produtividades deixavam a desejar. Em Suzano, SP, Hanashiro, que plantava as variedades "Rei Humberto" e "Chacareiro", encontrou plantas cruzadas resultantes dessas duas variedades apresentando as suas melhores qualidades. Tratou de cultivlas e colher sementes. A Cooperativa Agrcola de Cotia, ao inaugurar o ncleo de Santa Cruz, no Estado do Rio de Janeiro, entregou essa semente aos cooperados que se instalavam no novo ncleo. O tomate a produzido obteve grande aceitao no mercado do Rio, onde os comerciantes do ramo passaram a cham-lo "tomate Santa Cruz", ainda hoje presente no mercado com esse nome. Desde ento, muito trabalho foi despendido para a seleo de variedades mais produtivas, fundamentalmente alicerado na "Santa Cruz", sendo colocadas disposio dos produtores mais de 20 variedades. A seguir enumeraremos aquelas que envolveram os esforos dos agricultores e organizaes de origem japonesa: "CAC-A" e "CACB", da Cooperativa Agrcola de Cotia; "Sul-Brasil", da Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil; "Piedade Gigante", desenvolvida pelos agricultores de origem japonesa de Piedade, SP; "Samano", produzida pelo lavrador de mesmo nome, de Ibina, SP; a partir dessa variedade, Kobayashi, de Ribeiro Preto, SP, conseguiu a "Kobayashi"; o agricultor Monma, estabelecido em Santo Amaro, no municpio de So Paulo, produziu a variedade que conhecida pelo seu nome; "Kada" foi desenvolvida pelos agricultores de Piedade, SP; as variedades "Santa Elisa" e "Angela" foram produzidas por Nagai, do Instituto Agronmico de Campinas; as variedades "Miguel Pereira", "Santo Antnio" e "L-4" foram selecionadas por Watanabe, de Miguel Pereira, RJ; " Yokota" por agricultor de mesmo nome, de Pilar do Sul, SP; e "Oosawa" foi produzida por japons do mesmo nome em Indaiatuba, SP. Alm disso, existe o tomate-caqui, exclusivo para salada. Uma das variedades desse tomate foi desenvolvida por Nagai, do Instituto Agronmico de Campinas, e por Watanabe, de Miguel Pereira, RJ, cruzando com variedades existentes as trazidas dos Estados Unidos e do Japo. Recentemente, Oishi, produtor de So Carlos, SP, conseguiu uma variedade que leva o seu nome, bastante resistente podrido, selecionando-a a partir de plantas importadas dos Estados Unidos.

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No Brasil, o tomate uma das hortalias mais importantes, tanto quantitativamente como tambm do ponto de vista econmico, e cerca de 80% desse produto depende de produtores de origem japonesa. Em 1988, as entradas na Ceagesp- SP foram: 12.619.290 caixas de 25 kg, e mais 148.327 caixas de tomate-caqui, de 24 kg cada. Feijo Vagem (Phaseolus vulgaris L) Sul do Mxico e Amrica Central so os locais apontados como de origem dessa hortalia. A sua plantao no Brasil no est esclarecida, mas possvel que as sementes tenham sido trazidas da Europa ou dos Estados Unidos. Atualmente, so cultivadas no Brasil as vagens das variedades "Manteiga", chata, e "Macarro", redonda. Associados da Cooperativa Agrcola de Cotia selecionaram uma variedade com formato intermedirio "Rio-Cotia", com boa aceitao no mercado. A Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil desenvolveu a "Sul-Brasil Campineiro", e a Agroflora, uma empresa produtora de sementes, organizada por elementos da colnia nipnica, lanou "Namorada" e "Senhorita". Alm dessas, existem as variedades "Tup", "Itatiba", "Braslia", etc, desenvolvidas para as condies das respectivas regies. Foram recebidas pela Ceagesp-SP em 1988:1.150.355 caixas de 19 kg. Quiabo (Hibiscus esculentus L) O quiabo originrio da regio nordeste da frica e foi trazido para o Brasil pelos escravos. No se sabe com preciso a poca de sua chegada. Em 1948, Toshiharu Kunizawa, de Piranema, RJ, levou de So Paulo o quiabo branco e fez cultura experimental por dois anos. Era uma variedade de baixa produtividade e, alm disso, de pouca aceitao no mercado. Desde ento trabalhou para melhor-la, e em 1964 conseguiu encontrar um p cujo fruto era verde, de bom formato. Colheu as sementes, e durante trs anos tratou de fixar essa variedade. Por fim obteve o "Quiabo Piranema", que se disseminou amplamente. De boa qualidade e excelente sabor, hoje em dia o quiabo padro no mercado brasileiro. So tambm conhecidas a "Santa Cruz 47", desenvolvida por Sudo, da Faculdade de Agronomia do Rio de Janeiro, e "Campinas 2", criada pelo Instituto Agronmico de Campinas. Em 1988, foram recebidas pela Ceagesp-SP: 494.909 caixas de 16 kg. Abbora Japonesa (Cucurbita moschafa Duch) At ser introduzida do Japo na dcada de 70, esta variedade de abbora era desconhecida no Brasil, pois existiam apenas as variedades "mxima" e "pepo". Os agricultores de origem japonesa trouxeram as

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abboras japonesas "Tetsukabuto" e "Ebisu". Ultimamente a demanda dessa abbora aumentou bastante, pois usada tanto em sopa como para doces, aumentando em muito o nmero de seus plantadores. Alm de "abbora japonesa", ela tambm conhecida no mercado pela designao de "abbora Hokkaido". Deram entrada na Ceagesp-SP em 1988:24.026 caixas de 35 kg e mais 6.640.896 kg. Repolho (Brassica oleracea L) E considerado originrio da orla do Mar Mediterrneo. No se sabe a poca exata de sua entrada no pas, mas consta que no Estado de So Paulo os imigrantes europeus cultivavam-no desde sua chegada. So mais de 200 variedades de repolho existentes no mundo inteiro. As variedades desenvolvidas no Brasil so apenas a "Sabana" (apelidada de "louco") e os hbridos obtidos pelos cruzamentos das variedades trazidas do Japo. As outras so todas de sementes importadas. No ano de 1940, um agricultor espanhol de Mogi das Cruzes, SP, encontrou inflorescncia em alguns ps de repolho depois da incidncia de forte geada em sua plantao. Colheu as sementes e a partir da conseguiu fixar um repolho resistente a temperaturas mais baixas. Designado de "louco" pela inflorescncia inesperada, posteriormente foi nomeada "Sabana". J na dcada de 60, agricultores de origem japonesa trouxeram sementes do Japo. Escolheram as variedades mais adequadas para as condies climticas brasileiras. Apesar de menos resistente s doenas do que o repolho "louco", pela excelncia do sabor, os repolhos de origem japonesa conseguiram, em 3-4 anos, posio de destaque no mercado consumidor. Hiroshi Ikuta, da Luiz de Queiroz, com o intuito de eliminar a falta de resistncia s doenas das variedades oriundas do Japo, conseguiu realizar sua hibridao com o repolho "louco", bastante resistente s doenas, criando variedades difundidas a partir de 1967. Presentemente, so cultivados repolhos de sementes importadas do Japo. grande o nmero de plantadores de origem japonesa. Em 1988, as entradas na Ceagesp-SP foram de 2.405.131 sacos de 35 kg. Couve-flor (Brassica oleracea L, var Botrytis) Consta que originria da orla do Mar Mediterrneo. Desconhecese o histrico de sua vinda para o Brasil, mas cultivada nas encostas das montanhas, de clima mais ameno, nos estados do Rio de Janeiro, So Paulo, Paran e Rio Grande do Sul.Como a parte da flor que se destina

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ao consumo, a influncia da temperatura a que fica sujeita a planta grande, determinando a poca tima para a sua colheita. Assim, a sensibilidade temperatura de cada variedade muito importante, pois ela que determina se a variedade precoce ou requer maior tempo para atingir o ponto de colheita. Diante disso, os trabalhos de seleo de variedade adequada para cada regio vm sendo executados de h muito, e existem muitas variedades resultantes, tradicionais e importadas. Yamaguchi e Nakamura, estabelecidos no Estado do Rio Grande do Sul, desenvolveram a variedade "Rio Grande", e Anraku selecionou a que leva seu nome. So variedades precoces destinadas produo na poca de entressafra. Recentemente, Miyai, de Jaragu, SP, apresentou a variedade "Miyai", no muito sensvel ao calor, para o plantio no vero. Todas se constituem nas principais variedades cultivadas no pas, ao lado de outras conhecidas, desenvolvidas por diversas estaes experimentais e firmas especializadas. Em 1988, foram recebidas pela Ceagesp-SP: 1.339.739 caixas de 12 kg. Acelga Japonesa (Brassica pekinensis Rupr) Originria da China, chegou h muito tempo s ilhas japonesas e muito popular entre os seus habitantes. No Brasil, foi introduzida pelos imigrantes japoneses e produzida, inicialmente, com vistas populao de origem japonesa. Ultimamente, entretanto, h grande divulgao junto ao pblico brasileiro em geral, entrando na sua dieta na forma de salada e ingrediente para sopa. A principal variedade cultivada a "Taiby 60 dias" (Rokuju-nichi), importada do Japo. As entradas na Ceagesp-SP, em 1988, foram: 543.411 caixas de 27 kg. Cebola (Allium cepa L) Consta que originria da sia Central. Foi introduzida no Brasil, primeiramente no Estado do Rio Grande do Sul, pelos imigrantes europeus. Posteriormente, alm dos estados sulinos, a rea de cultura se estendeu Regio Nordeste, no Estado de Pernambuco. Com to extensas reas de produo, naturalmente as variedades produzidas so numerosas e sujeitas a condies climticas variadas. Em geral os mtodos de produo so extensivos e a produtividade baixa, quase a metade em comparao com a dos principais pases produtores. Os agricultores de origem japonesa vm adotando tcnicas de irrigao, uso de defensivos e fertilizantes, conseguindo melhores resultados. Essa prtica est se difundindo, notando-se j uma melhora na produtividade geral. Os recebimentos no ano de 1988 foram: na Ceagesp-SP 3.792.820

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sacos; Cooperativa Agrcola de Cotia 1.451.030 sacos; Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil 477.927 sacos de 20 kg cada. Gengibre (Zingiber officinale Roscoe) O gengibre originrio da regio tropical da sia. No Brasil, a introduo se deu pelas mos dos holandeses, no sculo XVII. Constituiuse, na poca, item importante de comrcio entre o Brasil e a Holanda. Atualmente, a principal regio produtora o Estado de So Paulo, que remete ao mercado cerca de 1.800 toneladas do produto por ano, sendo uma grande parte exportada para a Europa e tambm para os Estados Unidos. Est comeando a sua cultura tambm na regio do cerrado. As variedades cultivadas so do tipo grado, a maioria trazida do Japo. Entraram na Ceagesp-SP em 1988:127.749 caixas de 16 kg; e 87.761 maos de gengibre com folhas, de 0,75 kg cada. Cebolinha (Allium fistolosum L) Tradicionalmente usada no preparo das carnes, ultimamente j comea a ser consumida diretamente, aumentando sensivelmente sua demanda. So cultivadas as variedades importadas do Japo. Em 1988 a Ceagesp-SP recebeu: 4.026.210 maos de 0,6 kg cada. Inhame (Colocosia esclenta Engl) Vai aumentando seu consumo principalmente como ingrediente de sopa. As variedades importadas do Japo, como "Tsuchitare", "Ishikawa Wase" e "Kurojiku", esto sendo bem recebidas pelo mercado. Em 1988, foram recebidas pela Ceagesp-SP: 187.921 caixas de 22 kg. Rbano (Rephanus sativus L) Ultimamente passou-se a consumi-lo como salada, aumentando de muito sua demanda. As variedades mais produzidas so "Mino Wase", "Khai Natsumino Wase n. 1 - n. 3", importadas do Japo. As entradas na Ceagesp-SP em 1988 foram: 789.482 maos de 3,8 kg. Bardaria (Arctium lappa L) Em forma nativa a bardana encontrada na Europa, Sibria e China. Apesar do hbito de se comer a folha e a raiz tenras em algumas regies da Europa, apenas no Japo suas razes so consumidas amplamente. Imigrantes japoneses introduziram a bardana no Brasil, que se constitua no alimento de suas saudades. Ultimamente est havendo alguma familiaridade entre o pblico em geral, atravs da culinria japonesa em voga. As entradas na CEAGESP-SP em 1988 foram: 402.497 maos de 1 kg.

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Ervilha (Piswn sativum D.C) Originria da sia Central e orla do Mar Mediterrneo, no Brasil foi introduzida pelos imigrantes da Europa meridional. Em 1940, o produtor Ohkawa, estabelecido em Itapetininga, SP, desenvolveu, a partir da seleo realizada da variedade importada da Europa, a sua "Ohkawa", precoce, de vagem grande. A Cooperativa Agrcola de Cotia, sabendo da excelncia desse produto, incentivou a divulgao desse plantio entre os seus associados. Grande parte da produo atual dessa variedade. Por volta dos anos 60, Muramatsu, em Pilar do Sul, SP, conseguiu obter a tmpora "Muramatsu", e, posteriormente, Tsuruga, a partir da variedade "Ohkawa", desenvolveu e divulgou a variedade que leva o seu nome. A partir dos primeiros anos da dcada de 80, alm dessas ervilhas verdes, foi iniciada a cultura de ervilha em gro destinada industrializao, principalmente por parte dos agricultores estabelecidos na regio dos cerrados. A produo de ervilhas est inteiramente nas mos dos agricultores de origem japonesa. As. entradas na Ceagesp-SP em 1988 foram: 144.733 caixas de 12 kg e 34.674 caixas de 30 kg. Broto de Bambu (Phylbstachys sp) No Brasil existem muitas variedades de bambu que formam touceiras, sendo que os seus brotos no so muito adequados para fins comestveis, ao gosto do consumidor japons. Os brotos de bambu mais consumidos pelos imigrantes japoneses e seus descendentes so todos colhidos dos bambus introduzidos do Japo. Em 1930, Ryotaro Shimomoto e Masami Yano, ambos estabelecidos no municpio de Cotia, SP, trouxeram do Japo as variedades de bambu "Ms", "Matake" e "Hachiku". Reproduziram-nas e trataram de divulgar esses bambus. O broto de bambu foi, inicialmente, comestvel exclusivo da populao de origem japonesa, mas ultimamente, pela semelhana de seu sabor com o do palmito, h uma maior divulgao de seu consumo entre o pblico, como substituto deste ltimo. Em 1988, as entradas na Ceagesp-SP foram: 26.117 caixas de 23 kg. 3) Fibras Kami (Boechmeria nivea Gaudich) No comeo deste sculo, o rami era cultivado no Estado de Santa Catarina para rao do gado bovino. Segundo consta, no ano de 1934, foi

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tentada a cultura de uma variedade trazida da China no municpio de Salto Grande, SP, mas a divulgao da cultura e a industrializao do rami se devem aos japoneses e seus descendentes. Em 1938, Seiki Murakami, associado da Cooperativa Agrcola de Cotia, conseguiu fazer o melhoramento da variedade trazida da estao experimental da provncia de Miyazaki, Japo. Produziu a variedade "Murakami" e a divulgou no Estado de So Paulo. No mesmo ano, Heikichi Matsui introduziu mudas oriundas da Malsia, testando-as na estao experimental de Kaik, em Inhamas, e em glebas de Ura, PR. Essa variedade se mostrou de boa qualidade. Passou-se plantao em escala comercial e foram trazidas do Japo mquinas de desfibramento. Em 1941, a Cia. de Aniagem de Tokyo chegou a adquirir 726 hectares de terras no municpio de Ura para plantao de rami, mas a produo dessa fibra s foi bem-sucedida no ps-guerra. No ano de 1946 foram concludas as instalaes da Cia. Brasileira de Rami CIBRAM, e em 1958 ficaram prontas as instalaes de industrializao do rami pertencentes a Ichimura, cognominado rei do rami, em Ura. Assim, a cultura e a industrializao dessa fibra ficou nas mos de imigrantes japoneses e seus descendentes. Com o aparecimento das fibras sintticas, as fibras naturais sofreram altos e baixos, mas recentemente elas passaram a ter, novamente, lugar ao sol. Grande parte dos produtos exportada. Junco (Juncus deeipens Nakai) O imigrante Shigeru Yoshimura, ao vir para Registro, SP, em 1931, trouxe, de Okayama, algumas mudas desse junco. Uma das touceiras conseguiu sobreviver s repetidas enchentes do Rio Ribeira. Multiplicoua e conseguiu formar plantaes. Verificou que, enquanto no Japo esse junco cortado uma vez por ano, em Registro podia ser colhido trs vezes. Em 1934, por intermdio da Kaik trouxe o tear apropriado, quando se iniciou efetivamente a produo comercial de esteiras. No comeo essas esteiras foram vendidas atravs da Cooperativa Agrcola de Cotia e a produo foi crescendo regularmente, mas em 1963 passou-se a considerar que essa produo era industrial, obstando-se a Cooperativa Agrcola de Cotia de comercializ-la. Os 30 produtores fundaram uma cooperativa de industrializao e vendas, conseguindo sobreviver como produtores de um artigo tpico regional. Juta (Corchorus capsularis L) Originria do sul da China, a juta cultivada desde h muito na ndia e no Afeganisto. A Inglaterra deteve, por longo tempo, o monoplio da distribuio no mundo inteiro.

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At os anos 30, o Brasil dependia da importao da juta da ndia para a sacaria, principalmente para a sua produo de caf. O montante pago todos os anos por essa importao era significativo, o que fazia as autoridades governamentais pensarem na produo nacional da juta e terem esperana na atuao dos imigrantes japoneses na regio amaznica. Kotaro Tsuji, ento professor da Escola Superior de Comrcio de Kobe, a caminho de visita regio amaznica, passando por So Paulo obteve 2 kg de semente de juta, supostamente de origem indiana, na Secretaria da Agricultura. Era o ano de 1930. Levou essa semente, para Manaus, onde tomou providncias para efetuar a semeadura. Colaboraram imigrantes localizados na regio, inclusive os alunos da Escola Superior de Colonizao, um estabelecimento de ensino orientado e assistido por Tsukasa Uetsuka. Foram repetidas 2 a 3 semeaduras, mas apenas um tero das plantas atingiam a altura de 4 a 5 metros, um resultado insatisfatrio que decepcionou os imigrantes-agricultores esperanosos. Entretanto, em 1933, Ryota Oyama, que chegara Amaznia com 52 anos de idade, encontrou, na sua plantao de juta pouco promissora, dois ps qu aparentemente sofreram mutao espontnea. Do p que sobrara conseguiu colher 10 gros de semente, os quais tratou de multiplicar, e em abril de 1947 conseguiu preparar 8.941 kg de juta produzidos nas suas glebas. Essa juta foi designada "Oyama". As importaes de juta eram: 24 mil toneladas em 1935; 27 mil toneladas em 1936 e 34 mil toneladas em 1937, montando a 565 mil libras esterlinas. Com a difuso da juta "Oyama", as importaes desse material foram diminuindo a cada ano, e a produo de juta chegou a representar 30% da economia do Estado do Amazonas. A juta "Oyama" foi melhorada, no curso do perodo de 1941 a 1966, pelos rgos de pesquisa do governo, e a produo, que em 1948 era de menos de 7 mil toneladas, em 1965 conseguiu ultrapassar 60 mil toneladas. At h uns 20 anos, os agricultores descendentes de japoneses se dedicavam produo diretamente, mas depois passaram a empregadores dos trabalhadores, ou a compradores-intermedirios de juta. 4) Flores e Plantas Ornamentais Flores A floricultura no Brasil alcanou a etapa de empreendimento econmico apenas h 35 anos. At ento o cultivo de flores ho passava de atividade caseira.

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Em 1952, Hatsuo Ishibashi, estabelecido em Suzano, SP, importou da Holanda bulbos de gladolos, e depois de cinco anos de cultura experimental, conseguiu fazer a seleo de variedades adequadas ao clima brasileiro, passando reproduo e difuso da cultura dessa flor. No ano de 1954, Haruju Matsuoka, de Atibaia, SP, importou do Uruguai cravos e crisntemos. Multiplicou essas mudas e deu assistncia tcnica s pessoas que tencionavam dedicar-se cultura dessas flores. O acima citado Ishibashi trouxe do Uruguai novas variedades de cravos e crisntemos, e importou do Japo mudas de rosas, azleas, camlias, pinheiros, cedro japons, etc, desenvolvendo trabalho de seleo de variedades adaptveis ao nosso pas. Os cultivadores de flores, em geral agricultores jovens, orientados pelos pioneiros acima, cresceram muito em nmero, chegando a quase mil, e so, hoje em dia, o ncleo da fora da floricultura brasileira. de destacar que no so poucos os que esto trabalhando em grande escala visando a exportao. Plantas ornamentais e paisagismo O Brasil, alm de ser rico em plantas ornamentais e para paisagismo, introduziu do exterior, trazidos por imigrantes ou importados diretamente por rgos governamentais, grandes nmeros de plantas ornamentais. Hatsuo Ishibashi trouxe do Japo rosas, azleas, camlia, guerria japonica, pinheiros, cedro japons, ginkgo biloba, accraceae, nandina domestica Hornst, fatsia japonica Decne, bambus, etc, e tratou de multiplic-las para distribuio. 5) Especiarias - Bebidas Pimenta-do-reino Consta que se trata de produto originrio do oeste da ndia.. A pimenta-do-reino conhecida na Europa desde o sculo XII, introduzida que foi pelos mercadores rabes. No Brasil, a planta foi introduzida no sculo XVII, mas, em razo da inadequada variedade e desconhecimento da tcnica correta de sua cultura, no se conseguiu estabelecer plantao produtiva. Foram os imigrantes japoneses que conseguiram consolidar a produo de pimenta-do-reino em escala comercial no pas. Nanbei Takushoku Kaisha, fundada em Tokyo no ano de 1928, constituiu no ano seguinte a Companhia Nipnica de Plantao do Brasil, em Belm, PA, e iniciou a construo da colnia de Acar (posteriormente Tome-Au). Introduzindo a primeira leva de imigrantes japoneses em

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setembro do mesmo ano, elegeu como cultura principal a plantao de cacau, suplementando-a com as culturas de arroz, pimenta-do-reino e outros produtos. As mudas da pimenta-do-reino, na ocasio, foram conseguidas a partir de variedades existentes no pas, resultando em pouca frutificao, sem qualquer possibilidade de ganho econmico. Em agosto de 1933, Makinosuke Usui, que viajava no Hawai-Maru na qualidade de guia dos imigrantes, adquiriu no jardim botnico de Cingapura 20 mudas de pimenta-do-reino, trazendo-as para a colnia de Acar, e plantou-as na estao experimental de Aaizal. A Nanbei Takushoku Kaisha, no tendo sido bem-sucedida no empreendimento, havia decidido reduzir suas atividades, fazendo com que a partir da oitava leva os imigrantes se dedicassem apenas cultura de cacau; mas os esforos foram em vo, e em abril de 1935 foi decidido o fechamento da fazenda de plantao de cacau e a extino da estao experimental de Aaizal, assim como o fechamento da colnia de Monte Alegre e da fazenda de Castanhal. Nessa ocasio, Fukutaro Obana, que se dedicava ao trabalho de encerramento da estao experimental de Aaizal, encontrou num cantinho da estao trs ps de pimenta-do-reino, novos. Eram os remanescentes das pimentas-do-reino trazidas do Oriente por Makinosuke Usui. Deu a Tomoji Kato um p e outro a Enji Saito, imigrantes que desde sua chegada se dedicavam procura de plantas adequadas para cultivo na regio. Dedicaram-se reproduo dessas duas plantas e as mudas conseguidas foram sendo distribudas entre os patrcios. Logo aps o trmino da II Guerra Mundial, as cotaes da pimentado-reino comearam a subir. Em 1945, o quilo estava a 30 cruzeiros, e no ano seguinte alcanava 85 cruzeiros. E que as principais regies produtoras da pimenta-do-reino ndia, Indonsia, Malsia, etc. haviam sofrido com a guerra, que prejudicou suas produes. Na ocasio, os dois pimenteiros originais de Kato e Saito eram j cerca de 800 ps. Os agricultores, estimulados pela alta, cuidaram das plantaes abandonadas existentes e trataram de obter mudas da pimenta-do-reino trazida do Oriente. Em 1947, o balano da Cooperativa Agrcola de Acar indicava um salto de sete vezes no montante de vendas da pimenta-do-reino em comparao com o ano precedente. E todos os agricultores da Colnia de Acar decidiram dedicar-se plantao da pimenta-do-reino. Em 1949, a Cooperativa Agrcola de Acar mudou a sua designao para Cooperativa Agrcola de Tom-Au, e o ncleo passou a chamar-se Colnia de Tome-Au. Em 1950, a pimenta-do-reino passou a figurar em primeiro lugar nas vendas da Cooperativa e esta abriu um posto de vendas em So Paulo. As

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cotaes desse produto continuaram em alta nos anos subseqentes, at 1954. Verdadeiro boom da pimenta-do-reino, o diamante negro da Amaznia. Nessa ocasio, s plantaes da Colnia de Tome-Au contavam com 332 mil ps. A partir de 1955, com a recuperao das produes do Sudeste Asitico, as cotaes comearam a dar sinais de retrao. Enquanto em 55 o preo era de 150 cruzeiros o quilo, no ano seguinte baixava para 65, e em 1957, apenas 34 cruzeiros, j abaixo do custo de produo. Essa m conjuntura comeou a dar sinais de reverso em 1958. Nessa poca, Tome-Au produzia 3 mil toneladas por ano, e exportava para a Argentina, os Estados Unidos e a Inglaterra. A situao favorvel continuou at fins de 1960. Ao se inaugurar a dcada de 70, a cultura da pimenta se viu diante de nova dificuldade. Doenas, causadas por fusrio e por vrus que j se manifestavam h alguns anos nas pimenteiras, grassaram com mpeto cobrindo as colnias de Tom-Au n. 1 e n. 2, causando vertiginosa queda na produo. Na plenitude da produo, no perodo de 1968-70, o nmero de cooperados atingia 320, os quais conseguiram 7 mil toneladas de pimenta-do-rino por ano; em seguida a produo caiu para 5 mil toneladas, reduzindo-se a 240 pessoas o quadro de cooperados. No ano de 1976, a situao piorou ainda mais, reduzindo-se a 3.500 toneladas. Diante dessa situao difcil, os cooperados tomaram um dos trs seguintes rumos: o primeiro foi abandonar Tom-Au. Os mais afortunados se dirigiram para Santarm, segunda maior cidade do Estado do Par, a fim de iniciar, no municpio, novas plantaes de pimenta-doreino. A segunda opo foi a de permanecer na colnia e tratar de diversificar suas lavouras. Como a pimenteira sofre ataque da doena aos 4 ou 5 anos aps o plantio, trataram de cultivar melo, papaia, maracuj, mandioca, juntamente com a formao e transplante das mudas de pimenta-do-reino. O mamo, oriundo do Hava, logo se converteu num dos principais produtos da colnia. A terceira opo foi a de construir, conjugando foras em torno da cooperativa, uma nova colnia. Esse plano est em andamento, com a concesso obtida de 110 mil hectares de terras no distrito de Aiu-Uu. A praga que ataca a pimenteira podrido das razes provocada por nematides e seu combate demanda medidas radicais que congreguem os fatores climticos, do solo, e biolgicos, caractersticos da regio tropical. Em 1986, a Cooperativa Agrcola de Tom-Au informa, em seu relatrio, a situao das plantaes de seus associados: pimenta-do-reino 1.327.990 ps; seringueira 195.542 ps; cacaueiro 924.984 ps; dendezeiro 28.228 ps; cupuau 19.282 ps; guaran 15.149 ps; caf 14.517 ps; cajueiro 500 ps; maracuj 132.265 ps; mamoeiro

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3.000 ps; limoeiro 4.300 ps; graviola 3.000 ps; coqueiros 773 ps; castanheira 600 ps, mangosto 400 ps; aa 10.000 ps. Como se v, apesar dos contratempos, a pimenta-do-reino continua como principal cultura da colnia. As plantaes de pimenta-do-reino, presentemente, se estendem aos estados da Bahia e Esprito Santo, sendo a produo total do pas de 25.468 toneladas em 1986, cabendo ao Estado do Par 90% dessa quantidade. O Brasil exportou naquele ano 22.968 toneladas carreando para o pas US$ 85.736.792,00. Ch (Thea assamica Mast) Foi trazido da China, no ano de 1812, para o Jardim Botnico Real do Rio de Janeiro. Imigrantes chineses foram empregados na preparao do ch. As sementes colhidas no Jardim Botnico foram disseminadas nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e So Paulo, onde essas plantaes eram mais comuns. Consta que em meados do sculo XIX j eram exportadas mais de 10 toneladas de ch para a Europa. Na segunda metade do sculo passado se cultivava ch at mesmo na cidade de So Paulo. Neste Estado, os municpios de Atibaia, Campinas e So Roque se tornaram produtores de ch, concorrendo com Ouro Preto, MG. Entretanto, com o rpido progresso da cafeicultura, a produo do ch no Brasil entrou em retrocesso. Nos anos 20, eram encontradios chazeiros abandonados, em estado nativo. Diz-se que a esposa de Kisaku Hagihara, de Suzarto, SP, colhera sementes do chazeiro nativo e as semeou. Trata-se do primeiro registro de plantao de ch por parte dos imigrantes japoneses. Posteriormente Fukashi Furihata tambm realizou uma plantao de ch em Mogi das Cruzes, SP. Estes eram da variedade chinesa (Thea sinensis). Torazo Okamoto chegou a Registro, SP, em 1919. Trs anos depois, conseguiu sementes de ch chins em So Paulo e comeou uma plantao em suas terras. Como visava apenas o consumidor japons, produzia, portanto, o ch verde. J nos anos 30, iniciou a produo de ch preto a fim de atender ao consumidor brasileiro, mas com a variedade chinesa no se podia produzir esse ch de boa qualidade. Em 1934, de volta da visita ao Japo, passou por Sri Lanka, onde teve a oportunidade de visitar uma fbrica de ch, e obteve, a muito custo, cem gros de sementes de ch da variedade "assam". No curso da viagem de navio, Okamoto conseguiu fazer brotar essas sementes e, afinal, ao chegar ao porto de Santos, tinha 65 mudas de ch. Estas foram as matrizes do ch em Registro, que progrediu como uma agroindstria que consegue atender demanda nacional e ainda contribui hoje em dia para a obteno de divisas.

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A teicultura que se consolidou no municpio de Registro envolveu razovel nmero de produtores, a ponto de, durante a II Guerra Mundial, propiciar o aparecimento de 42 fbricas de ch de pequeno porte. Com o trmino do conflito, o ch nacional perdeu (principalmente por causa da no-uniformidade de sua qualidade) rapidamente o mercado tanto interno como o de exportao. A cultura do ch em Registro passou a enfrentar uma fase de muitas dificuldades. Em 1945, a Cooperativa Agrcola de Cotia instalou uma unidade de padronizao do ch para os produtos de seus associados. O produtor Shusaku Yamamoto, em associao com a Standard Brand, construiu uma fbrica de ch, em Registro, com capacidade para 700 toneladas/ano. A Cooperativa Agrcola de Cotia tambm montou uma fbrica com igual capacidade. Essas organizaes enviaram seus tcnicos para a ndia, Sri-Lanka, leste da frica, etc, principais centros produtores de ch do mundo, para estudos, e tambm trouxeram da Holanda e do Japo especialistas na produo de ch. Importaram, ainda, mquinas da Inglaterra, num esforo de modernizao de suas produes e abertura do mercado externo. Apesar de muitos contratempos, a produo de ch na regio de Registro, com decisiva participao dos agricultores de origem japonesa, se firmou como uma atividade vitoriosa, produzindo em 1988 cerca de 10 mil toneladas de ch, grande parte exportada. Nesse mesmo ano, as entradas na Cooperativa Agrcola de Cotia foram de 1.018.397 kg. 6) Cereais Soja (Glycine max L) Um dos campees dos cereais de exportao, gro dos mais importantes da agricultura da regio dos cerrados, a soja conhecida no Brasil h algum tempo. Gustavo Dutra introduziu-a no Estado da Bahia no ano de 1882 para rao verde do gado. Dez anos mais tarde, o Instituto Agronmico de Campinas obteve de Dutra essa soja para realizar testes de culturas intercaladas com gramneas. Independente desse trabalho, os imigrantes norte-europeus tentaram o seu cultivo no Estado do Rio Grande do Sul. Em seguida, surgem as sementes de soja trazidas na bagagem dos imigrantes japoneses. Essas sojas foram semeadas em reas pequenas pelos nipnicos, para consumo. Os imigrantes japoneses no dispensavam as suas comidas tpicas como "miss", "natt","tfu", elaboradas base de soja. As sementes trazidas por eles serviram para melhoramento da soja levada a efeito pelo Instituto Agronmico de Campinas. Nessa poca, a soja era cultivada principalmente como forragem

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verde para gado, mas a partir dos anos 40 passou a merecer ateno como oleaginosa e tambm como fonte protica para rao animal. Gom isso as plantaes de soja nos estados sulinos se ampliaram rapidamente. O Instituto Agronmico de Campinas, pela sua seo de leguminosas, onde trabalhava Shiro Miyasaka, desenvolveu variedades de excelente qualidade, indicando at as mais adequadas para cada Estado, fazendo com que as regies do cerrado dos estados de Minas Gerais, Gois e Mato Grosso passassem a produzir soja. Diga-se de passagem que Dok, presidente dos estaleiros Ishikawajima do Brasil, percebendo a importncia da soja dentro da agricultura brasileira, arcou com as despesas da pesquisa que redundou no desenvolvimento da variedade "Dok", hoje em dia muito divulgada nas regies do cerrado. Em 1989, a produo brasileira de soja foi de 22 milhes de toneladas, colocando-se em segundo lugar do mundo. Arroz (Orysa sativa L, var Matsum) Existe registro histrico de que os imigrantes japoneses, nos primeiros anos do Brasil, logo ao sarem das fazendas de caf, se dedicaram plantao de arroz margem do Rio Grande, na divisa entre So Paulo e Minas Gerais. Quanto cultura de arroz irrigada, h muito se praticou na colnia de Registro, SP. Outrossim, conhecem-se nomes de grandes rizicultores de origem japonesa como Kanegae, Maeda, etc, mas as glebas irrigadas, mesmo hoje, so destinadas apenas produo de arroz japons. Trigo sarraceno (Fagopyrum sagittatum Gilib) Trazido da Europa, h muito se cultiva nos trs estados sulinos. As sementes introduzidas pelos imigrantes japoneses inicialmente se prestaram para a produo de farinha destinada ao consumo caseiro, sendo, pois, plantaes de pequena escala. Posteriormente houve alguma demanda por parte dos fabricante de macarro desse tipo. Aps a II Guerra Mundial se abriu o caminho da exportao para o Japo, propiciando uma gradual ampliao da produo. Caf e outras culturas Kiyoshi Yamamoto, da Fazenda Tozan, em Campinas, SP, estudou no perodo de 1930-40 o combate broca do caf pelo seu inimigo natural, a vespa Uganda, e obteve excelente resultado prtico na sua fazenda, alm de obter o ttulo de doutor em agronomia apresentando trabalho acadmico a respeito. Quanto a outras culturas tradicionais do pas como arroz, algodo, amendoim, milho, cana-de-acar, etc, os imigrantes japoneses e seus

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descendentes vm contribuindo, com destaque, no aumento da produo e na melhoria da produtividade. 7) Novas Culturas Sero consideradas as culturas que vm sendo trabalhadas pelos agricultores descendentes de imigrantes japoneses. So espcies cujas sementes ou mudas foram obtidas junto a rgos governamentais ou adquiridas atravs de firmas especializadas, ou, ainda, selecionadas e melhoradas pelos prprios agricultores a partir de variedades existentes no pas, e que passaram recentemente para o esquema de produo econmica ou que se acham ainda na fase de experimentao. Acerola (Malpighia glabra) No se conhece com exatido a regio de origem, mas se considera como sendo as ndias Ocidentais, no Mar do Caribe. Trata-se de uma pequena fruta parecida com a cereja, com teor de vitamina C mais elevado entre as frutas conhecidas, com 1.000 a 4.000 mg em 100 g de suco, tendo, pois, cerca de 30 vezes mais essa vitamina do que o limo. Foi trazido de Porto Rico, em 1955, pela Prof.a Maria Selene, da Faculdade de Agronomia de Pernambuco. Sua cultura comercial foi bemsucedida em Castanhal, Estado do Par. Foi o produtor Teruo Shimomaebara, estabelecido na citada regio, que conseguiu o fornecimento de mudas no INATAM, e trabalhou na sua reproduo. Uma empresa japonesa se encarrega da industrializao, e h alguns anos se comercializa o seu suco naquele pas com o nome de "acerola drinks", com boa aceitao do pblico. Est em andamento a cultura de acerola tambm em Tome-Au, que j conta com instalaes de fabrico de sucos, tendo, pois, uma boa perspectiva para o futuro. Cupuau (Theobrama grandeflorum) Do mesmo gnero do cacau, uma fruta de 10 a 25 cm de comprimento e de 10 a 15 cm de dimetro, pesando de 1 a 2 kg. Ao redor de umas 20 sementes se encontra a polpa. Esta serve para preparar sucos, e da semente se faz chocolate branco. Atualmente, a maior produtora de cupuau Tome-Au. Quando a pimenta-do-reino sofreu os danos da praga, no processo de diversificao da lavoura ento empreendida o cupuau foi escolhido como uma das plantas importantes. Em 1988, j haviam sido plantadas na colnia cerca de 60 mil ps. O cupuau plantado concomitantemente com a pimentado-reino, e aps 4 a 5 anos, quando a pimenta fica inutilizada pela praga,

