Artigo
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1. Introduo e Objetivos
O crescente aumento do consumo de energia mostrou a necessidade de um planejamento
estratgico para promover uma maior diversificao da matriz energtica brasileira, hoje ainda
altamente dependente da hidroeletricidade.
Assim, diversos programas governamentais foram criados para estimular a gerao independente
e descentralizada de energia, tais como o Programa Prioritrio de Termoeletricidade (PPT) e o
Programa de Incentivo s Fontes Alternativas de Energia Eltrica (PROINFA).
Nesse sentido, o setor sucroalcooleiro pode contribuir e muito para a produo de energia eltrica
para comercializao, atravs da expanso de seus sistemas de cogerao, uma vez que a
biomassa da cana de acar uma das fontes incentivadas pelo PROINFA. No entanto, para que
isso ocorra devem necessariamente ser utilizadas tecnologias mais avanadas que permitam um
melhor aproveitamento energtico do combustvel.
Diante deste contexto, neste trabalho so realizadas anlises termodinmica e termoeconmica
de uma planta resultante do projeto de expanso do sistema de cogerao de energia da
Destilaria Pioneiros, atravs do qual foram substitudas as caldeiras que produziam vapor a baixas
presso e temperatura por uma nica caldeira que produz vapor a nveis mais elevados; tambm
2. Reviso da Literatura
Existem diversos livros clssicos sobre anlise de sistemas e cogerao de energia, entre eles
podem ser citados: ORLANDO (1991) e KOTAS (1995), que servem como base estudos
especfico.
A seguir sero relacionados alguns trabalhos relacionados anlise energtica, exergtica e
termoeconmica de sistemas aplicados s usinas de acar e lcool que contriburam para o
desenvolvimento do presente trabalho.
BARREDA DEL CAMPO et al. (1998) estudaram o sistema de cogerao de uma usina
sucroalcooleira que fornece excedentes de energia para a rede eltrica. Foram calculados, alm
das propriedades termodinmicas dos diferentes fluxos do sistema, os balanos de massa,
energia e exergia. Alm disso, eles realizaram uma comparao das eficincias de primeira e
segunda lei, mostrando a utilidade desta ltima na avaliao de um sistema real, e como elemento
importante para deciso de melhorias das plantas trmicas ao evidenciar os equipamentos de
maiores irreversibilidades e, conseqentemente, a perda de oportunidades de gerao de energia
eltrica.
CORRA NETO (2001) avaliou a viabilidade tcnica e econmica de projetos de gerao de
energia eltrica utilizando como combustvel o bagao, a palha e as pontas da cana-de-acar,
como opo complementar expanso do sistema eltrico brasileiro. A tecnologia analisada foi de
gerao termeltrica com ciclo combinado, operando em cogerao, integrado a sistemas de
gaseificao de biomassa para a produo de gs combustvel, com e sem adio de gs natural.
A anlise econmica foi feita atravs da modelagem e construo de curvas de economicidade do
projeto, baseadas nos preos da energia eltrica, do gs natural e nos custos da biomassa.
SNCHEZ PRIETO e NEBRA (2001) fizeram uma anlise de custo exergtico do sistema de
cogerao de uma usina aucareira que tem toda sua demanda de potncia e energia trmica
satisfeita pelo prprio sistema. Neste trabalho, os autores incluram a determinao das
irreversibilidades e das eficincias da segunda lei da termodinmica, salientando a importncia
destas eficincias para as decises sobre possveis alteraes do sistema, tanto para melhoria na
planta trmica, como no sentido de atender os requisitos necessrios estabelecidos pela ANEEL
para a qualificao de centrais cogeradoras para a venda de energia.
SNCHEZ PRIETO et al. (2001) tambm apresentaram uma outra anlise de custo exergtico do
sistema de cogerao aplicado na Usina Cruz Alta. Porm, neste estudo enfatizada uma
metodologia para a determinao experimental da eficincia do sistema, permitindo a
determinao do consumo de bagao de cana da caldeira. Alm disso, cada equipamento foi
tratado separadamente de forma que os balanos de massa, energia e exergia foram feitos para
cada componente do sistema trmico.
LOBO et al. (2002) analisaram os processos de extrao de duas empresas sucroalcooleiras que
usam turbinas de contrapresso para fornecer trabalho, sendo o vapor de contrapresso utilizado
como energia trmica de processo. Uma das empresas emprega grandes turbo geradores de
mltiplos estgios, que operam com entrada de vapor a 3,0 MPa e 330 C, para cogerar energia
eltrica para motores eltricos que acionam as moendas, picadores e desfibradores. J na outra
empresa, o acionamento das mquinas realizado diretamente por pequenas turbinas de simples
estgio operando com vapor a 2,0 MPa e 290 C. Foi verificado que a empresa que utiliza energia
eltrica cogerada, com turbinas maiores para acionar as mquinas, chega a economizar 65 % do
bagao gasto para moer uma tonelada de cana quando comprada com a empresa que utiliza
vrias turbinas menores e menos eficientes. Os autores concluram que, com o uso mais racional
do bagao gerando vapor em temperaturas e presses maiores, obtm-se uma grande economia
de bagao, que tanto pode ser comercializado in natura, ou ser usado para cogerao de
excedentes de eletricidade.
