Machado de Assis: Contos para muitas vozes (edição bilingue)
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Machado de Assis - Maria Rosa Duarte de Oliveira
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Vanderlei Becker Ribeiro
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Maria Rosa Duarte de Oliveira
LuÍs Eduardo Wexell Machado
(organizadores)
MACHADO DE ASSIS
CONTOS
PARA
MUITAS VOZES
MACHADO DE ASSIS
CUENTOS
PARA
MUCHAS VOCES
LOGOMARCA%20EDUC.tif Logo_EDUNISC_CMIK.tif
São Paulo, 2015
© Maria Rosa Duarte de Oliveira e Luís Eduardo Wexell Machado. Foi feito o depósito legal.
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Reitora Nadir Gouvêa Kfouri / PUC-SP
Assis, Machado de, 1839-1908
Contos para muitas vozes: edição bilíngue [recurso eletrônico] / Machado de Assis ; trad. Carlos Mario Vásquez Gutierrez... et al.; orgs. Maria Rosa Duarte de Oliveira, Luís Eduardo Wexell Machado. - 2. ed. São Paulo : Educ ; Santa Cruz do Sul : Edunisc, 2016.
1 recurso on-line : ePub
Disponível no formato impresso: Assis, Machado de. Contos para muitas vozes: edição bilíngue. Trad. Carlos Mario Vásquez Gutierrez... et al.; orgs. Maria Rosa Duarte de Oliveira, Luís Eduardo Wexell Machado. São Paulo : Educ ; Santa Cruz do Sul : Edunisc, 2015. ISBN 978-85-283-0478-7
Disponível para ler em : todas as mídias eletrônicas
Acesso restrito : www.pucsp.br/educ
ISBN eletrônico: 978-85-283-0532-6
1. Assis, Machado, 1839-1908 - Traduções para o espanhol. 2. Contos brasileiros. I. Oliveira, Maria Rosa Duarte de. II. Machado, Luís Eduardo Wexell. III. Título. IV. Título: Cuentos para muchas voces
CDD 869.934
EDUC – Editora da PUC-SP
Direção
Miguel Wady Chaia
Produção Editorial
Sonia Montone
Revisão Português
Siméia Mello
Revisão Espanhol
Carlos Mario Vásquez Gutiérrez
Editoração Eletrônica
Gabriel Moraes
Waldir Alves
Capa
Douglas Canjani
Secretário
Ronaldo Decicino
Produção do ebook
Waldir Alves
Rua Monte Alegre, 984 – sala S16
CEP 05014-901 – São Paulo – SP
Tel./Fax: (11) 3670-8085 e 3670-8558
E-mail: [email protected] – Site: www.pucsp.br/educ
MachadoAssis_Magazine_capa_PB.jpgAPRESENTAÇÃO
Machado de Assis – Contos para muitas vozes (Machado de Assis – Cuentos para muchas voces) foi lançado em 2011, em edição bilíngue, pelo Centro de Estudos Antropológicos da Universidade Católica de Assunção (Ceaduc), com o patrocínio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, como resultado de uma parceria entre a Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e a Universidade Nacional de Assunção (UNA). Para ela, colaboraram diversos acadêmicos e profissionais da área editorial que trabalharam nas traduções, revisões, preparação de texto e diagramação.
O objetivo foi o de levar um clássico da Literatura Brasileira como Machado de Assis para o público hispano-americano, em geral, e mais particularmente para o público paraguaio, que, salvo por meio de algumas poucas traduções para o espanhol, não tem tido um contato efetivo com a obra desse escritor.
Machado de Assis – Contos para muitas vozes representou essa rara oportunidade de unir as vozes de estudiosos da obra machadiana, de várias universidades brasileiras, às vozes múltiplas desse autor por meio da seleção de sete de seus contos, dentre os quase 200 que produziu, representativos de uma ampla gama temática e de efeitos estéticos: da moralidade ao fantástico; do filosófico-ensaístico ao de enigma e mistério, além dos perfis femininos, aos quais Machado se dedicou com maestria. A esse conjunto de vozes veio se juntar, ainda, a da tradução e com ela a possibilidade de trânsito e passagem para a língua e a cultura da América hispânica.
