Poemas de Miguel Torga

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Nem tenho versos, cedro desmedido,

Da pequena floresta portuguesa!


Nem tenho versos, de tão comovido
Que fico a olhar de longe tal grandeza.

Quem te pode cantar, depois do Canto


Que deste à pátria, que to não merece?
O sol da inspiração que acendo e que levanto
Chega aos teus pés e como que arrefece.

Chamar-te génio é justo, mas é pouco.


Chamar-te herói, é dar-te um só poder.
Poeta dum império que era louco,
Foste louco a cantar e louco a combater.

Sirva, pois, de poema este respeito


Que te devo e confesso,
Única nau do sonho insatisfeito
Que não teve regresso.

Vinha de longe o mar...


Vinha de longe, dos confins do medo...
Mas vinha azul e brando, a murmurar
Aos ouvidos da terra um cósmico segredo.

E a terra ouvia, de perfil agudo,


A confidencial revelação
Que iluminava tudo
Que fora bruma na imaginação.

Era o resto do mundo que faltava


(Porque faltava mundo!).
E o agudo perfil mais se aguçava,
E o mar jurava cada vez mais fundo.

Sagres sagrou então a descoberta


Por descobrir:
As duas margens da certeza incerta
Teriam de se unir!
Quem vai à luz do Céu com luz da Terra,
Encontra a escuridão no seu caminho;
Quem vai buscar a noiva em som de guerra,
Morre sem noiva e sem amor, sozinho.

Encontra a escuridão no sol ardente,


Arma do Anjo Negro mascarado
Que cega todo aquele que à sua frente
Ergue o rosto agressivo e confiado.

Morre na areia seca do deserto,


Seu corpo nu a apodrecer no chão,
Simplesmente coberto
Pelo pranto sem fim duma Nação.

E eu fui a Deus com alma natural,


E o meu grito de amor desafiou.
E Deus toldou-se quando eu dei sinal,
E a noiva nem sequer me sepultou!

Aqui declaro que não tem fronteiras.


Filho da sua pátria e do seu povo,
A mensagem que traz é um grito novo,
Um metro de medir coisas inteiras.

Redonda e quente como um grande abraço


De pólo a pólo, a sua humanidade,
Tendo raízes e localidade,
É um sonho aberto que fugiu do laço:

Vento da primavera que semeia


Nas montanhas, nos campos e na areia
A mesma lúdica semente,

Se parasse de medo no caminho,


Também parava a vela do moinho
Que mói depois o pão de toda a gente.

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