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o cupuau toma o seu lugar. A colheita de cupuau se inicia a partir do quarto ano aps o transplante definitivo. Em Tome-Au, a industrializao feita nas instalaes construdas com os subsdios da JICA Japan International Cooperation Agency. Cravo-da-ndia (Caryophyllus aronwticus) produzido em Zanzibar, Madagascar, Sri Lanka, ndia, Malsia, etc. No Brasil, supe-se que tenha sido trazido pelos escravos africanos e permanecido no mbito caseiro cerca de dois sculos. Ainda h cerca de dez anos, eram importadas de Madagascar 300 a 400 toneladas por ano. O imigrante japons Kiyoshi Yogo, em Ituber, BA, h mais de 30 anos encontrou na cidade um p de cravo-da-ndia, com aparncia de ter cerca de 200 anos de idade. Catou, sua sombra, sementes e tratou de formar mudas. Essa planta se espalhou entre os imigrantes japoneses de Ituber, Camumu, Taperoa, Valena, etc, e atualmente o Estado da Bahia produz por ano cerca de 1.500 toneladas de cravo-da-ndia, das quais exporta aproximadamente 70%. Macadmia (Macadamia integrifolia Maiden & Betche) Segundo se sabe, a macadmia originria da Austrlia, parte sul de Finsland e orla martima do norte de New Shouth Wales, sendo considerada muito importante pelos nativos. Cerca de 90% do total mundial produzido pelo Hava, onde foi introduzida em 1882. Outras regies produtoras so: Califrnia, Austrlia, frica do Sul, Zimbbue, Qunia, Guatemala e Costa Rica. No Brasil, foi introduzida em 1948 pelo Instituto Agronmico de Campinas. A foram feitos trabalhos de seleo de variedades mais adequadas para as condies brasileiras, sendo apresentadas aos produtores as variedades "Keaudo", "Waiasol", "Keaumi", "Kakare", "Keauhou". No Estado de So Paulo existem cerca de 50 mil ps e projeto para plantio de mais 1,5 milho de ps. O governo do Estado de Santa Catarina est com um projeto de plantar, at 1993, 1,25 milho de ps em seu territrio. Existem agricultores de origem japonesa que esto plantando essas nozes, mas ainda so poucos os grandes produtores. Kiwi (Actinidia chinenis Planchon) Originrio da bacia do Yang Ts-Kiang, muito apreciado na China. No comeo deste sculo, botnicos trataram de divulg-lo nos mais conhecidos jardins botnicos do mundo inteiro. Na Nova Zelndia, um fruticultor se interessou pela sua cultura e foi bem-sucedido na sua comercializao. Em 1960, foi batizado de "kiwi

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fruit" tomando emprestado o nome do pssaro nacional , e, graas a uma campanha promocional de mbito mundial, a fruta ficou definitivamente conhecida. Atualmente, a China produz 110 mil toneladas por ano, totalmente consumidas no pas. Assim, a Nova Zelndia, que produz hoje 40 mil toneladas destinadas exportao, considerada o maior produtor mundial. No Japo foi introduzido em 1963, e sua plantao foi difundida rapidamente. No Brasil, a entrada de kiwi se deu por intercmbio do Instituto Agronmico de Campinas e pela Dierberger. Agricultores de origem japonesa tambm a trouxeram do Japo em suas visitas a esse pas. Presentemente, j existem plantaes em escala comercial em Ibina, SP. Esto em andamento culturas experimentais nos estados do Esprito Santo, Minas Gerais, Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Existem cerca de 200 plantadores, na maioria agricultores de origem japonesa. Lichia (Litchi chinensis Sonnerat) originria da rea tropical do Sudeste Asitico compreendendo a parte sul da China, Indochina, Birmnia e Filipinas. A sua vinda para o Brasil data de 1809, quando foi remetida da Guiana Francesa para o Jardim Botnico do Rio de Janeiro. Posteriormente, foram selecionadas trs variedades Brewster, American e Bengal e vendidas pela Dierberger, firma estabelecida em Limeira, SP. A cultura econmica da lichia pelos agricultores de origem japonesa vem sendo feita nos municpios de Campinas, Limeira, Bauru, Bastos, no Estado de So Paulo, mas por enquanto a produo remetida ao mercado pequena. Mangosto (Garcinia mangostana L) E considerado originrio da pennsula da Malsia, no Sudeste Asitico, e comum encontrar-se nos quintais nas ilhas de Java e Sumatra. Sua rea de plantio se estende desde o sul da Indochina, sul da ndia, Sri Lanka, Filipinas at o Hava. No Brasil, h plantaes ao redor de Belm, inclusive em Tome-Au, no ncleo colonial de Una, em Ilhus, BA, em Maus, AM. A adaptabilidade do mangosto s condies naturais pequena, e sua semente tem ndice de germinao baixa, o que torna difcil a formao de muda. Alm do mais, demanda de 8 a 10 anos para o incio de frutificao. H, pois, muitos fatores limitantes na sua cultura econmica, mas de se considerar que h mercado para exportao.

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Abric-do-par (Mimusops coriacea Miquel) Nativo das ilhas das ndias Ocidentais e da Amrica tropical, hoje em dia se espalhou a quase todas as regies do mundo, mas poucas so as plantaes. Da mesma famlia do mangosto, o abric d uma fruta com cerca de 1 kg de peso, de sabor agridoce. No Brasil encontrado nos estados do Amazonas e do Par, podendo ser plantado em regies ao norte do Estado do Rio de Janeiro. Os imigrantes japoneses, Goro Sato, de Manaus, AM, e Noboru Oya, de Castanhal, PA, conseguiram fazer seleo de abricoteiros nativos, e tm plantaes de excelente produtividade, conseguindo colher de 150 a 300 frutas por p, comercializadas com sucesso nos mercados de Manaus e Belm. A Cooperativa Agrcola da Amaznia, a que pertence Noboru Oya, est preparando 1.700 mudas de abricoteiro para distribuir aos seus associados a fim de iniciar formao de plantao em escala comercial. Pimenta-da-jamaica (Pimenta officinalis Lindl) Originria da Jamaica, Cuba, Haiti, etc, presentemente a maior produtora a ilha que lhe d o nome. A fruta colhida imatura e seca ao sol tem a fragrncia de cinamomo, de noz-moscada, cravo, etc, razo por que chamada de "ali spice". Na nomenclatura oficial aparece "pimenta", mas na verdade pertence Myrtaceae, a mesma famlia do cravo. Esta planta difcil de cultivar fora de suas regies originrias. No passado, foram tentadas em Cingapura, Taiwan (Formosa), Sri Lanka, mas os registros dizem que no houve frutificao. Mesmo na Jamaica, at recentemente, as colheitas eram de ps nativos. Os imigrantes japoneses, estabelecidos em Teixeira de Freitas, no Estado da Bahia, sofrendo com as pragas que invadiram as suas plantaes de papaia, esto enfrentando o difcil desafio de cultivar essa planta, j conseguindo alguma colheita. 8) Avicultura Gado Sericicultura Piscicultura Avicultura Por volta de 1925-26, os imigrantes japoneses que vieram das fazendas de caf do interior do Estado para os municpios de Juqueri, Cotia, Suzano, etc, nas cercanias da cidade de So Paulo, e passaram a dedicar-se s plantaes de batata, tomate e verduras, confinaram 20-30 galinhas em cercados rsticos, iniciando assim a avicultura entre os agricultores de origem japonesa. No ano de 1926, Shigeaki Tanabe e Motoichi Shigeno, de Mogi das Cruzes, Iwao Nagashima e Keiichi Matsumoto, de Itaquera, conseguiram matrizes junto Granja Mandi, de

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Itaquaquecetuba, que havia introduzido 300 matrizes de Leghorn branca da Frana, matrizes para iniciar as suas granjas de reproduo, e a partir do ano seguinte passaram a remeter ovos e aves para o mercado. A Cooperativa Agrcola de Cotia, fundada em 1927, no seu 5. aniversrio promoveu uma exposio de seus produtos, exibindo, na ocasio, juntamente com exemplares de batata, tomate, tambm ovos e aves, incentivando o interesse dos agricultores pela avicultura. Na vila de Cotia, centro de produo da batata, o primeiro a comear a criao de galinha foi Ken-ichi Nakagawa. Iniciou a criao para obteno de estreo em 1930, mas logo passou a encarar a avicultura como sua atividade principal. Dedicou-se criao de poedeiras de alta produtividade, e em 1934-35 conseguiu criar duas aves, uma de 302 e outra de 300 ovos/ano, feito espantoso para a avicultura da poca. Nesses anos as criaes praticadas em So Miguel Paulista, Suzano, Mogi das Cruzes, municpios prximos cidade de So Paulo, eram de 50-100 aves, existindo criaes de at 300 aves. A Cooperativa Agrcola de Cotia testou a venda de ovos no posto de comercializao de verduras. Foram vendas a granel 3 a 4 ovos mas conseguiu vender naquele ano cerca de 7 mil dzias. Provada a viabilidade de venda, essa organizao instalou uma banca especial de venda de ovos. Na poca, a remessa de cada produtor no passava de 10 dzias, mas, com o aumento do nmero de criadores e da escalada do plantei, a produo foi crescendo continuamente. Em 1936 as vendas ascenderam a 28 mil dzias. Por volta de 1935, a migrao dos imigrantes japoneses para a periferia da cidade de So Paulo era considervel, e aqueles que pretendiam iniciar-se na avicultura eram cada vez mais numerosos, mas ressentiam a insuficincia de conhecimentos tcnicos sobre a avicultura. Diante disso, foi fundada a associao de difuso da avicultura pelas pessoas de destaque da comunidade de origem japonesa, com a assistncia da seo de fomento da produo, do Consulado Geral do Japo em So Paulo. O chefe dessa seo de fomento da produo, ao regressar ao seu pas, prometeu remeter aves-matrizes do Japo, o que cumpriu em fins de 1937. Foram enviadas 15 Leghorn brancas, 15 Rhode Island Red e 15 Plymouth Rock. As duas ltimas foram entregues ao avirio da associao agrcola japonesa, criada naquele ano em Caxingui, e as 15 Leghorn brancas foram entregues Cooperativa Agrcola de Cotia, que encarregou Yoshiji Kodato de cri-las. Contriburam muito para a divulgao da avicultura e seu aprimoramento tcnico os cursos ministrados para moos da zona rural. Valendo-se dessas organizaes de moos, eram realizados cursos sobre avicultura, e esses moos, ao regressarem aos seus bairros, levavam cada qual 200 pintinhos para iniciar os trabalhos de criao.

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A avicultura no interior do Estado de So Paulo, como nas regies da E. F. Noroeste do Brasil, E. F. da Alta Paulista, foi iniciada dessa maneira, e, com o lanamento de pintos de um dia de "poedeiras de 300 ovos por ano", a criao de galinhas se estendeu a todo o territrio do Estado no espao de tempo de dez anos, entremeando a II Guerra Mundial. A avicultura se erigiu assim como uma atividade produtiva independente. Nos 20 anos que antecederam o ano de 1962, o conflito mundial, as dificuldades do ps-guerra, o surgimento da doena de Newcastle nas aves dos EUA, etc. fizeram com que fosse nula a introduo de matrizes do exterior. Em 1961 foi autorizada a importao de matrizes. Assim, a partir do ano seguinte houve verdadeira invaso de aves americanas. A granja Ito, que aguardava a revogao da proibio de importao das matrizes estrangeiras, tratou imediatamente de entrar em acordo com a Hy Line americana para iniciar a distribuio dos pintos dessa linhagem. Diante da melhor performance dessas aves em comparao com as linhagens existentes no pas, as outras granjas produtoras de pintos tiveram de importar, tambm, matrizes americanas. Vieram firmas americanas, alm da Hy Line citada, como Kimber, Babycock e Shaver, de maneira que a avicultura brasileira ficou literalmente tomada pelas aves americanas. Alis, toda a Europa como o Japo no ficaram alheios a isso. No foi s com a avicultura de postura, mas tambm com as aves de corte, pois a tecnologia americana havia criado aves de corte de performance revolucionria, as quais no poderiam deixar de ser importadas. Em 1969, foram introduzidas do Japo as matrizes Iwaya, Goto e Enya, que tiveram o seu lugar ao sol. Atualmente, entre os avicultores de descendentes de japoneses se encontram criadores de 100 mil a 1 milho de poedeiras, mas a grande maioria faz criao na escala de 10 mil a 30 mil aves. Quanto criao de aves para corte, pratica-se a produo contratada com grandes empresas. No existem grandes criadores de aves para corte de origem japonesa. As entradas em 1988 foram: na Ceagesp-SP: 403.407 engradados de 30 dzias; Cooperativa Agrcola de Cotia: 1.907.338 engradados; Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil: 439.585 engradados. A Cooperativa Agrcola de Cotia recebeu nesse ano 16.394.654 kg de aves para abate. Gado Ultimamente est aumentando o nmero de criadores bovinos, inclusive grandes produtores, mas poucos so aqueles que se dedicam ao trabalho de melhora das raas e vendas de reprodutores.

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Um desses poucos criadores Hiroshi Yoshio, do Estado de So Paulo. Afora a criao de cerca de 10 mil cabeas de gado para corte, tem importado reprodutores Nelore, da ndia, e, a par de todo o trabalho de manuteno da linhagem pura, vem conseguindo efetuar melhoras de raas. Os seus produtos exibidos em exposies tm obtido prmios em diversas regies do pas. Possui Yoshio, ainda, uma empresa de distribuio de smen, cuja rede de vendas abrange todo o territrio nacional e alguns pases vizinhos. Existem mais de dez empresas japonesas que possuem fazendas de criao de gado de corte. A Yakult desenvolve uma fazenda de gado leiteiro. Sericicultura A criao do bicho-da-seda era muito familiar para os imigrantes japoneses, e era muito natural que eles se interessassem pela sericicultura no Brasil. J na primeira leva de imigrantes, Tomojiro Ibaragi trouxera apetrechos para criao do bicho-da-seda, mas, na Hospedaria dos Imigrantes, no conseguindo explicar convenientemente para qu aqueles apetrechos serviam, foram eles confiscados. Em 1912, o iniciador da Colnia de Iguape, Ikutaro Aoyagi, solicitou ao governo do Estado de So Paulo, e conseguiu, o fornecimento de mudas de amoreiras, e em 1916 trouxe ovos de bicho-da-seda para testar a sua criao. Os resultados no foram promissores. Em 1919, Toyozo Ono e alguns companheiros, estabelecidos na colnia de Gara, SP, fizeram da sericicultura atividade exclusiva. O governo do Estado de So Paulo, no ano de 1922, demonstrou interesse pela sericicultura, fundando a Seda Nacional S.A., subsidiada pelo Estado, que tratou de produzir ovos de bicho-da-seda, e atravs da sua distribuio se empenhou na divulgao dessa atividade produtiva. Em 1938, a Bratac, com o intuito de proporcionar mais uma atividade produtiva subsidiria, incentivou, entre os imigrantes que se estabeleceram nos ncleos de Bastos, Tiet e Aliana, a criao do bicho-da-seda, instalando fiaoes de modestas propores nos dois primeiros ncleos citados. A iniciativa foi muito positiva, pois alm de auxiliar economicamente os imigrantes pela participao da mo-de-obra feminina e de menores, aqueles que j tinham experincia com a sericicultura puderam dedicar-se especificamente a essa atividade. A fiao da Bratac tratou de importar do Japo e melhorar o bicho-da-seda, e trouxe do exterior mquinas de fiao automtica, contribuindo para melhorar a qualidade da seda brasileira e impulsionando a produo sericcola do pas. Na poca, cerca de 90% da seda consumida pelas tecelagens brasi-

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leiras era importada do Japo e da Itlia. Com a II Guerra Mundial, as importaes cessaram, e o governo adotou a poltica de incentivo da produo interfla. Ao trmino do conflito, o montante produzido no pas ultrapassava em algumas dezenas de vezes a produo de antes. Pouco depois, todavia, com o retorno da produo do bicho-da-seda do Japo e da Itlia, as exportaes da seda brasileira foram prejudicadas. Com grandes estoques, as cotaes do produto sofreram tremendas quedas, trazendo situao de verdadeira calamidade para a sericicultura nacional. A retrao do mercado se acentuou com a queda no consumo da seda motivada pelo aparecimento de fibras sintticas, como o nilon e similares. Essa situao de dificuldades persistiu por mais alguns anos para os produtores sericcolas e fiaes de seda. Em 1962, as amostras remetidas pela fiao Bratac Sua foram consideradas de excelente qualidade, comparveis aos melhores produtos japoneses, italianos e chineses, pelo rgo internacional de padronizao da seda. Isso coincidiu tambm com o perodo de recuperao econmica do Japo e acentuado aumento da demanda de seda nesse pas, resultando na escassez mundial desse produto. Isso trouxe sericicultura brasileira um novo alento e prosperidade. Foram embarcadas, pela primeira vez em 1967,9,2 toneladas de seda para o Japo. J em 1972 essa exportao alcanava 216 toneladas, trazendo novo incentivo produo. A partir dessa poca muitas empresas japonesas chegaram ao Brasil. A produo foi aumentando a cada ano, e, das sete fiaes de seda existentes no pas, seis so de origem japonesa. A produo de seda em 1983/84 foi de 1.327 toneladas. Criao de Truta Kiyoshi Koike, jovem imigrante chamado pela Cooperativa Agrcola de Cotia, passou a trabalhar, por volta do ano de 1970, na estao experimental em Campos do Jordo,. dedicando-se viabilizao da criao de truta. Em 1972, com a ajuda financeira de Evaristo Comolatti, proprietrio do Terrao Itlia, de So Paulo, montou uma instalao pisccola para produo comercial de truta. Animados com esse empreendimento, j existem estabelecimentos de criao e produo de truta nos estados do Rio de Janeiro e Santa Catarina.

2. IMPLANTAO DA AGRICULTURA INTENSIVA

O Prof. Oracy Nogueira, da Universidade de So Paulo, na conferncia intitulada "O imigrante japons e o desenvolvimento de So Paulo".

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proferida no Simpsio dos 60 Anos de Imigrao Japonesa no Brasil, disse: "Iniciada em princpios do sculo XX e tendo atingido um montante relativamente modesto, em comparao com os italianos, portugueses e espanhis, a imigrao japonesa tem tido uma importncia excepcional, especialmente no papel que tem desempenhado os imigrantes dessa nacionalidade na produo e comercializao de produtos perecveis, destinados ao consumo interno, como frutas, hortalias e ovos. Dificilmente se poderia conceber como So Paulo teria atingido o seu atual grau de urbanizao e industrializao sem a contribuio do imigrante japons no setor de abastecimento de produtos perecveis destinados alimentao. Ainda est por se fazer um estudo sistemtico da influncia japonesa na transformao da agricultura em So Paulo, do preparo e trato do solo experimentao agrcola, criao de variedades mais econmicas, indstria de mudas e sementes, organizao de pequenos estabelecimentos agrcolas e granjas, ao cooperativismo e comercializao dos produtos". Ditas h 20 anos, essas palavras do Prof. Oracy Nogueira so atuais, exprimindo a contribuio da imigrao japonesa ao pas. Experincias adquiridas no Japo aplicadas no Brasil Dos primeiros imigrantes que foram introduzidos nas fazendas de caf na regio da Mogiana Estado de So Paulo , alguns aps o trmino do perodo contratual de trabalho, e outros abandonando o servio com quebra de compromisso, se dirigiram para as cercanias da cidade de So Paulo. Isso por volta de 1914-15. Tambm nos anos seguintes, os imigrantes que completavam os seus contratos de trabalho nas fazendas de caf se dirigiram para o interior do Estado para formar ncleos agrcolas ou se dirigiram para os arredores da cidade de So Paulo. No perodo que sucedeu ao fim da II Guerra Mundial essa tendncia de fluxo visando os arredores de So Paulo foi acentuada. O "Recenseamento da Colnia Japonesa no Brasil", realizado em 1958, apresenta a seguinte situao para o nmero de imigrantes japoneses na regio de So Paulo (excludos os moradores da cidade de So Paulo):
Anos 1908-17 1918-27 1928-37 1938-47 1948-58 Entradas 17 188 922 1.586 1.936 Sadas 17 64 473 704 916 Saldo 10 famlias 124 449 882 1.019

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Como se v, h sadas, mas o nmero de famlias que chegam muito mais expressivo. Este fluxo para as redondezas da cidade de So Paulo motivado por muitos fatores, mas um deles certamente o fato de o imigrante querer colocar em prtica a experincia agrcola adquirada no Japo. Segundo Kiichi Mori (Desenvolvimento do capitalismo na agricultura japonesa, p. 125-29), no perodo de 1908-1912, exatamente no perodo em que vieram para o Brasil os primeiros imigrantes, a mdia de rea possuda por famlia de lavrador japons era de 1,1 hectare. E a famlia era composta, em mdia, por seis pessoas. Assim, o agricultor japons tinha necessidade de produzir o mximo em rea agricultvel limitada para tirar o sustento de sua famlia. Aps o advento da Era Meiji, a agricultura foi passando, mais e mais, da produo de cereais diversos que no o arroz para a produo de hortalias, frutas e criaes, no atendimento da demanda dos consumidores. Para o aumento da intensidade de utilizao das terras, os lavradores estavam permanentemente interessados na introduo de novas variedades, na adoo de sistemas de rotao de culturas, na utilizao de mais fertilizantes, nos trabalhos de defesa contra as pragas, e nas atividades subsidirias, como criaes, inclusive a de bicho-da-seda. Tudo para aumentar a receita familiar. Quer dizer que os imigrantes japoneses estavam acostumados a conviver com a agricultura de trabalho intensivo. A agricultura do interior do Estado no propiciava a oportunidade de praticar esse tipo de lavoura, mas nos arredores de So Paulo isso era perfeitamente possvel, principalmente porque a cidade, com ndice de crescimento raro no mundo todo, no s permitia, mas exigia produo agrcola desse tipo. Os imigrantes japoneses que vieram para estabelecer-se nas redondezas de So Paulo nessa poca passaram, inicialmente, a dedicar-se plantao de batata, e em seguida foram se deslocando para a produo de hortalias, frutas e a criao de aves. Associaram suas produes nos moldes da agricultura de trabalho intensivo, semelhante praticada no Japo, criando um modo de produo agrcola at ento inexistente no Brasil. a) A bataticultura na fase inicial A vila de Cotia, onde os primeiros imigrantes se estabeleceram, fica a uns 20 quilmetros a oeste da cidade de So Paulo. uma vila fundada pelos missionrios jesutas para a catequese dos ndios. Desbravada h muito tempo, submetida agricultura de queimada e coivara, a terra j se achava empobrecida e com capim barba-de-bode quando os citados japoneses chegaram. No s a de Cotia, mas a maioria das terras ao redor

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da cidade de So Paulo se encontrava nessa situao. Entretanto, essas terras, convenientemente tratadas, poderiam recuperar sua capacidade produtiva. A existncia dessas terras propiciou a entrada de imigrantes japoneses que contavam com poucos recursos, mas que almejavam estabelecer-se por conta prpria como lavradores independentes. A cidade de So Paulo se encontrava em poca de rpida expanso com a chegada de imigrantes estrangeiros, necessitando de fornecimento de alimentos. Os imigrantes japoneses que chegaram a Cotia trataram de revolver a terra com enxada e cultiv-la moda do Japo, deitando nela a batatasemente adquirida dos caboclos. Esses imigrantes j sabiam que a batata tinha boa demanda e que seus preos eram compensadores. Entretanto, s a partir da segunda semeadura que se conseguiu colher batata em boas condies, quando se passou a cultiv-la em baixadas. As terras cultivadas, sem rotao e sem adubao, se exauriam com rapidez. Tendo informao de que o abatedouro de Osasco tinha disponvel restos orgnicos de abate, os lavradores enviaram representantes a esse estabelecimento para adquirir o material e usaram-no para fertilizao da plantao de batata. Obtendo excelentes resultados, da para diante todos os bataticultores passaram a empregar esse material orgnico para adubao de suas plantaes. As batatas-sementes adquiridas no local eram de muitas variedades misturadas. Assim, na colheita se separavam as batatas de cada cova para fazer a escolha das melhores. Com esse esforo se chegou "batata-ouro de Cotia", que conseguiu angariar fama e preferncia do consumidor. Tendo conhecimento da eficcia da calda bordalesa no combate s pragas, pulverizaram as suas plantaes com ela obtendo bom resultado. Adotaram a prtica do mutiro alis de fcil aceitao por parte dos imigrantes japoneses em virtude da existncia de prtica semelhante no Japo para os trabalhos de semeadura, a fim de terminar a tarefa num s dia. Essa prtica serviu para aproximao dos membros da comunidade, facilitando a ao conjunta para aquisio de adubos, o controle da rea de plantio, a racionalizao das remessas de batata para o mercado, beneficiando, no todo, a produo de batata da vila de Cotia. Na sua faina entremeada de tentativas e erros, os imigrantes japoneses foram construindo o tipo de agricultura das cercanias de grandes cidades, adaptando seus conhecimentos da agricultura japonesa. b) Horticultura Primeiramente foi s a plantao de batata. A cidade de So Paulo registrava, no ano de 1920, uma populao de 579 mil habitantes e o abastecimento de verduras e hortalias era feito pela produo das pequenas chcaras de portugueses. Os imigrantes japoneses, de incio, tentaram cultivar algumas verduras de origem japonesa, mas como eram

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pouco familiares para a populao, no tiveram boa aceitao. Assim, as plantaes desses produtores japoneses se limitaram por algum tempo s de batata. Esses imigrantes, principalmente os produtores de batata, tomaram a iniciativa de fundar cooperativas agrcolas. Surgiram assim, na segunda metade da dcada de 20, nos arredores da cidade de So Paulo, cooperativas de produtores agrcolas, das quais algumas se tornaram de grande porte e prestam, ainda hoje, importantes servios sociedade. Somente a partir de 1933 essas organizaes cooperativas passaram a trabalhar sistematicamente na comercializao de verduras e hortalias.. Em 1934 a populao de So Paulo havia ultrapassado um milho de habitantes. Contando com grande contingente de imigrantes italianos e seus descendentes, estava num contnuo crescendo a demanda de verduras e hortalias, principalmente a de tomate. De outro lado, imigrantes japoneses, que se dedicavam cafeicultura ou plantao de algodo no interior do Estado de So Paulo, atingidos em cheio pela crise econmica de 1929, procuraram, no poucos, o caminho da lavoura de hortalias e verduras nos arredores da cidade de So Paulo. nica lavoura possvel de ser empreendida pela pequena disponibilidade de capital, pois at a plantao de batata no estava ao seu alcance diante do investimento indispensvel. Diante dessa contingncia, o nmero de horticultores nos municpios que circundam a capital cresceu com grande rapidez. Em julho-agosto de 1933 houve ondas de frio e intensas geadas, acarretando quedas da oferta de tomate no mercado de So Paulo e seus preos tiveram altas acentuadas. Atrados por essa alta cotao, centenas de horticultores passaram a plantar tomate, e em janeiro-fevereiro do ano seguinte houve uma verdadeira enxurrada de tomate em So Paulo. Os preos caram vertiginosamente. Quando o mercado paulistano assimilava diariamente pouco menos de 500 caixas, chegavam alguns milhares de caixas por dia. O preo da caixa, que era de 25 a 40 mil ris, foi a 2 mil ris. Com essa lio, os cultivadores de tomate passaram a diversificar suas culturas, plantando batata, repolho, cenoura, etc. Aumentou o nmero de produtores que se ligaram s organizaes cooperativas. Esse aumento do nmero de horticultores pode ser constatado pela evoluo do nmero de associados da Cooperativa Agrcola de Cotia: no ano de 1933 eram cerca de 70 horticultores, j no ano seguinte aumentou para 190, em 1935 eram 371, quase a metade do total de cooperados. O nmero de horticultores que se localizavam nos arredores da cidade de So Paulo foi crescendo de ano a ano: num anncio de jornal de fevereiro de 1936 aparecem os dizeres: "ns, 2 mil famlias de horticultores das cercanias da cidade de So Paulo".

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Com o aumento do nmero de horticultores japoneses, no s houve o aumento da quantidade ofertada, mas tambm a introduo de novas variedades e novos tipos de hortalias e verduras. Tornou-se mais rica a oferta de alimentos, na quantidade, qualidade e variedade, influindo na mudana do hbito alimentar do citadino. c) Avicultura Juntamente com a implantao da horticultura, a criao de aves nos municpios que cercam a cidade de So Paulo foi outro setor da produo em que os imigrantes japoneses tiveram destacada contribuio conforme meno feita anteriormente. d) Fruticultura Juntamente com a horticultura e a avicultura, a fruticultura, especialmente a cultura de frutas de zona temperada, se constitui num.dos trips da agricultura intensiva desenvolvida nos arredores da cidade de So Paulo. Os imigrantes japoneses s passaram a dedicar-se com afinco fruticultura aps a conquista de uma posio econmica mais estvel, obtida com a plantao de batata, a horticultura e a criao de aves, e depois de terem conseguido adquirir as suas prprias terras. No Brasil existiam, introduzidas de h muito pelos imigrantes europeus, frutas conhecidas pelos japoneses, como uva, caqui, pra, ameixa, castanha, etc, mas eram para o consumo caseiro e muito poucas frutas eram produzidas com fins comerciais. Os imigrantes japoneses trataram essas frutas fazendo podas, adubao, etc, e efetuando seleo e melhora de variedades, ou ainda trazendo sementes e mudas do estrangeiro, para conseguir frutas comercializveis. E quando a agricultura do tipo praticado nos arredores de So Paulo se difundiu pelo interior do Estado, as frutas tropicais e subtropicais, como abacate, abacaxi, mamo, manga, goiaba, melo, melancia, etc, que eram cultivadas de maneira precria, ou quase em estado nativo, foram objeto de mesma ateno, com melhorias na tcnica de trato, introduo de variedades selecionadas, etc, de maneira que passaram a ser produzidas em escala comercial. Atualmente, existem estabelecimentos que produzem essas frutas em grande escala, destinando seus produtos exportao para pases da Europa e os Estados Unidos. e) Propagao da agricultura de trabalho-intensivo no interior do Estado Aps o trmino do perodo contratual, os imigrantes japoneses que vieram para o Brasil como trabalhadores contratados nas fazendas de caf se dirigiram para os muitos ncleos coloniais formados pelos japoneses

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como agricultores por.conta prpria. Mas esses ncleos a que se dirigiram no ofereceram condies de permanncia definitiva. que, na grande maioria dos casos, as culturas de caf ou de algodo eram praticadas, como ento era de praxe, de maneira quase que predatria, sem qualquer fertilizao do solo, e com isso as terras se exauriam com o correr dos anos obrigando os agricultores a procurarem novas terras para desbravamento. Segundo o "Recenseamento da Colnia Japonesa" feito em 1958, a mdia de mudanas feitas pelos imigrantes japoneses era de 6,5 vezes por famlia. Esse tipo de comportamento, que retrata o estado psicolgico instvel do trabalhador dekasegi, vai desaparecendo gradativamente quando os imigrantes japoneses e seus descendentes adotam a determinao de permanecer definitivamente no pas aps o trmino da II Guerra Mundial. Cessando esse estado de instabilidade psicolgica e com o surgimento da deciso de permanncia definitiva, a agricultura no interior tambm deixou de ser a de depredar a fora vital da terra. Passou-se ao uso de fertilizantes, ao emprego de defensivos, mecanizao, com o que houve ampliao da escala das plantaes e a produtividade teve sensvel melhora, tudo isso com reflexos na situao econmica dos imigrantes japoneses. A partir de 1965 at os primeiros anos da dcada de 70, o sistema de rodovias em todo o Brasil, e particularmente a rede convergente para a cidade de So Paulo, teve grande avano. Com o desenvolvimento dos mercados das cidades regionais, a agricultura do interior do Estado evoluiu para uma maior diversificao, com a adoo de horticultura, fruticultura e criao de aves, saindo da incerteza que sempre cerca a monocultura. Hoje em dia, em localidades distantes mais de mil quilmetros da cidade de So Paulo, pratica-se agricultura intensiva, similar existente nos arredores da capital. Empregando trabalho assalariado, os agricultores de origem japonesa se dedicam, a par das culturas de caf, algodo, etc, tambm s plantaes como as de uva "itlia", que demandam tcnicas mais apuradas e trabalho mais intenso e dedicado. Essa mudana que se verificou na agricultura do interior foi e possvel, fundamentalmente, graas ao desenvolvimento da circulao de mercadorias resultante, principalmente, da melhora do sistema de transportes. A isso se deve acrescer a contribuio das cooperativas que tiveram e tm papel destacado na comercializao dos produtos e na assistncia aos produtores.

DESENVOLVIMENTO DE NOVA AGRICULTURA 505 3. DESENVOLVIMENTO DE NOVA AGRICULTURA

A agricultura brasileira comea a mudar nos anos 70. As culturas de soja, trigo, arroz, milho, etc, com o processo de intensa mecanizao iniciado a partir da segunda metade da dcada anterior, tm as suas reas de plantao ampliadas. Os estados do Rio Grande do Sul, Paran e So Paulo, que adotaram essas tcnicas agrcolas, acusavam, j no trmino dos anos 60, falta de terras agricultveis e seus agricultores rumaram para o norte, onde comearam a praticar agricultura mais tecnificada, desbravando novas fronteiras agrcolas. Os gachos foram os pioneiros. J na dcada de 60, eles formaram grandes plantaes de soja, trigo, milho e arroz nas terras do Estado do Mato Grosso. Os agricultores de origem japonesa, que estavam sentindo o mesmo problema da falta de terras, partiram no seu encalo. Distinta dos estados sulinos, onde existem prontas as infra-estruturas, a nova regio, distante dos mercados, tem de ser desbravada adotando-se forma prpria de agricultura. Uma forma pode ser o ncleo de colonizao; outra a criao de centro de produo de determinado produto. A partir da segunda metade do sculo passado, o governo tem tentado estabelecer ncleos agrcolas em diversos pontos do territrio nacional, mas poucos foram os casos bem-sucedidos. Assim, nos ltimos tempos o governo vem instando as organizaes agrcolas mais destacadas a colaborarem nesses empreendimentos desde a fase de elaborao dos projetos. As cooperativas agrcolas de origem japonesa no fizeram exceo. 1) Regio do cerrado O cerrado brasileiro tem uma rea de 180 bilhes de hectares e se estende pelos estados de Gois, Minas Gerais, Mato Grosso, Piau e Maranho, compreendendo cerca de 20% do territrio nacional. O cerrado brasileiro pertence ao clima de savana tropical igual ao de savanas do sul da sia, frica e Austrlia. Apresenta as seguintes caractersticas: a) A pluviosidade anual de 1.500 mm em mdia. Existem oscilaes regionais. Cerca de 65% do cerrado se encontra na faixa de 1.200 mm a 1.800 mm, mas existem regies com mais de 2.000 mm de chuva por ano e outras com menos de 1.000 mm. H um perodo de seca acentuada de abril a setembro. b) Praticamente 90% das terras do cerrado so constitudas de solo cido, com deficincia de elementos essenciais. Cerca de 70% tem conformao geogrfica plana ou com leves ondulaes. Em geral, a drenagem boa, e a capacidade de reteno de umidade pelo solo pequena.