Esta nova edição, agora feita em parceria da Editora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Educ) com a editora da Universidade de Santa Cruz do Sul (Edunisc), foi totalmente revisada, conta com novas traduções e diagramação atualizada, e vem coroar um projeto bem-sucedido, que recebeu, no triênio 2010-2012, o grau máximo da Comissão de Avaliação de Livros da Área de Letras e Linguística da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), órgão vinculado ao Ministério da Educação e Cultura do Brasil (MEC).
Os organizadores esperam, com esta nova edição, contribuir para manter viva a presença de um escritor como Machado de Assis cuja obra, embora produzida na segunda metade do século XIX e início do século XX no Brasil, ainda não terminou de dizer o que tinha para dizer
para o público brasileiro e hispano-americano.
Maria Rosa Duarte de Oliveira
Luís Eduardo Wexell Machado
PRESENTACIÓN
Machado de Assis – Contos para muitas vozes (Machado de Assis – Cuentos para muchas voces) fue publicado en 2011, en edición bilingüe, por el Centro de Estudios Antropológicos de la Universidad Católica de Asunción (Ceaduc), con el apoyo del Ministerio de Relaciones Exteriores del Brasil, como resultado de la alianza entre la Pontificia Universidad Católica de São Paulo (PUC-SP) y la Universidad Nacional de Asunción (UNA). Para ello colaboraron diversos académicos y profesionales del área editorial que trabajaron en la traducción, revisión, preparación y diagramación del texto.
El objetivo fue llevar un clásico de la Literatura Brasileña como es Machado de Assis al público hispano-americano, en general, y particularmente al público paraguayo, que, salvo algunas traducciones al español, no ha tenido acceso directo a la obra de este escritor.
Machado de Assis – Contos para muitas vozes representó esta extraordinaria oportunidad de unir las voces de estudiosos de la obra machadiana, de varias universidades brasileñas, a las múltiples voces de este autor por medio de la selección de siete de sus cuentos, dentro de los casi 200 que produjo, que representa una amplia gama temática y efectos estéticos: de la moralidad a lo fantástico; de lo filosófico--ensayístico al enigma y al misterio, más allá de los perfiles femeninos, a los cuales Machado se dedicó con maestría. A este conjunto de voces se suma ahora la traducción y con ella la posibilidad de interacción con la lengua y la cultura de América hispana.
Esta nueva edición, hecha en coedición de la Editora de la Pontificia Universidad Católica de São Paulo (Educ) con la editora de la Universidad de Santa Cruz do Sul (Edunisc), fue totalmente revisada, cuenta con nuevas traducciones y diagramación actualizada y viene a coronar un proyecto exitoso, que recibió, en el trienio 2010-2012, el grado máximo de la Comisión de Evaluación de Libros del Área de Letras y Lingüística de la Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nivel Superior), órgano vinculado al Ministerio de Educación y Cultura de Brasil (MEC).
Con esta nueva edición los organizadores esperan contribuir a mantener viva la presencia de un escritor como Machado de Assis cuya obra, aunque fue producida en la segunda mitad del siglo XIX e inicio del siglo XX en Brasil, aún no terminó de decir lo que tenía para decir
al público brasileño e hispano-americano.
Maria Rosa Duarte de Oliveira
Luís Eduardo Wexell Machado
Traducción: Carlos Mario Vásquez Gutiérrez
Sumário
Indice
APRESENTAÇÃO
PRESENTACIÓN
Introdução
Machado de Assis: contos para muitas vozes
Introducción
Machado de Assis: cuentos para muchas voces
TEMA I
A voz moral
La voz moral
O anjo das donzelas. Conto fantástico
El ángel de las doncellas. Cuento fantástico
O anjo das donzelas ou variações em torno do conto moral
El ángel de las doncellas o variaciones acerca del cuento moral
TEMA II
A voz do fantástico
La voz del fantástico
Entre santos
Entre santos
Entre santos
de Machado de Assis: fantástico ou realista?