BRIGHENTI (2003) apresentou e analisou os diversos requisitos necessrios para que haja uma
integrao confivel e segura dos sistemas de gerao a partir de biomassa (especificamente
cogerao com bagao de cana) ao sistema eltrico de potncia. Foi considerado um estudo da
Usina Santa Adlia, que recentemente ampliou sua gerao prpria, passando a comercializar sua
eletricidade excedente com a CPFL. Foram levantadas e analisadas as barreiras tcnicas,
legislativas, econmicas e ambientais, que, em conjunto, determinam a integrao do cogerador,
sendo dada nfase especial parte tcnica da interligao, buscando analisar o impacto que a
insero dos produtores independentes pode causar no sistema eltrico e o que precisaria ser
feito para a interligao com a concessionria.
JAGUARIBE et al. (2004) discutiram um caso real de investimento na ampliao do sistema de
cogerao de energia em uma indstria sucroalcooleira paraibana, considerando o preo sazonal
do bagao, os custos de gerao de energia e levando-se em conta um perodo de 10 anos. Com
o novo parque de cogerao a indstria se tornou auto-suficiente em energia, dispondo de
21.240 MWh para comercializao, com uma potncia mdia de exportao de 4.000 kW.
Todavia, aps a anlise econmica efetuada, verificou-se que a melhor opo seria manter a
planta na forma original e vender o bagao a R$ 26,00 por tonelada.
3. Metodologia
3.1 Anlise Energtica
Considerando desprezveis as variaes de energia cintica e potencial, a primeira lei da
termodinmica pode ser escrita na seguinte forma (BEJAN, 1988):
& e he
Q& v.c. W& v.c. + m
m& s hs = 0
(1)
Onde: Q& v.c. : taxa de transferncia de calor no volume de controle (kW); W& v.c. : potncia no volume
de controle (kW); he : entalpia especfica na entrada do volume de controle (kJ/kg); hs : entalpia
& e : vazo mssica entrando no volume de
Especfica na sada do volume de controle (kJ/kg); m
&
controle (kg/s); ms : vazo mssica saindo do volume de controle (kg/s).
A Segunda Lei da Termodinmica para um volume de controle, considerando o processo em
regime permanente, pode ser representada pela seguinte equao:
Q& v.c.,i
S& ger, v.c. +
Ti
+ m
& e se m
& s ss = 0
(2)
bt = (h h0 ) T0 (s s0 ) + (i 0,i ) xi
(3)
Sendo: 0,i : potencial qumico de referncia do elemento (T0, P0); i : potencial qumico do
elemento na mistura (T0, P0); x i : frao do componente na mistura.
I =
W& v.c.
& hiso
m
(4)
Onde: hiso : diferena entre as entalpias de entrada e sada do volume de controle, para
processo isoentrpico (kJ/kg); m& : vazo mssica (lquido ou vapor) no volume de controle (kg/s).
Associado ao uso da anlise de exergia, tem se a segunda lei da termodinmica (II ) . Esse
conceito envolve a comparao da taxa de transferncia de trabalho real produzido no processo
com a variao de exergia avaliada entre o estado real de entrada e o estado real de sada
conforme segue:
II =
W& v.c.
& (be bs )
m
(5)
& s hs m
& e he
m
&
mcomb PCI comb
(6)
& s bs m
& e be
m
&
mcomb bcomb
(7)
II =
FUE =
W& + Q&U
& comb PCI
m
(8)
IPE =
& combPCI
m
&
W
Q&U
+
term_ref cald_ref
(9)
Onde: term_ref : eficincia trmica de uma planta de potncia de referncia (adotada 40%);
cald_ref : eficincia trmica de caldeiras que produzem apenas vapor saturado (adotada 77%).
EEC = 1 IPE
(10)
W&
& comb PCI Q& U / cald
m
(11)
W&
Q&
(12)
(13)
As taxas de exergia ( B& s , B& Q e B& e ) saindo e entrando no k-simo componente, bem como a
potncia ( W& ), so calculadas em uma anlise exergtica. O termo
Valores
5.000 h
240,0 t/h
0,47
13,0%
46,0 %
65,8 t/h
65,8 t/h
67,8 t/h
Bagao excedente
2,0 t/h
Tabela 2. Parmetros operacionais da planta.
m& (t/h)
Pontos
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
140,0
140,0
140,0
125,0
120,0
120,0
135,0
15,0
15,0
15,0
5,0
T (C)
105
105,7
530
148,1
148,1
90
84,7
42,6
42,7
42,7
148,1
P (kPa)
237
9.200
6.600
237
237
237
237
8,5
8,5
237
237
h (kJ/kg)
440,1
452,5
3.486
2.762
2.762
376,9
354,9
2.322
178,7
179
2.762
s (kJ/kgK)
1,362
1,37
6,919
7,187
7,187
1,192
1,13
7,395
0,6078
0,6081
7,187
b (kJ/kg)
38,5
48,6
1427
623,7
623,7
26,2
22,6
121,8
2,074
2,309
623,7
4. Resultados
4.1 Resultados Termodinmicos
So determinadas as eficincias da primeira e da segunda lei da termodinmica para os
equipamentos do sistema de gerao de vapor e energia eltrica de cada configurao avaliada.