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Para a agricultura, trata-se de solo pobre, acrescido do rigor das condies naturais de 5 meses de seca, mas se o interesse pelo desbravamento do cerrado aumentou, isto se deve, de um lado, crescente carncia de terras agricultveis na Regio Sul do pas, e de outro convico de que a lavoura seria vivel se contasse com alta tecnologia e muita vontade de trabalhar. Havia tambm o reconhecimento de que o desbravamento do cerrado brasileiro teria um grande significado para assegurar alimento aos 5 bilhes de habitantes do mundo, no s pela produo propriamente dita, mas pelo desenvolvimento e implantao da tecnologia adequada que poder ser seguida pelas futuras agriculturas nas regies de savana do sul da sia, frica e Austrlia. a) Plano Nacional de Desenvolvimento do Cerrado Considerando vivel o aproveitamento de 50 milhes de hectares do cerrado para fins agropecurios com o emprego de novas tecnologias agrcolas, o governo da Unio, atravs do decreto n. 75.370, de 20 de janeiro de 1975, criou o projeto Polocentro. Pelo plano seriam desenvolvidos 3,7 milhes de hectares de campo localizados nos estados de Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Gois. No perodo de 1975-79, seriam desenvolvidos 1,8 milho de hectares para agricultura, 1,2 milho para a pecuria e 0,7 milho de matas. Este era o plano do governo federal. Antes desse projeto, a Cooperativa Agrcola de Cotia, em associao com o governo do Estado de Minas Gerais, j havia iniciado o plano Padap, projeto pioneiro no desenvolvimento do cerrado. b) Padap Projeto Agrcola de Desenvohnmento do Alto Paranaba A Cooperativa Agrcola de Cotia instalou em So Gotardo, a 300 km de Belo Horizonte, o centro de operaes do projeto. Essa localidade se situa a 740 km de So Paulo e 800 km do Rio de Janeiro por estradas asfaltadas. Terreno plano, chamado chapado, localizado altitude de 1.150 metros, servido pela BR-354, o planalto se estende na direo nortesul e faz desaguar as fortes chuvas nos rios Indai e Borrachudo, a leste, para afinal cair no Rio So Francisco; a oeste as guas vo em direo do Rio Paran atravs do Rio Paranaba. No planalto so encontrados olhos d'gua que formam pequenos crregos que correm nos declives a leste e a oeste. Na parte de baixo dessas inclinaes so comumente encontradas terras frteis que os moradores da localidade utilizavam para o plantio de mandioca, milho e feijo. Tradicionalmente essas terras s se prestavam para essas pequenas produes e para o preparo de carvo pela queima de arbustos. Foi nessas terras que o governo do Estado de Minas Gerais visou desenvolver uma rea de produo agrcola e a Cooperativa Agrcola de

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Cotia, com a participao ativa de seus associados, colaborou decisivamente na sua concretizao. Assim, por volta do ano de 1971 a situao comeou a modificar-se. Agricultores do norte do Paran comearam a dirigir-se regio do cerrado, e um dos seus representantes, Hifumi Ogasawara, diretor da CAC, adquiriu terras em Serra do Salitre para iniciar o plantio de caf e soja. Insistiu que seus companheiros se estabelecessem na regio. c) Resultados do Padap O Padap foi iniciado com a plantao de soja, arroz de sequeira, trigo e caf. Arroz de sequeira. No primeiro ano foram semeados 800 hectares, mas o veranico (pequeno perodo de seca que se intercala na estao chuvosa, em geral de 1-2 semanas, podendo persistir at 30 dias) e bruzone causaram graves danos, ficando a colheita reduzida a 2 sacos por hectare. A safra seguinte, com semeadura de 1.400 hectares, foi pior ainda, pois a produo foi de apenas 1,5 saco por hectare. Diante do resultado desastroso, a cultura do arroz foi abandonada. Na dcada de 80, por motivo de rotao das plantaes, a plantao de arroz foi retomada, mas a rea de cultura no passa de 100-250 hectares. O rendimento atual cerca de 35 sacos de arroz em casca por hectare. Soja. No 1. ano agrcola (1974-75) foram plantados 2.000 hectares, mas a colheita mdia foi de apenas 6-7 sacos por hectare. O rendimento mdio elevou-se para 18 sacos no 2. ano, e no 3. a 20 sacos por hectare. No 6. ano agrcola (1979-80), plantando-se 19.000 hectares, foram colhidos 36 sacos por hectare, em mdia. No perodo de 1981-83, a situao da cultura de soja se modifica. At ento, para permitir a semeadura de trigo no inverno, a soja tinha de ser da variedade precoce, mas a partir desses anos foi introduzida a variedade tardia. Isto se deveu s irregularidades climticas desse perodo e introduo de "piv" central para irrigao. A irregularidade climtica mencionada foi a elevao da taxa de pluviosidade da regio. Enquanto a mdia de chuva registrada ao longo dos anos de 1.500 mm, em 1980 choveu 1.960 mm, at 2.485 mm em 1983, dificultando a colheita da soja precoce, obrigando ao abandono cerca de 5.000 hectares de plantao em 1983. Nessas circunstncias, teve de se fazer a adoo da variedade tardia para evitar os prejuzos e obter vantagens na produtividade, pois, enquanto a soja precoce rende de 30 a 35 sacos, a variedade tardia consegue de 45 a 47 sacos por hectare.

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Milho. O milho comeou a participar da produo a partir dos primeiros anos da dcada de 80. Isso se deveu no apenas a fatores de preo, mas tambm para que fossem evitados os males da monocultura da soja. No incio, seu rendimento era da ordem de 65 sacos por hectare, mas ultimamente sua produtividade tem se elevado, alcanando cerca de 100 sacos. Trigo. A produo de cereais no cerrado no inverno perodo de chuvas atendida pela soja e milho. A cultura de inverno problemtica. Desde o incio se visou a cultura do trigo. que a altitude da regio de 1.100 metros. Assim, apesar de situar-se em rea subtropical, a temperatura mdia mensal no perodo de maio a agosto fica abaixo de 20C, com a umidade relativa pouco acima de 50%, condies climticas que permitiriam a cultura do trigo. Apesar de ser perodo de seca, a pluviosidade mdia observada durante 13 anos indica 95 mm em abril e 60 mm para o ms de maio. Tentada a plantao de trigo, em 1975 se obtiveram 14 sacos por hectare, e j no 4. ano de produo foram colhidos 23 sacos. As irregularidades climticas verificadas nos anos de 1979,81 e 83, por exemplo, provocaram baixas colheitas, mas com boas condies de tempo a produtividade pode chegar a 34-35 sacos por hectare, falandose at na mdia de 60 sacos em breve, em algumas glebas, mesmo sem irrigao. A produo do trigo tornou-se estvel a partir de 1983 quando foram introduzidas 11 unidades de "piv" central para irrigao. A partir do ano seguinte sua introduo, a produo tritcola da regio se estabilizou, conseguindo a mdia de 60-70 sacos por hectare. Entretanto, h certa dose de incerteza no futuro dessa triticultura em decorrncia das mudanas na poltica agrcola do governo. Atualmente, existem instaladas na regio 39 unidades de "piv" central. Caf. A rea. plantada de caf em 1987-88 era de 4.436 hectares, colhendo-se 60 mil sacos de caf beneficiado. Em 1989, atingem a idade de produo os 2,3 milhes de ps de caf plantados em 1984-85. As terras de So Gotardo so boas, e o clima excelente para a produo de caf de alta qualidade. Produes da seca. Com a introduo de "piv" central se tornaram possveis as seguintes culturas, que podem ajudar a estabilizar a agricultura da regio: Ervilha em gro. Esta produo foi iniciada em 1985. A produtividade

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de 13-20 sacos por hectare em rea no irrigada e 20-36 sacos com irrigao. Atualmente so cultivados 700 hectares irrigados e 1.100 hectares no irrigados. produo contratada com empresas de alimentos enlatados. Tomate para industrializao. Durante os cinco meses de inverno a quantidade de chuva de 255 mm, a temperatura mdia abaixo de 20 C e a umidade relativa pouco acima de 50%. Com baixa incidncia de pragas nessas condies, h a possibilidade de produo de tomate quando se pode contar com irrigao adequada. Assim, prosseguem as culturas experimentais de tomate. Batata. Esto sendo feitas culturas experimentais. Por enquanto a produtividade da ordem de 370-400 sacos por hectare. Cenoura. Com um rendimento de 1.500 caixas (25 kg) por hectare, j se tornou um produto importante da regio. Alho. Rendimento de 400-700 caixas (10 kg) por hectare. Sementes de hortalias. Mantendo contrato com empresa fornecedora de sementes, so produzidas sementes de cenoura, pepino, tomate, pimento, quiabo, couve-flor, etc. Com trs anos a viabilidade do Padap pde ser comprovada e a partir do 6. ano o projeto conseguiu estabilizar-se. Antes de dez anos de existncia os movimentos de produo e aquisio de insumos na sucursal de So Gotardo assumiram o primeiro lugar entre as 88 sucursais que a Cooperativa Agrcola de Cotia possui espalhadas em todo o territrio nacional. 2) Colaborao Brasil-Japo Em visita ao Brasil em 1974, Kakuei Tanaka, ento primeiro-ministro do Japo, props o exame do programa de cooperao econmica para o desenvolvimento do cerrado. A idia de desenvolvimento do cerrado entrou, a partir dessa oportunidade, na ordem do dia das discusses bilaterais em nvel governamental. Na ocasio, o j mencionado programa do Padap, da Cooperativa Agrcola de Cotia, estava em andamento com a fixao de 24 famlias de associados. E o Ministrio da Agricultura estava elaborando o seu grandioso projeto do Polocentro. Em 1976, o presidente Geisel, na sua visita ao Japo, assinou o protocolo sobre o programa global de cooperao econmica. No desen-

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volvimento dos trabalhos tcnicos, os dois governos decidiram criar a Companhia de Promoo Agrcola Campo, rgo executor do projeto. Em setembro do ano seguinte, foi ao Japo o ministro Paulinelli, da Agricultura, sendo firmada a "cooperao para a Pesquisa da Agricultura no Cerrado". Atendendo a esse acordo, o governo brasileiro criou o Cepac atravs da Embrapa, instalando perto de Braslia uma estao experimental, e o Japo enviou, a partir de 1978, atravs da JICA Japan International Cooperation Agency, equipe de especialistas para colaborar na pesquisa. Para prover de recursos a Campo, os dois governos organizaram, cada qual, empresas de investimento. No Brasil foi a Brasagro, com a participao do Banco de Desenvolvimento do Estado de Minas, o Banco do Brasil e outros, num total de 44 entidades. Do lado japons foi fundada a Jadeco. Com a participao dessas duas empresas, foi realizada em novembro de 1978 a assemblia de fundao da Campo, dando-se incio execuo do projeto. a) I Plano de Desenvolvimento do Cerrado O plano de execuo a ser desenvolvido pela Campo, elaborado pelo Ministrio da Agricultura, previa trabalhos por etapas. A primeira, designada de Prodecer-I, compreendia uma rea de 58.771 hectares localizada nos distritos de Irai de Minas, Coromandel e Paracatu, na regio noroeste do Estado de Minas Gerais. O plano piloto elaborado previa a introduo de 94 famlias, instalao de dois empreendimentos agrcolas e a formao de uma unidade de administrao direta da Campo. Parte da infra-estrutura foi atendida pelos recursos do Polocentro e uma outra arcada pelo governo do Estado de Minas Gerais. Foram construdos 215 km de estrada e executadas obras de eletrificao numa extenso de 163 km. O capital do Prodecer, de 50 milhes de dlares, foi suprido pela Jadeco (49%) e pela Brasagro (51%); o lado japons ficou de efetuar um financiamento de 25 milhes de dlares atravs da JICA. O Prodecer I foi um empreendimento bilateral proposto pelo governo do Japo, mas o pensamento do Ministrio da Agricultura era o de fazer participar as cooperativas agrcolas ou empresas do ramo. Havia especial interesse em relao Cooperativa Agrcola de Cotia, que tinha experincia no desbravamento do cerrado com o Padap. Solicitada pelos dois governos, a Cooperativa Agrcola de Cotia passou a participar do projeto levando 50 famlias de agricultores. Foi tambm fundada, com a participao de elementos da comunidade de origem japonesa, a CD AC, empreendimento com rea de 10.120 hectares.

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a.l) Ncleo de Paracatu da CAC O ncleo projetado pela CAC se localiza a 100 km da cidade de Paracatu. Abrange 22 mil hectares de terras situadas altitude de 800 a 1.000 metros, distantes de Braslia 220 km, 545 km de Belo Horizonte e 1.059 km do porto de Santos. Temperatura mdia anual: mxima de 38 C e mnima de 18 C. Pluviosidade mdia: 1.200-1.300 mm, com perodo de seca prolongado. Vegetao variada, de campo limpo at cerrado. Leves ondulaes de terreno com terras arenosas com boa permeabilidade. Nas baixadas so encontradios olhos d'gua. Existem cr-regos. Grande parte das terras adequada para a agricultura mecanizada. Os terrenos foram divididos em 50 lotes de 400 hectares cada. No primeiro ano de implantao do projeto conseguiu-se a produo de 840 kg (16 sacos) de soja por hectare, mas os rendimentos se elevaram com o correr dos anos: 1.467 kg (24 sacos) em 1982; 2.184 kg (35 sacos) em 1984. A soja o principal produto do ncleo. A produo de arroz oscila bastante de ano para ano, tendo sido obtidos resultados de 613 a 1.359 kg por hectare. Isto se deve s irregularidades das chuvas de vero. A regio apresenta uma inconstncia na distribuio pluviomtrica na poca das chuvas. Aps chuva torrencial pode aparecer sol escaldante durante uma semana inteira, fenmeno chamado de veranico. A colheita de caf comeou em 1984. Era voz corrente que a cultura de caf no seria fcil na regio, em virtude da irregularidade das chuvas. Entretanto, ficou comprovado que os efeitos danosos da seca poderiam ser atenuados pela escolha adequada das variedades e trato correto, particularmente a administrao de fertilizantes orgnicos. Os cooperados que seguiram essa prtica conseguiram em 1986, ano que foi de m colheita para todos, excelente rendimento, de 20 sacos ou mais. Hoje, o caf se constitui na principal cultura do ncleo de Paracatu, juntamente com a soja. Sendo, o milho uma cultura que exige terras ricas em matrias orgnicas, havia a tendncia generalizada de deix-lo de lado diante das terras magras do cerrado. Em 1984, foi feita cultura experimental de milho em terras enriquecidas aps trs colheitas de soja e arroz, plantando-se 506 hectares e conseguindo colher a mdia de 2.550 kg (42 sacos) por hectare, um resultado razovel para o cerrado. Com a introduo de sementes melhoradas pela Embrapa e com boa administrao da cultura, foram colhidos, em 1985 e 86, 4.000-5.000 kg por hectare. Esse resultado pode concorrer com as produes que se alcanam nos estados de So Paulo e Paran, regies tradicionalmente produtoras de milho, comprovando a viabilidade dessa cultura no cerrado. A rotao com plantao de soja proporciona resultado excelente. Para a utilizao eficaz do

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perodo das chuvas, muito limitado na regio de Paracatu, a semeadura de soja precoce deve acontecer cedo, sendo feita sua colheita em plena poca das chuvas (janeiro-fevereiro), fazendo-se imediatamente em seguida a semeadura do milho. Quer dizer que durante a poca das chuvas so efetuadas duas plantaes. Com esse sistema, o rendimento mdio, em todo o ncleo de Paracatu, de 82 sacos por hectare, havendo glebas com produo acima de 100 sacos por hectare. a.2) Cedac Fazenda Santa Maria Fundada em 1979, a Cedac um empreendimento que participou do Prodecer, de colaborao econmica entre o Brasil e o Japo. Participaram na sua fundao, como acionistas, Campo, Jadeco, empresrios da colnia japonesa, Banco do Estado de Minas Gerais, Grupo Banco Amrica do Sul, Banco de Tokyo do Brasil, Banco Mitsubishi Brasileiro, Banco Sumitomo e Grupo Katsuzo Yamamoto. A Fazenda Santa Maria se localiza no municpio de Paracatu, Estado de Minas Gerais. b) Prodecer II A primeira fase do projeto do cerrado foi executada em trs distritos do Estado de Minas Gerais e encerrada em setembro de 1982 com o ltimo emprstimo do Japo. O Ministrio da Agricultura, nessa altura, j estava examinando a execuo da segunda fase do projeto. Em fevereiro de 1983, o governo brasileiro apresentou ao governo do Japo as linhas gerais do plano para iniciar as consultas, e em outubro do mesmo ano o ministro Stbile, da pasta da Agricultura, visitou aquele pas para solicitar a participao no plano de expanso do projeto. A JICA enviou duas misses para realizar os estudos necessrios, e baseando-se nos seus relatrios decidiu pela participao. Em maio de 1984, o presidente Figueiredo, na sua visita oficial ao Japo, chegou a um acordo com o primeiro-ministro Nakasone. Em fevereiro de 1985 foi estabelecido o Prodecer II (2. projeto de desenvolvimento do cerrado), e no ms seguinte foi firmado o contrato referente ao projeto entre o Banco Central-Campo e o grupo japons. Recursos necessrios: 300 milhes de dlares, divididos em partes iguais entre os dois governos, ficando a administrao com a Campo, como acontecera na primeria fase. As reas includas na execuo do projeto seriam os estados de Minas Gerais, Gois, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Bahia. Nos trs estados onde j houve a atuao do Polocentro com resultados positivos seriam executadas as ampliaes do projeto, e nos estados de Mato Grosso e Bahia, onde a atuao do Polocentro fora, at ento, muito pouca ou nula, seriam adotados os "planos pilotos". rea total de 190 mil

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hectares, isto , cerca de trs vezes a rea compreendida pela prinieira fase. Nesta segunda fase do projeto, diante da experincia positiva da primeira etapa, foi elaborado plano de implantao atribuindo-se papel central s organizaes cooperativas. As cooperativas que se manifestaram positivamente foram: Cooperativa Agrcola de Cotia - Cooperativa Central municpio de Formosa do Rio Preto, Estado da Bahia. Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil municpio de GuardaMor, Estado de Minas Gerais. COACERAL municpio de Formosa do Rio Preto, Estado da Bahia. COOPERLUCAS distrito de Viva, Estado do Mato Grosso. COOPERCANA distrito de Ana Terra, Estado do Mato Grosso. COOPERVAP distrito de Entre Ribeiro, Estado de Minas Gerais. FEMECAP distrito de Bonfinpolis, Estado de Minas Gerais. COCARI distrito de Paineiras, Estado de Gois. CAMAS distrito de Alvorada, Estado do Mato Grosso do Sul. COOPA GO municpio de Bridis, Estado de Minas Gerais. COOPA DF municpio de Pirapetinga, Estado de Minas Gerais. CPLAC municpio de Niquelndia, Estado de Gois. O lanamento do Prodecer II coincidiu com a transio do governo militar para o poder civil e tambm com o incio de maiores dificuldades econmicas, e, tendo havido atrasos no perodo de 1986-88, o projeto teve o prazo de implantao prorrogado. b.l) Projeto Ouro Verde da CAC Conseguindo o registro das terras em fins de 1986, a Cooperativa Agrcola de Cotia deu partida ao projeto em 1987. Adquiriu uma gleba de 13.558 hectares, no centro dos cerca de 300 mil hectares possudos por seus associados no municpio de Formosa de Ouro Preto, dividindo-os em 34 lotes de aproximadamente 400 hectares cada. Na rea conhecida como Ouro Verde, a CAC contava com mais de cem associados assentados na vizinhana desde 1984. Apesar dos contratempos iniciais na obteno das terras, j no ano agrcola de 1988-89 as reas programadas haviam sido plantadas, mas em virtude das condies climticas desfavorveis as colheitas foram modestas, de 1,44 tonelada por hectare. Essa colheita abaixo da expectativa e a cotao da soja muito baixa foram um golpe duro para os produtores. Esperava-se, contudo, que, com a melhora nas condies de preparo das terras e com a introduo das instalaes de irrigao, dentro de 3-4 anos poderia haver diversificao das culturas e com isso o surgimento de uma nova rea de produo agrcola, de feies diferentes das existentes.

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b.2) Projeto Guarda-Mor da Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil Dos 33 lotes previstos nas terras adquiridas no municpio de Guarda-Mor, Estado de Minas Gerais, dentro do Prodecer II, 18 lotes foram ocupados pelos associados, j em 1987, e 16 deles plantaram um total de 2.660 hectares de soja, tendo uma colheita de 3.800 toneladas em 1988. Oito associados plantaram 135 hectares de caf. Em 1988, entraram as 15 famlias restantes de associados e a estao experimental da Cooperativa ficou pronta. Assim, toda a rea programada foi ativada, mas, enquanto em fase de preparao das terras e sem as instalaes de irrigao, a produtividade da soja continuou baixa, e pequena a possibilidade de variar as espcies de culturas. Os estudos para aps a introduo do "piv" central esto, porm, em andamento na estao experimental. b.3) Projeto Formosa da COACERAL COACERAL a cooperativa formada pelo grupo Ueno-Okamoto para participar do Prodecer II. Este grupo tem grande participao na cotonicultura, na produo de lcool e de caf. Os 15.000 hectares de terras destinados a ela so contguos aos lotes do Projeto Ouro Verde, da CAC, situando-se na divisa dos estados da Bahia e Piau. Foram divididos em 30 lotes de 420 hectares cada. Todos os lotes j foram ocupados, sendo 17 agricultores do Estado do Paran, de origem japonesa. O desbravamento foi iniciado em 1987, tendo sido plantado arroz e soja nos 30 lotes. Como nas demais reas do projeto, tambm os produtores a assentados sofreram as agruras das safras ruins em conseqncia das irregularidades climticas e das baixas cotaes do mercado domstico, mas o futuro deve ser promissor j que as instalaes de irrigao sero concretizadas em breve. 3) Desenvolvimento dos Ncleos de Produo a) Plano de Desenvolvimento do Vale do Rio So Francisco Desenvolver uma agricultura irrigada nas ridas terras da caatinga com a participao da populao local a concepo do plano do governo para o desenvolvimento do Vale do So Francisco. A Codevasf (Companhia de Desenvolvimento do Vale do So Francisco) iniciou suas atividades em 1974. Como acontecera com o desenvolvimento do cerrado, a Cooperativa Agrcola de Cotia e a Cooperativa Central Agrcola SulBrasil foram solicitadas a colaborar, participando do projeto. a.l) Ncleo de Produo de Fruta de Pirapora A Cooperativa Agrcola de Cotia, no seu primeiro empreendimento de cooperao com a Codevasf, participa do "Plano Piloto de Pirapora", localizado no municpio de Pirapora, ao norte do Estado de Minas Gerais,

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na confluncia do Rio das Velhas com a margem direita do Rio So Francisco, a 330 km de Belo Horizonte e cerca de 500 km da capital do pas. Boa infra-estrutura e fcil acesso aos mercados, e o maior atrativo: irrigao. Em se tratando de projeto piloto, a rea era de apenas 1.685 hectares, cabendo CAC 900 hectares, que foram divididos em 15 lotes para o assentamento de seus associados. Eram cooperados com prtica de fruticultura nos estados de So Paulo e Paran. O melo cresceu bem com a irrigao, e a primeira colheita j indicava que a fruta era de primeira qualidade. Isso ajudou muito na rotao dos recursos financeiros no incio dos empreendimentos. A partir da, a cada seis meses se procedeu plantao de melo, fazendo-se ao mesmo tempo a formao de mudas de papaia havaiana. Esta comea a produzir dez meses aps o plantio definitivo e pode ser colhida durante dois anos. O ncleo foi beneficiado com a boa conjuntura de alto consumo da papaia, incrementando as plantaes. Em 1980 foram iniciadas as plantaes de uva "itlia". A regio produz no perodo de julho a dezembro, exatamente na entressafra das zonas produtoras do sul do pas, conseguindo, portanto, boas cotaes. Juntamente com as uvas, foram feitos plantios de mangueiras, que j comearam a produzir. A rea total plantada nesse ncleo, em outubro de 1988, trabalhada por 33 associados, : uva .210 hectares; manga 263 hectares; papaia 27 hectares; melo 40 hectares; pinha 17 hectares; limo 32 hectares; macadmia 2 hectares. O "packing-house" e o armazmfrigorfico instalados no ncleo trabalham a toda carga. a.2) Ncleo de Produo de Fruta de Cura A Cooperativa Agrcola de Cotia comeou a participar do projeto de Cura, da Codevasf, em 1983, situado a cerca de 90 km da cidade de Juazeiro, Estado da Bahia, na margem direita do rio e servido pela rodovia estadual 210. Altitude de 370 m. O projeto compreende cerca de 4.000 hectares dos quais a CAC se encarregou da metade. Desses 2.000 hectares, a rea passvel de irrigao pelas facilidades da Codevasf de 926 hectares. Foram introduzidas 27 famlias de associados. A maioria com experincia em fruticultura no sul. Como no caso de Pirapora, o projeto reunia boas condies quanto infra-estrutura e mercado. Foram escolhidas as culturas de melo e uva "itlia". A produo de melo havia sido comprovada pelas plantaes feitas na regio por produtores de origem japonesa estabelecidos nas redondezas. Quanto viticultura, j eram conhecidos os trabalhos de Mamoru Yamamoto no territrio de Pernambuco, no lado oposto do rio, que h mais de dez anos tinha desenvolvido uma extensa plantao de uva.

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O melo cresce rpido, podendo ser cultivado o ano todo. A possibilidade de envio ao mercado no perodo de abril a novembro, de melhor cotao do produto, propiciou a obteno de recursos no incio das atividades, facilitando a formao de mudas e o plantio da uva "itlia". Esta uva pode ser levada ao mercado no perodo de julho a dezembro, isto , na entressafra do sul do pas. Alm do mais, o consumo dessa uva nos mercados do Norte e Nordeste se elevou consideravelmente. Em fins de 1986, a rea plantada de uva era de 207 hectares, j produzindo 122 mil caixas, e a de melo alcanava 63 hectares, remetendo-se 85 mil caixas. b) Ncleo Produtor de Ma de So Joaquim Em maro de 1973 a diretoria da Cooperativa Agrcola de Cotia decidiu executar o projeto de instalao de um ncleo de produo de ma nos planaltos do Estado de Santa Catarina. Na poca, praticamente a totalidade da ma consumida no pas, cerca de 200 mil toneladas, era importada. O Ministrio da Agricultura j vinha estudando o incremento da produo nacional de ma com o propsito de desenvolver mais uma vertente da produo agrcola do pas e a fim de contribuir para obter divisas. A CAC, reconhecendo a importncia dessa cultura, vinha estudando sua viabilidade desde a dcada de 60, mas os conhecimentos e as informaes tcnicas eram ainda escassos para iniciar-se de imediato o empreendimento. O associado da CAC, Tamitsu Nishimori, estabelecido em Caucaia do Alto, SP, tinha iniciado em 1963 uma plantao de ma, variedade "Brucknel". Na poca, existia apenas essa variedade para ser cultivada num clima de temperatura relativamente elevada no inverno, como o das cercanias de So Paulo. No se conhecia variedade adequada ao clima e de boa aceitao no mercado. Em 1964, esse cooperado teve oportunidade de visitar a regio do planalto catarinense, com altitude que varia de 1.000 a 1.500 m, onde j havia pequenos plantadores de ma. Teve a convico de que a cultura de ma s poderia vingar em climas frios e comeou a cogitar em transferir-se para essa regio, mas ainda havia a carncia de maiores informaes tcnicas. Passou a reunir informaes juntamente com alguns companheiros, ao mesmo tempo que a CAC dava andamento aos seus estudos sobre as necessidades de produo nacional da ma. A vinda do dr. Kenshi Ushirozawa, criador da mundialmente conhecida variedade de ma "Fuji", em maro de 1971, incendiou o nimo dos agricultores. Esse especialista veio ao Brasil a convite do Ministrio da Agricultura, e to logo assumiu o seu posto na estao experimental de Videira, em Santa Catarina, comeou a visitar as principais regies com plantaes de ma. Em So Paulo, teve contato com a diretoria e

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associados da CAC, e seu entusiasmo pela cultura de ma no Brasil contagiou o nimo da direo da Cotia. Em abril de 1974, o dr. Ushirozawa apresentou parecer indicando as terras de So Joaquim como adequadas para a implantao da cultura de ma no Brasil, e, com a ativa participao dos associados, a diretoria da CAC decidiu adquirir nessa regio rea para a implantao do seu ncleo produtor. Sob a orientao do Ministrio da Agricultura, o governo de Santa Catarina j havia institudo o Programa de Desenvolvimento de Culturas de Frutas da Zona Temperada, e o governador Konder Reis, tomando conhecimento do projeto, conseguiu junto ao Banco Central a liberao de financiamento especial, com repasse do Banco do Estado, no total de 4,3 bilhes de cruzeiros, recebendo ainda garantias de implementao de verbas para estradas vicinais e eletrificao. Em agosto de 1974 foi feito o sorteio para a determinao das glebas, dando-se o incio da instalao do primeiro ncleo, chamado "Colnia Cotia". J em janeiro de 1975 foi feita a instalao do segundo ncleo no distrito de Boava, a 17 km de So Joaquim, e em agosto, o terceiro ncleo. Em setembro de 1976, foi inaugurado o quarto ncleo na gleba contgua ao nmero 1. So ao todo 54 lotes, onde se encontram plantados 352 mil ps de ma, numa rea de 440 hectares. Essas macieiras comearam a produzir em 1978, sendo colhidas 26.113 caixas em 80; 180.000 em 81. Em 82, quando todos os ncleos entraram em produo, foram colhidas 440.000 caixas. A CAC instalou em 1976 seu escritrio em So Joaquim, e em 79 construiu o "packing-house", completando o armazm-frigorfico com capacidade de 2.000 toneladas em 83. Essa capacidade de armazenamento a frio da fruta foi sendo ampliada at alcanar, em 87, o total de 8.000 toneladas. Essa instalao indispensvel para controle das vendas da fruta. A regio de So Joaquim vivia da indstria madeireira e da pecuria de baixa rentabilidade. Com o surgimento do ncleo produtor de ma com excelente resultado, as plantaes de ma se propagaram nas circunvizinhanas, tornando-se So Joaquim um dos maiores produtores de ma de Santa Catarina. Municpio de So Joaquim Populao rea plantada de ma Produo de ma 1974 26.600 440 ha. 1988 30.650 2.330 ha. 2.120.000 caixas

Nesses anos, a produo de ma do Estado de Santa Catarina teve um grande avano. A rea plantada do Estado, que em 1975 era de 3.150

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hectares, em 1988 passou a 12.700 hectares, com uma produo de 203.100 toneladas. Continua em expanso a rea de plantio. A Cooperativa Agrcola de Cotia apresenta os seguintes dados sobre a ma no Brasil. 1986
Consumo Produo Importao

1987

1988

1989
360.000 306.000 54.000

1990
380.000 360.000 20.000

300.000 320.000 340.000 220.000 250.000 280.000 60.000 70.000 80.000

(Unidade: tonelada)

4. FUNDAO E DESENVOLVIMENTO DAS COOPERATIVAS AGRCOLAS

Uma das contribuies importantes dos imigrantes agricultura brasileira a organizao das cooperativas agrcolas, com caractersticas peculiares. Criaram organizaes que no s cuidam da produo, mas tambm da comercializao dos produtos agrcolas. A lei especfica das cooperativas foi promulgada em 1932. Antes dessa data elas eram regidas pela legislao atinente a sociedades comerciais, datada de 1907. Os imigrantes japoneses fundaram, em 1918, em Conquista, Estado de Minas Gerais, uma entidade cooperativa com a designao de Sindicato Agrcola Nipo-Brasileiro. Essa organizao foi desfeita aps alguns anos em conseqncia da m conjuntura da rizicultura e por serem todos os seus associados produtores-arrendatrios, fato que merece meno, pois fora uma organizao cooperativa que antecedera de 15 anos instituio da lei especfica. No Japo o movimento para a criao de cooperativas agrcolas foi intenso desde a dcada de 10 primeira metade dos anos 20. Os imigrantes que conheciam de perto essas organizaes demonstraram vontade de criar entidades semelhantes nas localidades onde desenvolviam suas atividades produtivas, como meio de autodefesa num ambiente diferente daquele de sua origem. A partir da segunda metade da dcada de 20, essas organizaes foram sucedendo-se nas localidades de maiores concentraes de imigrantes japoneses. Elas no s serviram para a estabilidade da vida dos imigrantes, mas tiveram o grande mrito de provar a viabilidade da agricultura em pequenas reas, forma diferente da agricultura extensiva das fazendas, predominante na poca. Essas cooperativas introduziram

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inovaes no mecanismo de circulao de mercadorias e enriqueceram o abastecimento das grandes cidades. Hoje em dia ocupam uma posio indispensvel em todo o mecanismo de fornecimento de alimentos perecveis do pas. As organizaes cooperativas criadas e desenvolvidas pelos imigrantes japoneses mereceram especial considerao das autoridades a ponto de incentivarem a formao de organizaes semelhantes e de receberem convites para participar nos diversos projetos de desenvolvimento regional, em particular nos programas de implantao de ncleos de produo na zona do cerrado. 1) Fundao e Desenvolvimento das Cooperativas Agrcolas a) Organizao de autodefesa dos pequenos produtores A criao de cooperativas agrcolas pelos imigrantes japoneses foi inspirada no movimento cooperativista ento em voga no Japo, mas razo maior deve ser atribuda aspirao e necessidade sentida por esses agricultores de conseguir uma vida mais estvel e de poder dedicarse produo com mais sossego. Os imigrantes que tiveram a necessidade de fundar as suas colnias para se dedicarem lavoura, ao levar ao mercado as suas produes tiveram de enfrentar dificuldades muito grandes. O desconhecimento da lngua dificultava sobremaneira as transaes, e no raras vezes eles eram vtimas de ardis de comerciantes inescrupulosos. Era natural que pensassem numa organizao coletiva de defesa, surgindo da as cooperativas agrcolas. Como no caso da cooperativa de produtores de arroz de Conquista, em muitas localidades se cogitou da formao de cooperativas, mas algumas razes, principalmente de ordem econmica, fizeram com que se frustrassem essas iniciativas. S em fins do ano de 1927 se presenciou o nascimento de uma cooperativa agrcola na vila de Cotia, a pouco mais de 20 km da cidade de So Paulo, com o nome de Sociedade Cooperativa de Responsabilidade Limitada dos Produtores de Batata em Cotia S.A. Tratava-se de uma entidade formada com base na lei das sociedades mercantis. No ano de 1914, alguns imigrantes japoneses se estabeleceram na vila de Cotia, nos arredores da cidade de So Paulo. Eram imigrantes oriundos das fazendas de caf. Comearam a dedicar-se ao plantio da batata. Com a diminuio da fora da terra introduziram o uso de restos de matadouro como fertilizante. Este foi o primeiro caso de uso de adubo por parte dos imigrantes japoneses. Das muitas variedades de batata existentes em mistura nas sementes ento empregadas, esses lavradores conseguiram selecionar uma variedade de boa qualidade, que foi designada batata-ouro. Passaram a

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empregar a calda bordalesa para combate s pragas, conseguindo obter boas safras, e abriram caminho para a implantao da agricultura intensiva nas cercanias da capital. No incio da vida comunitria, foi fundada uma sociedade, que, alm da funo de congraamento dos membros da comunidade e de executar a tarefa da educao dos filhos, em 1919, quando a produo se tornou ativa, passou a centralizar os trabalhos de aquisio coletiva de adubos. A associao estava assumindo o papel de uma cooperativa de produtores e os membros da comunidade adquiriram, na prtica, maior compreenso sobre os trabalhos de uma cooperativa. Com a ampliao da escala de produo, principalmente graas ao emprego de fertilizantes, a utilizao da mo-de-obra dos moradores das redondezas foi se tornando cada vez maior, e a carncia dessa mo-deobra implicou elevao da diria paga. A associao japonesa foi acionada para se chegar a um entendimento entre todos os scios para o estabelecimento de um acordo sobre o salrio. Atuou tambm no estabelecimento de controle sobre a rea de plantio diante da superproduo da batata e conseguiu a concordncia dos negociantes para a adoo de peso (kg) nas transaes da batata no lugar de volume (litro), tradicionalmente adotado. Foram esses acontecimentos e experincias que fizeram amadurecer o movimento para a formao da cooperativa. Em 1921, estava em andamento um plano de organizar-se cooperativa com a participao de todos os scios da associao japonesa, e de se partir imediatamente para a construo de um armazm no mercado e para a pavimentao da estrada vicinal para o transporte da produo. Na manh em que se ia fechar a aquisio ocorreu uma forte geada deitando o plano por terra. At o ano de 1926, apesar do aumento do nmero de plantadores, no se viu movimento no sentido de formao de cooperativa dos produtores. Esse ano, a vila se viu com um extraordinrio aumento da produo de batata, provocando grande acmulo de produto no mercado. Os preos caram, ficando os produtores merc dos comerciantes. Alm de verem seus produtos castigados pela chuva, eram tambm vtimas de furtos. Os produtores sentiram na pele a falta de uma organizao. Na ocasio, o Consulado Geral do Japo estava incentivando a formao de cooperativa nas colnias dos imigrantes japoneses concedendo subsdios. Kenkichi Simomoto, que fora visitar o Japo, esteve em estreito contato com o movimento cooperativista local e voltou convicto da necessidade desse tipo de organizao para os produtores agrcolas. Com a liderana de Simomoto, comeou a efetiva movimentao para a fundao da cooperativa em Cotia. Reunindo 83 agricultores, em dezembro de 1927, finalmente, foi fundada a cooperativa de produtores de batata.