Entre santos
de Machado de Assis: ¿fantástico o realista?
TEMA III
A voz do filosófico
La voz de lo filosófico
Teoria do medalhão. Diálogo
Teoría del figurón. Diálogo
Teoria do medalhão
e a paródia do diálogo filosófico
Teoría del figurón
y la parodia del diálogo filosófico
TEMA IV
A voz do mistério
La voz del misterio
O relógio de ouro
El reloj de oro
O enigma do relógio de ouro
El enigma del reloj de oro
A cartomante
La cartomántica
A cartomante
: um efeito ao estilo de Poe?
La cartomántica
: ¿un efecto al estilo de Poe?
TEMA V
A voz do feminino
La voz de lo femenino
D. Paula
D. Paula
D. Paula em tempo de escuta de um passado
D. Paula en momento de oír un pasado
Uns braços
Unos brazos
Uns braços
: entre ambiguidades, paixão e riso
Unos brazos
: entre ambigüedades, pasión y risa
Introdução
Machado de Assis: contos para muitas vozes
As obras dissolvem as fronteiras da sua época, vivem nos séculos, isto é, no grande tempo, e além disso levam frequentemente (as grandes obras, sempre) uma vida mais intensiva e plena que em sua atualidade. (Bakhtin, 2003, p. 362)
Hoje mais que nunca, a tradução é o elemento de troca e de conhecimento entre as culturas, e no interior de cada cultura. Não se saberia fazer a história da literatura sem a história da tradução. (Meschonnic, 2010, p. XXXIX)
Machado de Assis: contos para muitas vozes, em ressonância ao que as epígrafes enunciam, é uma coletânea de contos de um escritor brasileiro – Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) – cuja obra nos remete ao sentido mais puro de um clássico, isto é, uma obra que, como diz Calvino em Por que ler os clássicos (1993), ainda não terminou o que tinha para dizer
, permanecendo atual e contemporânea, de modo a romper os limites do tempo-espaço, da língua e da cultura em que foi concebida.
Isso não significa, porém, que se mantenha inalterada e fixa, indiferente ao tempo que a cruza, e à história de sua recepção imersa em horizontes de expectativas diversos. É justamente porque é flexível, povoada de vazios, espaços lacunares e corredores, que uma obra literária perdura, porque foi escrita em presença das outras línguas do mundo
, como diria Glissant¹, levando em conta a alteridade e a presença da palavra do outro
.
Machado de Assis experimentou todos os gêneros literários durante a sua vida de escritor. A extensão e multitonalidade de sua obra pode ser percebida por meio de um breve elenco de suas produções: aproximadamente 200 contos publicados em diversos periódicos como Jornal das Famílias, A Estação, Gazeta de Notícias, etc., usando assinaturas diferentes, tais como: Job, Manassés, Lélio, M. de A., etc. Desses contos, apenas 68² foram recolhidos por Machado para as edições em livro: Contos fluminenses (1870), Histórias da meia noite (1873), Papéis avulsos (1882), Histórias sem data (1884), Várias histórias (1896), Páginas recolhidas (1899) e Relíquias da Casa Velha (1906).
É nos periódicos, também, que Machado de Assis atua como cronista com um número aproximado de 600 crônicas publicadas ao longo de sua carreira de escritor. Machado também redefine esse gênero na sua forma moderna, que encontra na imprensa seu novo habitat.
Como cronista, Machado produziu verdadeiras obras-primas no gênero cuja força está na contaminação do cotidiano pelo literário. Esse trabalho construtivo faz com que o cronista recolha dos jornais que lê a matéria-prima de sua crônica para explorar justamente o efeito estético, isto é, promover tal combinatória pelo discurso de modo a acionar o imaginário e o ficcional em detrimento do informativo. Um pequeno exemplo é o que ocorre neste fragmento de uma crônica de A Semana, de 16/10/1892, publicada no periódico A Gazeta de Notícias, que trata da inauguração dos bondes elétricos no Rio de Janeiro do século XIX. O que vemos na cena é o cronista em diálogo com dois burros para sugerir a crítica irônica ao poder econômico e social por meio de uma estratégia literária alicerçada sobre a matriz popular da fábula, na qual se mesclam a fantasia e a moralidade:
[...] O bond elétrico apenas nos fará mudar de senhor.