Alm disso, so obtidos a eficincia global e os ndices de desempenho das plantas de cogerao
baseados na primeira lei da termodinmica.
A resoluo do sistema de equaes resultante foi efetuada utilizando-se o programa EES
(Engineering Equation Solver), desenvolvido por KLEIN e ALVARADO (1995), que permite a
determinao das propriedades termodinmicas do sistema, como entalpia e entropia, e possibilita
a realizao de clculos de uma maneira simples e eficiente, sem a necessidade de se recorrer a
tabelas termodinmicas.
A Tabela 3 apresenta os resultados para as eficincias da primeira e segunda lei da
termodinmica, bem como a energia na forma de potncia ou calor, para a caldeira e a turbina Na
Tabela 4 so apresentados os ndices de desempenho baseados na primeira lei da
termodinmica.
Tabela 3. Eficincias e energia gerada nos principais equipamentos da planta.
Equipamento
Caldeira
Turbina
II (%)
28,6
88,9
I (%)
83,4
87,0
W& (kW)
Q& (kW)
29.979
70.539
-
Valor
0,712
0,847
0,153
0,529
0,425
manuteno, devem ser adicionados os custos do capital investido, considerando uma taxa de
juros de 12 % ao ano e uma vida til da planta considerada como sendo de 20 anos.
160
20
18
140
16
120
cvapproc [R$/t]
ce;medio [R$/MWh]
14
100
80
60
40
20
0
12
10
8
6
4
10
20
30
40
50
2
0
10
cbagaco [R$/t]
20
30
40
50
cbagaco [R$/t]
Valor
99,33
11,38
29,98
20,00
10.599.000,00
5. Concluso
Com relao aos ndices de desempenho, nota-se que o FUE possui um valor relativamente alto
se comparado com outras usinas do setor, isso porque a planta utiliza equipamentos modernos
e eficientes. O IGP mostra que a usina tem uma alta gerao de potncia eletromecnica, como
era de se esperar devido a seu propsito de gerao de excedente de eletricidade. Verifica-se que
a planta da usina est economizando energia de combustvel se comparada a plantas
convencionais que produzem separadamente energia eltrica e trmica, uma vez que o IPE
inferior a uma unidade, sendo a energia economizada devido cogerao (ECC) igual a 15,3%.
Por fim, nota-se que a planta produz 42,5% a mais de energia na forma de eletricidade com
relao ao calor, de acordo com o RPC, evidenciando a sua finalidade.
Verifica-se que com o uso de tecnologias mais eficientes possvel a gerao de um excedente
de energia da ordem de 20 MW, com a conseqente reduo do custo unitrio de gerao.
Embora o preo de comercializao da energia eltrica fixado pelo PROINFA seja ainda
considerado baixo pelos usineiros, no caso especfico da Destilaria Pioneiros, obtido um lucro
lquido anual de R$ 10.599.000,00 com a comercializao da venda do excedente de energia
eltrica gerado. Por outro lado, devido ao fato da maioria das usinas sucroalcooleiras terem sido
construdas durante a dcada de 80, os equipamentos das mesmas j esto no final de suas vidas
teis, assim sendo, mesmo com o preo da energia no to satisfatrios, muitas empresas tm
visto no PROINFA uma boa oportunidade de financiamento para a substituio de seus
equipamentos, por outros mais eficientes, de alta tecnologia.
Vale ressaltar que foi adotado para o bagao um custo equivalente ao da tonelada de cana
produzida no campo, j que o bagao deixou de ser considerado um simples rejeito do processo
industrial e passou a ser um insumo bastante valorizado. Dessa forma, acredita-se que o custo
atribudo ao bagao deva ser inferior ao adotado (R$ 25,00), o que motivaria a comercializao de
energia atravs do PROINFA, mesmo diante dos valores atualmente pagos pelo governo.
Na realidade, a partir do momento que se tem como produto a eletricidade, alm do acar e do
lcool, seria interessante realizar uma melhor partio de custos entre os produtos e insumos
envolvidos no processo industrial das usinas. Dessa forma, certamente poderia ser atribudo um
melhor custo ao bagao, aumentando a atratividade pela gerao e comercializao do excedente
de energia eltrica produzida.
Palavras-chave: Cogerao de energia, Termoeconomia, Usina sucroalcooleira.
Referncias bibliogrficas
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