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b) Crescendo junto com a expanso da cidade de So Paulo Colnias de imigrantes japoneses espalhadas em extensas reas do Estado de So Paulo seguiram o caminho percorrido pelos produtores da vila de Cotia e foram surgindo as cooperativas agrcolas. Nos arredores da cidade de So Paulo, em Juqueri (atual Mairipor), foi fundada a Cooperativa do mesmo nome (atual Cooperativa Central Agrcola SulBrasil) em 1929. As cooperativas de produtores agrcolas criadas no interior do Estado de So Paulo logo encontraram dificuldades e muitas desapareceram seguindo o destino da primeira cooperativa de rizicultores de Conquista. A causa principal era a mudana, ou seja, os deslocamentos das lavouras dos associados. A lavoura praticada na poca no interior do Estado consistia na derrubada da mata e em uma agricultura prxima predatria, sem qualquer uso de fertilizante ou prticas que permitissem o restabelecimento do poder produtivo do solo; com a regresso da vitalidade do solo, os agricultores se transferiam para terras virgens recomeando o processo. As colnias estabelecidas pelos imigrantes japoneses sofriam as vicissitudes das sadas dos agricultores, o que colocava em jogo a continuidade da organizao cooperativa. Alm do mais, os imigrantes da poca no dispunham dos conhecimentos necessrios administrao de uma organizao cooperativa e a inabilidade administrativa tambm dificultava a vida dessas entidades. De outro lado, a imensido territorial do Brasil, com poucos centros de consumo, tornava difcil a existncia de cooperativas pequenas, localizadas distantes dos centros consumidores. A prpria Cooperativa Agrcola de Cotia, sofrendo os impactos da grande crise mundial de 29, esteve ameaada de falncia, mas, vencida a situao e contornando as dificuldades surgidas nos anos subseqentes, conseguiu caminhar e progredir. Algumas outras organizaes cooperativas surgidas nas localidades prximas rea metropolitana de So Paulo, vencidas as dificuldades dos primeiros anos de existncia, conseguiram desenvolver-se com segurana. A lei das cooperativas do Brasil foi promulgada em 1932, e os governos da Unio e do Estado criaram os respectivos rgos de assistncia ao cooperativismo. Com essa nova legislao, surgiu de direito a designao de Cooperativa Agrcola de Cotia. O desenvolvimento das organizaes cooperativas de produtores agrcolas criadas nas cercanias da cidade de So Paulo contou com alguns fatores que o ajudaram. Um bom nmero de imigrantes japoneses que se dedicavam cultura do caf e plantao de algodo, afetados seriamente pela crise de 29 e sem recursos financeiros para refazer seus

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empreendimentos, se transferiu para os arredores da cidade de So Paulo para se dedicar horticultura. Esses pequenos produtores ingressaram nas cooperativas j organizadas. Estas passaram a trabalhar, alm da batata, com verduras e hortalias. Com o crescimento do ncleo desses associados, os volumes de tomate, frutas, hortalias e verduras aumentaram reforando a economia das cooperativas. O crescimento contnuo desses produtos para abastecimento deveuse expanso rpida da cidade de So Paulo como um grande centro industrial. No incio da dcada de 20, quando os imigrantes japoneses comearam a estabelecer-se nos arredores, a populao de So Paulo era de 579 mil habitantes; 20 anos depois j contava com 1,326 milho de pessoas. Um crescimento de 129% nesses anos. Contar com uma metrpole consumidora dessas propores foi um fator decisivo para as cooperativas que lidavam com produtos perecveis. A urbanizao, incluindo arredores, no s exigiu o aumento da quantidade absoluta de alimentos, como acarretou mudanas profundas nos hbitos alimentares da populao, caracterizados pela acentuada elevao no consumo de verduras, hortalias, frutas, e particularmente de tomate. As cooperativas agrcolas conseguiram atender a essa demanda e cresceram com ela. Com o advento da II Guerra Mundial, firmas de origem japonesa sofreram interveno e congelamento de seus bens, mas as cooperativas agrcolas, pela sua importncia no setor de abastecimento, ficaram inteiramente margem desse processo, desempenhando seu papel nos servios de fornecimento de alimentos. c) Presena no mercado mundial As cooperativas de produtores agrcolas estabelecidas nos arredores da capital paulista, para atender demanda de alimento que crescia rapidamente, tinham de ampliar a rea de sua atuao. Cresceram para o interior do Estado de So Paulo e se expandiram para os territrios de outras unidades da federao. Nesse processo conseguiram adeso das cooperativas pequenas, j instaladas e com dificuldades administrativas. Pode-se observar a evoluo dessas cooperativas agrcolas grandes, citando-se o aumento no nmero de associados da Cooperativa Agrcola de Cotia:

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Ano
1927 1937 1947 1957 1967 1987

N. de cooperados
83 1.303 3.930 5.846 13.306 14.470

Em 1966 deu-se a reforma da lei das cooperativas, e a Cooperativa Agrcola de Cotia passou a operar como cooperativa central. Presentemente conta com dez unidades cooperativas, com 16.309 associados. As duas grandes organizaes cooperativas de produtores agrcolas fundadas por imigrantes japoneses que atuam presentemente em So Paulo so a Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central e a Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil. Ambas foram iniciadas por produtores de batata. Passaram a trabalhar com verduras e hortalias em atendimento demanda do mercado paulistano, e em seguida com ovos e frutas. Com a ampliao de sua rea de atuao, tiveram de estender os seus servios comercializao de algodo, de caf e outros cereais. Hoje em dia, lidam com cerca de 250 itens. Para conseguir boa comercializao das produes de seus associados tiveram de implantar servios prprios de transporte, de coleta dos produtos, instalaes de padronizao, armazns e postos de vendas nos principais centros de consumo do pas. Instalaram, pois, um sistema prprio de circulao de mercadorias, beneficiando no s a economia dos produtores estabelecidos em localidades distantes como tambm desempenhando importante papel no abastecimento das cidades. Hoje em dia, essas cooperativas atuam tambm no mercado internacional, exportando caf, banana, soja, frutas, hortalias, frangos abatidos, ovos, etc. Executam ainda importao de bens de produo para uso dos associados. Contam ainda com instalaes para beneficiamento e industrializao para melhor comercializao da produo de seus associados. Possuem abatedouros de aves, fbricas de extrao de leo vegetal, usina de beneficiamento de ch e at fiao de algodo, como acontece com a CAC. d) Mudanas provocadas pela II Guerra Mundial Organizao nascida para a defesa dos interesses dos agricultores da comunidade de origem japonesa, a cooperativa, no seu processo evolutivo, foi se modificando para assumir, cada vez mais, o papel de defensora dos pequenos produtores agrcolas em geral, linha consentnea com os

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princpios fundamentais do cooperativismo. Esta mudana foi acelerada com as restries advindas com a II Guerra Mundial. As cooperativas agrcolas no perodo anterior guerra, pelo fato de se inspirarem em similares japonesas, tinham as feies moldadas semelhana das cooperativas agrcolas do Japo. No s eram organisrnos de defesa dos interesses dos pequenos lavradores, mas tambm, como acontecera com as cooperativas no Japo, eram permeadas da ideologia nacionalista desse pas. Passando pelos rigores do estado de guerra mundial e sob a fiscalizao das autoridades do pas, como nacionais de pas inimigo, as cooperativas formadas pelos imigrantes japoneses foram saindo dos estreitos limites de suas origens tnicas. Enquanto as empresas de propriedade dos japoneses instaladas no pas sofriam interveno e congelamento de seus bens, as cooperativas agrcolas, pelo importante papel de produtoras de alimentos, no tiveram restries desse gnero, e essa situao contribuiu para as mudanas que se verificaram posteriormente. e) Papel das cooperativas na estabilizao dos pequenos e mdios lavradores Com a lei das cooperativas de 1932, o cooperativismo vem sendo incentivado no pas, mas essas organizaes no vm prosperando no pas como desejado. Parece que o excessivo individualismo obstculo ao seu maior sucesso. Observa-se maior prosperidade das organizaes cooperativas nos estados sulinos, onde houve maior afluncia de imigrantes estrangeiros, como So Paulo, Rio Grande do Sul, Paran, Santa Catarina e Minas Gerais. As cooperativas de criadores de gado do Estado de Minas Gerais, de produtores de trigo, de arroz e de vinho do Rio Grande do Sul, de produtores de caf, de acar e lcool e de leite do Estado de So Paulo so organizaes que congregam produtores de um nico produto. Diferentes, pois, das cooperativas agrcolas formadas pelos imigrantes japoneses, que desde o incio eram mistas, prestando servios de vendas de produto, compra de insumo e materiais de consumo, crdito e servios aos associados. Calcadas no modelo japons, prestam importantes servios aos lavradores, principalmente queles residentes em localidades de acesso precrio ao mercado. Esses associados podem usufruir as facilidades oferecidas pelas cooperativas para a comercializao das produes, aquisio de bens de consumo e insumos necessrios produo, acesso ao crdito e obteno de assistncia tcnica. Tendo em vista os resultados alcanados pelas cooperativas mistas, as autoridades vm incentivando a criao desse tipo de organizao nas regies menos avanadas do pas.

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2) Presente e Futuro das Cooperativas de Origem Japonesa a) Cooperativas agrcolas de origem japonesa existentes De 1907, quando a lei regulou a formao de cooperativas, at o ano de 1915, foram fundadas 14 organizaes desse tipo; de 1916 a 1926 se criaram 43 cooperativas. De 1927 a 1932, quando foi instituda a lei das cooperativas, tinham sido registradas 145 organizaes. Entre estas se encontravam as seguintes oito cooperativas de origem japonesa: Cooperativa Agrcola de Cotia (1927), Cooperativa de Registro (1928), Cooperativa da Colnia Katsura (1928), Cooperativa de Sete Barras (1928), Cooperativa de Juqueri (atual Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil, 1929), Cooperativa da Colnia Hirano (Cooperativa de Cafelndia, 1930), Cooperativa de Igarapava (1931) e Cooperativa de Promisso (1931). Na poca, existia no Consulado Geral do Japo, em So Paulo, a seo agrcola, que dava assistncia tcnica s lavouras dos imigrantes. Inclua em seu trabalho a orientao e assistncia para a formao de cooperativas agrcolas visando a estabilizao da vida dos imigrantes. Propunha at fornecer como subsdio parte dos recursos necessrios a aquisies de instalaes. As oito cooperativas j mencionadas receberam esse subsdio do governo japons. Esse tipo de assistncia financeira foi suspenso aps ajuda s citadas organizaes, mas o movimento para formao de cooperativas continuou, mormente depois da promulgao da lei das cooperativas, que as incentivava com isenes tributrias e com a criao de rgos de assistncia ocorrida em 1933. Em 1934, j eram 16 as cooperativas fundadas por imigrantes japoneses. Sob os auspcios do Consulado Geral do Japo em So Paulo, interessado no fortalecimento e desenvolvimento dessas organizaes, foi realizada em fevereiro de 1934 uma reunio dos administradores de cooperativas agrcolas. Esta reunio propiciou a criao da Cooperativa Central Agrcola de So Paulo congregando as cooperativas instaladas no interior do Estado. Da assemblia geral de sua fundao participaram as seguintes cooperativas: Cotia, Juqueri, Promisso, Igarapava, Katsura, Hirano, Bastos, Registro, Mogi das Cruzes, Guarant, Itaquera, Cedro, Unio, Sete Barras, Campo Grande e Vila Nova. Participam dessa reunio grande nmero de cooperativas de produtores de algodo localizadas no interior. Deve-se isso ao fato de muitos cafeicultores terem deixado a plantao de caf para se dedicarem cultura de algodo, em decorrncia da pssima situao do caf com a crise de 30, queima dos cafeeiros com a geada e a restrio governamental de plantio do caf. Com a excelente situao econmica do algodo no mercado no perodo de 1938-40, surgiram mais cooperativas de produtores de ai-

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godo em Paraguau, Marlia, Araatuba, Pompia, Presidente Prudente, Taquaritinga, Monte Alto, Tup, Birigi, Londrina e Trs Barras. Posteriormente, com a elevao do preo do fio de seda durante a guerra, surgiram as cooperativas dos criadores de bicho-da-seda. Em 1942, contavam-se ao todo 28 cooperativas registradas e 35 organizaes similares, informais. Entidades nacionais, as cooperativas agrcolas dos imigrantes japoneses puderam operar durante a guerra, s que com a substituio obrigatria de seus administradores por brasileiros natos. Algumas tiveram seus nomes includos na lista negra, acarretando esse fato dificuldades econmico-administrativas. A derrota do Japo e as confuses que se seguiram na coletividade de origem japonesa com o caso de "vitoristas e derrotistas" trouxeram transtornos s cooperativas agrcolas, pois abriram profundas brechas na conscincia de solidariedade dos integrantes da coletividade. Alm do mais, os agricultores que estavam proibidos de se mudarem de terras durante a guerra, estavam s voltas com o problema da diminuio da fora das terras: to logo se desfez a proibio, no foram poucos os que se deslocaram em demanda de novas terras. A conseqncia disso se fez sentir de imediato na diminuio da produo. As mquinas de benef iciamento de algodo e de arroz pertencentes s cooperativas recebiam cada vez menor volume de produtos e a administrao dessas organizaes se tornava mais difcil, obrigando muitas delas a cerrar suas portas. As cooperativas de produtores de bicho-da-seda, com o mercado em pssima situao, entraram em situao crtica. O desenvolvimento das redes de estradas de rodagem e a modernizao na agricultura criaram condies de difcil atendimento para as cooperativas agrcolas regionais e pequenas, sendo muitas absorvidas pelas organizaes maiores, como a Cotia e Sul-Brasil. Com esse processo, o nmero de cooperativas agrcolas de origem japonesa ficou reduzido a cerca de uma dezena. Encontram-se atualmente em atividade: Regio Sul: Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central, Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil, Cooperativa Agrcola de Cafelndia, Cooperativa Agrcola de Aliana, Cooperativa Agrcola de Tiet, Cooperativa Agrcola de Bastos, Cooperativa Agrcola de Marlia, Cooperativa Agrcola de Mirandpolis, Cooperativa Agrcola de Ourinhos, Cooperativa Agrcola de Campo Grande e Cooperativa Agrcola de Ivoti. Regio Norte: Em cada um dos 20 ncleos de colonizao criados na Regio Norte, foram inicialmente criadas as respectivas cooperativas agrcolas, mas com a sada dos imigrantes causada principalmente por razes econmicas, apenas cinco organizaes cooperativas se acham em atividade: Cooperativa Mista de Tome-Au, Cooperativa Mista de Monte

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Alegre, Cooperativa Agrcola Amaznica, Cooperativa Agrcola Paraense, Cooperativa Agrcola de Efignio Sales. Regio Nordeste: No decorrer das dcadas de 50-60, foram instalados nesta regio mais de dez ncleos de colonizao, mas, da mesma maneira como acontecera na Regio Norte, as dificuldades para se encontrar culturas adequadas e as dificuldades de transporte contriburam para impedir o desenvolvimento das organizaes cooperativas que foram criadas no perodo inicial de cada colonizao. A partir da dcada de 70 esses produtores passaram a pertencer aos quadros de associados das cooperativas grandes como Cotia e Sul-Brasil. Outras regies: Nas regies agrcolas dos estados de Minas Gerais, Gois, Mato Grosso, etc, desenvolvidas a partir da dcada de 70, por facilidades de armazenamento, beneficiamento, transporte e comercializao, os produtores esto associados s cooperativas grandes como a Cotia, a Sul-Brasil, ou a outras organizaes cooperativas. A ttulo de ilustrao, so apresentados a seguir os dados das duas maiores cooperativas de origem japonesa: b) Cooperativa Agrcola de Cotia Cooperativa Central Fundada em 1927, uma das organizaes cooperativas mais antigas do Brasil e a maior do seu gnero na Amrica do Sul. Iniciada por 83 produtores de batata da vila de Cotia arredores de So Paulo , hoje estende a sua rea de ao pelos territrios dos estados de So Paulo, Paran, Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina e Bahia, congregando 16.309 associados (1988). A seguir cifras referentes ao ano de 1988 (Unidade: cruzado; a taxa de cmbio de dezembro/88 era de: US$ 1,00 - Cz$ 661,00): Capital Reservas e fundos Ativos permanentes Movimentos Vendas Compras 3.070. 817 (Cz$ 1.000) 14.707.137 39.375.439 227.338.793 129.477.134 97.861.659

O nmero de produtos trabalhados ascende a 250 itens, sendo os principais:


Espcie
Batata Soja Algodo

Quantidade
3.321.460 se 7.538.649 se 1.170.246 se

Importncia
11.216.900 (Cz$ 1.000) 20.830.800 7.082.800

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Espcie Ovos Aves Trigo Caf Tomate Cebola Milho Alho Frutas Verduras e Hortalias Quantidade 1.907.338 16.394.654 5.464.109 656.984 2.608.800 1.451.030 2.323.191 284.589 cx kg se
SC

Importncia 7.731.800 4.508.500 22.267.900 12.546.000 3.485.500 3.017.300 3.392.500 1.150.000 16.529.900 6.159.900

cx se
SC

cx

Possui estaes experimentais agrcolas, fbrica de adubos, granjas de matrizes de aves, abatedouros avcolas, usinas de beneficiamento de caf, fbricas de extrao de leo vegetal, usina de beneficiamento de ch, armazns de padronizao e embalagem, instalaes de beneficiamento de fibras de rami, uma moderna instalao de fiao de algodo. Exporta caf, soja, algodo, ch preto, frutas, hortalias e aves abatidas, faturando, em 1987, US$ 35,37 milhes. Por solicitao dos governos da Unio e dos estados, tem participado ativamente dos projetos de desenvolvimento dos cerrados de Minas Gerais, Bahia e Mato Grosso, com resultados merecedores de elogios. c) Cooperativa Central Agrcola Sul-Brasil Fundada em 1929, em Juqueri, atual municpio de Mairipor, nos arredores da cidade de So Paulo, com a participao de 49 plantadores de batata. Presentemente, como cooperativa central, conta sob sua administrao 40 unidades cooperativas congregando 10.074 associados. As cifras referentes ao ano de 1988 so as seguintes (Unidade: 1.000 cruzados, sendo a taxa de cmbio em dezembro/88: US$ 1,00 = Cz$ 661,00): Capital Reservas e fundos Ativos permanentes Movimentos Vendas Compras 9.540.111 8.318.666 6.692.283 24.640.360 16.932.372 7.716.988

Trabalha com mais de 200 itens produzidos pelos cooperados, sendo os principais (1988):

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Espcie Batata Soja Ovos Trigo Caf Tomate Cebola Milho Alho Frutas Verduras e Hortalias Quantidade 373.455 SC 405.362 SC 439.585 cx 536.846 SC 83.529 SC 592.477 cx 477.927 SC 34.257 SC 146.342 CX Importncia 1.613.379 (Cz$ 1.000) 1.403.751 1.713.111 2.038.465 1.405.826 837.257 1.003.404 66.161 315.495 4.835.426 1.652.645

Conta com estaes experimentais agrcolas, granjas de matrizes de aves, mquinas de beneficiamento de caf, reas de reflorestamento, etc. Participa do programa de desenvolvimento do cerrado no Estado de Minas Gerais. d) Cooperativas agrcolas e o comrcio Como j se enfatizou, as cooperativas agrcolas de origem japonesa comearam com o propsito de defender os interesses dos imigrantesagricultores. No incio tinham de enfrentar comerciantes inescrupulosos, mas hoje em dia, no que diz respeito s suas principais produes, como batata, hortalias, tomate, frutas, etc, ocupam posio de destaque. Nesse aspecto, pode-se dizer que os objetivos iniciais foram alcanados. Atualmente essas organizaes, como defensoras dos interesses dos pequenos e mdios produtores agrcolas, se defrontam com novos problemas. Ultrapassando a etapa de simples distribuidoras de produtos agrcolas "in natura", passaram a atuar nos setores de industrializao das matrias-primas produzidas pelos associados e a participar do comrcio exterior exportando a produo dos cooperados. Adquiriram, assim, outra dimenso em comparao com as organizaes de outrora. Tm de concorrer com o capital comercial e industrial no cenrio internacional. E o desafio que se lhes apresenta. (Hideharu Sakata/Katsunori Wakisaka)
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CAPTULO 2

PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO

IMIGRAO japonesa no Brasil foi essencialmente agrcola. Assim, sua participao no comrcio foi naturalmente tardia. Constatam-se alguns tipos distintos na participao dos imigrantes japoneses no comrcio, como se ver a seguir. 1. Comrcio dos Imigrantes Japoneses no Perodo Anterior II Guerra a) Imigrantes que vieram com inteno de dedicar-se ao comrcio

Poder-se- consider-los como os precursores das firmas japonesas que se estabeleceram no Brasil. As casas comerciais mais conhecidas so a casa Fujisaki, que chegou ao pas antes do Kasato-Maru, e a Casa Hachiya, que se estabeleceu na cidade do Rio de Janeiro em 1910. Em 1906, a Casa Fujisaki, de Sendai (Japo), abriu uma filial na rua So Bento, em pleno centro de So Paulo, com o nome de "O Japo em So Paulo", onde vendia artigos japoneses. O negcio prosperou, mas em 1926 faleceu o proprietrio, Saburosuke Fujisaki, e em decorrncia das dificuldades geradas pela m conjuntura econmica do ps-guerra a matriz entrou em crise, obrigando o fechamento da loja em So Paulo no ano de 1932. A Casa Hachiya, com sede em Nagoya, criou uma casa comercial com o mesmo nome no Rio em 1910, para dedicar-se ao comrcio de atacado de porcelanas e artigos importados. A casa se desenvolveu muito a ponto de responder por 80% das porcelanas japonesas importadas pelo Brasil pouco antes da ecloso da II Guerra Mundial.

532 PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO

b) Imigrantes agrcolas que vieram com inteno de dedicar-se ao comrcio Comerciantes no Japo, no podendo contar com capital ou por outras razes, vieram como imigrantes para trabalhar na lavoura temporariamente, mas sua inteno era se estabelecerem no comrcio to logo as condies os permitissem. Na verdade, tinham trazido algum capital e abriram seus negcios principalmente em So Paulo. *So os casos da Casa Hase, Casa Endo, Casa Nakaya, Casa Kunii, Casa Ito, etc. Faziam geralmente importao de artigos japoneses e, alm de vend-los na prpria loja, mandavam seus vendedores (os ditos "viajantes") para conseguir encomendas das lojas de japoneses estabelecidos no interior do Estado. Esses "viajantes" eram, na poca em que os meios de comunicao eram precrios na coletividade de origem japonesa, uma importante fonte de informaes para os moradores do interior. A atividade era tambm uma escola de treinamento para comerciante, e muitos desses "viajantes" vieram a se tornar comerciantes bem-sucedidos. c) Comerciantes que surgiram naturalmente no seio da comunidade japonesa Nessa poca, havia, no bairro de Pinheiros, na cidade de So Paulo, um ncleo de cerca de 200 famlias de imigrantes japoneses. A se formou um comrcio que atendia os lavradores japoneses que se localizavam no sudoeste da cidade, como Taboo, Campo Limpo e Cotia. Mantidas as propores, em muitas cidades do interior foram surgindo casas comerciais com as mesmas caractersticas. O jornal Seish Shinp, em sua publicao comemorativa dos 25 anos da imigrao japonesa no Brasil (1933), registra a seguinte relao sobre o comrcio nas principais cidades do Estado de So Paulo: So Paulo Santos Bauru Lins Araatuba Promisso Presidente Prudente Bastos Registro Ribeiro Preto Campo Grande (MT) 159 lojas 99 30 39 39 37 24 26 16 7 35

Tratava-se de comrcio de produtos agrcolas, secos e molhados, confeitaria, bares, hospedaria, barbearia, transportes, quitanda, farmcia, mveis, etc.

COMRCIO DOS IMIGRANTES NO PERODO ANTERIOR II GUERRA 533

d) Mercado de verduras A participao dos imigrantes japoneses no mercado de verduras e hortalias aconteceu relativamente cedo. Com a vinda dos imigrantes para os arredores de So Paulo, primeiramente surgiram as plantaes de verduras em pequena escala, visando famlias de japoneses. J em 1911, assinalam-se os primeiros horticultores nos bairros de Santana, Taipas, que foram seguidos de plantadores de verduras estabelecidos em Morumbi, Mairipor, Moinho Velho. A principal cultura era a batata, sendo as verduras secundrias produzidas em pequena escala. Somando-se aos sitiantes portugueses, j de h muito estabelecidos, os imigrantes japoneses se dedicaram a produzir as mesmas hortalias, mas, com o aumento da demanda decorrente da expanso da cidade, os agricultores japoneses aumentaram as suas produes estabelecendo-se em localidades mais afastadas. Nessa altura, alm da criao de cooperativas agrcolas, comearam a surgir comerciantes do ramo. Em 1928, apareceu o primeiro intermedirio de verduras, de nome Uhichi Imai, e, em 1929, dona Ushi Taba foi a primeira imigrante japonesa que estabeleceu uma banca no mercado de verduras da cidade. O nmero de comerciantes foi aumentando a ponto de alcanar dois teros do total de comerciantes do ramo em 1941. A ttulo de informao, a seguir os dados referentes participao de comerciantes de origem japonesa na Ceagesp-SP, em 1978: REGISTRADOS PELA CEAGESP-SP
Total De origem japonesa U7 (207) 79 (146) 11 (199) 23 (28) 320 (320) 46 (51) %

Armazm A Armazm B Mercado livre de produo Mercado de frutas Mercado livre de flores Boxes de produtores

195 (228) 158 (306) 125 (272) 215 (188) 443 (443) 103 (120)

75,4 (90,4) 52,5 (47,7) 61,6 (73,2) 10,7 (14,9) 72,2 (72,2) 44,7 (42,5)

Obs.: (n. de boxes).

534 PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO

Cresce tambm o nmero de horticultores que vo vender suas produes nas feiras livres de So Paulo. Posteriormente um bom nmero deles se transforma em feirantes que vo abastecer-se no mercado atacadista de verduras e hortalias. Esse processo se repete nas grandes cidades dos estados de So Paulo, Paran e Rio de Janeiro. e) Mquinas de beneficiamento e comrcio atacadista de produtos agrcolas Na dcada de 20 comeam a aparecer imigrantes que trabalham no comrcio de intermediao de produtos agrcolas. Lidam inicialmente com arroz, caf, e, pouco depois, com algodo. Inicialmente se dedicavam a coletar as pequenas produes dos imigrantes japoneses e transportlas para as mquinas de beneficiamento. Eram, na verdade, pequenos intermedirios. A edio comemorativa dos 25 anos da imigrao japonesa do jornal Seish Shinp registra dois estabelecimentos em So Paulo, seis em Santos, dois em Bauru, quatro em Araatuba, um em Presidente Prudente, cinco em Bastos e dez em Promisso. Alguns desses comerciantes passam, posteriormente, a possuir mquinas de beneficiamento de arroz, caf e algodo. So os chamados "maquinistas". Entre eles, os mais conhecidos: Casa Hisato Fujiwara, Casa Ueno, Casa Wada. Esses beneficiadores de produtos agrcolas se intitulavam "indstria e comrcio", mas na realidade o peso maior estava no comrcio. f) Lavanderia e tinturaria Na participao dos imigrantes japoneses no comrcio, no se pode deixar de lado seu trabalho no setor de lavanderia e tinturaria. Rokuro Kowyama, em Histria dos 40 anos da imigrao japonesa, diz que das 1.500 tinturarias existentes na cidade de So Paulo, no fim da dcada de 40, cerca de dois teros eram estabelecimentos de japoneses e seus descendentes. Pelo levantamento feito em 1958, eram 4.356 as lavanderias e tinturarias pertencentes a japoneses em todo o Brasil. Tratava-se de trabalho que demandava pouco capital e muito dependente da mo-deobra familiar. Era uma atividade fcil de iniciar para os imigrantes que por qualquer razo abandonavam a lavoura e se fixavam nas cidades. Todos da famlia trabalhavam. Barbeiros e fotgrafos eram tambm numerosos. O levantamento de 1958 registra como 2.013 e 1.122 pessoas, respectivamente, o nmero de japoneses prestadores desses servios. g) Finanas e servios No perodo que antecedeu II Guerra Mundial, os financiamentos aos imigrantes japoneses eram feitos diretamente pelas empresas de

COMRCIO DOS IMIGRANTES NO PERODO ANTERIOR II GUERRA 535

colonizao e outras instituies do Japo. Em 1932, a Casa Tozan abriu, com o capital de 200 contos de ris, a Casa Bancria Tozan. A Casa Tozan era uma empresa constituda no pas, em 1927, com o investimento de 3.500 contos, pela Tozan Nji Kabushiki Kaisha (Tozan Agrcola S.A.). Esta, uma empresa de investimento no exterior, com sede no Japo, fundada pessoalmente por Fumiya Iwasaki, representante do grupo Mitsubishi. Era uma empresa que visava atividades no setor agropecurio. Adquiriu, inicialmente, uma fazenda em Campinas, SP, e em 1928 abriu uma comissria de caf com a designao de Mizukami & Cia. Em 1937 ampliou as suas atividades, adquirindo a Fiao de Seda Paulicia. Nessas atividades, a Casa Bancria Tozan, posteriormente Banco Tozan, serviu de fonte financiadora das atividades agrcolas, recebendo as pequenas contas de depsito da comunidade de origem japonesa, tornando-se a pioneira nessas atividades dentro da comunidade. Em 1937, quando foi fundada no Japo a Nichinan Sangy Kabushiki Kaisha, com capital social de 10 milhes de yens, a Bratac passou a ser o rgo executor de seus servios no Brasil. Ficaram reunidas sob sua organizao as empresas Casa Bancria Bratac, a Comercial Bratac, a Minerao Bratac, a Algodoeira Bratac, a Fiao de Seda Bratac. Contava ainda com oito mquinas de beneficiamento de arroz, quatro de caf, quatro de algodo, uma usina de acar, duas produtoras de ovos de bicho-da-seda, duas casas de tratamento de casulos, cinco fbricas de leo, trs casas de secagem de tabaco, quatro fiaes, quatro confeces, oito olarias, nove oficinas de conserto de mquinas agrcolas, quatro serrarias. A Casa Bancria Bratac foi inaugurada em 1937 e comeou a operar no setor financeiro. No mesmo ano foi fundada a Casa Bancria Kaik, contribuindo para o incremento das atividades creditcias das casas bancrias de origem japonesa. De acordo com a "Histria dos 20 anos do Banco Amrica do Sul", sucessor da Casa Bancria Bratac, os volumes dos servios desses trs estabelecimentos foram:

Ano
1930 1939 1940 1941

N. de agncias Capital e reservas

Depsitos Emprstimos
16.932 30.581 44.091 58.004 13.672 25.526 35.384 50.754

15 18 29 35

620 969
1.952 3.300

(Unidade: 1.000 cruzeiros).

536 PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO

Alm das j citadas, funcionou uma outra, a Casa Bancria Brascot, cuja patente foi adquirida pelo Banco Sumitomo ao instalar-se no Brasil no ps-guerra. Da mesma maneira a Casa Bancria Kaik foi sucedida pelo Banco Popular. A Casa Bancria Tozan foi colocada, j em 1943, em regime de liquidao, s saindo dele em 1952. Em 1954, aumentando seu capital social para 10 milhes de cruzeiros, passou designao de Banco Tozan. Em 1973, foi reorganizado sob a razo social de Banco Mitsubishi Brasileiro com a participao do Banco Mitsubishi, do Japo. Merece meno especial o papel desempenhado pelo Yokohama Specie Bank, predecessor do Banco de Tokyo. Foi estabelecido no Rio de Janeiro no ano de 1919, como estabelecimento especializado em cmbio. Aps a visita da misso econmica chefiada por Yahachiro Hirao em 1935, passou a desempenhar a funo de refinanciador das casas bancrias citadas. Os financiamentos aos plantadores de caf, algodo, feitos por elas, em instncia final, saam dos recursos desse banco. 2. Japoneses e Descendentes no Comrcio Ps-Guerra A evoluo econmica dos imigrantes japoneses e seus descendentes pode ser vista pelos dados levantados pela Comisso de Recenseamento da Colnia Japonesa em 1958: CAFEICULTURA Ano % total do n. de agricidtores 92,6 76,8 52,0 62,2 59,0 32,1 24,3 23,6 27,5 28,3 % n. de proprietrios de terras 2,6 10,1 28,3 26,9 23,8 38,8 59,7 69,7 77,2 83,1 % de colonos

1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1958

91,9 81,2 53,2 56,3 54,5 46,2 26,5 16,4 8,0 3,5

JAPONESES E DESCENDENTES NO COMRCIO - PS-GUERRA 537

CULTURA DE ALGODO Ano % total do n. de % n. de proprietrios agricultores de terras % de arrendatrios

1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1958

12 , 45 ,
12,1 11,1 14,0 39,0 39,3 31,2 20,5

85 ,

42,0 24,4 20,6 32,4 29,1 35,8 40,4 43,8 53,6

40,0 63,6 62,0 55,4 52,0 51,0 49,4 48,0 40,3

AGRICULTURA DO TIPO CERCANIAS DA CAPITAL Ano % total do n. de % n. de proprietrios agricultores de terras % de arrendatrios

1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1958

06 , 42 ,
10,2 11,1 13,0 14,5 19,9 27,5 34,1 42,3

22,2 27,7 27,4 30,9 36,0 42,0 46,4 50,7 52,7

62,2 60,9 55,5 51,8 49,9 47,6 44,8 41,3 38,2

538 PARTICIPAO DE IMIGRANTES JAPONESES NO COMRCIO

POSIO DOS AGRICULTORES (%) Ano % n. de proprietrios de terras % n. de arrendatrios % de colonos

1912 1917 1922 1927 1932 1937 1942 1947 1952 1958

51 ,
16,1 28,7 26,7 27,2 35,5 44,9 51,2 58,0 64,0

19 , 87 ,
25,2 19,7 19,9 33,1 35,8 33,9 29,6 28,4

87,9 66,0 32,3 41,0 37,1 19,5

97 , 66 , 41 , 20 ,

Constata-se que de 1937 para 1947 o percentual dos cafeicultores em relao ao total de agricultores regrediu de 32,1% para 23,6%. Ao mesmo tempo, verifica-se que o nmero de colonos frente ao total daqueles que se dedicam cafeicultura diminuiu de 46,2% para 16,4%, notando-se, inversamente, uma sensvel elevao no percentual dos proprietrios de terras nesse setor de produo, de 38,8% para 69,7% no decorrer do perodo mencionado. As mudanas se dirigem no sentido da transferncia da situao de colonos dos cafezais para as formas de agricultura independente, seja como proprietrios de terras seja como arrendatrios de terras, o que aconteceu principalmente na cultura de algodo e no tipo de agricultura dos arredores das cidades. A proporo dos cotonicultores frente totalidade dos agricultores sobe de 14,0% em 1932 para 39,0% em 1937, no havendo, praticamente, qualquer modificao durante o perodo da guerra. Os lavradores que se dedicam agricultura tpica das cercanias das cidades aumentaram de nmero num crescendo constante: de 14,5% em 1937, passaram para 19,9% em 1942, e 27,5% em 1947. Examinando-se a posio dos agricultores, enquanto os proprietrios de terras somavam 35,5% no ano de 1937, em 1942 esse percentual j se eleva para 44,9%, e em 1947 para 51,2%. O nmero de colonos se retraa de 19,5% em 1937 para 6,6% em 1947. Na poca, ainda prevalecia a agricultura sem adubao, particularmente no interior do Estado. Essa prtica ensejava a preferncia dos agricultores pelo arrendamento das terras, pois, com o esgotamento da fora produtiva delas, eles eram obrigados a se deslocar. Esta situao retratada pela no-variao do nmero de arrendatrios: 33,1% em 1937 e 33,9% em 1947.

JAPONESES E DESCENDENTES NO COMRCIO - PS-GUERRA 539

As cifras citadas do conta de que, nos dez anos que cobrem o perodo da guerra, mais de 90% dos agricultores japoneses passaram a trabalhar por conta prpria, seja como proprietrios desterras ou como arrendatrios. A participao dos japoneses e seus descendentes no setor comercial e industrial teve como ponto de partida a economia agrcola, comprovada pela anlise mais minuciosa da origem da formao de capital de empresas, mesmo daquelas aparentemente muito distantes da agricultura. (Nobuo Suzuki/Katsunori Wakisaka)

CAPITULO 3

PARTICIPAO NA INDSTRIA

1. No incio a manufatura

OMO acontecera com o comrcio, a participao na indstria por parte dos imigrantes japoneses teve um incio modesto, de manufatura ou indstria caseira visando principalmente os patrcios. Comearam como carpinteiros, serralheiros, fabricantes de mveis, pequenas oficinas de consertos de mquinas, funileiros, beneficiamento de arroz, fabricantes de leo, beneficiamento de caf, fabricantes de "shyu" e "miss", fabricantes de cachaa, de saque, fabricantes de doces. Hiroshi Saito, em seu Os japoneses no Brasil, registra que era de 3% da populao o nmero de japoneses que se achavam envolvidos na indstria em 1940. Para os imigrantes japoneses, a passagem da agricultura para a indstria era mais fcil do que a passagem para o comrcio. 2. Imigrantes que vieram para dedicar-se indstria

Muito provavelmente, Tatsuo Okochi tenha sido o nico imigrante japons a vir para o Brasil munido de capital e alta tecnologia e com o intuito de estabelecer-se como industrial. Depois de formar-se em qumica agrcola na Universidade de Hokkaido, foi para os Estados Unidos fazer pesquisas sob a orientao de Jkichi Takamine. Veio para o Brasil em 1923 e em 1925 fundou uma empresa farmacutica em associao com um brasileiro. Dois anos depois fundou o Laboratrio Okochi lanando "Takadiastase", remdio digestivo que freqentou por muito tempo os lares brasileiros. Esse laboratrio continua trabalhando como fornecedor de matrias-primas para a indstria farmacutica e alimentcia.