– De que modo?
– Nós somos bens da companhia. Quando tudo andar por arames, não somos já precisos, vendem-nos. Passamos naturalmente às carroças.
– Pela burra de Balaão! Exclamou o burro da esquerda. Nenhuma aposentadoria? Nenhum prêmio? Nenhum sinal de gratificação? Oh! Mas onde está a justiça deste mundo? [...]
– Tu és lúgubre, disse o burro da esquerda. Não conheces a língua da esperança.
– Pode ser, meu colega; mas a esperança é própria das espécies fracas, como o homem e o gafanhoto; o burro distingue-se pela fortaleza sem par. A nossa raça é essencialmente filosófica. [...] aproveitei a ocasião e murmurei baixinho entre os dois burros:
– Houyhnhnnms!
Foi um choque elétrico. Ambos deram um estremeção, levantaram as patas e perguntaram-me cheios de entusiasmo:
– Que homem és tu, que sabes a nossa língua? (Machado de Assis, 1992, pp. 552-553)
Esse discurso singular, com seu ritmo próprio dado pela pontuação, pela vivacidade dos diálogos e pelas combinatórias e cortes inusitados, é que faz de Machado de Assis um verdadeiro clássico
, capaz de atravessar fronteiras e poder ser apreciado por aquele leitor disponível para o pacto ficcional. Essa marca de um estilo essencialmente dialogal acompanhará o conjunto da obra machadiana que, nesse sentido, deverá ser percebida como um sistema orgânico no qual cada partícula estará intrinsecamente conectada ao todo, penetrando em cada gênero que produziu.
Não será diferente, portanto, com o romance, no qual Machado se distingue pela audácia das soluções e da revolução trazida para as formas da tradição literária, seja ela romântica ou realista.
Como romancista, Machado de Assis publicou nove romances – Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876), Iaiá Garcia (1878), Memórias póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1900), Esaú e Jacó (1904) e Memorial de Aires (1908). Nos quatro primeiros, Machado faz sua estreia como romancista e vai apurando neles o confronto entre o modelo romântico e o realista, embora ainda as soluções românticas acabem predominando, mesmo que as personagens, especialmente as femininas, já tragam em si o gérmen de uma nova mulher, bifronte e dissimulada, no limiar de uma perspectiva de mundo diversa, na qual é sujeito de seus desejos e de seu discurso.
A partir de Memórias Póstumas, a chave realista será a tônica, porém, um realismo fundado sobre a tradição luciânica da sátira menipeia, nascida com Luciano de Samósata³, cuja obra Machado de Assis guardava em sua biblioteca pessoal. Trata-se, então, de uma chave realista pelo anseio de apropriar-se da tradição e do passado para revigorá-los, trazendo-os para a realidade mais atual. Tal se dá por meio da miscigenação e do hibridismo entre o literário e o não-literário, o sério e o cômico, o sublime e o terreno, fazendo da paródia e da ironia aliadas para a desestabilização dos gêneros nobres. É a partir daí, também, que Machado intensifica o jogo de duplos entre autores ficcionais – Brás Cubas, Casmurro e Aires – que também são leitores, narradores e personagens, estabelecendo um profundo questionamento sobre a matéria ficcional e seu estatuto de realidade.
Machado de Assis foi ainda crítico literário e teatral, dramaturgo e poeta, gêneros aos quais trouxe, também, contribuições significativas. Na crítica literária, destacamos Notícia da atual Literatura Brasileira – Instinto de Nacionalidade
(Novo Mundo, 1873), ensaio sobre o sentido de nacional na literatura brasileira, porém, em íntima sintonia com o universal e O ideal do crítico
(Diário do Rio de Janeiro, 1865), no qual traça, com extrema lucidez, os princípios norteadores do crítico literário, cujo ideal deveria estar pautado pela ética de um julgamento nascido da análise das qualidades de uma obra e não de critérios pessoais. Como crítico teatral, a sua luta foi por constituir um teatro com elementos da cultura brasileira, abandonando a imitação dos padrões europeus.
Foi ainda dramaturgo com várias peças, dentre as quais podemos citar: Tu só, tu, puro amor (1880), Não consultes médico (1899) e Lição de Botânica (1906); além de sua produção como poeta em: Crisálidas (1864), Falenas (1870), Americanas (1875) e Ocidentais (1901).
No que se refere ao gênero conto, objeto desta coletânea bilíngue, deve-se a Machado de Assis o fato de tê-lo constituído como forma singular da narrativa breve na tradição da literatura brasileira que, ainda no século XIX, não havia dado a esse gênero a importância devida ante a dominância do romance. Machado, leitor de Poe, não nega a filiação ao mestre, quando, na Advertência
à coletânea Várias Histórias (1896), diz que:
[os contos] Não são feitos daquela matéria, nem daquele estilo que dão aos de Mérimée o caráter de obras-primas, e colocam os de Poe entre os primeiros escritos da América. O tamanho não é o que faz mal a este gênero de histórias, é naturalmente a qualidade: mas há sempre uma qualidade nos contos, que os torna superiores aos grandes romances, se uns e outros são medíocres: é serem curtos. (Machado de Assis, 1992, v. 2. p. 474; grifos nossos)
É com um tom de ironia que Machado reduz a qualidade de seus contos diante dos de Mérimée e Poe, justamente os dessa coletânea em que há algumas verdadeiras obras-primas do gênero como A Cartomante
, D. Paula
, Entre Santos
e Uns braços
, não por acaso, escolhidos para fazerem parte desta coletânea. A ironia, no entanto, tem um alvo certeiro: o romance que, assegurado de seu posto de liderança, acomoda-se à mediocridade de modelos desgastados.
Além dos contos elencados acima – A cartomante
, D. Paula
, Entre santos
e Uns braços
–, três outros fazem parte do conjunto: Teoria do Medalhão
(Papéis Avulsos), O relógio de ouro
(Histórias da meia-noite) e O anjo das donzelas
, proveniente do periódico Jornal das Famílias e só publicado em livro em 1956, por Raimundo Magalhães Júnior, em Contos avulsos, e, mais recentemente, por Cavalcante em Contos completos de Machado de Assis (2003, vol. 1, pp. 66-81).
O critério que os reuniu foi de natureza crítico-interpretativa, tendo por base a diversidade de efeitos estéticos que o conto machadiano desencadeia munido de estratégias narrativas moralizantes (O anjo das donzelas
), filosófico-ensaísticas (Teoria do medalhão
), fantásticas (Entre santos
), de enigma e mistério (O relógio de ouro
e A cartomante
), ou, simplesmente, de construção de perfis femininos (Uns braços
e D. Paula
), onde encontramos a grande maestria de Machado de Assis ao revelar na mulher a mesma duplicidade, ambivalência e simulação de que é feita a ficção literária.
Resta ainda dizer que Machado de Assis: contos para muitas vozes, além dos textos integrais dos contos selecionados com sua respectiva tradução, trará, ainda, a apresentação de cada um deles feita por estudiosos da obra machadiana vindos de várias universidades brasileiras. Em tais artigos, o leitor encontrará informações relevantes sobre as edições dos contos, bem como algumas diretrizes crítico-interpretativas para sua leitura.
Embora não seja esta uma edição crítica dos contos machadianos selecionados, os editores tiveram extremo rigor no estabelecimento do texto final em português a fim de criar os parâmetros para a tradução em espanhol. Nossas fontes foram: o Portal Domínio Público (http://machado.mec.gov.br/), biblioteca digital de referência patrocinada pelo Ministério de Educação e Cultura do governo brasileiro, onde encontramos a obra completa de Machado de Assis, além de edições conceituadas em livro como: Machado de Assis – Obras Completas, 3 vol. (1992); a edição crítica de Histórias da meia noite (1975); Contos completos de Machado de Assis, 2 vol. organizado por Djalma Cavalcante (2003); Contos: uma antologia – Machado de Assis, 2 vol. organizado por John Gledson (1998) e Papéis Avulsos – Machado de Assis (2005), edição preparada por Ivan Teixeira, um dos grandes especialistas da obra machadiana.