542 PARTICIPAO NA INDUSTRIA

3. Imigrantes agrcolas que passaram indstria Admitidos como imigrantes agrcolas, havia entre eles, todavia, pessoas com conhecimento tcnico que, reunindo recursos, posteriormente se dirigiram para empreendimentos industriais. A histria de Shunji Nishimura, da Mquinas Agrcolas Jacto S.A., um dos destacados fabricantes de pulverizadores e polvilhadeiras do pas, pode ser mencionada como um exemplo da participao do imigrante japons no setor industrial. Formado na Escola Industrial de Kyoto, Nishimura chegou ao Brasil em 1932. Experimentou a vida de colono na fazenda de caf e depois de passar pela experincia de empregado domstico, caminho seguido por muitos imigrantes japoneses que vieram ter cidade, estudou durante um ano no Colgio Adventista, para depois trabalhar numa fbrica em So Paulo. Em seguida, juntamente com um amigo, abriu uma oficina de conserto de mquinas, passando, em 1939, a residir em Pompia, SP, ento uma das frentes mais avanadas do desbravamento, onde abriu uma oficina mecnica. A, Nishimura, alm de consertar todo tipo de mquinas agrcolas, fabricava baldes e outros utenslios de funilaria. Na poca da guerra, com as importaes interrompidas, numa localidade muito distante de So Paulo, oficina de Nishimura comearam a aparecer pedidos de conserto de mquinas de serraria, de beneficiamento de algodo, de peas de automveis, etc. Foi adquirindo mquinas operatrizes e expandindo suas atividades. De maneira semelhante se implantaram indstrias como Yadoya Indstria e Comrcio S.A., que atua na rea de fundio e fabricao de furadeiras; Kato & Cia. Ltda. Indstria Mecnica de Preciso, que fabrica peas de automveis; Ishiki & Cia Mquinas Santo Andr, fabricante de lavanderias industriais. 4. Da agricultura e do comrcio para a indstria a) Perodo que antecedeu Segunda Guerra Um caso tpico foi o que aconteceu com a produo de ovos do bichoda-seda. Para este caso pode ser citada a Fiao Bratac. Na dcada de 30, esta organizao incentivou a criao do bicho-da-seda nas colnias de Bastos, Tiet e Aliana, por ela administradas. Sendo a seda um dos principais produtos de exportao do Japo naquele perodo, muitos imigrantes japoneses estavam bem familiarizados com a tcnica de criao do bicho-da-seda, e a Bratac tinha o intuito de diversificar a produo. Em 1932, fez vir o tcnico Heikichi Ueda para instalar a produtora de ovos de bicho-da-seda, e em 1940 as fiaes de Bastos e de Tiet se uniram para formar a Fiao Bratac Ltda.

PARTICIPAO NA INDSTRIA 543

Durante a guerra essa fiao foi alvo de interveno governamental por ser considerada bem de pas inimigo, e no ps-guerra sofreu as vicissitudes da brutal queda de preo do fio de seda, conseguindo equilibrar-se somente na dcada de 60. Posteriormente, a Bratac trouxe do Japo novas variedades de bicho-da-seda e introduziu inovaes tecnolgicas importando novas mquinas. Com a melhora da qualidade dos fios e a reduo no custo de produo, essa empresa tem conseguido impor-se no mercado domstico, conseguindo exportar tambm para o Japo, Taiwan e Europa. Um outro setor agrcola que se ampliou para o setor industrial foi o da cultura e produo de ch. Torazo Okamoto, estabelecido em Registro, SP, obteve, nos arredores de So Paulo, sementes de ch da China. Foi em 1922. Comeou por formar cerca de 2 mil mudas, e em 1934 j tinha formado 195 hectares de plantao de ch. Ele havia comeado a fabricao de ch em 1929. Inicialmente produziu ch verde, passando posteriormente a fabricar ch preto. Segundo consta, Registro contava em 1934, com 17 fbricas de ch. Comeando com o maceramento com os ps, passou-se depois para maceradeira semi-eltrica, posteriormente inteiramente de ferro fundido. A secadeira era inicialmente de tambor vazio adaptado. Seguiu-se a introduo de mquinas maiores e mais modernas. Quanto ao combustvel usado, da lenha se passou ao leo combustvel e posteriormente ao secador eltrico. A concentrao de capital foi se acentuando, e hoje em dia atuam no setor, destacadamente, o ch Ribeira, de Torazo Okamoto; ch Tupi, da Cooperativa Agrcola de Cotia; Tender Leaf, de Yamamoto-Standard; Lipton, que comercializado pela Gessy-Lever. Existem ainda produtores de descendentes de japoneses de menor porte. Segundo Kumaki Nakao, fundador de Adubos Kanakao, o uso de fertilizantes na agricultura brasileira foi iniciado pelos plantadores de batata no municpio de Cotia, SP, em 1917. Usaram-se, de incio, os restos de matadouro, adquiridos em Osasco, SP. Grande parte dos adubos produzidos no pas ou importados era consumida praticamente pelos agricultores japoneses nos 15 anos que se seguiram. Esse mesmo Nakao fundou uma empresa de fabricao de farinha de ossos e cola. Passou a produzir 200 toneladas de cola e 3.000 toneladas de farinha de ossos por ano. Em 1940, a razo social foi alterada para Indstria de Adubos Jaguar S.A. Nesse mesmo ano, foi inaugurada uma fbrica de farinha de ossos, com capacidade de 1.000 toneladas/ano pela Fbrica Ikeda. Em 1945, Gisuke Takenaka, ento gerente da Kaik, assumiu os negcios do Armazm Paulicia dessa organizao, para estabelecer a Takenaka S.A. Indstria e Comrcio, que atua no setor de fertilizantes.

544 PARTICIPAO NA INDUSTRIA

Durante a II Guerra se iniciou a entrada dos comerciantes no setor industrial. Sakuryo Hase comeou com a industrializao de gar-gar colhido nos mares de Santos para a fabricao de gelatina vegetal. Comeou, outrossim, a participar da preparao de hortel, e em 1944, fundou, junto com Ikutaro Awazu, uma indstria de relgios, predominantemente de relgio cuco. Posteriormente se associou com a Seiko, do Japo. A Indstria Agrcola Tozan Ltda., fundada em 1934 para atender demanda de saque por parte dos imigrantes japoneses, e tambm a Sakura Nakaya Alimentos Ltda., constituda em 1949 e dedicada fabricao de "shoyu" e "miss" (molho e massa de soja), tiveram ampliadas as suas vendas com a maior difuso de comidas japonesas entre o pblico brasileiro. b) Participao na indstria no ps-guerra Quando os bens congelados voltaram aos japoneses no ps-guerra, seus valores eram surpreendentemente baixos. Os depsitos bancrios haviam sofrido os efeitos da inflao. Houve, todavia, casos de ganho em virtude da elevao dos valores dos imveis de que estavam impedidos de se desfazer durante a guerra. No setor industrial em geral, a no ser para os casos de investimentos diretos do Japo, o congelamento no teve grandes efeitos sobre as indstrias mantidas pelos japoneses. Verdade que, desaparecendo a ameaa da possibilidade de confisco, houve alento para a participao mais ativa no setor por parte dos japoneses. A poltica de industrializao do presidente Juscelino Kubitschek, sob o slogan "50 anos em 5", incentivou tambm os japoneses a participarem das indstrias. O atacadista de produtos agrcolas e importador Katsuzo Yamamoto, por exemplo, fundou, em 1958, a Sadokin S.A. Eltrica e Eletrnica, para fabricar lmpadas especiais, associando-se a uma empresa japonesa. Ainda em 1967, fundou a Sadokin Nordeste, em Recife. Outro atacadista, Yoshikazu Tanaka, introduziu do Japo mquinas e tecnologia para, em 1964, inaugurar a Papelok S.A. Indstria e Comrcio. Ambos os empreendimentos tm em comum uma caracterstica peculiar: a participao de capital japons radicado no pas. Outros exemplos de empreendimentos industriais de imigrantes japoneses bem-sucedidos: Motordio S.A. Comercial e Industrial, fabricante de rdios; Nakata S.A. Indstria e Comrcio, que atua no setor de fabricao de peas para veculos e tratores. Em 1966, alguns cultivadores de batata se cotizaram para fundar a Sansuy S.A. Indstria de Plsticos, fabricante de artigos plsticos para fins agrcolas, silos e armazns plsticos.

PARTICIPAO NA INDSTRIA 545

No setor da indstria alimentcia, em 1961, trs atacadistas de produtos agrcolas que atuavam ao longo da Cia. Paulista de Estrada de Ferro se reuniram para iniciar a Indstria de leos Pacaembu S.A. Fundada ainda por cerealistas, existe a leos Menu Indstria e Comrcio Ltda., em Guararapes, SP. Foram citados exemplos de indstrias muito peculiares iniciadas por japoneses no pas. No geral, a participao de japoneses e seus descendentes no setor industrial vem se ampliando. Em 1958, segundo os dados registrados pelo recenseamento da colnia japonesa, o nmero de japoneses e descendentes que trabalhavam na indstria representava 7,2% da populao. J no levantamento de 1988, esse percentual se eleva para 15,81%. Essas cifras podem ser interpretadas como indicativas do xodo rural dos japoneses, mas melhor seria tom-las como ilustrativas da incluso no processo geral de aumento do nmero de trabalhadores do setor secundrio e tercirio e conseqente diminuio dos agricultores, que se verificam no pas em geral. 5. Papel desempenhado pelos imigrantes-tcnicos do ps-guerra Com a poltica de industrializao, adotada pelo Brasil no psguerra, foi aberto na indstria o caminho para a imigrao de trabalhadores. O Japo adaptou sua poltica emigratria a essa nova situao. Essa modalidade de imigrao foi inaugurada em 1953 com a vinda de 16 tcnicos para uma tecelagem no Estado do Rio de Janeiro. Em 1957, a Howa S.A. Indstrias Mecnicas, com sede em Nagoya, instalou uma fbrica de acessrios para mquinas txteis em Mogi das Cruzes, SP, e promoveu a vinda de imigrantes para a indstria. Diante dessa perspectiva, a JAMIC, uma organizao governamental japonesa com escritrio na cidade de So Paulo, tratou da colocao de imigrantes japoneses nas indstrias de So Paulo. Treze empresas brasileiras se interessam por esse tipo de imigrantes candidatando-se recepo de 219 japoneses. Esse assunto foi recebido com especial interesse pelo ento governador da provncia de Kanagawa, Iwataro Uchiyama, ex-diplomata que servira em So Paulo como cnsul-geral. Fundou ele um centro de treinamento de imigrantes industriais dentro do Colgio Profissional Oficial de Hadano. Em 18 anos de sua existncia, esse centro treinou e enviou 310 imigrantes industriais para o Brasil. Eram mecnicos e outros tcnicos especializados que foram colocados nas indstrias e que se tornaram funcionrios categorizados ou, ainda, que se estabeleceram posteriormente por conta prpria. A partir da segunda metade da dcada de 60, a imigrao agrcola se reduz rapidamente ao passo que a procura por imigrantes para o setor

546 PARTICIPAO NA INDUSTRIA

industrial se eleva de maneira acentuada. Influi para o surgimento dessa tendncia, naturalmente, o crescente nmero de indstrias japonesas que se instalam no pas, mas a razo principal era a mudana na estrutura econmica brasileira. Estava se modificando o perfil da demanda de mode-obra. Para fazer face a essa situao, em 1966 a Japan Emigration Service instalou um centro de preparao tcnica em So Paulo, ampliando seu servio de promoo de imigrao de tcnicos. Em 1974 a mencionada entidade foi sucedida pela JICA Japan International Cooperation Agency, e a imigrao industrial continuou sendo tratada pela JAMIC e JEMIS, organizaes subordinadas JICA estabelecidas no Brasil. Em 1981, por determinao do governo brasileiro a JAMIC e JEMIS encerram suas atividades. Interrompera-se dessa maneira a imigrao industrial, at que em 1985 a Associao dos Imigrantes Tecno-Industriais do Brasil foi reconhecida como rgo para tratar da introduo desses imigrantes no pas. Presentemente, o nmero desses imigrantes muito pequeno, mas no ps-guerra cerca de 2 mil tcnicos vieram para o Brasil como imigrantes, contribuindo com a sua parcela para o desenvolvimento industrial do pas. (Kji Nishida/Katsunori Wakisaka)

CAPTULO 4

EDUCAO, CULTURA, RELIGIO

1. EDUCAO DOS FILHOS NO PS-GUERRA

EDUCAO dos filhos, na colnia japonesa, pode ser considerada sob duas perspectivas: 1) ensino da lngua japonesa; e 2) freqncia nas escolas de segundo grau e nvel superior.

Ensino da lngua japonesa Propomo-nos a examinar a situao do ensino da lngua japonesa, no ps-guerra at a presente data, que fora alvo de severa fiscalizao e restries a partir da segunda metade do decnio de 30, culminando com o fechamento de todas as escolas s vsperas da II Guerra Mundial. Os dez anos que se seguiram a 1937/38 foram "anos de trevas" para a comunidade de origem japonesa no Brasil, quando, de maneira alguma, se pde pensar no ensino da lngua japonesa. Em 1949, ainda quando a comunidade de origem japonesa se achava mergulhada na confuso "vitorista-derrotista", as pessoas que desde antes da guerra se dedicavam ao ensino da lngua japonesa fundaram uma entidade de mbito nacional, mas ela no conseguiu sobreviver por muito tempo. S em julho de 1954 que cerca de cem pessoas, entre professores e administradores de escolas de lngua japonesa, se reuniram em So Paulo para organizar a Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Estado de So Paulo. Essa entidade foi registrada oficialmente em 16 de janeiro de 1955 (assumiu a designao de Federao das Escolas de Lngua Japonesa do Brasil a partir da assemblia geral de 14 de janeiro de 1956). Continuou ativa at setembro de 1988, quando se incorporou ao Centro de Estudos da Lngua Japonesa, constitudo em fevereiro desse ano. Considerando-se que mais de cem pessoas participaram da primeira reunio da citada entidade, possvel supor que existisse, poca, um

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nmero razovel de estabelecimentos e de professores de lngua japonesa em atividade. Ento, quais eram as diretrizes norteadoras desse ensino? Levando-se em conta que as seqelas das confuses geradas no seio da comunidade de origem japonesa no ps-guerra demoraram pelo menos dez anos para desaparecer, procedente supor-se que a ideologia que servia de lastro para esse ensino tenha sido aquela semelhante ao pensamento prevalecente no perodo anterior guerra. Certamente era o reflexo do posicionamento da grande maioria da comunidade de origem japonesa no Brasil nessa poca, pois, como uma porcentagem elevada dessa populao era propensa, de alguma forma, a acreditar na vitria do Japo, os pais dos alunos no desejavam a orientao sobre o ensino da sua lngua de origem que no aquela que prevalecia no perodo do prguerra. Naturalmente, havia um bom nmero de professores que tinham a exata compreenso da situao da derrota japonesa e pretendiam imprimir diretrizes condizentes com a nova ordem existente. Decorriam da conflitos que afloravam na administrao da mencionada Federao, e demandaram um bom tempo para se conseguir um aparente apaziguamento. Os jornais de lngua japonesa comearam a ser reeditados em 1946/47, mas as escolas de lngua japonesa s foram reabertas na dcada de 50. Como j foi visto, a imigrao japonesa foi reiniciada em 1953. Entre esses imigrantes havia professores com experincia de magistrio, e a atuao dessas pessoas mais a influncia dos novos imigrantes deram alento novo ao ensino da lngua japonesa no Brasil. Num ambiente bastante controvertido como esse, em janeiro de 1956 um grupo de estudiosos liderado por Zenpati Ando iniciou a publicao de Esperana, edio mensal e bilnge, no qual se debatiam assuntos relacionados ao ensino da lngua japonesa. Surgiu tambm uma corrente de opinio de que os livros didticos deveriam ser elaborados em consonncia com a vida brasileira para serem ensinados aos brasileiros filhos de imigrantes. Essa opinio conflitava, como fcil de se imaginar, com a corrente de pensamento que ainda prevalecia, de que a orientao do pr-guerra deveria constituir-se no centro das atividades de ensino e de que os livros didticos daquela poca deveriam continuar em uso. A Aliana Cultural Brasil-Japo instituiu, em 1959, uma comisso de elaborao de livros didticos de idioma japons (presidente: Dr. Kiyoshi Yamamoto). Em abril de 1961 foi concluda a edio de oito volumes do curso elementar, registrados na Secretaria da Educao do Estado de So Paulo em novembro de 1963, e em julho de 1964 terminou a elaborao dos quatro volumes do curso avanado. Quanto ao nmero de escolas de lngua japonesa, a publicao da

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citada Federao menciona como sendo de aproximadamente 600 estabelecimentos nos primeiros anos da dcada de 60, pelos levantamentos feitos no estado do Paran, interior do Estado de So Paulo e na cidade de So Paulo e arredores. Um outro levantamento, realizado pelo Centro de Difuso da Lngua Japonesa no ano de 1977, apresenta os seguintes resultados: cidade de So Paulo 44 escolas; subrbios de So Paulo 60; E. F. Paulista 9; E. F. NOB 22; E. F. Sorocabana 17; Estado do Paran 53; Estado do Rio de Janeiro 13; regio amaznica 20, num total de 224 estabelecimentos. Nota-se uma grande diferena no nmero de escolas no lapso de trs lustros. Outrossim, em relao aos pouco mais de 8 mil escolares pesquisados nesse levantamento, a distribuio segundo as geraes foi a seguinte: 1% issei; 29% nisei; 67% sansei; 3% yonsei. Atividades literrias entre os imigrantes e seus descendentes Os imigrantes, uma vez estabelecidos nas novas terras, ao lado da labuta de todos os dias, mesmo como um lenitivo s agruras da vida cotidiana, continuaram os seus contatos com os vrios gneros de produo literria a que tinham, na sua terra natal, maior ou menor afeio: gneros poticos tpicos como "tanka", "senryu", "haiku", poemas livres; e novelas, ensaios, crnicas, etc. Particularmente aquelas trs modalidades poticas, por serem de forma reduzida e muito familiares no cotidiano do Japo, foram praticadas desde os primrdios da imigrao japonesa no Brasil. J Shuhei Uetsuka, o condutor dos imigrantes vindos no KasatoMaru, era conhecido autor de "haiku'', e Teijiro Suzuki, que aportou s terras brasileiras antes do primeiro navio de imigrantes, era aficionado do "tanka" e liderava um crculo de poetas do gnero. Os jornais da colnia tiveram papel importante no incentivo dessas atividades emprestando seus esforos, exguos na verdade, acolhendo as produes, na maioria das vezes amadorsticas, mas que no deixavam de expressar os sentimentos do cotidiano dos imigrantes. Essas atividades se tornaram mais intensas na segunda metade da dcada de 20 e particularmente nos anos que se seguiram. Comeam a surgir organizaes mais bem estruturadas e aparecem publicaes de diversos gneros literrios. Nessas atividades, devem ser destacados Keiseki Kimura e Nenpuku Sato na rea de "haiku" e Kikuji Iwanami na de "tanka", como mestres e orientadores. Alm das pginas literrias dos jornais da colnia, os diversos grupos de "tanka" e "haiku" publicaram, desde essa poca, revistas e outras publicaes, peridicas ou mesmo aperidicas, muitas das quais desapareceram, restando algumas poucas. Assim, tendo como mentores Kikuji Iwanami e Futoshi Abe, foi

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lanada Yashiju, revista de "tanka", em outubro de 1938. Esse peridico especializado alcanou o n. 11 em outubro de 1941, quando a sua publicao foi interrompida, no por interferncia das autoridades brasileiras, mas por falta de vontade de seus participantes. A sua edio foi retomada em 1947, com o n. 12, continuando at hoje. O nmero de participantes da Yashiju na dcada de 30 era de 200-250 pessoas. Presentemente, a populao que participa da atividade de produzir "tanka" estimada em cerca de 200 pessoas. V-se, pois, que no houve sensvel variao dessa populao. Menor, no tamanho, do que o "tanka", o "haiku", mais conhecido entre ns como "haikai", mais popular entre os imigrantes como o no Japo. Como j se fez meno, um dos pioneiros da imigrao, Shuhei Uetsuka, foi um dos primeiros cultivadores desse gnero potico na colnia, mas inegavelmente se deve a Nenpuku Sato o trabalho sistemtico de organizar e difundir essa modalidade no seio dos imigrantes japoneses no Brasil. Ele chegou ao Brasil em 1927 e trabalhou com a firme determinao de fazer prosperar a escola "Hototogisu", uma das principais correntes do "haiku" no Japo. Alm de orientar as produes de seus adeptos nas pginas literrias dos jornais, Nenpuku Sato fundou, em 1948, a revista Kokage para acolher os "haiku" de sua corrente. Essa revista teve continuidade at outubro de 1979, tendo desaparecido no seu n. 372. Nenpuku Sato faleceu em dezembro desse ano. Essa revista foi sucedida logo aps por uma outra, Asakage, com a mesma feitura e orientao. Houve, desde o perodo anterior guerra, "haikastas" independentes da escola "Hototogisu", isto , autores que se opem pura descrio objetiva adotada por essa corrente e que do maior nfase ao aspecto subjetivista. Apesar de no contar com um orientador da grandeza de Nenpuku Sato, e de, por isso mesmo, no conseguirem se constituir em fora organizada, em 1972 fundaram a "Associao dos Haikastas do Brasil". Sem se reunirem num nico rgo, existem vrios grupos que editam as suas revistas de "haiku". O nmero de praticantes do "haiku" no Brasil, na atualidade, estimado em 800-1.000 pessoas. As outras modalidades de produes poticas existem, mas no so muito ativas. A produo literria em prosa, particularmente novelas, remonta a fins dos anos 20, ainda aqui se valendo das pginas dos jornais editados em lngua japonesa. Como foi visto, a derrota do Japo deixou marcas profundas no esprito dos imigrantes, e a tomada de conscincia da permanncia

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definitiva no Brasil no deixou de marcar, explcita ou veladamente, as produes literrias dos nikkeis do Brasil. Publicaes literrias se sucederam ao longo de todo esse perodo, com duraes muito variadas, umas mais curtas, ou mesmo curtssimas, e outras mais longas, mas todas elas lutando contra dificuldades econmicas. A peculiaridade da lngua japonesa confere a toda essa produo uma situao particular; o pblico leitor se limita ao restrito nmero da colnia, e pouca ou pouqussima repercusso tem obtido no Japo (a bem da justia, preciso mencionar que os "tanka" e "haiku" remetidos pelos autores s revistas especializadas no Japo so publicados com certa freqncia). Belas-Artes Entre as atividades culturais desenvolvidas pelos integrantes da comunidade nikkei no Brasil, as belas-artes tm maior penetrao na sociedade brasileira. No I Salo Paulista de Belas-Artes, realizado em 1933, Toyomatsu Sato, Seiji Tomioka e Tomoo Handa apresentaram os seus trabalhos, assim como nos anos seguintes. Outros pintores de origem japonesa passaram a ser aceitos nesse Salo. Em maro de 1935, os pintores nikkei fundaram uma associao que ficou conhecida com a denominao de Grupo Seibi. Foram seus fundadores: Seiji Tomioka, Tomoo Handa, Shigeto Tanaka, Ichigoro Nemoto, Haruichi Nishida, Yoshiya Takaoka, Yuji Tamaki, Hajime Higaki e Kichizaemon Takahashi. A partir do ano seguinte, organizou esse grupo uma exposio anual de pintura. Essa atividade teve prosseguimento at 1940. Em 1939, Yoshiya Takaoka obteve medalha de prata no Salo Nacional de BelasArtes, com um auto-retrato. Somente em 1947 os pintores nikkei conseguiram reunir-se novamente, reorganizando o Grupo Seibi, graas, principalmente, aos esforos de Yoshiya Takaoka. Entretanto, as reunies de estudos se tornaram logo intermitentes, em virtude das "dificuldades, atarefados em que estavam todos para sobrevivncia", como assinala Tomoo Handa. Nessa quadra difcil, dois niseis trouxeram alegria comunidade japonesa. Jorge Mori, com 15 anos de idade, realizou, em 1947, duas mostras individuais com sucesso, e Flvio Shir Tanaka foi festejado como pintor com muito futuro. Por volta de 1948, Handa, Takaoka, Tamaki e outros organizaram o "Grupo Quinze", um agrupamento de artistas para pesquisa, com a participao, tambm, de novos pintores, no-descendentes. Na dcada de 50, as artes plsticas do pas entraram numa fase de

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efervescente atividade: o "Salo Paulista de Arte Moderna" e o "Salo Nacional de Arte Moderna" foram institudos em 1951, e em outubro do mesmo ano houve a realizao da "Bienal de So Paulo". Participaram da Bienal 13 artistas da colnia japonesa. Esses movimentos artsticos tiveram acentuada influncia sobre os artistas de origem nipnica. Em maio de 1952 foi organizada a I Exposio da Colnia pelo Grupo Seibi, passando a ser repetida nos anos seguintes. Na primeira mostra coube a Shir Tanaka o "Prmio Colnia"; na segunda a Manabu Mabe, e no terceiro ano a Tikashi Fukushima. Abriamse as portas da nova era para as belas-artes da colnia japonesa. Mabe, que desde o incio de sua carreira vinha desenvolvendo suas atividades com dinamismo, obteve no "Salo Paulista de Arte Moderna" de 1956 a Pequena Medalha de Ouro, e no ano seguinte a Grande Medalha de Ouro. Em 1959 foi contemplado com o I Prmio Leiner, de melhor artista do ano, alm de conquistar o Prmio Brown, participando, como representante do Brasil, na I Bienal Juvenil de Paris. Reaberta a emigrao japonesa para o Brasil, verificou-se a vinda de artistas plsticos, principalmente na segunda metade dos anos 50 at o incio da dcada seguinte. Passaram a fixar residncia no Brasil os pintores Kazuo Wakabayashi, Bin Kondo, Sachiko Koshikoku, Tomashige Kusuno, Yukio Suzuki, Kenichi Kaneko, Hisao Sakakibara, Mitsutaka Kogure, Hisao Shirai, Yoshiyuki Miura, Iwao Nakashima, Shinji Tanaka, e os escultores Masami Tsuchimoto, Hisao Ohara, Yutaka Toyota. Em cermica se destacam os nomes de Shoko Suzuki, Akinori Nakatani, bem come Kozo 'mayuki e Shozo Nagata em charo, Terunobu Takeda em trabalhos em metal. Em 1970, o nmero de participantes da "Exposio Colnia" ultrapassava cem pessoas. O Grupo Seibi, que na dcada de 30 comeara como um grupo de pintores procura de afirmao profissional, nessa altura j tinha de abrigar um nmero grande de artistas. Era a velha gerao junto com a nova: artistas que se criaram no seio da colnia com aqueles que tiveram sua formao no perodo do ps-guerra no Japo; eram os figurativistas diante dos artistas abstratos. Era natural o conflito de opinies. Assim, em 1972, a "Exposio Colnia", que abrigou e viu surgir pintores que se firmavam no cenrio artstico do pas, cedeu o seu lugar para o "Salo Bunky". Em setembro de 1979, o Banco de Desenvolvimento do Estado do Paran realizou, em Curitiba, uma exposio dos artistas de origem japonesa. Participaram 32 representantes dos artistas da colnia. Nesse ano, Tomie Ohtake recebeu o prmio de melhor artista do ano, conferido pela Associao dos Artistas.

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O mundo artstico da colnia na dcada de 80 se caracterizou, a par dos trabalhos de Handa, Mabe, Fukushima, Wakabayashi e outros, pelo surgimento dos pintores da segunda gerao. So nomes como Toshifumi Nakano, Laerte Orui, Milton Sogabe, Hiro Kai, Madalena Hashimoto, Ayao Okamoto, Lidia Okumura, Mario Ishikawa, Takashi Fukushima, Taro Kaneko, Ryo Wakabayashi, Ricardo Uh e outros. A partir de 1980, no "Salo Bunky", alm dos artistas-imigrantes e dos niseis e sanseis, comea a destacar-se a participao de artistas no descendentes. Esportes No perodo inicial da imigrao japonesa no Brasil, ao lado dos trabalhos nas fazendas de caf, os imigrantes organizaram, em diversas regies do interior do Estado de So Paulo, as ditas "colnias", aglomeraes de agricultores que foram se estabelecendo de uma forma ou de outra. Modalidades de diverso eram praticamente inexistentes, e, nas circunstncias reinantes, as prticas desportivas, mesmo em forma rudimentar, se constituam em vlvula de escape s agruras do trabalho cotidiano. Assim que, j em 1914, se tem notcia de um torneio de sumo em homenagem ao aniversrio do Imperador.
SUMO

Luta corporal tpica japonesa, no demanda qualquer tipo de instalao nem apetrechos. Muito popular no Japo, talvez tenha sido a modalidade de esporte praticada desde os primrdios da imigrao japonesa no Brasil. Sua divulgao foi intensa, tendo sido organizadas competies e campeonatos regionais, e tambm de mbito estadual e nacional. Circunscrito por longo tempo ao mbito da colnia japonesa, o sumo passou a ser mais conhecido do pblico em geral com a organizao da Federao de Sumo do Brasil (pertencente Federao Brasileira de Boxe), no ano de 1962. Desde ento, tem havido competies com a participao de atletas do Japo, ida ao Japo de lutadores de sumo, descendentes de japoneses, e at profissionalizao de alguns deles. H ainda a acrescentar que j surgiram alguns atletas de destaque, no descendentes de japoneses.
ATLETISMO

Uma das modalidades esportivas mais praticadas nos ncleos de imigrantes japoneses, o atletismo fez parte, desde as primeiras pocas, da vida das "colnias". Correr e saltar no exigiam apetrechos especiais, e o treinamento poderia ser individual. Desde cedo, j por volta de 1930, se

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tem notcia de competio em Promisso, reunindo os atletas de origem japonesa de toda regio abrangida pela E. F. NOB. Com a participao das agremiaes formadas na cidade de So Paulo, em abril de 1931 foi realizada a I Competio de Atletismo da Colnia Japonesa, nas pistas do Clube Paulistano, em So Paulo. Participaram representaes de So Paulo, Noroeste do Estado de So Paulo, Cotia e Registro. A segunda metade dos anos 30 se constituiu num perodo de muitas atividades do atletismo da colnia. Em 1933, houve a visita de uma delegao japonesa de seis atletas ao Brasil, realizando-se ento uma competio nipo-brasileira de atletismo. Em 1939 esteve no Brasil o atleta Chuhei Nambu, medalha de ouro em salto triplo nas Olimpadas de Los Angeles, em 1932, permanecendo por algum tempo no Brasil orientando os atletas da colnia. Isso deu grande alento ao atletismo na colnia, incentivando muito a prtica dessa modalidade esportiva. O Campeonato da Colnia, que havia sido interrompido durante a guerra, foi retomado em 1947 e se realiza todos os anos at a presente data. A diviso surgida no seio da comunidade de origem japonesa no psguerra acarretou ciso tambm na organizao do campeonato, fazendo aparecer a situao anmala de existirem dois campeonatos da colnia, o que persistiu no perodo 1950-55. A partir de 1955, esse campeonato anual foi unificado, passando realizao da Associao Cultural e Esportiva Piratininga, de So Paulo.
BEISEBOL

A histria da prtica do beisebol na comunidade de imigrantes japoneses to antiga quanto a do atletismo. Na verdade, o beisebol foi praticado pela primeira vez no Brasil pelos americanos que trabalhavam na Light, na Telefnica, no Consulado Americano, na Armour do Brasil, etc, por volta de 1910, em So Paulo. Por certo induzidos por esses eventos, os imigrantes japoneses moradores da cidade de So Paulo formaram um time de beisebol, no ano de 1916, para jogar contra o time dos americanos. Em 1936, foi organizado o primeiro campeonato reunindo as representaes das principais regies de concentrao de imigrantes japoneses. Desde ento, se repetiu, at 1941, esse campeonato anual. Em setembro de 1946 foi fundada a Federao Paulista de Beisebol, que realiza, todos os anos, o Campeonato Brasileiro de Beisebol. Organiza ou patrocina ainda campeonatos infantis, juvenis, etc.
JUD

O Brasil conheceu o jud j no incio deste sculo. Diz-se que Sack Miura, posteriormente diretor-proprietrio do jornal Nippak Shinbun,

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ensinara jud no Rio em 1909; que, em 1911, Takezo Mamizuka dera aulas dessa modalidade de artes marciais na polcia do Estado de So Paulo; e que o faixa-preta do 6. grau, Maeda (cognominado conde Koma), vindo da Argentina em 1916, fizera lutas-exibies nas cidades dos estados de Minas e So Paulo. Depois de regressar ao Japo, conde Koma retornou ao Brasil em 1920 paia ensinar jud na cidade de Belm. Entretanto, a verdadeira difuso do jud no Brasil s comeou com a vida do imigrante Tatsuo Okochi, faixa-preta de 3. grau, em 1924. Por volta do ano de 1930, certo nmero de faixas-pretas havia chegado ao Brasil na qualidade de imigrante. Muitos deles se dedicaram orientao de moos e menores, descendentes de imigrantes. Com a ampliao desse ensino, surgiu ambiente para a formao da Federao de Jud e Kend do Brasil, que foi organizada em 1933 sob a liderana de Okochi. Foi realizada a primeira competio de artes marciais em junho desse ano, nos sales das Classes Laboriosas, na cidade de So Paulo. Em seguida, foram organizadas sucursais regionais dessa Federao no interior do Estado de So Paulo. Realizaram-se nove campeonatos a partir daquele ano, at que em 1942 a Federao teve de ser dissolvida. J na segunda metade da dcada de 30, havia surgido um bom nmero de academias de jud, as quais foram propulsoras da difuso dessa modalidade esportiva entre a populao brasileira. Em 1953, Okochi, com o intuito de incrementar a prtica do jud no Brasil, organizou a vinda de uma delegao da Kdkan, de Tokyo, integrada pelo prof. Takagaki, Ozawa e pelo campeo japons Yoshimatsu. Foi realizado, na oportunidade, o campeonato brasileiro. J na poca, o Brasil contava com fortes judocas, como Arsnio Costa Martins e Durval Castro e Silva, aos quais foram conferidas faixas pretas de 5. grau pela Kdkan. Foi organizada a Federao Paulista de Jud em 1958, e em 1962 a Confederao Brasileira de Jud, com federaes filiadas nos estados. Alguns judocas decidiram fixar residncia definitiva no Brasil. Entre eles se contam Ishii, Okano, Sekine, etc, que muito contriburam para a elevao do nvel tcnico do jud no Brasil. O faixa-preta de 5. grau, Ishii, naturalizado brasileiro, obteve a medalha de bronze nas Olimpadas de Munique, em 1972. Nas Olimpadas de Los Angeles, Luiz Onmura e Carmona obtiveram medalhas de bronze, e Viera a medalha de prata. Em 1988, nas Olimpadas de Seul, Aurlio Miguel conquistou a medalha de ouro. Pode-se dizer que o Brasil, hoje em dia, um dos pases de maior populao de praticantes de jud no mundo.

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KEND

Com a fundao da Federao de Jud e Kend do Brasil, em 1933, foi realizada competio dessas duas modalidades de artes marciais, com a participao de 30 praticantes do kend. Trata do primeiro encontro do gnero. Ampliou-se, a partir da, o nmero de praticantes, e, na ltima competio, realizada antes da ecloso da guerra, participaram dez entidades, que mandaram cerca de 150 esgrimistas. No ps-guerra, tambm nessa modalidade esportiva a confuso reinante na comunidade de origem japonesa deixou marcas por alguns anos, no permitindo a realizao de competies com a participao dos praticantes de todas as regies. Somente em 1959 renasceu a Federao, que conseguiu realizar o primeiro campeonato. Atualmente existe organizada legalmente a Federao Paulista de Kend, e como rgo central dos clubes de kend existe a Federao Brasileira de Kend. Tornou-se intenso o intercmbio internacional, e o Brasil envia representao ao campeonato mundial que acontece a cada trs anos, tendo obtido, nas ocasies em que participou, excelentes classificaes. Apesar de no ser to popular quanto o jud, esta modalidade esportiva est se difundindo com segurana.
NATAO

Registra-se a vin.da de Kaiyo Saito como treinador de natao da Marinha Brasileira na dcada de 30 e de Kanichi Sato como professor da Associao Crist dos Moos pouco depois, mas a prtica organizada da natao no seio da comunidade de origem japonesa s aconteceu no psguerra. Em 1950, os "peixes voadores", como eram conhecidos os nadadores que tinham frente o recordista mundial Furuhashi, competiram no Estdio Municipal do Pacaembu, em So Paulo, trazendo grande alento colnia. As exibies que fizeram em diversas cidades do interior do Estado de So Paulo, em Niteri e no Rio de Janeiro, estabelecendo at alguns recordes, trouxeram grande conforto espiritual colnia, que sentia amargamente as seqelas das confuses reinantes em seu seio, no ps-guerra. inegvel que esse evento deu grande impulso prtica da natao entre os descendentes de origem japonesa. Tetsuo Okamoto, nadador do Iara Clube de Marlia, integrou a equipe brasileira de natao nas Olimpadas de Helsinque, em 1952, obtendo a medalha de bronze nos 1.500 m nado livre. Da para diante se intensificam as participaes de nadadores descendentes de japoneses nas competies tanto nacionais como internacionais. Desde 1967 se realiza o Torneio Intercolonial de Natao.

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TNIS DE MESA

O Dirio Nippak realizou, no ano de 1950, o primeiro campeonato de tnis de mesa da colnia nipnica. A partir desse evento se repete todos os anos a competio que rene os mesa-tenistas da colnia. A dcada de 50 foi o perodo de destaque do tnis de mesa do Japo, e isto no deixou de ter influncia no desenvolvimento dessa modalidade esportiva entre os descendentes de imigrantes japoneses. Por ocasio do cinqentenrio da imigrao japonesa no Brasil, estiveram entre ns Ichiro Hagimura e Toshiaki Tanaka, destacados mesa-tenistas da poca, realizando jogos-demonstraes, e, em 1959, Yoshitsumi Hirasaki e Seigo Takahashi ocupavam os primeiros lugares do ranking nacional, respectivamente da classe geral e dos juniores; e Mihoko Hirasaki e Emiko Takahashi conseguiam tambm os primeiros lugares nos rankings das classes correspondentes femininas. A partir dessa poca, os atletas nikkei passaram a ocupar lugares de destaque nas representaes nacionais, em competies internacionais dessa modalidade esportiva.
CARAT

Trata-se de uma modalidade de artes marciais difundida somente no ps-guerra. Pelo apelo direto que exerce como uma modalidade de defesa pessoal, o carat vem tendo muita aceitao por parte do pblico brasileiro, existindo muitas academias que ministram aulas, disseminadas em muitas cidades. Diferentemente do jud, que tem um centro unificador denominado Kdkan, no carat so muitas as escolas, de maneira que os campeonatos so realizados por cada uma delas.
GATEBALL

Introduzido na colnia de origem japonesa em 1977, trata-se de uma modalidade esportiva que se difundiu com incrvel rapidez. O gateball praticado por idosos, e os times formados, que so j numerosos, disputam campeonatos e competies, em mbito regional e mesmo nacional.
GO E SHOGUI GO

Apesar de ser praticado entre os crculos dos aficionados no perodo que antecedeu II Guerra Mundial, somente em 1948 foi realizado o primeiro torneio de go abrangendo todo o territrio brasileiro. Nesse ano, concomitantemente ao evento foi criado o Brasil Kiin, entidade central dos praticantes dessa modalidade de jogo. Com a sede concluda em 1988, essa organizao do Brasil a primeira sucursal da organizao central do Japo. Desde 1976, quando foi realizado o primeiro torneio sul-americano

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de go, com a participao de representantes do Brasil, Argentina, Chile, Bolvia, Peru e Mxico, vem sendo disputada a escolha das representaes nos campeonatos internacionais. A contribuio de Kaoru Iwamoto, mestre de 9. grau, que esteve no Brasil pela primeira vez em 1928, deve merecer destaque especial, pois orientou e incentivou o desenvolvimento do go no Brasil, tendo tambm papel destacado na construo da sede brasileira.
SHOGUI (XADREZ JAPONS)

Mais popular do que o go, o shogui sempre esteve mais prximo da vida dos imigrantes japoneses desde seus primeiros anos no pas. J na dcada de 30 foram realizadas competies em vrias regies, mas foi o Jornal Paulista que organizou, em 1948, o primeiro campeonato brasileiro, o qual passou a ser realizao do Dirio Nippak a partir do ano seguinte. Em 1955 foi organizado o Brasil Shogui Renmei (Federao de Shogui do Brasil), instalando sua sede e salo de jogos no prdio da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, em So Paulo. A difuso de shogui tem se dado mais entre os descendentes de japoneses. Talvez os ideogramas que se acham inscritos nas peas, e que servem para sua identificao, dificultem a difuso e prtica por parte dos no-descendentes. Como aconteceu com o go com o mestre Iwamoto, o shogui contou com a orientao e incentivo de Yasuharu Oyama, mestre emrito, que no tem poupado sua assistncia, visitando pr diversas vezes o nosso pas. (Masuji Kiyotani/Katsunori Wakisaka)

CAPTULO 5

VIDA RELIGIOSA DOS JAPONESES E SEUS DESCENDENTES RESIDENTES NO BRASIL E RELIGIES DE ORIGEM JAPONESA

ARA estudar as religies de origem japonesa no Brasil, vamos inicialmente ordenar a sua histria e a vida religiosa dos descendentes de japoneses no Brasil. Por comodidade, tentaremos fazer o ordenamento efetuando a diviso em perodos, conforme seguem, examinando a vida religiosa e a situao do trabalho de difuso das doutrinas das organizaes religiosas em cada um desses perodos. 1. Perodo. Ausncia de religio Este perodo abrange desde o incio da imigrao, em 1908, at a dcada de 20. Nessa poca, os imigrantes japoneses, em grande nmero, foram introduzidos como colonos nas fazendas de caf, em substituio direta aos imigrantes italianos. Trata-se da poca em que a "estratgia de trabalho temporrio de curta durao" regulava a ao e a vida dos imigrantes japoneses. E verdade que, j na dcada de 10, se iniciou a formao de "colnias" pelos imigrantes japoneses, tendo como pano de fundo a mudana da "estratgia de trabalho temporrio de curta durao" para a "estratgia de trabalho temporrio de longa durao"; procuraremos identificar o tipo de vida dos imigrantes japoneses dessa poca. No se pode dizer que a vida religiosa dos imigrantes japoneses da poca de "colono" tenha sido ativa. Quais teriam sido as razes disso?

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2. Perodo. Atividades religiosas na Colnia Este perodo corresponde aos anos abrangidos pela dcada de 20 a de 30. Tendo como pano de fundo a "estratgia de trabalho temporrio de longa durao", ou melhor, no processo de transio para essa "estratgia", foram sendo formadas "colnias" pelos japoneses no interior do Estado de So Paulo. Foi tambm a poca em que os imigrantes japoneses passaram de "colonos" para agricultores independentes ou arrendatrios. Na segunda metade da dcada de 30, o nmero dessas colnias era de 600-700. A partir de 1925, foi iniciado o fornecimento de subsdio para os gastos com passagem pelo governo japons, e na dcada de 30 foram instalados ncleos coloniais para acolher agricultores independentes. Dessa maneira, pode-se dizer que esse perodo se constituiu na poca urea da imigrao japonesa no Brasil, mesmo do ponto de vista do nmero de imigrantes que entraram no pas. De outro lado, nessa poca j se verifica a migrao com destino cidade de So Paulo, dando lugar ao aparecimento do bairro japons ao redor da rua Conde de Sarzedas. Para esse perodo, vamos fazer referncia aos aspectos mais importantes da vida religiosa dos japoneses centrados na "colnia"; e em relao zona urbana analisaremos a situao dos trabalhos missionrios das igrejas crists e dos primeiros passos da divulgao das religies de origem japonesa, como Tenry-ky e Seich-no-i. 3. Perodo. xodo rural migrao urbana Uma parte do perodo se sobrepe aos anos do 2. perodo. Cobre o perodo que vai dos ltimos anos da dcada de 30, quando teve incio a poltica nacionalista do governo de Getlio Vargas, que se constituiu em restrio psicolgica e concreta para os japoneses e seus descendentes, at o comeo da dcada de 50, em que, passando pela deflagrao da II Guerra Mundial e a derrota do Japo, cessam as restries impostas a eles e tambm terminam as confuses geradas no seio da comunidade de origem japonesa em conseqncia do "problema vitoristas-derrotistas". Este perodo apresenta ativa migrao urbana dos japoneses e seus descendentes, em decorrncia, inicialmente, da escolha de atividades por conta prpria na zona urbana, que seria uma variante da "estratgia de trabalho temporrio de longa durao" acima mencionada, e depois pelo aumento de oportunidades de emprego em decorrncia do crescimento industrial da cidade de S*o Paulo, e tambm pelo alto grau de escolaridade, eleito pelos japoneses e seus descendentes como meio de ascenso social e econmica. Na segunda metade da dcada de 40, em substituio

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ao "trabalho temporrio" comea a surgir o pensamento da "permanncia definitiva". A desintegrao da mundiviso viso do mundo em torno do culto ao imperador , que existia como abrigo espiritual dos imigrantes japoneses do ps-guerra; a migrao urbana e conseqentes mudanas de camada social e adaptao s condies urbanas; o surgimento do conceito de "permanncia definitiva", etc. foram os fatores que induziram a "ressurreio das religies japonesas" que teve incio na dcada de 50. Em relao a este perodo, faremos ligeira referncia s atividades religiosas que se observaram durante a guerra, e em seguida teceremos consideraes sobre os fatores que se relacionam "ressurreio das religies japonesas". 4. Perodo. poca Urbana Ressurreio das religies japonesas e seu desenvolvimento posterior Este perodo compreende a dcada de 50 at os nossos dias. Originariamente, os imigrantes japoneses mais de 90% do total foram levados para a zona rural, mas em decorrncia de ativa migrao urbana, iniciada a partir dos anos 40, atualmente cerca de 90% de japoneses e descendentes so moradores da zona urbana. E os descendentes de japoneses, sejam eles da zona urbana ou rural, como resultante da estratgia de ascenso social e econmica, passaram a se situar na classe mdia. Vamos efetuar uma sucinta exposio sobre as religies japonesas que iniciaram as atividades de pregao no Brasil, a partir dos anos 50, e observar as mudanas surgidas, num cotejo entre a situao atual e aquela da ltima metade dos anos 60, comparando as foras das principais organizaes religiosas com especial ateno para as mudanas observadas junto aos adeptos relacionando-as s mudanas na sociedade brasileira e ressaltando o aprimoramento na pregao por parte das seitas religiosas japonesas. A ressurreio das religies japonesas, verificada a partir dos anos 50, foi de incio um fenmeno surgido entre os japoneses e seus descendentes, mas, no perodo compreendido entre as dcadas de 60-70, elas ultrapassaram os limites tnicos, isto , dos japoneses, e passaram a penetrar amplamente no meio brasileiro, de no descendentes de japoneses. l. Perodo. Ausncia de religio "Mais tarde, j nas fazendas, era raro que os imigrantes presenciassem eventos religiosos. Em algumas localidades, no entanto, muitos imigrantes tinham tombado mortos, vtimas da malria. Nesses casos, os enterros eram extremamente simplificados: por vezes, nem mesmo rezas havia. Nas sepulturas, no lugar dos soto-

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bas, cruzes de madeira branca: no seu verso, inscreviam-se, no sentido horizontal, as datas de nascimento e falecimento do defunto e, no sentido vertical, o seu nome e o nmero de anos que vivera; na sua frente, lia-se namuamidabutsu ou namumyhremgeky ou seja, 'Que Buda nos salve7. Sobre o montinho de terra, colocavam-se coroas de flores de lata, pintadas de esmalte, de considervel durabilidade mesmo sob a intemprie. Em seguida, acendiam-se incensos ou velas e os presentes juntavam as palmas de suas mos, em silncio ou balbuciando invocaes a Buda e outras ladainhas. A famlia enlutada voltava, ento, sua casa na colnia e num canto da casa (na maioria das vezes, no quarto) instalava uma espcie de prateleira, em que colocava uma foto do falecido, oferecendo-lhe flores do campo e incenso. Em caso de no haver incenso, utilizavam-se velas em seu lugar. Por alguns dias, deixavase uma lamparina acesa, como se fosse a prpria iluminao dos verdadeiros altares budistas. No stimo dia, a famlia reunia o pessoal da vizinhana para realizar algo parecido com uma missa de stimo dia. Evidentemente, no havendo bonzos tambm no havia rezas, mas depois de prestadas as devidas reverncias diante do altar improvisado, jantavam todos juntos, sendo comum nessas ocasies oferecer shiruko e udon" (Handa, 1987:727). No se pode dizer que neste perodo, ou melhor, at a ecloso da II Guerra Mundial, a vida religiosa dos imigrantes japoneses tenha sido ativa. Por que razes a vida religiosa dos imigrantes japoneses no foi ativa nesse perodo? A vida religiosa dos japoneses, tradicionalmente, teve como uma das coordenadas de referncia o "culto aos antepassados", que se alicera na instituio familiar, e a outra, o "culto s deidades da comunidade". Na tradicional instituio da famlia, o culto ao antepassado era funo atribuda ao sucessor, em regra o primognito, e o grosso dos imigrantes japoneses era constitudo de segundo ou terceiro filho, "no-sucessor", que saa da sua famlia originria, no possuindo antepassado para prestar culto. De certo modo, seria ele o iniciador de uma famlia e, portanto, futuramente iria ser ele prprio objeto de culto. Ao ir trabalhar no exterior como "trabalhador temporrio", eles se afastam, provisoriamente, de sua casa e de sua vila de origem, mas de maneira alguma perdem essa posio, sendo pois ausentes temporrios, que "deixaram delegados queles que ficaram a incumbncia de tratar dos assuntos religiosos e relacionados aos antepassados". Entretanto, desafortunados, alguns morriam em meio s difceis condies encontradas no Brasil. Nessas ocasies eram realizados ritos funerais provisrios como os descritos acima, em que "sua alma voa para

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o Japo" (Willems, 1948:98). Quer dizer que, para os imigrantes japoneses, a realizao do culto ao antepassado ou ao morto s poderia acontecer no Japo, onde se encontra a "casa" da comunidade para onde deve regressar. No caso dos japoneses e seus descendentes no Brasil, a questo do culto ao antepassado emerge, juntamente com o surgimento da conscincia de famlia, s no ps-guerra, com a tomada de deciso de permanncia definitiva no pas, pelo apego s suas terras e patrimnios e pelo crescimento dos nisei. Se dessa maneira essa inatividade religiosa dos imigrantes japoneses explicada com referncia estrutura. social do Japo, de outr o lado, se deve tambm s posturas do governo japons e das organizaes religiosas. Em 1918, quando Honpa Honganji tencionou enviar seu pregador ao Brasil e o Ministrio dos Negcios Estrangeiros do Japo dirigiu consulta sua Legao no Brasil, esta apresentou a seguinte respostaparecer: "O nosso Imprio um pas com liberdade de crena, pelo que entre os imigrantes japoneses no Brasil existem aqueles que seguem o xintosmo, outros que crem no budismo, e ainda alguns cristos. Os budistas so mais numerosos, e suas seitas tembm numerosas. Caso se pretenda enviar missionrio, apenas o de Shinshu-Honganji no ser suficiente. Alm do mais, a economia de nossos imigrantes se encontra em situao precria a ponto de sentir-se carente nos aspectos mais importantes do que o religioso, como so os casos do mdico-hospitalar, da educao das crianas, razo porque o envio de orientador religioso no o mais desejado pelos imigrantes. Ademais, deve-se atentar para o fato de que, apesar de tnue, existe uma corrente oculta anti-nipnica, apontando-se como uma das suas razes, alm das diferenas de raa, lngua, costumes, etc, a diferena de religio. Assim, recomendvel que se evite o envio de bonzos e de sacerdotes xintostas" (Histria do Desenvolvimento dos Japoneses no Brasil, 1953:209). A respeito, Nakamaki (1989:384) resume em quatro itens as razes dessa autoconteno: 1) Enviado o pregador pela Honganji, no se poder colocar qualquer freio diante das pretenses idnticas de outras seitas. 2) Ausncia de condies econmicas para manuteno do pregador. 3) O desejo dos imigrantes referente ao envio do pregador no to forte. 4) Existe sentimento antinipnico. Dessas razes de autoconteno, 1) e 4) so resultantes das condies de ordem poltica e emigratria do governo japons e a 3) se pode atribuir a firmeza da "conscincia de trabalho temporrio" possuda pelos imi-

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grantes. Tratava-se de orientao ou medida para se evitar os diversos problemas que poderiam surgir em decorrncia das tradies culturais no Brasil, terra de "residncia temporria, provisria", e onde, apesar de fraco, existia sentimento antinipnico. Com parecer dessa natureza, foi rigorosamente restringida pelo Ministrio dos Negcios Estrangeiros a sada de pregadores religiosos para o Brasil, com exceo dos catlicos, a partir de 1918 at a poca do ps-guerra. E tecida a seguinte considerao: "... Os patrcios que emigraram para o Brasil devem ter sempre em mente que a grande maioria dos brasileiros catlica, devendo os cultos do budismo ou xintoismo, religies estranhas para os brasileiros, serem realizados de maneira a mais discreta possvel, e deixar de lado construes de templos budistas ou xintostas que podem dar muito na vista. Considero essas medidas mais inteligentes para o desenvolvimento futuro de nosso povo" (Noda, 1926:477). E um pregador da seita Tenry-ky teve de assinar uma declarao, ao deixar o Japo, dizendo no trabalhar na difuso da seita no Brasil (Histria do Trabalho de difuso religiosa do Tenry-ky no Brasil). Este tipo de indicao, emanada diretamente da legao local do governo japons, era coerente com a disposio psicolgica e comportamento dos imigrantes japoneses da poca. Era fortemente arraigada a "conscincia de trabalho temporrio", conforme j se fez meno 1 ; por isso: "Mesmo que continuando a viver, por longo perodo, dentro do balizamento da sociedade brasileira, era forte o pensamento de que pertencia, como membro regular e de origem, sociedade japonesa, e que no passava de seu membro temporariamente ausente, permanecendo no Brasil, apenas, na qualidade de 'visitante'" (Maeyama, 1987:9). "E o fato de ser 'visitante' queria dizer que no era membro da 'famlia' em que presentemente encontrava assento, no assumindo responsabilidade sobre a maneira de ser dessa 'famlia', e, como se tratava de 'pessoa que se acha sob ateno e favor', no devia fazer comentrios ou se intrometer nos 'lares dessa famlia' e manter-se discreto, pois se tratava de 'pessoa que devia agradecer a acolhida e a ateno e voltar sua prpria famlia' e em razo do que 'pensavam em no provocar transtornos introduzindo o budismo, fazendo poltica'" (Maeyama, 1982:194). De fato, houve, em 1922, acontecimento que exprime claramente uma atitude desse tipo. Nesse ano, no Estado de Minas Gerais, na chamada regio do Tringulo Mineiro, foram detidos pelas autoridades brasileiras quatro pregadores da seita Omoto-Ky por motivo de suas atividades religiosas. Referindose a esse acontecimento, o jornal de lngua japonesa editado em So Paulo
Sobre a "conscincia do trabalho temporrio", em 1938 os japoneses e seus descendentes que desejavam voltar ao Japo somavam 85% do total, e apenas 10% optavam pela permanncia definitiva no pas (Wako, 1939:1).
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tecia o seguinte comentrio em seu editorial, criticando as atividades de promoo da seita pelos pregadores: " procedente e recomendvel que se evite a propaganda de outras seitas religiosas para o Brasil que tem como religio nacional de fato o catolicismo. Mormente para ns japoneses que, dotavarvte, ainda muitos imigraro para este Pais e que temos a obrigao de promover e cultivar as relaes de boa amizade entre o Japo e o Brasil, todo cuidado pouco, devendo-se evitar propagandas de outras religies ou atos semelhantes, e tomar cuidado para que os brasileiros no tenham, a respeito da religio, dvidas ou lhes proporcionem sentimentos de incerteza. Viemos apresentando, freqentemente, esse tipo de advertncia nos nossos escritos e pronunciamentos" (Notcias do Brasil Brasil Jih, 1932: 5-25). Pode-se ver que se trata da clara expresso do pensamento dos japoneses da poca. Com respeito razo 2, Ryji Noda, que visitou e observou as condies de trabalho dos imigrantes nesse perodo inicial da imigrao, deixou o seguinte relatrio: "Como resultado de um ano de trabalho, uma famlia de dois homens e uma mulher obteve apenas 440 mil ris, isto , convertidos em moeda nacional seriam aproximadamente 270 ienes, insuficiente para cobrir as despesas de viagem dessas trs pessoas. Principalmente quando se considerar que esses 270 ienes de renda lquida se referem a imigrante de melhor resultado, pois que os piores s conseguiram obter o sustento do ano". Pelo visto, os imigrantes desse perodo tinham dificuldades em conseguir o sustento prprio e dos seus e ressarcir as despesas de viagem, no havendo possibilidade de realizar atividades religiosas e atender aos gastos de sustento do pregador. Alm dessa dificuldade econmica por parte dos imigrantes, tambm para as organizaes religiosas do Japo era economicamente difcil a.prtica do trabalho de difuso das seitas entre os imigrantes disseminados em reas to extensas. Chien Matsubara, pregador de Honganji, que visitou o Brasil em 1924, apresentou o seguinte relato: "Os nossos imigrantes e colonos se acham espalhados em reas to extensas que, no caso de construir-se um templo, ou ainda programar-se visitas aos fiis, seriam necessrios montantes significativos para atendimento s despesas, os quais, naturalmente, os fiis do Brasil, como tambm o templo-matriz, no teriam condies de arcar (Histria da Expanso dos Japoneses no Brasil, 1953:209). Pelas razes expostas, a vida religiosa dos imigrantes no perodo inicial era bastante precria. "... traos religiosos que poderamos encontrar na vida dos primeiros imigrantes eram os verificados durante as cerimnias fnebres e as leituras de rezas budistas ou xintostas, diante de oratrios, nas casas em que tinham ocorrido casos de falecimento" (Handa, 1987:735).

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Nos meados desse perodo dcada de 10 j comeava a formao de colnias de japoneses, e, de outro lado, em 1914 havia sido instalado o consulado do Japo em So Paulo e iniciada a constituio do bairro japons, tendo como centro a rua Conde de Sarzedas. Na seo a seguir ser feita referncia s situaes religiosas nas colnias de japoneses na cidade de So Paulo. 2. Perodo. Atividades Religiosas na Colnia a) Formao das colnias e vida religiosa "Na poca do ingresso na colnia era moo e forte. No pensava no que seria o futuro. Apenas dedicando-me para ganhar dinheiro. E o resultado? Acumulei dinheiro? No. Adquiri posio social? No. Restou-me este corpo magro e uma personalidade desfigurada. Desta maneira, visitar a terra natal como pessoa bem sucedida, apenas no sonho. Pensando dessa maneira, que ser deste meu corpo no futuro? Sou prisioneiro de tormentos. Sinto-me insatisfeito: um profundo vazio. Acalmar este tormento do corao e esquecer o sofrimento, somente pela fora do Buda poderei purificar-me..." (Histria dos 25 anos de Hirano). "O retrato do imperador era o corpo sagrado do culto; o edito imperial sobre a educao era a escritura sagrada do culto; o hino nacional kimi-ga-yo era o cntico sagrado; o diretor da escola era o sacerdote e a escola japonesa a divindade da vila" (Maeyama, 1984:451). O ganho como trabalhador assalariado (colono) da fazenda de caf era pouco, sendo impossvel o regresso terra natal como pessoa bemsucedida. A grande maioria dos imigrantes japoneses veio ao Brasil na poca de refluxo da cultura do taf em So Paulo. M safra, superproduo, crise, etc. fizeram frustrar o seu desgnio original. De outro lado, pelo fato de coincidir com a fase negativa da cafeicultura, houve oportunidade de se adquirir lotes de terras, mesmo por parte dos colonos, uma vez que matas da frente de desbravamento, reservadas para futuras plantaes de caf, foram oferecidas, retalhadas em pequenos lotes e em condies de pagamentos parcelados, sendo ainda possvel consegui-las por arrendamento. Os imigrantes japoneses mudaram a sua estratgia, de "trabalho temporrio de curto prazo" para "trabalho temporrio de longo prazo", transformando-se em pequenos produtores de mercadorias ao passarem

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a ser meeiros, arrendatrios ou agricultores independentes. Alm do mais, os imigrantes japoneses no se instalaram cada qual isoladamente. Tendo como princpio de organizao a etnicidade, os japoneses arrendaram ou adquiriram as terras em grupo, construindo dessa maneira as ditas "colnias". Na constituio da vila nessas "colnias" foi empregado o paradigma cultural com razes na comunidade alde do Japo. Este tipo de "colnias" de japoneses comeou a ser formado j na dcada de 10, e na dcada de 30 existiam de 600 a 700 ncleos similares na Regio Sudeste do Brasil. Juntamente com a organizao baseada no paradigma cultural com razes nas aldeias do Japo,2 foram reproduzidos, tambm, muitos atos e comemoraes. Entretanto, "as reconstituies de atos religiosos foram sempre postergadas, abandonadas" (Maeyama, 1968:126). E isso, tambm em nvel familiar: "Na fase inicial dos ncleos de colonizao, os oratrios budistas ou xintostas s podiam ser vistos naquelas casas em que tinha havido mortes... Os oratrios encomendados aos marceneiros que os executavam nas horas vagas s apareceriam seis ou sete anos depois, quando o caf j estava comeando a produzir, ou seja, mais de dez anos aps terem pisado no solo brasileiro pela primeira vez" (Handa, 1987:730). O funeral e culto ao morto, na fase inicial da imigrao, no passavam de "improvisaes". Assim, "quando havia morto, um vizinho qualquer que soubesse algum rudimento de reza era solicitado, o qual atendia prontamente para fazer a recomendao da alma do falecido, e nos aniversrios da morte tambm executava as rezas amadoras" (Maeyama, 1967:93-6). Com a estabilizao da produo e com o avano da organizao da colnia, comeam a surgir as atividades de natureza religiosa. A partir da segunda metade da dcada de 20 e nos anos 30, nos ncleos coloniais maiores, como Cafelndia, Registro, Marlia, Lins, etc, notam-se atividades budistas dos "crentes, em famlia", e nas colnias de Promisso e Aliana se notam movimentaes para a construo de templos xintostas. A Colnia Hirano foi um dos primeiros estabelecimentos de imigrantes japoneses que visaram tornar-se agricultores independentes. Ela se localizou na regio noroeste do Estado de So Paulo. O desbravamento foi iniciado em agosto de 1915 por um grupo liderado por Unpei Hirano. A malria comeou a grassar a partir de maro do ano seguinte, vindo a
Sobre o momento e o procedimento na constituio da "vila", Maeyama (1968:125) faz as seguintes observaes: "Na sociedade de imigrantes no Brasil, os imigrantes japoneses que perderam as formas de ligao de famlias e relaes de parentesco, estabeleciam relaes de pseudo-parentesco apegando-se ao fato de ser da mesma provncia de origem, de terem viajado no mesmo navio, de terem trabalhado na mesma fazenda de caf, ou apenas pelo fato de serem japoneses, e imbudos com esse tipo de sentimento, partiam para "visitar" novas terras, ou faziam a aquisio ou arrendamento de terras numa mesma localidade; residiam num mesmo agrupamento e estabeleciam relaes de mtua ajuda na construo de moradias, derrubada de matas, plantio, colheita, etc."
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falecer, s nesse ano, cerca de 80 pessoas. Nessa colnia foi organizada, a partir de 1930, "reunio de palestra budista", para a qual era freqentemente convidado Sukeichi (Kushin) Ito. Natural de Hiroxima, ao imigrar, inicialmente se fixou na E. F. Mogiana, passando depois a morar perto da Colnia Hirano. Ito no era bonzo propriamente dito, mas um budista muito devoto. Em 1933, foi organizada uma associao de adeptos, sendo construda, em 27 de novembro de 1934, uma casa-oratrio com rea construda de 5 x 7 m. No incio, o sacerdote foi Eizen Fukunami, nascido na provncia de Hiroxima. O sacerdcio no lhe permitia ter qualquer estabilidade de vida, e logo teve de se mudar para Ribeiro Preto, onde trabalhou no consulado japons. Fukunami e Ito se dirigiam s colnias dos imigrantes japoneses com o objetivo de pregao. Com a sada de Fukunami da colnia, Ito o substituiu. Em julho de 1940, Hakud Inoue foi solicitado a encarregar-se dos servios religiosos. Alis, ele j havia servido como conferencista nas reunies de seguidores. Entretanto, em novembro de 1941, ele faleceu vtima de insuficincia cardaca. Ito estava morando em Assai, PR, e, ao visitar a Colnia Hirano para render preces ao tmulo de Inoue, foi solicitado insistentemente pelos adeptos budistas a permanecer como pregador. Ele anuiu. Em 1954, quando o sacerdotemor da seita veio ao Brasil pela primeira vez, ele foi ordenado sacerdote, e, juntamente com a viva Inoue, que fora ordenada na segunda visita do sacerdote-mor, se dedicou vida religiosa na. Colnia Hirano (Nakamaki, 1980:392-3). Esse exemplo ilustra as atividades dos "budistas, em famlia" e a organizao das atividades religiosas nas colnias. Cotejando com a citao apresentada no incio, podem-se notar as transformaes nos 15 anos de vida nas colnias: da necessidade formal dos servios religiosos para funerais e culto aos mortos, emergncia das aspiraes religiosas dos imigrantes. Quanto ao movimento de construo de templos xintostas podem ser assinalados os seguintes fatos: instituio do Templo do Bugre, no distrito de Bonsucesso, do ncleo colonial de Uetsuka, em Promisso, e o projeto de construo do Templo de Suwa, na Colnia Aliana. Tendo sido descobertos tmulos de ndios no distrito de Bonsucesso, no ncleo colonial de Uetsuka, em 1920 foi erguido no local o Templo do Bugre, escolhendo-se como corpos sagrados potes e instrumento de sopro feito de barro, usados pelos ndios. Todos os anos, no dia 5 de maio, era realizado torneio de sumo em homenagem s divindades (Ngy no Brasil Brasil Agrcola 1928/9). Em 1928, houve um movimento para construo do Templo de Suwa, na Colnia Aliana, mas a Sociedade de Aliana se manifestou contrria, argumentando que a construo conflitaria com as diretrizes brasileiras de assimilao, ficando o projeto

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apenas na inteno. Em 1938 foi construdo na Colnia de Bastos o Templo de Sanso, em homenagem deidade do bicho-da-seda. Sob as mais variadas motivaes, houve movimentos de construo de templos xintostas. Eram "reorganizaes", em hbitat brasileiro, da deidade da aldeia, existente no Japo. Entretanto, os movimentos de construo de templos budistas e xintostas no se vulgarizaram. Na realidade, foi o Culto ao Imperador que se encarregou da funo integradora coletiva nas colnias de japoneses. No Japo, essa funo era exercida por atos religiosos. O centro do culto ao imperador era a "escola japonesa", que fora organizada junto com a formao do ncleo colonial. A escola japonesa era no s o local de ensino, era tambm a sede da sociedade japonesa, sede da cooperativa agrcola e o salo de festa dos casamentos. Dos atos que aconteciam nesse local participavam todos os componentes da colnia. Antecedendo a todos os eventos eram obrigatrias: a reverncia ao lado leste, profunda reverncia ao retrato do imperador, a solene leitura do edito imperial sobre educao, a execuo cantada do hino nacional japons. O retrato do imperador era o corpo divino, o edito imperial sobre educao a palavra sagrada, o hino nacional o cntico sagrado, o diretor da escola o sacerdote, e a escola japonesa a deidade da aldeia3. Criou-se assim a "estrutura religiosa". Este tipo de movimento ser reforado pelos imigrantes japoneses que vieram para o Brasil na dcada de 30, temperados pelo nacionalismo japons. De qualquer maneira, a religiosidade, que quase nenhum avano teve na poca de imigrantes-colonos, surgiu e se desenvolveu nas colnias organizadas pelos japoneses. b)Trabalho de pregao das igrejas crists4 Da mesma maneira como aconteceu no 1. perodo, neste tambm, por motivo de "respeito e comedimento" diante da igreja catlica e do nacionalismo brasileiro, os trabalhos de divulgao das seitas religiosas japonesas no se desenvolveram ativamente. Em contraposio, as igrejas crists, tanto a catlica como as protestantes, atuaram intensamente nas colnias japonesas e na cidade de So Paulo, onde havia sido formado o bairro japons. Essas atividades foram desenvolvidas por padres no japoneses no caso da igreja catlica e por missionrios japoneses nas igrejas protestantes. A pregao do catolicismo entre os japoneses no Brasil foi iniciada em 1919 pelo padre alemo Loureno Futzbauer, na Fazenda SapucaiaTozan, em Pindamonhangaba. Em 1921 esse sacerdote alemo realizou o
Maeyama, 1984, p. 415. A exposio feita foi baseada na Histria do Desenvolvimento dos Japoneses no Brasil (Tomo II) p. 208-9 e em Kowyama Rokuro, Histria dos 40 Anos de Imigrao, p. 373-84.
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batismo de um grupo de japoneses numa pequena capela de Curuputuba. No mesmo ano o padre Lourencio, do Mosteiro da Penha, em So Paulo, vendo o aumento do nmero de imigrantes japoneses, solicitou ao embaixador do Vaticano acreditado no Rio de Janeiro o envio de um padre japons. Em 1923 chegava ao Brasil o padre Chohachi Nakamura, nascido em Amami-shima. Em 1926, o jesuta Guido Del Toro ficou encarregado da catequese dos japoneses e no -dia comemorativo da Proclamao da Repblica desse ano celebrou o batismo coletivo de 46 crianas descendentes de japoneses 5 . O jornal O Estado de S. Paulo se refere a esse ativo trabalho da igreja catlica nos seguintes termos: "A converso desses japoneses ao catolicismo o caminho mais curto para a assimilao, elimina a nica parede que obstaculiza a fuso entre os brasileiros e os japoneses e elimina a leviana opinio de negativa ao imigrante japons pela iluso de que os sentimentos entre ambos os povos se contrariam" (O Estado de S. Paulo, 23.12.1927). Em muitos casos, a converso ao catolicismo, representada pelo batismo dos niseis, se deu mais por interesse social do que por crena pessoal. Adaptando-se ao costume de compadrio, pedia-se que pessoas conhecidas se tornassem padrinhos. Isso funcionava como um meio de adaptao sociedade brasileira e como recurso de ascenso social e econmica (Handa, 1987; Nakamaki, 1989:385). Na dcada de 20 foram erguidas igrejas catlicas nos ncleos japoneses de Registro, Promisso, Botucatu, Birigi e Alvares Machado, entre outros. A construo de igrejas tambm era mais manifestao da vontade de adaptao ao ambiente brasileiro do que propriamente converso ao catolicismo. Do ponto de vista psicolgico, certamente "se assemelha a ter construdo um templo" (Nakamaki, 1989:386). Seria a aceitao como substituto do sistema de "filho da deidade da aldeia", pelo que se pode entender por que os japoneses no se tornaram ardorosos fiis. Ao levar-se em conta a composio social da colnia, j que existiam trabalhadores brasileiros no descendentes de japoneses, poder-se-ia apontar um aspecto realista nessa ao, ou seja, a considerao para com os brasileiros, e uma demonstrao para exteriorizar o processo de assimilao. Na cidade de So Paulo os trabalhos missionrios das diversas igrejas protestantes foram iniciados, j na primeira metade da dcada de 20, por pastores japoneses. Em 1921, chegou a So Paulo, procedente dos Estados Unidos, protestante Midori Kobayashi com o objetivo de desenvolver trabalho
O Padre Guido dei Toro, jesuta, foi o fundador do Colgio So francisco Xavier, onde estudaram muitos filhos de imigrantes japoneses. Em 1933, celebrou missa comemorativa do 25." aniversrio da imigrao e abenoou, na ocasio, o lanamento da pedra fundamental do Hospital Japons.
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missionrio. No dia 15 de maio do ano seguinte inaugurou a primeira escola dominical na Escola Taish, ento localizada na rua Conde de Sarzedas. Conseguiu reunir cerca de 50 pessoas. No centenrio da Independncia do Brasil tornou pblica a declarao da fundao do "Seishu Gijuku", uma instituio educacional crist. Dois anos depois, tambm no Dia da Independncia, fundou a Igreja de So Paulo. Os trabalhos missionrios da igreja episcopal foram iniciados em maro de 1923, quando o pastor Yasoji Ito reuniu sete pessoas, membros da Rikk-kai (uma associao de promoo da emigrao japonesa de inspirao protestante), na penso Ueji, sita na rua Bonita, 11. O pastor Ito, ao mesmo tempo que servia na Igreja de So Joo, no bairro de Pinheiros, So Paulo, percorria as concentraes de japoneses de Birigi, Lins, Colnia Aliana, Colnia Tiet, Marlia, Londrina, Registro, etc, na sua faina missionria. O trabalho da igreja "Holiness" foi iniciado com a chegada do pastor Monobe, do Japo, em julho de 1925. Ele se estabeleceu na rua Bonita, 13. Em 1936 chegou ao Brasil, como imigrante-agricultor, o capito do Exrcito de Salvao Sanji Tanaka. Inicialmente se dedicou ao trabalho missionrio, no Rio de Janeiro, durante trs meses. Em setembro do mesmo ano foi nomeado para a abertura da "frente de combate" da seo japonesa. Mudou-se para a cidade de So Paulo e realizou a primeira reunio no salo da escola Gysei. A Igreja Metodista Livre realizou tambm, de forma intermitente, seu trabalho de pregao 6 . c)Pregao das religies japonesas Honmon-Biitsuryushu, Omoto-ky, Tenry-ky, Seich-no-i Neste perodo, as religies japonesas no realizaram trabalhos ativos de pregao. Entretanto, algumas seitas iniciaram, de forma no organizada, pregaes ou trabalhos de divulgao atravs de fiis "fervorosos", por iniciativa pessoal ou com beneplcito das sedes. A Honmon-Butsuryu-k (atual Butsuryushu) iniciou sua pregao atravs de Tomojiro Ibaragi, imigrante vindo no Kasato-Maru, em 1908. O presidente da Companhia de Emigrao Kkoku, Ryu Mizuno, era adepto dessa seita, e o imigrante era includo nessa primeira leva graas solicitao da sede da seita. Independentemente de Ibaragi, Yoneji Matsubara iniciou, em 1932, na Colnia Unio, em Lins, os trabalhos de divulgao da seita. Tomando conhecimento da existncia de Ibaragi, em 1936 construiu em terreno de sua propriedade um templo (Templo-sede
6 Alm destas, desenvolveram trabalhos missionrios entre os japoneses e seus descendentes as igrejas Alliance (inglesa), Luterana, Esprito de Jesus, Adventista do Stimo Dia.