O estabelecimento do texto em português não foi tarefa fácil, dado que as maiores variações entre as edições estavam na pontuação, o que, aparentemente, poderia ser irrelevante para o leitor comum. No entanto, em se tratando de uma leitura crítica de confronto entre versões de um mesmo conto, tal fato se torna de extrema importância visto que na pontuação está o ritmo singular da escrita machadiana, de seu fluxo respiratório:⁴ avanços e recuos, interrupções, ora breves, ora delongadas, cortes abruptos e ondulações. Enfim, estávamos no território da escrita literária, cuja vitalidade está nos modos e tons expressivos do que se enuncia e não na informação. Pudemos experimentar, então, uma das máximas da poética do traduzir, segundo Meschonnic⁵, que está no ritmo, alvo de um verdadeiro tradutor.
Para encerrar, uma palavra final sobre a importância da publicação desta segunda edição da coletânea bilíngue de contos de Machado de Assis agora em coedição da Editora da PUC-SP (Educ) com a Editora da Universidade Santa Cruz do Sul (Edunisc), e que teve sua primeira edição publicada no Paraguai, em 2011, graças ao patrocínio do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Trata-se de uma rara oportunidade de, pela tradução, elemento de troca e de conhecimento entre as culturas
, como afirma Meschonnic, oferecer a singularidade da escritura de um dos maiores clássicos da Literatura Brasileira – Machado de Assis – para o público da América hispânica, ampliando a recepção de uma obra que, embora nascida no Brasil do século XIX, foi elaborada em presença das outras línguas e culturas do mundo, o que a faz a um só tempo local e universal, princípio chave de uma obra literária, conforme afirma Machado de Assis em Instinto de Nacionalidade:
[...] e perguntarei mais se o Hamlet, o Otelo, o Júlio César, a Julieta e o Romeu têm alguma coisa com a história inglesa nem com o território britânico, e, se, entretanto, Shakespeare não é, além de um gênio universal, um poeta essencialmente inglês.
Não há dúvida que uma literatura, sobretudo uma literatura nascente, deve principalmente alimentar-se dos assuntos que lhe oferece a sua região; mas não estabeleçamos doutrinas tão absolutas que a empobreçam. O que se deve exigir do escritor antes de tudo, é certo sentimento íntimo, que o torne homem do seu tempo e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço. (1992, v. 3, p. 804)
Referências bibliográficas
BAKHTIN, Mikhail (2003). Os estudos literários hoje
. In: Estética da criação verbal. Tradução e introdução de Paulo Bezerra. 4. ed. São Paulo, Martins Fontes, pp. 359-366.
CALVINO, Ítalo (1993). Por que ler os clássicos. Tradução de Nilson Moulin. 5. ed. São Paulo, Companhia das Letras.
CAVALCANTE, Djalma Moraes (org.) (2003). Contos Completos de Machado de Assis. Juiz de Fora, Editorial da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2 vol.
GLISSANT, Édouard (2005). Introdução a uma poética da diversidade. Tradução de Enilce Albergaria Rocha. Juiz de Fora, Editora da Universidade Federal de Juiz de Fora.
MACHADO DE ASSIS, Joaquim Maria (1975). Histórias da meia noite. Edição crítica. Rio de Janeiro/ Brasília, Civilização Brasileira/ Instituto Nacional do Livro.
_____(1992). Obra completa. Organizada por Afrânio Coutinho. Rio de Janeiro, Editora Nova Aguilar, 3 vol.
_____(1998). Contos/uma antologia. Seleção, introdução e notas de John Gledson. São Paulo, Companhia das Letras, 2 vol.
_____(2005). Papéis Avulsos/Machado de Assis. Edição preparada por Ivan Teixeira. São Paulo, Martins Fontes.
MAGALHÃES JÚNIOR, Raimundo (1956). Contos avulsos. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira.
MESCHONNIC, Henri (2010). Poética do traduzir. Tradução de Jerusa Pires Ferreira e Suely Fenerich. São Paulo, Perspectiva.
PORTAL DOMÍNIO PÚBLICO. Obra completa de Machado de Assis. Disponível em:
Maria Rosa Duarte de Oliveira
Notas
1 Em Introdução a uma poética da diversidade, o escritor e ensaísta Édouard Glissant expõe ao longo de quatro conferências e entrevistas, realizadas entre 1993 e 1995, a sua concepção sobre a arte e a literatura produzidas em culturas não hegemônicas, como as do Caribe e das Américas, na sua relação de alteridade, autonomia e diversidade com as demais línguas e culturas do mundo. Desse modo, para o autor, especialmente na atualidade, não há como um escritor manter-se à parte desta poética do caos e da relação
que implica o estar-sendo
num lugar de trânsito, criolização
e mistura, onde cada cultura faz emergir sua singularidade dentro da totalidade-terra. Daí afirmar que [...] o escritor contemporâneo, o escritor moderno, não é monoglota, mesmo se conhece apenas uma língua, porque escreve em presença de todas as línguas do mundo
(2005, p. 33).
2 Segundo Cavalcante, em Contos Completos de Machado de Assis (2003), nas coletâneas em livro foram publicados 76 contos e, deste total, 8 foram escritos diretamente para a versão em livro e apenas 68 foram recolhidos dos periódicos, nos quais Machado os publicou originalmente.
3 Escritor de origem síria, que foi para a Grécia no século II dC e aí viveu em constantes viagens entre Grécia, Itália e Egito.
4 No caso do texto machadiano, abriríamos um pequeno parêntese para uma observação sobre o uso especial que o autor dá ao ponto-e-vírgula [;] colocado estrategicamente em lugares que materializam o posicionamento ambíguo e duplo de sua escritura: nem a pausa da vírgula, que não chega a interromper o fluxo do pensamento; nem o ponto final, que dá por encerrado o curso das ideias. Ao invés disso, ganha realce a figura bifronte do ponto-e-vírgula: marcação que sugere uma interrupção que se deixa perceber como tal, obrigando-nos a ver e sentir este espaço vazio, onde algo ficou por dizer, antes de seguirmos o continuum da frase.
5 Meschonnic é autor de vasta obra que tem na tradução um de seus temas mais importantes. Em Poética do Traduzir, de 1999, sistematiza sua concepção sobre o ato de traduzir como uma poética centrada em dois eixos principais: o do discurso e ritmo e o da invenção de um sujeito histórico – o tradutor – que nem se apaga diante da tradução, nem interfere a ponto de corrigir
, amenizar
ou aparar
as arestas do original.
Introducción
Machado de Assis: cuentos para muchas voces
Las obras disuelven las fronteras de su época, viven a través de los siglos, es decir, en el gran tiempo, además (las grandes obras siempre) tienen una vida más intensa y plena que en su actualidad. (Bakhtin, 2003, p. 362)
Hoy más que nunca, la traducción es un elemento de intercambio y de conocimiento entre las culturas, y en el interior de cada cultura. Sería difícil pensar en hacer la historia de la literatura sin la historia de la traducción. (Meschonnic, 2010, p. XXXIX)
Machado de Assis: cuentos para muchas voces, concordando con lo que enuncian los epígrafes, es una recopilación de cuentos de un escritor brasileño – Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) – cuya obra nos remite al sentido más puro de un clásico, es decir, una obra que, como dice Calvino en Por qué leer a los clásicos (1993), aún no dijo todo lo que tenía para decir
, todavía permanece actual y contemporánea, rompe los límites del tiempo y del espacio, de la lengua y de la cultura en la que fue creada.
Sin embargo, esto no significa que se mantenga inmutable y estática, independiente al tiempo que la atraviesa y a la historia de su recepción, inmersa en los más diversos horizontes de expectativas. Y justamente por el hecho de ser flexible, llena de vacíos, espacios desiertos y laberintos, es que una obra literaria perdura, por haber sido escrita en presencia de otras lenguas del mundo
, como diría Glissant¹ teniendo en cuenta la alteridad y la presencia de la palabra del otro
.