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da Butsuryu-k do Brasil) e solicitou a vinda de Ibaragi. Presentemente, esta seita possui nove templos espalhados nos estados de So Paulo, Paran e Rio de Janeiro. A Honpa Honganji enviou, da sede, Masumi Ikoma, em 1928. Organizou na Colnia de Iguape uma reunio chamada Jikkai, onde comeou os trabalhos de divulgao da seita Shinshu. Em 1954, por ocasio do 4. centenrio da fundao da cidade de So Paulo, o patriarca da seita esteve em visita ao Brasil e declarou oficialmente a abertura dos ensinamentos. Presentemente, a Honpa Honganji Organizao da Amrica do Sul possui 32 templos no Brasil. J fizemos meno de que a Omoto-ky fizera pregao na regio do Tringulo Mineiro e fora alvo de crtica no jornal da comunidade japonesa como "perturbadora da assimilao", mas outras seitas japonesas, de formao mais recente, como a Tenry-ky, Seich-no-i, Konk-ky, etc. se instalaram no Brasil nessa poca, realizando trabalhos de pregao no interior do Estado de So Paulo, junto s reas de concentrao de japoneses. Os trabalhos de divulgao da seita Tenry-ky foram iniciados quando quatro famlias de crentes, pertencentes ao templo de Nankai, chegaram ao Brasil em 1929 e se fixaram na Colnia Tiet, na regio oeste do Estado de So Paulo. Posteriormente, o ponto de apoio da organizao foi transferido para a cidade de Bauru e as atividades intensificadas. Em 1935 foi construdo o primeiro templo (Templo da Noroeste) na Colnia Bora. A organizao de mbito nacional que controla os seguidores e os templos de todo o pas foi implantada em 1941, sendo instalado, em 1955, o Centro Brasileiro da Tenry-ky na cidade de Bauru. Em 1983, a seita contava com 56 templos, 243 locais de divulgao, 2.006 fiis qualificados e cerca de 10 mil fiis comuns. Quanto a Seich-no-i, por volta de 1930 j havia japoneses estabelecidos em colnias no interior do Estado de So Paulo que liam publicaes que mandavam buscar no Japo, mas nessa poca ainda no havia qualquer trabalho de divulgao da seita para o pblico. Em 1934, Daijiro Matsuda, que estava de cama, se restabeleceu com a leitura de Seimei-no-jiss (Verdade da Vida) e comeou, com seu irmo Miyoshi, a difuso da seita, dando incio aos trabalhos de pregao da Seich-no-i no Brasil. Graas aos esforos dos irmos Matsuda, a seita conseguiu ampliar seu mbito de atuao ao longo das estradas de ferro NOB e Paulista. Em 1936 foi inaugurado, em Guararapes, um crculo de amigos da leitura de livros, que foi reconhecido como sucursal brasileira em novembro desse ano. A partir da foram sendo formados muitos crculos de amigos da leitura em vrias regies. Em dezembro de 1937 foi criada em Guararapes a primeira associao de "pombas brancas". Em

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1950, foi formada a federao dos crculos de leitura das cercanias da cidade de So Paulo e no ano seguinte a federao brasileira. Em maio do mesmo ano foi autorizado o funcionamento da "Sucursal Geral Brasileira da Seich-no-i", iniciando-se com isso o trabalho organizado de difuso da seita em mbito nacional. No ano de 1952, comeou a edio do seu rgo oficial Enkan (Elo circular), e em agosto desse ano obteve do governo brasileiro a autorizao de funcionamento como entidade religiosa. J na primeira metade dos anos 50 foram publicadas as edies brasileiras do livro doutrinrio Kanro no Hou (Chuva de Nctar da Verdade) como tambm seu rgo oficial "Seich-no-i", instrumentando-se com isso os trabalhos de difuso da seita entre os descendentes de japoneses e entre os no-descendentes. Em 1963 veio ao Brasil o presidente da seita, Masaharu Taniguchi, que declarou: "Eis a Terra onde pode frutificar uma nova revoluo crist", dando impulso s atividades de propagao, enfatizando seu empenho na difuso da seita entre os niseis e no-descendentes. Na sua segunda visita ao Brasil (1973), falou da importncia dos trabalhos de difuso da seita por meio das publicaes, o que teve influncia marcante no desenvolvimento dessas atividades. O Acendedor e Pomba Branca apresentaram ao longo do tempo as seguintes mdias por edio: 393.000 em 1980, 403.000 em 1985 e 511.000 exemplares em 1988. A organizao estima em 2.400.000 o total de seus adeptos. 3. Perodo. xodo Rural Migrao Urbana "Os 3 cls e as associaes japonesas, os jornais de lngua japonesa, as escolas japonesas desapareceram numa noite, mas a 'beleza do esprito japons' e a estrutura simblica que tinha como ncleo o imperador continuaram a viver no corao de cada um dos imigrantes" (Maeyama, 1982b).' a) Vida religiosa na segunda metade dos anos 30 e durante a guerra Na segunda metade dos anos 30, quando a vida nas colnias se encontrava em seu perodo ureo, foi implantada pelo governo de Vargas a poltica de nacionalizao, fortemente impulsionada sob o Estado Novo. A poltica de nacionalizao tinha por objetivo a elevao do esprito de brasilidade e o nacionalismo, sendo, pois, uma forte poltica de assimilao frente aos estrangeiros e seus filhos. As muitas colnias de japoneses formadas no interior do Estado de So Paulo foram consideradas "quistos" dentro da sociedade brasileira, sendo criticada a inassimilabilidade dos japoneses, exacerbando a opinio antinipnica e a grita contra "o perigo amarelo". Em 1937 foi proibido o ensino de lnguas estrangeiras a menores de 14 anos de idade, com o fechamento, no ano

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seguinte, das escolas de lnguas estrangeiras, e em 1941 determinada a proibio da edio de jornais nessas lnguas. Com a ecloso da Guerra do Pacfico em dezembro de 1941 e subseqente rompimento das relaes diplomticas do Brasil com os pases do Eixo (janeiro de 1942), os japoneses passaram condio de originrios de pas inimigo, sofrendo restries nas suas liberdades. Foi limitada a liberdade de viajar, proibido o uso da lngua de origem em logradouros pblicos e as reunies. Na dcada de 30 verificava-se nas colnias uma ativao da vida religiosa especialmente o budismo e o culto ao imperador, praticados espontaneamente em famlia , e algumas seitas japonesas j tinham iniciado o trabalho de difuso de suas doutrinas. Essas atividades tambm ficaram expostas a grandes restries e ameaas. Lderes e pregadores de algumas entidades religiosas foram detidos sob suspeita de espionagem. Na Histria do Trabalho de Difuso Religiosa do Tenry-ky no Brasil (p. 18-9) est descrita da seguinte maneira a situao durante a guerra: "Tenry-ky, como religio de pas inimigo, tambm se tornou alvo de rigorosa fiscalizao. Os templos foram fechados e as reunies proibidas. No ms de maro desse ano (1942), Chujiro Ohtake, dirigente do templo de Bauru foi preso na qualidade de um dos principais lderes dos japoneses e ficou detido durante um ano e trs meses em So Paulo. Foi liberado em maio do ano seguinte, mas como estava proibido de sair da cidade de So Paulo, ficou hospedado na casa de pregao da Capital. Arrendou um terreno contguo, e a pretexto de casa de treinamento, inaugurou secretamente uma escola de doutrinao, esforando-se por formar fiis qualificados, principalmente jovens de ambos os sexos. Tendo sido revogada a proibio em 1945, transferiu a casa de treinamento para Ava, perto da cidade de Bauru, e mesmo sob a rigorosa fiscalizao que continuava, a casa de treinamento foi mantida at o ano de 1948". A Seich-no-i organizou, durante e no perodo do ps-guerra, centros de amigos da filosofia de Taniguchi, pregando a identificao com os destinos do Imprio, e conseguiu, precariamente, continuar seus trabalhos. As situaes por que passaram a Tenry-ky e a Seich-no-i foram praticamente as mesmas suportadas pelas outras organizaes religiosas de origem japonesa. Um dos movimentos importantes realizados durante a guerra foi o "Servio Social de Assistncia", organizado principalmente pelos catlicos. Com o advento da Segunda Guerra, os japoneses foram presos, como suspeitos de espionagem, e recolhidos antiga Hospedaria dos Imigrantes. Em maio de 1942, Chibata Miyakoshi, representando a opinio de muitas pessoas, conversou com Margarida Watanabe para organizar um

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servio de assistncia a essas pessoas. Com a ajuda do Cardeal Arcebispo de So Paulo, Dom Jos Gaspar, foi obtida autorizao das autoridades para funcionamento de um servio assistencial. Assim, a partir de junho do mesmo ano, passou a funcionar, diretamente ligado ao arcebispado, a "Assistncia aos Japoneses pelos Catlicos de So Paulo". Essa entidade se transformou , em 1953, em Sociedade Beneficente Dom Jos Gaspar, continuando suas atividades assistenciais. Outrossim, em 1943, o padre Guido Del Toro fundou um orfanato para crianas de origem japonesa na rua Tamandar, em So Paulo. b) Migrao urbana dos japoneses e descendentes e mudanas na sociedade dos japoneses e seus descendentes Dos meados dos anos 30 dcada de 50, durante o perodo que se poderia chamar de "hibernao das religies", ocorreram algumas mudanas importantes na sociedade brasileira e tambm na dos japoneses e seus descendentes, mudanas que provocariam, a partir da segunda metade dos anos 50, a "ressurreio religiosa entre os japoneses e seus descendentes". Algumas dessas mudanas na comunidade de origem japonesa ou entre os japoneses e seus descendentes podem ser consideradas como condies de ressurreio das religies de origem japonesa, como veremos. Com o advento da II Guerra Mundial, o Brasil, que estava fora do palco das aes blicas, teve sua economia beneficiada pela conjuntura, com acentuada alta nos preos do caf e de quase todos os produtos agrcolas. Graas a essa boa conjuntura, os japoneses, cuja maioria se dedicava agricultura, tiveram sua capacidade econmica altamente favorecida e fortalecida. Valendo-se do capital acumulado e dos meios de produo obtidos nesse perodo, alguns passaram de arrendatrios a agricultores independentes; outros se mudaram e passaram a viver em cidades regionais ou em So Paulo. A migrao para a cidade de So Paulo se tornou especialmente intensa a partir da dcada de 50. A principal razo era a educao dos filhos, e essa migrao foi facilitada pela existncia de bairros japoneses e tambm pelo fato de poder contar com a ajuda de parentes e amigos. A situao pode ser ilustrada pelas seguintes cifras: em 1939 apenas 3.467 japoneses e seus descendentes residiam em So Paulo. Cerca de 20 anos depois, eram 62.327, ou seja, cerca de 18 vezes mais. Na dcada de 70, cerca de um tero da populao de japoneses e seus descendentes se concentrava na rea da Grande So Paulo. Naturalmente, esse fenmeno de migrao urbana no aconteceu apenas com os japoneses e seus descendentes. A situao deve ser compreendida dentro do contexto da

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grande onda de migrao urbana verificada a partir dos anos 40 em toda a sociedade brasileira, em decorrncia da industrializao e urbanizao (Quadro 1). A urbanizao trouxe sociedade brasileira grandes mudanas na composio social: uma delas foi a classe mdia; outra o violento aumento das classes baixas. Os japoneses e seus descendentes eram participantes da classe mdia que se expandia. Essa classe mdia podia ser dividida em dois tipos: a dos que possuam meios prprios de produo (antiga classe mdia) e a dos que no os possuam os chamados "colarinhos brancos" (nova classe mdia). Os japoneses e seus descendentes, pelo menos no perodo inicial da urbanizao, ingressaram, predominantemente, na antiga classe mdia. O Quadro 1 mostra a estrutura de classes dos japoneses e seus descendentes em 1958, segundo a diviso em nascidos no Japo e no Brasil. Quadro 1. COMPOSIO SOCIAL DOS JAPONESES E DESCENDENTES RESIDENTES NO BRASIL (SETORES NO-AGRCOLAS) Japoneses Nova Classe Mdia Antiga Classe Mdia Trabalhador Assalariado Total (Maeyama, 1983:62) Por volta do ano de 1958, os isseis, niseis e sanseis pertenciam, predominantemente, antiga classe mdia. Este fato decorre da estratgia adotada de se dedicar s atividades por conta prpria com base no trabalho familiar, valendo-se de pequenos capitais acumulados na agricultura ou em atividades desenvolvidas em pequenas cidades regionais. Houve, de outro lado, japoneses e seus descendentes que se dirigiram para a zona urbana e se tornaram trabalhadores assalariados. So Paulo estava j adiantada em seu processo de industrializao, contando com uma classe trabalhadora, qual foram assimilados. Entretanto, quando os japoneses iniciaram sua migrao para os centros urbanos, j h algum tempo eram moradores da cidade de So Paulo os imigrantes europeus e seus descendentes, que ocupavam o setor industrial, e, em vista da forma de ascenso socioeconmica dos japoneses e seus descendentes, supe-se que no tenham sido numerosos os que foram incorporados a 13% 75% 12% 100% Brasileiros 25% 52% 23% 100% Total 20% 63% 17% 100%

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esse setor. A situao dos imigrantes japoneses da poca, registrada no levantamento de 1958, mostra as profisses ou ramos de atividades mais procurados pelos japoneses e seus descendentes, pertencentes antiga classe mdia: tintureiro, barbeiro, intermedirios de produtos agrcolas, feirantes, etc. Ao conseguir a consolidao dos alicerces econmicos graas irrestrita colaborao de todos os membros da famlia, os descendentes de japoneses passaram a enviar s universidades os irmos e irms mais novos, liberando-os do trabalho braal. Visavam com isso obter status social e conseguir elevar a posio da famlia. Quer dizer: dividiram-se entre irmos as tarefas de ascenso econmica e de ascenso social da famlia, pretendendo-se atingir os dois objetivos pela estreita colaborao e solidariedade de todos (Maeyama, 1987:18). Esta interpretao pode parecer demasiadamente esquemtica, mas o fato que essa diviso de trabalho entre irmos resultou no aparecimento de dois tipos de niseis. Um forma a camada dos intelectuais que "s conversa em portugus, no entende bem a lngua japonesa, e possuidor de valores culturais brasileiros acentuados, e quando tem sentimentos religiosos se aproxima do catolicismo". Tem formao de nvel superior e se dedica profisso liberal ou colarinho-branco. O outro, o irmo mais velho, aquele que se dedica "profisso relacionada, de alguma forma, ao trabalho fsico, apesar de trabalhar por conta prpria", e que "sabe a lngua japonesa e demonstra forte apego viso dos valores japoneses, com forte tendncia participao em religies japonesas. E pessoa que trabalha por conta prpria, em escala de trabalho familiar, na lavoura ou em empreendimento de pequeno ou mdio porte" (Maeyama, 1987:118). Em decorrncia da industrializao e urbanizao brasileiras e das mudanas nas camadas sociais, muitos descendentes de japoneses se tornaram integrantes da classe mdia, sendo que no seio dessa classe mdia, como vimos, se verificou o aparecimento de dois tipos de niseis7. Tanto na zona rural como na urbana, o fato de os descendentes serem educados em ambiente brasileiro e a sensao de perda da ptria pela derrota na guerra fizeram com que comeasse a medrar entre os japoneses e seus descendentes o pensamento de permanncia definitiva no pas. Havia japoneses que falavam de permanncia definitiva neste pas desde os anos 30, mas esse pensamento comea a cristalizar-se entre a maioria dos japoneses e seus descendentes apenas na segunda metade dos anos 40, aps a derrota japonesa.
7 Analisando-se, a partir deste esquema, a tendncia religiosa dos niseis, os pertencentes nova classe mdia se dirigem para o catolicismo e os da "velha classe mdia" pertencem s religies de origem japonesa. Esta interpretao se adequa situao do perodo de ressurreio das religies de origein japonesa dos anos 50. Depois a situao se torna mais complexa, e deve ser compreendida relacionando-a s solues dos problemas nas famlias e maior difuso do individualismo.

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Passaram a ter mais apego aos meios de produo, posio social, bens, etc, adquiridos no Brasil, e, na proporo inversa desse apego, a conscincia de regresso ao Japo foi se enfraquecendo e se inclinando para a eleio deste pas como local de permanncia definitiva. Com essa deciso, uma mudana importante se processa em nvel de conscincia: o surgimento gradativo da conscincia de "famlia" (ie - casa ou famlia). O japons que se decidiu pela permanncia definitiva passa a identificar-se como o "antepassado da famlia". Comea a situar-se, ele prprio, como o antepassado que dever ser cultuado na "famlia", fundada por ele mesmo. As viagens ao Japo pretextando, muitas vezes, visita ao jazigo da famlia se tornaram freqentes a partir da segunda metade da dcada de 60. Essas viagens eram possibilitadas pelo sucesso econmico, mas no deixavam de ter, de certo modo, o objetivo de relatar aos parentes sua inteno de permanecer definitivamente no Brasil. As "colnias", formadas em todas as partes do Brasil no perodo que antecedeu a Segunda Guerra, na sua estruturao tinham como ncleo a associao de japoneses. Vinha de fora porm a orientao global ao nvel de Brasil. Era colocada como imposio de cima, do Japo, tendo como pano de fundo "o pas divino" e "o imperador do Japo". Os representantes dessa estrutura que integrava os imigrantes eram chamados de "Trs Famlias" (Go sanke), constitudas pelo Consulado Geral do Japo em So Paulo, a Kaigai Kgy Kabushiki Kaisha (Empreendimentos Ultramarinos S.A.) e a Bunky Fukyukai (Associao de Difuso do Ensino). "Assim, cada um dos imigrantes, atravs da associao dos japoneses estabelecida na comunidade, e por via das 'Trs Famlias' de So Paulo, estava simbolicamente ligado ao imperador do Japo. Quer dizer que a postura espiritual do imigrante mdio e a estrutura social do grupo de imigrantes mantinham certo tipo de harmonia que lhe proporcionava estabilidade" (Maeyama, 1982b:140-l). Com o Japo em guerra, a citada "classe dominante" partiu no navio de troca do pessoal do corpo diplomtico e pessoas afins, provocando, do dia para a noite, o desmoronamento da estrutura social existente. Entretanto, o universo simblico que existia no se altera to simplesmente. Assim, logo aps o trmino da guerra, os japoneses ficaram com a sensao de existncia de uma grande vala entre a sua mundiviso e a realidade e colocados num estado de perda de significado. A ascenso econmica e social, a urbanizao, a vocao para a classe mdia, o surgimento do pensamento da permanncia definitiva, o comeo da conscincia de "famlia", a distncia entre a realidade e o mundo simblico, etc, que comearam a aparecer a partir dos,anos 40, constituem, no nosso entender, o pano de fundo social motivando a "ressurreio das religies japonesas", que se inicia a partir da segunda metade

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dos anos 50. (Quanto s mudanas sociais a partir da segunda metade dos anos 60, sero referidas mais adiante.) 4. Perodo. poca Urbana Ressurreio das Religies Japonesas e seu Desenvolvimento Posterior "O imigrante, quando abandonou o 'Japo', levou e reteve dentro de si a religio japonesa" (Maeyama, 1987:12). a) Situao religiosa da sociedade de origem japonesa nos anos 50 Tentaremos fazer, a partir dos dados da dcada de 50, um ligeiro retrospecto da situao das religies da sociedade de origem japonesa. Quadro 2. RELIGIES DOS DESCENDENTES DE JAPONESES SEGUNDO ZONA URBANA-RURAL (%) Brasil Rural Religio japonesa tradicional Catlica (Brasil) Outras (CRCJ, 1964) Pelos dados acima, a proporo dos seguidores das religies japonesas tradicionais se iguala, praticamente, dos fiis da igreja catlica. Reflete a situao da composio percentual da populao por gerao e poca (ainda era elevado o percentual de isseis) e o nmero elevado de niseis cujo batizado enquanto criana era aceito como prtica social. Dados da poca mostram que 35,8% dos catlicos descendentes de japoneses eram da faixa de 10-14 anos de idade. As razes de converso ao catolicismo nessa faixa etria eram: "os pais seguiam o budismo mas batizavam o filho para que ele no fosse colocado em situao de inferioridade na escola"; ou pediam a um brasileiro que se tornasse padrinho de seu filho para beneficiar suas atividades econmicas. A converso no resultava propriamente de convico religiosa. O fato de as converses se darem, em muitos casos, por convenincia social e prtica explica, de certa maneira, por que os descendentes de japoneses no se tornaram fiis ardorosos. E isso explica, de certo modo, por que, nessa poca, no se desenvolveu o estreito relacionamento social que prprio do sistema de compadrio, entre compadres e entre os padrinhos e afilhados de origem japonesa. Gamou (1957), pelos resultados da pesquisa sobre assimilao dos japoneses e descendentes realizada em 44,5 42,8 12,7 50,1 36,5 13,4 Urbana 37,9 50,3 11,8 Sao Paulo 37,7 48,7 13,4

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ncleo colonial da regio amaznica, assinala que, apesar de os japoneses e descendentes aceitarem, ativamente, as religies de origem brasileira, isso no implicava, diretamente, mudana de conscincia. Estudando a correlao existente entre o catolicismo e o grau de escolaridade, Izumi (1954:78-9) aponta a tendncia de que "quanto mais elevada a escolaridade, mais profunda se torna a crena no catolicismo, tornando-se, cada vez mais, portador de cultura catlica". A situao das religies na zona urbana e rural contrastante, com maior ndice das religies japonesas tradicionais na zona rural (50,1%) e maior nmero de catlicos na parte urbana (50,3%). de se apontar que na zona urbana havia maior concentrao de niseis, que demandavam as cidades para freqentar as escolas ou procura de empregos. Na zona rural, as exigncias ntimas frente s religies inclinaram, principalmente, nos ncleos coloniais, para as seitas de origem japonesa. A elas se organizaram mais ativamente, como por exemplo as igrejas budistas, devendo-se destacar o fato de que as foras controladoras por parte da famlia e da comunidade eram mais fortes. A seguir, examinaremos a situao religiosa dos japoneses e descendentes segundo as geraes, em 1958: Quadro 3. RELIGIES DOS DESCENDENTES DE JAPONESES SEGUNDO GERAES Japoneses Religio japonesa tradicional Catlica Outras (CRCJ, 1964) O quadro indica que entre os isseis a proporo dos seguidores das religies trazidas do Japo, por exemplo, o budismo, que se relaciona com o culto da "famlia = antepassado", elevada, mas, medida que avanam as geraes, as mudanas para o catolicismo se acentuam. Vejamos os dados obtidos pelas pesquisas levadas a efeito por Izumi nas regies Sul e Amaznica (uma das poucas de que temos conhecimento) levando em conta a existncia ou no de oratrio xintosta e budista nos lares. No Sul, 40,6% das casas no tinham oratrios, o mesmo acontecendo com 78,3% na regio amaznica. Mesmo possuindo oratrio, 17,7% no realizavam qualquer tipo de culto, sendo de 7,9% o mesmo tipo de comportamento na regio amaznica. Assim, a prtica xintosta deixou 70,6 15,5 13,9 Nisei 29,2 58,7 12,1 3-4sei(%) 19,0 70,0 11,1

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de existir em 58,3% no Sul e 86,2% na regio amaznica. Quanto s casas que no possuam oratrio budista, eram 17,9% no Sul e 47,1% na regio amaznica. Casas que, apesar de contarem com oratrios budistas, no realizavam qualquer tipo de culto budista eram: 8,2% no Sul e 6,8% na regio amaznica. Isso quer dizer que a crena formal no budismo desaparece em 26,1% no Sul e 53,9% na regio amaznica (Izumi, 1954:108-9). De acordo com esses resultados, a tradio budista mais bem conservada do que o xintosmo. O Prof. Izumi supe que isso se deva ao fato de que o objeto do culto algo indefinido no xintosmo, enquanto que no budismo mais concreto, mais prximo dos fiis e, portanto, mais forte o seu apelo. Achamos que esses dados podem ser interpretados atravs da conscincia da "famlia" e do culto ao antepassado que a acompanha, surgidos depois da II Guerra Mundial. Enfocando-os como exteriorizao da conscincia da "famlia", pode-se dizer que os cultos aos antepassados so praticados em mais de 70% no Sul; na regio amaznica so adotados por quase metade dos lares. b) Sucinta exposio sobre as religies de origem japonesa a partir da dcada de 50 Passaremos a expor os trabalhos de difuso das religies japonesas que se ativaram a partir dos anos 50 e a situao de cada uma delas, dividindo-as em budistas, xintostas e outras 8 . Um dos fatores que contriburam diretamente para o incremento das atividades das entidades religiosas de origem japonesa foi a comemorao dos 400 anos da fundao da cidade de So Paulo, ocorrida em 1954. Nessa ocasio, visitaram o Brasil o lder da Tenry-ky e o patriarca da Nishi-Honganji. Ao mesmo tempo, a igreja catlica tomou uma posio crtica, severa, em relao ao budismo. Um catlico, por exemplo, se manifestou da seguinte maneira: "No Brasil, pas democrtico, a liberdade de religio reconhecida por lei, mas o sentimento nacional repele o avano de religies estranhas. No respeitar esse sentimento nacional, e alegando a liberdade assegurada por lei para trazer as religies estranhas e ir s vias pblicas para fazerem sua propaganda ostensiva, desconsiderar o sentimento nacional dos brasileiros, e quando foram os niseis, j batizados, a se converterem, se torna um desafio igreja catlica" (Shinjiro Aoki, 1958 - "Movimento dos 50 anos do catolicismo na colnia" - Akeno-hoshi - Centro Catlico Japons).
8 Nakamaki, na tentativa de interpretar esse sucesso do Seich-no-ie entre os brasileiros, lana mo da teoria da civilizao, associando-o ao gosto do brasileiro e a sua carncia de ortodoxia, e formula a hiptese de que civilizao de "fuso", como a brasileira, se adequa melhor uma religio resultante de fuses (Nakamaki: Anurio dos Estudos Religiosos da Universidade de Tokyo. II, 1985).

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BUDISTAS

Quase todas as seitas budistas iniciaram seus trabalhos sistemticos de proselitismo na dcada de 50. Jdo Shinshu Honganji (Honpa Honganji) j tinha comeado o seu trabalho desde antes da guerra pela atuao de fiis mais dedicados, mas o incio oficial dos trabalhos se deu em 1954, quando seu patriarca veio ao Brasil por ocasio das comemoraes do 4. centenrio da fundao da cidade de So Paulo. A seita Shinshu-Ohtaniha declarou abertos os trabalhos de difuso de seus ensinamentos quando, em 1952, o patriarca da Higashi Honganji veio ao Brasil. Presentemente, a Honpa Honganji Organizao da Amrica do Sul possui 32 templos, e a seita Shinshu-Ohtani-ha Organizao da Amrica do Sul conta com 15 templos. A Jdo-shu e a Nichiren-shu iniciaram os trabalhos em 1954. A St-shu inaugurou em 1955 sua sucursal da Amrica do Sul e, atualmente, conta com quatro templos, localizados em So Paulo, Mogi das Cruzes, Rolndia, PR, e Ipirs, ES, contando com cerca de 300 famlias de seguidores entre japoneses e descendentes. A Shingon-shu estabeleceu, j no ano de 1939, a sucursal brasileira da Kyasan Taishi Kykai (Kowyama, 1949:384). Essas seis seitas integram, presentemente, a Federao do Budismo do Brasil (fundada em 1958). Esta Federao realiza, todos os anos, no fim de semana mais prximo a 8 de abril, data do nascimento de Buda, a festa das flores, com programas variados e tambm visitas s entidades beneficentes e viagens para locais do interior com o objetivo de ampliar os trabalhos de divulgao dos ensinamentos (por ocasio da fundao, a Honmon-Butsuryu-shu participou dessa Federao, mas logo se desligou). A Nichiren Shshu do Brasil (NSB) antes de 1960 contava apenas com atividades limitadas s famlias dos adeptos, que recebiam jornais e publicaes do Japo. Em 1960, com a organizao da SGI (Ska Gakkai Internacional), a abertura dos trabalhos em mbito internacional, e a vinda do presidente da entidade, Daisaku Ikeda, ao Brasil, foi grandemente ativado o trabalho de divulgao de seus ensinamentos neste pas. Em 1964, foi feito seu registro como entidade religiosa com a designao de Sociedade Religiosa Nichiren Shshu do Brasil. Conta atualmente com cerca de 200 mil adeptos, e o corpo principal dos adeptos, a associao dos fiis, congrega cerca de 30 mil pessoas. A proporo de adeptos descendentes e no-descendentes de 4:6, predominando os fiis no-descendentes. Como templo da NSB localiza-se em So Paulo o Ichij-ji, contando com 22 sucursais localizadas nas principais capitais e outras cidades dos estados. A Tendai-shu no desenvolve atividade organizada para a ampliao de sua seita, mas possui dois templos que seguem sua orientao,

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localizados, ambos, em Diadema, subrbio de So Paulo. Um deles est ligado ao Sens-ji, e denominado Brasil Kannon-jiin. Construdo em 1952, especializou-se em encantamento e rezas. Incorporando em suas prticas o rito da travessia do fogo, o culto a Konpira e a adorao a Nossa Senhora da Aparecida, conta com um nmero elevado de adeptos nodescendentes (Maeyama, 1983:225-35). O outro templo foi fundado por uma mdium muito ligada a Kihara Fudson (Tendai-shu Chju-ji, localizado em Tomiai-cho, Shimomashiki-gun, Kumamoto-ken). Essa mdium iniciou suas atividades em 1961, e em 1972 construiu a Tendai-shu Jgan-ji Fudsho em Diadema. Da linhagem do budismo podem ser citados ainda: Chusan-ShingoShshu-Namufud-Shinrei-kai, de Jundia, Kenpon Hokke-shu, de So Paulo, Jdo-Shinshu-Shinran-kai, Shinrei-ky, Kegon-shu-Fudmy-Heich-ji, Daigo-san Sanp-in Shugend, Shrei-kai, Namikiri-Fud, Agan-shu.
XINTOSTAS

As organizaes religiosas e os templos xintostas podem ser classificados em trs grupos: ao primeiro grupo pertencem os templos erguidos pelos imigrantes nas colnias construdas pelos japoneses e seus descendentes. Eqivalem, por assim dizer, s "deidades da aldeia" existentes nas comunidades de aldeia no Japo. Podem ser citados os templos erguidos em Bastos e na Colnia Fuji, perto da cidade de Bauru, onde o bicho-da-seda alvo de culto (Sanso jinja), "Dois Galhos jinja" construdo em Monte Alegre, PA, no ano de 1958, e tambm o "Brasil Ishizuchi jinja", construdo em 1961, na Colnia Shikishima, em Suzano. H notcias de que foram construdos templos xintostas tambm nas colnias de japoneses nos estados do Amazonas e Mato Grosso (Maeyama, 1983:185). Ao segundo grupo pertencem aquelas seitas fundadas por mdiuns (na maioria mulheres) que fizeram sincretismo das tradies das crenas japonesas com religies brasileiras e que se localizam nas zonas urbanas. So, por exemplo, a Iwatojinja (intitula-se Kami-noya yaororozu-kyo e presta culto a Brasil Daijingu), constituda em Aruj, SP, no ano de 1966; Inari-kai, que cultua Inari, fundada na mesma poca; a Shindo yamato-kyo Daijinmyogu, da linhagem do Templo de Ise, inaugurada por uma nisei do interior do Estado de So Paulo; a Hakko daijin-gu, instalada na cidade de So Paulo em 1980. Essas organizaes realizam a "salvao dos homens" pela prtica de rezas, de purificao, de imprecao, libertao dos maus espritos, etc, isto , atendimento de pessoas com problemas pelo exerccio do exorcismo atividades religiosas. Pertencem ao terceiro grupo as organizaes religiosas xintostas que vieram diretamente do Japo. Yasukuni-k desenvolve suas ativi-

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dades desde 1949, dedicando-se, em So Paulo, Marlia e em mais de dez outras localidades, ao culto dos mortos na guerra, que so considerados "deidades", e tambm tem o objetivo de dar apoio ao Yasukuni-jinja, do Japo. O Nanbei Daijin-gu, que pertence linhagem de Ise-jingu, vem, desde 1978, com o patrocnio da Associao dos Lojistas da Liberdade, realizando, todos os anos, no dia 30 de junho e 31 de dezembro, o ato divino de "chi-no-wa". E a partir de 31 de 1979, foi instalado dentro da sede de Kagawa kenjin-kai, em So Paulo, o Konpirajinja, que realiza, todos os anos, festas bem animadas (Nakamaki, 1989:395).
SEITAS DIVERSAS

Das seitas que se classificam neste grupo, j tivemos a oportunidade de fazer referncias a Omoto Nanbei-shukai (1924), a Tenry-kyo (comeo de 1930), a Seich-no-i (1932). Outrossim, a organizao PL, que vem desenvolvendo atividade intensa desde 1957, e Rish ksei-kai, que veio para o Brasil em 1971, sero tratados parte. Aqui vamos fazer, apenas, sucinta referncia a Sekai kyusei-kyo, Reiyu-kai, Sekai Mahikari Bunmei kyodan (atual Suk Mahikari). Os trabalhos de divulgao da seita pelo Sekai Kyusei-kyo se dividem em "poca de desbravamento", que antecede abertura da sede, verificada em julho de 1965, e a "poca de trabalho organizado", a partir desse ano. Na "poca de desbravamento", o trabalho foi iniciado a partir de 1955, quando os imigrantes-adeptos, chegados do Japo, passaram a trabalhar junto de japoneses e descendentes nas cidades de Belm e So Paulo, de maneira que em 1965 j havia cerca de dez sucursais. A partir de 1965, os trabalhos de divulgao da seita se concentraram na "purificao d'alma" e nos documentos de difuso dos ensinamentos por meio da lngua portuguesa.Sua revista mensal, Jornal Messinico, tem a tiragem aproximada de 90 mil exemplares, estando o nmero de adeptos em redor de 150 mil pessoas. Aproximadamente 97% dos seguidores so de no-descendentes. Presentemente, h 141 sucursais em todo o territrio nacional, 80% das quais so dirigidas por no-descendentes. Trabalham como pregadores 257 pessoas. Conta com a Fundao Messinica, que desenvolve variadas atividades artstico-culturais que contribuem para a promoo da seita, bem como para a conquista de adeptos. Est construindo, agora, o "Reino do Cu na Terra", em Guarapiranga. A vinda de Toku Suzuki ao Brasil, no ano de 1969, foi muito importante para a Reiyu-kai, que foi registrada em 1975 como entidade religiosa. Enquanto quase todas as entidades religiosas mencionadas neste trabalho escolheram So Paulo como principal ponto de apoio de sua atuao, Reiyu-kai elegeu como principal rea de atuao o Estado do Paran. Esta seita est presentemente trabalhando na sua difuso ado-

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tando a prtica do budismo em famlia, o culto aos antepassados, tanto consangneo como colateral, e enfatiza como importante o desenvolvimento prprio, pessoal. Em 1979, inaugurou sua sede geral para a Amrica do Sul. Atualmente o nmero total de seus adeptos de 50 mil (scios) e a proporo entre descendentes e no-descendentes de 4:6. Em 1976 foi publicado o jornal Reiyu-kai do Brasil, em japons e em portugus, mas a partir de 1985 editado somente em lngua portuguesa. Suk Mahikari foi estabelecida em maro de 1974, e j conta com algumas dezenas de milhares de adeptos. Na cidade de So Paulo, a proporo de adeptos de origem japonesa elevada; nas demais regies o percentual de crentes no-descendentes maior. A GLA (God Light Association) fundou, em 1977, a GLA do Brasil. A Seimei-kyo est desenvolvendo atividades de difuso de sua doutrina principalmente com a participao de seus adeptos. A Konk-kyo desenvolve suas atividades principalmente em Birigi, Estado de So Paulo, mas j possui pontos de apoio na cidade de So Paulo e em Ariquemes, Estado de Rondnia. Kurozumi-kyo tambm est presente, mas no desenvolve trabalho ativo de difuso. c) Caractersticas dos trabalhos de difuso das religies japonesas a partir dos anos 60 Quadro 4. EVOLUO DAS FORAS DAS PRINCIPAIS RELIGIES JAPONESAS 1968/1988 N. de adeptos Descendentes No-descendentes 1968 1988 1968 1988 1968 1988 (1000) (%) (%) Tenry-ky Seich-no-i Sekai Kyusei-kai PL Nichiren shshu (Ska-gakkai) 4 15 7 10 20 10 2.400 153,8 30 200 100 99 40 90 100 99 15 3 10 40 0 1 60 10 0 1 85 97 90 60

Obs.: Os nmeros se referem: PL adeptos ativos; Seich-no-i calculados a partir da venda das publicaes doutrinrias. Se forem includos os simpatizantes, esse nmero sobe para 300 mil. Os dados referentes a 1988 foram obtidos por Mori.