Machado de Assis se introdujo en todos los géneros literarios durante su vida de escritor. La extensión y multitonalidad de su obra puede ser comprobada por medio de una breve muestra de sus producciones: aproximadamente 200 cuentos publicados en distintos periódicos como Jornal das Familias, A Estação, Gazeta de Notícias etc., usando distintos pseudónimos como: Job, Manassés, Lélio, M. de A., etc. Entre estos cuentos solo 68² fueron elegidos por Machado para ediciones en libros: Contos fluminenses (1870), Histórias da meia noite (1873), Papéis avulsos (1882), Histórias sem data (1884), Várias histórias (1896), Páginas recolhidas (1899) e Relíquias da Casa Velha (1906).
También en los periódicos, Machado de Assis trabajó como cronista, con un número aproximado de 600 crónicas publicadas durante su carrera de escritor. A su vez, redefinió este género en su forma moderna, que encontró en la prensa su nuevo lugar.
Como cronista, Machado realmente produjo obras maestras del género, cuya fuerza está en la contaminación de lo cotidiano por lo literario. Este trabajo constructivo consiste en seleccionar de los diarios la materia prima de la crónica para desarrollar justamente el efecto estético, es decir, promover dicha combinación de discursos para accionar lo imaginario en detrimento de lo informativo. Un simple ejemplo se encuentra en este fragmento de una crónica de A semana, del 16/10/1892, publicada en el diario A Gazeta de Notícias, que trata de la inauguración de los colectivos eléctricos en Río de Janeiro del siglo XIX. Lo que vemos en esta escena es al cronista dialogando con dos burros para sugerir la crítica irónica al poder económico y social, por medio de una estrategia literaria basada en la matriz popular de la fábula, en la que se mezclan la fantasía y la moral:
[...] el tranvía eléctrico solo nos va a hacer cambiar de dueño
– ¿De qué forma?
– Nosotros somos bienes de la compañía. Cuando estén bien encaminados por los cables, no nos necesitaran más y nos venderán. Pasaremos naturalmente a las carrozas.
– ¡Qué burrada de noticia! Exclamó el burro de la izquierda. ¿Ninguna jubilación? ¿Ningún premio? ¿Ningún signo de agradecimiento? ¡Oh! Pero, ¿dónde está la justicia de este mundo? [...]
– Eres lúgubre, dijo el burro de la derecha. No conoces la lengua de la esperanza.
– Puede ser compañero, pero la esperanza es propia de las especies débiles, como el hombre y el grillo; el burro se distingue por su fortaleza sin igual. Nuestra raza es esencialmente filosófica. [...] aproveché la ocasión y murmuré bajito entre los dos burros:
– Houyhnhnnms!
Fue un choque eléctrico. Ambos se estremecieron, levantaron las patas y me preguntaron llenos de entusiasmo:
– ¿Qué hombre eres tú, que conoces nuestra lengua? (Machado de Assis, 1992, pp. 552-553)
Este singular discurso, con su propio ritmo dado por la puntuación, por la vivacidad de los diálogos y las combinaciones y cortes inusuales, es un ejemplo de lo que hace de Machado de Assis un verdadero clásico
, capaz de atravesar fronteras y de ser apreciado por aquellos lectores disponibles para el pacto ficcional. Esta marca de estilo, esencialmente dialogal, acompañará toda la obra machadiana que en este sentido, podrá ser considerada como un sistema orgánico en el que cada partícula está intrínsecamente conectada con el todo, penetrando en cada género que produjo.
Lo mismo sucedió con la novela, en la que Machado se distingue por la audacia de soluciones y por la revolución introducida en las formas de la tradición literaria, tanto romántica como realista.
Como novelista, Machado de Assis publicó nueve novelas – Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876), Iaiá Garcia (1878), Memórias póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891), Dom Casmurro (1900), Esaú e Jacó (1904) y Memorial de Aires (1908). Machado