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A principal caracterstica das religies de origem japonesa na dcada de 60 era, com exceo da Sekai Kyusei-ky: seus seguidores eram constitudos, praticamente, apenas de japoneses ou seus descendentes. Isso se deve, antes de mais nada, ao fato de que as organizaes no estavam estruturadas para trabalhar com os no-descendentes. As condies de desenvolvimento de trabalho no haviam sido preparadas. Nessa poca, com exceo da Kyusei-kyo, no havia sido tentado o trabalho de divulgao dos ensinamentos das seitas junto a no-descendentes. Na Tenry-ky a conquista de adeptos se inicia com a "ajuda" (otasuke) e se transmitem os ensinamentos pelo que se designa como "nioigake", isto , frente a uma situao crtica de famlia, como, por exemplo, doena ou morte. Uma vez obtida a adeso, ento se parte para a conquista dos familiares por intermdio da rede de famlia. Assim, enfatiza-se a expanso da religio dentro da famlia, colocando-se maior fora na "difuso da seita no sentido vertical". Na Tenry-kyo, a estratgia da ampliao da seita tem sido a de transmitir os ensinamentos de japoneses para os descendentes, de pai para filhos. A PL tambm passa, a partir dos meados dos anos 70, da fase da difuso dos ensinamentos para a fase de ensino doutrinrio, deslocando o centro de gravidade da atuao para horizontes mais amplos, j que, at ento, atuava principalmente entre os japoneses e seus descendentes. Mais do que a falta de organizao por parte dessas entidades religiosas para trabalhar na ampliao do seu crculo de adeptos, o fato de visarem especificamente o pblico japons se deve sobretudo forte vontade e desejo existentes no seio da comunidade japonesa de atuar nesse sentido. Segundo Izumi (1954:78), na poca, isto , na primeira metade dos anos 50, a Seich-no-i estava penetrando rapidamente na sociedade japonesa do Brasil, o que o prprio Izumi explica: "que a Seichno-i est substituindo o 'esprito japons' (Nihon Seishin), um dos pilares espirituais da colnia de origem japonesa durante e no ps-guerra". Isso significa que as religies de origem japonesa no caso especfico a Seichno-i estariam exercendo o papel de preencher a lacuna entre a realidade e a viso do mundo. Os ensinamentos da Seich-no-i, de fato, enfatizam os valores japoneses, sendo o povo e a cultura japonesa embelezados nacionalisticamente. Essa enfatizao no era exclusiva da Seich-no-i. Era comum grande maioria da religies de origem japonesa. d) Mudanas na sociedade brasileira a partir dos anos 60 Examinando-se a situao a partir dos anos 60, conforme se pode constatar no Quadro 4, com exceo da Tenry-ky, todas as seitas aumentaram com sucesso o nmero de seus adeptos, entre os no-descendentes.

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Quais as razes desse sucesso? O primeiro aspecto favorvel est relacionado s mudanas da sociedade brasileira que tiveram incio na segunda metade dos anos 30 e se aceleraram no ps-guerra. O segundo diz respeito ao posicionamento das organizaes religiosas de origem japonesa no trabalho de difuso de suas seitas. O Brasil, ao saltar da economia de monocultura diretamente para a fase de industrializao, assistiu rpida urbanizao, com migrao macia dos camponeses. Especialmente as cidades de So Paulo e Rio de Janeiro se expandiram com espantosa rapidez com essa migrao interna. Examinando-se a evoluo das populaes dos oito maiores municpios brasileiros no perodo de 1940-50, 84% do aumento populacional se deveu migrao interna (Durham, 1978:28). Ainda segundo pesquisas de 1968, o fenmeno da migrao interna continuou, por exemplo, na cidade de So Paulo, onde 61,6% da populao tinha vindo de fora. Como fenmenos que acompanham essas migraes urbanas, geralmente so citados o desaparecimento e/ou enfraquecimento do grupo familiar ou de vizinhana, o aparecimento da secularizao, o individualismo e o anonimato (Wirth, 1949; Park, 1925; Refield, 1949; Durham, 1979, etc). A industrializao e a urbanizao provocaram na zona urbana a diversificao profissional e o aumento das oportunidades de trabalho. A classe mdia, que existia em pequeno nmero desde o comeo do sculo XIX, se multiplicou. Correspondendo a essa expanso, no perodo que vai da segunda metade dos anos 60 para os anos 70, a nuclearizao da famlia no Brasil avanou rapidamente em forma linear (Velho, 1981:75, etc). As famlias dos moradores da zona urbana no Brasil so na maioria de classe mdia; as grandes famlias, com exceo de parte da classe alta e da classe baixa, foram substitudas pela forma de famlias nucleares. Pela rapidez com que se deu o surgimento da classe mdia urbana e a nuclearizao, ocorreram muitos problemas e dilemas. Por exemplo, a classe mdia procura conservar os valores e atitudes da classe alta tradicional, mas como lhe faltam bases econmicas necessrias sua manuteno, isso se torna difcil; o marido brasileiro possui, arraigado, o sentimento de machismo, um dos valores tradicionais da sociedade brasileira, e pensa que a mulher deve ser obediente e permanecer no lar, mas a fragilidade econmica produz a necessidade do trabalho da mulher fora do lar, impondo um relacionamento diferente da relao tradicional do casal, e a adaptao a essa nova relao (Wagley, 1963:112-3). Outrossim, na regio urbana surgiram diversos tipos de profisso, que implicaram o aparecimento de problemas de adaptao s novas relaes humanas no local de trabalho e tambm s prticas profissionais, e, nesse processo, tornou-se necessria a procura de novos valores e atitudes (Nakamaki, 1989:427-31; Wagley, 1968).

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Os estudos sobre famlias no Brasil a partir dos anos 70 nos mostram que, apesar de serem famlias nucleares, verificam-se diferenciaes dentro de uma mesma camada social, nos estilos ou estratgias de sobrevivncia, etc. A difuso do individualismo acarreta diversificao nos pensamentos relativos ao estilo de vida, trazendo, em conseqncia, a procura de formas diversas de famlia (Salem, Velho, etc). O Brasil, mesmo em 1980, tinha uma populao de 90% de catlicos, com uma base muito forte, mas ao mesmo tempo uma aceitao ampla de pentecostais e religies afro-brasileiras. O protestantismo aceito pela classe mdia, surgida como resultado da mobilidade social. Isso porque o protestantismo "exige dedicao ao trabalho, proibe a bebida, o jogo e o sexo extra-marital, alto nvel de moralidade... atribuio de importncia educao dos filhos", possibilitando novos valores e dignidade para o sucesso dos integrantes da classe mdia, que interromperam os liames familiares, migraram para a cidade e abandonaram as relaes com a igreja catlica (Wagley,1971:120). As religies afro-brasileiras, modificando suas organizaes, as doutrinas, os corpos de adeptos e as relaes com a sociedade mais ampla, foram sendo aceitas pelas populaes de origem no-africana. Assim, na situao atual, dificilmente se pode dizer que o Brasil possui uma base religiosa uniforme. E nessa situao, com esse pano de fundo, que as religies de origem japonesa foram sendo aceitas pela sociedade brasileira. e) Situao das seitas de origem japonesa Se essa situao favoreceu a aceitao das religies de origem japonesa, isto no quer dizer que todas elas conseguiram a adeso de nodescendentes. A partir da segunda metade dos anos 60, as religies de origem japonesa podem ser agrupadas em dois blocos, quanto a sua penetrao no seio da populao brasileira. De um lado esto as seitas que conseguiram romper a barreira da etnicidade e obtiveram sucesso em conquistar seguidores entre os no-descendentes; de outro, as seitas ou organizaes religiosas que, apesar do desejo de conseguir a adeso de no-descendentes, no superaram as barreiras da etnicidade, ou, ainda, aquelas que no visaram ou no visam trabalhar junto da populao de no-descendentes. Pertencentes ao primeiro grupo, podem ser enumeradas as seitas como Seich-no-i, Igreja Messinica, PL, Nichiren Shshu, Suk Mahikari. Ao segundo grupo pertencem a Tenry-ky, Rish Ksei-kai, e as seitas budistas tradicionais (note-se que algumas seitas, atravs do zen-meditao, tm aceitao pela camada intelectualizada de no-descendentes). O aparecimento de tais diferenas pode ser atribudo a diversos fatores como: contedo da doutrina, estratgia de difuso, poca

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de sua vinda ao Brasil, etc. Vamos citar a Seich-no-i e a PL como exemplos das seitas bem-sucedidas na conquista de adeptos no-descendentes.
SEICH-NO-I

A Seich-no-i iniciou suas atividades de difuso na dcada de 30, no interior do Estado de So Paulo. No ps-guerra, na funo de substituir o "esprito japons" conseguiu captar, com muita rapidez, os japoneses e seus descendentes como seguidores. Ela modificou radicalmente as diretrizes de seu trabalho de difuso no perodo de 1966-68, elegendo como alvo de trabalho doutrinrio os brasileiros no descendentes. A partir dessa mudana, em 1966 foi instalado o Departamento de Trabalho Doutrinrio em Lngua Portuguesa, e a partir do ano seguinte a revista de divulgao Acendedor foi modificada, destinando-se aos brasileiros em geral em vez de s-lo para os niseis. Acompanhando essas transformaes, em 1967-68 comearam a surgir reunies de leitura e estudo dessa publicao, organizadas para os no-descendentes. Em 1988, 85% dos adeptos so de no-descendentes. A Seich-no-i, na sua estratgia de expanso adota o lema: "Seichno-i no religio: trata-se de filosofia", possibilitando que os nodescendentes continuem catlicos e passem a seguir os ensinamentos da seita. Ao proporcionar nova interpretao do cristianismo, conseguiu faz-los entender que a Seich-no-i "tinha um sentido de movimento renovador, sendo, pois, uma forma de existir dentro do quadro amplo do cristianismo". Neste ponto, a doutrina da Seich-no-i difere da que se apresenta aos japoneses e descendentes. Para estes, ensina que "a entrada a Seich-no-i tornar-se bom japons ou descendente, um homem melhor", e para os brasileiros "melhores catlicos". Assim, se procura nova interpretao das doutrinas catlicas, preenche as dvidas e falhas, e resolve as insatisfaes com a maneira de ser da igreja catlica brasileira. Esta dualidade existe tanto nas organizaes e ritos, como no aspecto doutrinrio. Por exemplo, dentro do rito central de viso de deidade, durante o processo cantado o "cntico da evocao da deidade", sendo que para os japoneses-descendentes se tenta fazer com que apreendam por intuio metanatural, atravs da deidade, que o centro do mundo o Japo, e que o centro do Japo o imperador, e que o Japo o pas divino. Em contraposio, para os brasileiros, os conceitos formados pela tradio japonesa so traduzidos pela tradio crist, e assim cantado (Maeyama, 1987:13-7). No caso da Seich-no-i, acompanhandose a mudana das diretrizes de difuso da seita, verifica-se uma passagem rpida para o uso da lngua portuguesa; eliminao da concorrncia com o catolicismo; flexibilidade na interpretao da doutrina (diferena dos

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ensinamentos para os descendentes e para os no-descendentes); diferena nas respectivas organizaes. Com isto houve condies de a seita ser difundida no s entre os japoneses e descendentes como entre brasileiros no-descendentes.
PL (PERFECT LIBERTY)

Quanto a PL, os dados de 1968 indicam que do total de adeptos, 8090% eram japoneses e descendentes. Em 1988 os dados mostram que mais de 90% so de no-descendentes, demonstrando grande mudana na situao. Os trabalhos de difuso da seita no Brasil foram iniciados na cidade de So Paulo. Posteriormente, esses trabalhos podem ser divididos em duas pocas: a poca em que o trabalho de difuso da seita se apoiava no "oyashikiri", e a poca em que o centro de gravidade foi deslocado para a doutrinao. Essa passagem, que se deu na segunda metade dos anos 60, pode ser sucintamente explicada da seguinte maneira: a crena de que doenas e dores eram milagrosamente curadas pelo "acontecimento divino de Oyashikiri" foi substituda pela pregao tica como soluo para os sofrimentos da vida cotidiana. As crenas no milagre por exemplo, o "otazuke" da Tenry-ky, a "limpeza do esprito" da Sekai Kyusei-ky, "ato divino da colocao da mo" da Mahikari, etc. foram recursos utilizados no incio para ampliao da fora da seita. Entretanto, contrastando com a fixidez dos crentes da Tenry-ky, era impossvel a continuidade da f baseada somente no milagre, e era muito elevada a fluidez dos adeptos. No caso da PL, um fator dessa mudana foi a necessidade de se ligar a crena do milagre tica da vida. As novas religies do Japo j tinham sofrido antes de sua vinda para o Brasil o processo de modernizao do Japo, e tinham sido muito exigidas no que diz respeito a suas feies ticas. Digamos que j haviam sido testadas nesse aspecto. A PL conseguiu despertar o interesse no s dos japoneses e seus descendentes, mas tambm dos no-descendentes, pela crena do milagre, e posteriormente adaptou, no Brasil, que se encontrava em meio ao processo de modernizao, o "know-how" forjado no processo das mudanas sociais modernizantes do Japo. Concretamente falando: em forma de tica da vida na famlia nuclear, tica profissional e do local de trabalho, tica da cidadania, oferecendo-as ao processo de adaptao da classe mdia urbana que estava procura de novas atitudes e valores. Nesse ponto, a mesmo pode ser dito em relao a Seich-no-i, que se autodefinira como "tica de vida". E, para a exposio de tais ticas de vida, foram tomadas diversas medidas de "localizao" no aspecto doutrinrio. Eram mudanas diversas, objetivando o trabalho de doutrinao por meio da lngua portuguesa. Na prtica, era a formao de mestres-pregadores exmios na lngua portuguesa, e as tradues para o

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vernculo das doutrinas e publicaes. Especial ateno foi dispensada traduo: no se tratava de transliterao pura e simples para o portugus. Foram tomados cuidados para adaptar-se ao contexto brasileiro. Este tipo de "localizao" se estende aos ritos e s atividades cotidianas. Por exemplo, a igreja da Liberdade institui o dia da feijoada mensal. Realizada no ltimo domingo de cada ms, serve para ajudar suas finanas. Realiza, tambm, ativamente, as festas juninas (Nakamaki, 1989: 411-52). Como aconteceu com a Seich-no-i, a PL, ao passar da difuso da seita para a doutrinao, mudando rapidamente sua estratgia, tratou de organizar o ensino doutrinrio por meio da lngua portuguesa e de adaptar os ritos e princpios doutrinrios s necessidades locais, conseguindo, com isso, a penetrao no seio da comunidade de no-descendentes. Em contraposio aos exemplos citados esto a Tenry-ky e Rish Ksei-kai, como exemplos de seitas japonesas que ainda no tiveram penetrao entre os no-descendentes.
TENRY-KY

O trabalho de divulgao da Tenry-ky no Brasil foi iniciado no interior do Estado de So Paulo, onde em 1937 j contavam nove templos da seita. A organizao para integrao dos fiis teve suas bases aliceradas em 1941. A Tenry-ky, semelhana da PL, na fase inicial do seu trabalho de divulgao, valeu-se da crena do milagre chamado "otasuke" (ajuda) para a ampliao de sua influncia. Entretanto, no caso da Tenryky, diferentemente da PL, o ndice de fixao dos fiis foi elevado. Uma vez se tornando fiel, entre o "otasuke" e a pessoa que o concedeu se estabelece uma relao religiosa de aspecto paternal-filial, chamada "relao de pai-filho de princpio", e em torno dessa relao se estrutura uma relao de direitos e deveres diversos. O estabelecimento desse tipo de relao pai-filho em nvel religioso consolida relaes estreitas entre os seguidores da seita. A Tenry-ky tinha, como a PL, grande interesse na ampliao de sua influncia, mas no que tange aos mtodos havia uma grande diferena. Na Tenry-ky a crena de pai para filho era encarada como muito importante em razo do que se enfatizava a "difuso vertical do ensino". Concomitantemente passagem da crena de pai para filho, eram trabalhadas as pessoas dentro da rede social de parentesco para a obteno de adeptos. Como na Tenry-ky, os adeptos pertenciam a um templo, os "pais e filhos de princpio" tinham de pertencer a um mesmo templo. Com isto, um templo de Tenry-ky passa a apresentar o aspecto de uma "Grande Famlia". Essa estratgia da Tenry-ky contribuiu para a fixidez e solidariedade entre os seus seguidores e foi tambm a estratgia que permitiu a ampliao dos seus quadros de seguidores firmes e certos. Examinando-se os seguidores dessa seita quanto s profisses e

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camada social, constata-se que muitos se dedicam tinturaria e trabalho por conta prpria. Em geral, so possuidores de um sistema de valores japoneses, que se manifestam, por exemplo, na escolha de cnjuge, de preferncia descendentes de japoneses. Da sucesso na crena religiosa, decorre maior tendncia de o filho associar-se ao empreendimento do pai. Entre os filhos de mais idade, a aceitao da Tenry-ky era relativamente mais fcil, mas os filhos dos seguidores da Tenry-ky que conseguiram escolaridade mais elevada e adquiriram um maior grau dos valores brasileiros apresentaram a tendncia de no seguir a crena da Tenry-ky. Isso significa que o mtodo da Tenry-ky, que prope a "difuso vertical dos ensinamentos", foi bem-sucedido em parte, no conseguindo porm a ampliao da seita na progresso geomtrica. Pela prpria natureza do processo de difuso, bastante difcil conseguir adeptos no descendentes. Na Tenry-ky, como aconteceu com a PL e a Seich-no-i, foi tentada a transformao do ensino e da divulgao da seita por meio da lngua portuguesa, mas seu objetivo visava primordialmente a continuidade do ensino e a difuso da seita entre niseis e sanseis. Assim, diferentemente da PL e da Seich-no-i, no se fizeram tradues com preocupao de "localizao" ou adaptao s condies brasileiras. Mesmo os ritos, nos seus aspectos formais, so praticamente idnticos aos do Japo. A Tenryky no se ope difuso entre os no-descendentes, mas na prtica isso vem sendo dificultado pelos fatores mencionados.
R1SH KSEI-KAI

Vamos examinar, a seguir, a Rish Ksei-kai. A seita iniciou suas atividades em 1971, em So Paulo, quando foi enviado do Japo um pregador. Esta seita adota a estratgia de difundir seus ensinamentos procurando pessoas ligadas por consaginidade ou por serem conhecidas pelas relaes estabelecidas em alguma localidade, a fim de proporcionar-lhes os ensinamentos atravs de "michibiki" (conduo). Em 1983, o nmero de fiis era da ordem de 1.500, sendo 99% dos adeptos japoneses ou seus descendentes. As pregaes em portugus, como acontece com a Tenry-ky, se destinam a niseis e sanseis, e foram iniciadas a partir da segunda metade dos anos 80. S agora que esto sendo traduzidos os livros doutrinrios. Os trabalhos de pregao em portugus por enquanto s acontecem uma vez por ms, sendo os trabalhos cotidianos executados em japons. No h, pois, nenhum trabalho ativo junto aos no-descendentes. No caso da Rish Ksei-kai, alm da data recente de sua vinda, o fato de no ter qualquer organizao para difuso da seita junto aos nodescendentes se deve, fundamentalmente, postura de que, "se o ensinamento realmente correto e justo, no h necessidade de forar-se a difuso; os adeptos viro, naturalmente, por si" (Ogasawara, 1983:132).

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Citamos quatro exemplos de seitas religiosas de origem japonesa. Vamos examinar por que umas foram bem-sucedidas nos seus trabalhos de difuso dos ensinamentos junto aos no-descendentes e outras no. Vamos primeiramente considerar o caso das seitas bem-sucedidas junto aos no-descendentes. Podemos dividi-las em dois grupos. No primeiro grupo ficam a Seich-no-i, PL, Sekai Kyusei-ky, Suk Mahikari, etc, e no segundo a Shinrei-ky, Inari-kai, Brasil Dainjin-gu, etc. Examinemos, inicialmente, as vantagens das seitas que esto no primeiro grupo. As religies japonesas nasceram dentro das tradies culturais do Japo, e conservam peculiaridades dessa influncia; mas as seitas includas neste grupo tiveram a possibilidade de apresentar explicaes de suas doutrinas, ritos e atividades, despojadas dessas peculiaridades, e seus respectivos sistemas de explicao j haviam sido testados e forjados dentro das condies especiais e duras em que viveram as seitas no Japo. Isto possibilitou um posicionamento flexvel dentro das condies especiais do Brasil, dando-lhes relativa liberdade e independncia a seus ritos e doutrinas frente aos contextos culturais do Japo. Em termos contrastantes, as seitas de origem budista ou xintosta, ao apresentar explicaes sobre seus ensinamentos e atividades, tm de comear a argumentar a partir da peculiaridade da cultura japonesa. Quer dizer que, para a difuso dos ensinamentos, a chave do sucesso est na flexibilidade possvel diante do pblico no-descendente (Inoue, 1955). Quanto ao segundo grupo, as seitas se comportam da seguinte maneira: umas incorporaram ativamente as tradies religiosas brasileiras por exemplo, a Inari-kai incorpora a venerao Nossa Senhora de Aparecida ou ao Padre Ccero, smbolos de grande significao na f popular brasileira, e tem como uma de suas atividades importantes medidas contra a macumba. Na obteno de adeptos, tem a seu favor o sentido imediato dos resultados, como a cura de doenas, a eliminao dos maus espritos, etc. Alm do mais, essas seitas pequenas lidam mais com a classe baixa, enquanto as grandes organizaes tm mais penetrao na classe mdia 9 . f) As religies na comunidade de origem japonesa O Quadro 5 mostra a situao das religies na comunidade de origem japonesa segundo os sexos e a distribuio nas zonas urbana e rural, de acordo com os resultados obtidos nas pesquisas da populao de origem japonesa realizadas em 1988:

Sobre Inari-kai, Watanabe realizou estudo detalhado em 1990.

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Quadro 5. SITUAO DAS RELIGIES NA COMUNIDADE DE ORIGEM JAPONESA EM 1988 (%)


Masculino Catlicos Protestantes Religio japonesa Sem religio Outras 57,65 3,18 24,20 12,84 2,09 Feminino Urbana Rural 60,80 3,04 25,69 8,20 2,25 60,79 2,71 23,36 10,85 2,29 45,54 6,61 38,17 8,77 0,88 Geral 59,19 3,12 24,90 10,64 2,14

Como se v, cerca de 60% da populao de origem japonesa segue o catolicismo, e aproximadamente 25% so seguidores de religies de origem japonesa. A distribuio segundo sexos no apresenta diferena digna de destaque, .mas na parte urbana o percentual de catlicos elevado, e na zona rural, apesar de os seguidores do catolicismo representarem percentual grande, a diferena frente aos seguidores de religies de origem japonesa diminui sensivelmente. Entretanto, deve-se atentar para o fato de que, presentemente, a populao de origem japonesa residente na regio urbana esmagadoramente dominante, isto , na proporo de 9:1 em relao que mora na zona rural. Assim, a populao residente na regio urbana que segue as religies de origem japonesa deve ser estimada em mais de 200 mil. De outro lado, os seguidores das seitas de origem japonesa que residem na zona rural so calculados em cerca de 50 mil. Comparando-se esses dados com os de 1958, quando os seguidores das religies tradicionais japonesas e o nmero de catlicos na colnia japonesa se eqivaliam, em 1988, isto , aps 30 anos, o nmero de catlicos aumentou, enquanto houve diminuio dos seguidores das seitas de origem japonesa. Nota-se tambm que nestes 30 anos se elevou a aceitao do catolicismo pela populao de origem japonesa residente na regio urbana; na zona rural, as posies das seitas de origem japonesa e o catolicismo se inverteram, com maior destaque para este ltimo.

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Quadro 6. RELIGIES SEGUIDAS PELOS CASAIS DE ORIGEM JAPONESA RESIDENTES NA CIDADE DE SO PAULO (AMBOS DE ORIGEM JAPONESA)
Marido Catlica Religio Protestante Esprita Sem Japonesa E s P o s a Catlica 41,4 2,5 29,6 0,6 32,7 4,3 0,6 4,3 0,6 Religio 4,3 1,2 0,6 11,1 0,6 17,6 0,6 0,6 48,2% 33,3% 5,5% 0,6% 11,7% 1,2% 110,5% Outras Total

Religio japonesa 1,9 0,6 Protestante Esprita Sem religio Outras Total(%) 0,6 43,8

Quadro 7. RELIGIES SEGUIDAS PELOS CASAIS DE ORIGEM JAPONESA RESIDENTES NA CIDADE DE SO PAULO (CASAIS INTERTNICOS)
Marido Catlica Religio Protestante Esprita Sem Japonesa E s P o s a Catlica Religio japonesa Protestante Esprita Sem religio Outras Total (%) 46,6 1,9 1,9 2,9 53,3 1,9 11,7 1,0 1,0 15,6 1,0 3,9 4,9 1,9 1,0 2,9 Religio 8,7 1,9 12,6 23,2 _ 1,0 1,0 60,1 % 15,5% 5,85% 4,9% 13,6% 1,0% 100,9% Outras Total

Para verificar as caractersticas sociais dos japoneses e seus descendentes que seguem a igreja catlica ou as religies de origem japonesa, vamos analis-las luz dos atributos dos casais de origem japonesa residentes na cidade de So Paulo10.

10 Esta amostra foi obtida por ocasio da realizao da pesquisa da populao de japoneses e seus descendentes residentes no Brasil realizada em 1987. Com base nos dados obtidos, Mori est realizando "anlise das relaes matrimoniais dos nikkeis residentes na cidade de So Paulo" (mimeo).

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Os quadros 6 e 7 indicam a distribuio das religies seguidas pelos maridos e esposas, respectivamente, de casais constitudos por descendentes e de casais mistos (de descendentes e no-descendentes). Em ambos os casos, so constatados percentuais mais elevados para as combinaes em que o marido e a esposa seguem as mesmas religies. Quase a metade do total dos casais catlica. Outrossim, cerca de 30% dos casais em que ambos so descendentes seguem as religies de origem japonesa (12% no caso de casais intertnicos). Isto pode significar que pessoas que seguem a mesma religio se casam com maior freqncia ou que, aps o casamento, um dos parceiros se converte a outra religio. Os quadros 8 e 9 mostram a aceitao das religies pelos casais de descendentes de japoneses segundo o grau de escolaridade (foram excludos os casais de japoneses propriamente ditos que seguem em elevado percentual as religies tradicionais japonesas). Constata-se que, no caso de casais em que ambos so descendentes, o catolicismo se expande independentemente do grau de escolaridade; de outro lado, aparece a tendncia de os descendentes que seguem as religies de origem japonesa comparecerem na faixa de baixa escolaridade. No caso de casais intertnicos, tanto o catolicismo como as religies de origem japonesa so aceitos mais nas camadas de maior escolaridade. Nestas so encontrados em maior nmero os profissionais tcnicos especializados e administrativos, ao passo que nas camadas de baixa escolaridade so encontradas pessoas que trabalham mais por conta prpria, nas vendas e prestao de servios. Correlacionando-se esses dados com as relaes existentes entre religio e escolaridade, quando o marido se dedica a atividades- por conta prpria, passa, com maior freqncia, a seguir as religies de origem japonesa. Entretanto, no caso de casais de descendentes e no-descendentes, h percentual significativo daqueles que aceitam as religies de origem japonesa, apesar de seu alto grau de escolaridade, no se podendo, pois, estabelecer esse tipo de correlao.

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Quadro 8. ESCOLARIDADE E RELIGIO DOS CASAIS DE DESCENDENTES DE JAPONESES RESIDENTES NA CIDADE DE SO PAULO (AMBOS DESCENDENTES, COM EXCLUSO DE ISSEIS)
Catlica Religio Protestante Japonesa 1 Grau Incompleto 1. Grau Completo 2Grau Completo Superior Completo Sem Informao Total (%) 14,8 15,8 11,0 18,6 10,5 5,3 1,4 3,3 0,5 21,0 1,0 1,0 0,5 1,0 Esprita
JCTII

Outras

Total

Religio

0,5

4,3 3,3 1,4 5,3

60,3

3,5

0,5

14,3

30,6% 25,4% 14,3% 28,8% 0,5% 99,6%

Quadro 9. ESCOLARIDADE E RELIGIO DOS CASAIS DE DESCENDENTES DE JAPONESES RESIDENTES NA CIDADE DE SO PAULO (CASO DE CASAMENTO INTERTNICO)
Catlica Religio Japonesa 1. Grau Incompleto 1. Grau Completo 2. Grau Completo Superior Completo Sem Informao Total (%) 7,8 7,8 9,7 28,2 3,9 3,9 1,9 7,8 1,9 1,9 Protestante Esprita Sem Religio Outras Total

53,3

17,5

3,8

1,9

9,7 2,9 1,9 1,9


7,8 1,9 1,9

23,3% 16,5% 13,5% 45,7% 1,9% 100,9%

22,3

At aqui consideramos a comunidade de origem japonesa frente s religies em geral. Passaremos a examinar a situao frente ao catolicismo, budismo e s novas seitas e os papis que desempenham. Nos eventos oficiais da comunidade de origem japonesa, o mais destacado a comemorao do "dia da imigrao japonesa no Brasil 18 de junho. Todos os anos, a data lembrada e festas maiores foram realizadas no passado, marcando os "X anos da imigrao japonesa no Brasil", que em So Paulo acontecem sob os auspcios da Sociedade Brasi-leira de Cultura Japonesa. E praxe nessa data realizar-se missa e celebrao budista em memria dos imigrantes falecidos. J vem se repetindo desde 1958, quando se comemorou o cinqentenrio da imigrao japonesa no Brasil. A partir de 1975, a Federao das Associaes das Provncias do Japo celebra, no dia 18 de junho, ato religioso budista no Parque Ibirapuera, onde se localiza o cenotfio em homenagem aos imigrantes mortos.

598 VIDA RELIGIOSA

Como se v, os eventos oficiais da comunidade de origem japonesa, no que diz respeito aos atos religiosos, se acham ocupados pela igreja catlica e pelos cultos budistas, no havendo participao de outras seitas religiosas. Outrossim, nos ritos de passagem (casamento-nascimento-funeral) e eventos anuais tais como "obon", Natal, festa budista das flores predominam, ainda aqui, a igreja catlica e as seitas budistas, mas em alguns casos comparecem o xintosmo e outras seitas. Cerca de 60% dos descendentes de japoneses professam a religio catlica, o que quer dizer que as tradies catlicas tm profunda influncia nos acontecimentos das diversas fases da vida de cada indivduo. Por exemplo, o sistema de compadrio que se estabeleceu no batismo-casamento. Na fase inicial da imigrao, essa relao era estabelecida no batismo dos filhos, procurando-se os padrinhos entre as pessoas mais influentes da localidade (por exemplo, o dono da fazenda, etc), que poderia significar proteo ou auxlio no processo de ascenso social Hoje em dia, entretanto, os padrinhos so escolhidos entre irmos, cunhados, tios, etc, fortalecendo os laos de parentesco. No culto aos mortos, so realizadas celebraes tanto catlicas come budistas, como missa de stimo dia, "obon", e no Dia de Finados, no Dia das Mes e no Dia dos Pais, ou, ainda, no aniversrio de seus falecimentos, se fazem visitas aos seus tmulos. Quanto aos eventos anuais, o Natal o dia da "festa da famlia", e, juntamente com a festa do Ano Novo, so oportunidades para a reunio da famlia. A Festa da Flor, que festeja o nascimento de Buda, realizada no fim da semana prxima ao dia 8 de abril pela Federao do Budismo do Brasil e pelo Clube dos Lojistas da Liberdade, com desfile e culto. Outrossim, Nanbei-jingu, que tem ligao com Ise-jingu, do Japo, desde 1978 vem realizando, com o patrocnio do mesmo Clube dos Lojistas, o ato sagrado de "chi-no-wa". Na rea das solues de problemas, as novas seitas e os mdiuns (inclusive "yuta", originrio de Okinawa) tm ascendncia muito grande. (Koichi Mori) BIBLIOGRAFIA ASSOCIAO Ake no Hoshi (ex-Nippak Catlico Chu-kai) 1955. Seishi 400 nensai (Festa do IV Centenrio da Cidade de So Paulo). Ed. especial de Ake no Hoshi (Estrela da madrugada) Zaihaku nihonjin fuky enkakushi (Histria da catequese dos japoneses do Brasil). So Paulo. BRASIL jih (Notcias do Brasil). Ed. 25.02.1932.

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VIDA RELIGIOSA

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POSFCIO

Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, incumbida de dar prosseguimento aos trabalhos remanescentes da Comisso dos Festejos do 80. Aniversrio da Imigrao Japonesa no Brasil, ocorrido a 18 de junho de 1988, organizou uma comisso encarregada de elaborar e redigir a histria dos imigrantes nipnicos que, em 1908, pela primeira vez, pisaram a terra brasileira. A Comisso de Elaborao ficou assim constituda: Katsunori Wakisaka (Coordenador) Masuji Kiyotani Katsuo Uchiyama Tetsuya Tajiri Susumu Miyao Jos Yamashiro Kazuo Watanabe Atsushi Yamauchi. A coleta de dados e elaborao do texto foram iniciados em maro de 1989. Dentro da programao traada pela Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, o livro deveria ter edies em portugus e japons. Ao comear suas atividades, a Comisso discutiu e decidiu adotar as seguintes normas, que iriam orientar todo o trabalho durante a elaborao da obra: 1. Utilizao de dados de fontes primrias e aproveitamento de

604 POSFCIO

informaes contidas em publicaes disponveis somente aps rigoroso exame crtico; 2. Todo o material escrito ser submetido ao escrutnio e discusso da Comisso, sendo de sua responsabilidade coletiva a redao final. Obedecendo a esse procedimento estabelecido, no decorrer dos anos de 1989 e 1990, a Comisso se reuniu quinzenalmente, num total de 52 sesses, para verificar e discutir os materiais, esmiuar e criticar os textos preparados pelos seus membros; esses textos eram, ento, reelaborados e reescritos. O tempo gasto na preparao e redao no foi suficiente para estruturar de modo satisfatrio e dar o devido polimento ao texto final. Mas o leitor encontrar registrados todos os fatos importantes acontecidos no decorrer das oito dcadas focalizadas e, mais ainda, verificar que se recorreu a pesquisas inditas e originais, abrindo "novas pistas e questes para os estudiosos futuros" (do Prefcio do Prof. Benedicto Ferri de Barros). Ao entregar este livro ao pblico, a Comisso de Elaborao se sente recompensada pela certeza de haver dado alguma contribuio histria dos 80 anos da Imigrao Japonesa no Brasil. AGRADECIMENTOS A Comisso recebeu inestimvel colaborao dos senhores Katsuzo Yamamoto, Yozo Suzuki, Nobuo Suzuki, Koji Nishida, Tetsuo Nakasumi, Koichi Mori, Hideharu Sakata, loe lida (pesquisa) e Shinji Tanaka (capa e layout). Contou com uma contribuio especial da Prof.a Dra. Arlinda Rocha Nogueira, do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de So Paulo.' Valioso foi o assessoramento tcnico proporcionado pela Associao Brasileira de Estudos Tcnicos em Agricultura ABETA, atravs dos Engenheiros-Agrnomos Ruy Kikuty, Hideki Amenomori, Hlio Watanabe, Kenji Kuga, Masayoshi Tanaka e Mineo Yoda, que revisaram a parte que trata da produo agrcola. Um especial agradecimento ao Prof. Benedicto Ferri de Barros, que teve a gentileza de ler os originais e apresentou valiosas sugestes e ainda escreveu um lcido e objetivo Prefcio. Ao Museu Histrico da Imigrao Japonesa nossa gratido pelas facilidades proporcionadas no acesso ao seu importante acervo. So Paulo, abril de 199Z Comisso de Elaborao da Histria dos 80 anos da Imigrao Japonesa no Brasil.

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