Práticas (Trans)formativas em Linguagens - V.2
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Práticas (Trans)formativas em Linguagens - V.2 - Gabriela Belo-Silva
Práticas (trans)formativas
em linguagens
v. 2
Editora Appris Ltda.
1.ª Edição - Copyright© 2022 dos autores
Direitos de Edição Reservados à Editora Appris Ltda.
Nenhuma parte desta obra poderá ser utilizada indevidamente, sem estar de acordo com a Lei nº 9.610/98. Se incorreções forem encontradas, serão de exclusiva responsabilidade de seus organizadores. Foi realizado o Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional, de acordo com as Leis nos 10.994, de 14/12/2004, e 12.192, de 14/01/2010.Catalogação na Fonte
Elaborado por: Josefina A. S. Guedes
Bibliotecária CRB 9/870
Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT
Editora e Livraria Appris Ltda.
Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês
Curitiba/PR – CEP: 80810-002
Tel. (41) 3156 - 4731
www.editoraappris.com.br
Printed in Brazil
Impresso no Brasil
Gabriela Belo-Silva
Jamille Arnaut Brito Moraes
(org.)
Práticas (trans)formativas
em linguagens
v. 2
Dedicamos este livro a todos aqueles que, no Brasil, apesar da escassez de investimentos governamentais, não desistem de seguir trabalhando, incansavelmente, em prol de uma educação pública, gratuita e de qualidade.
AGRADECIMENTOS
Gostaríamos de exprimir nossos agradecimentos e nossa gratidão às autoridades do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano), especialmente à Pró-Reitoria de Extensão (Proex), o financiamento deste livro por meio do Edital 127/2021.
Agradecemos à Professora Doutora Célia Maria Pedrosa, coordenadora de Extensão, no campus Valença, o auxílio ao longo de todo o percurso na submissão desta proposta.
Ao diretor-geral do campus Valença, Professor Doutor Geovane Lima Guimarães; ao diretor acadêmico, Professor Doutor Gilson Antunes da Silva; e à coordenadora-geral de Ensino, Professora Doutora Dislene Cardoso de Brito, o incentivo e apoio na elaboração desta obra.
Aos estudantes do curso de pós-graduação em Leitura e Ensino Aplicadas à EJA (Poslet/IF Baiano), aos discentes do curso técnico de Agroecologia Integrado e aos alunos egressos do IF Baiano, campus Valença, que contribuíram com este projeto.
Aos docentes e servidores do IF Baiano, campus Valença, e aos pesquisadores que atuam em distintas instituições públicas de ensino do Nordeste brasileiro: Universidade Federal do Ceará (UFC), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (Ifba), Universidade Federal do Sergipe (UFS), Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Universidade Federal da Bahia (Ufba), Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e Universidade Federal do Maranhão (Ufma). Agradecemos por abraçarem esta proposta de trabalho e por tecerem, conosco, redes de afeto e de estudos, de parcerias e pesquisas.
Aos coordenadores e aos membros dos grupos de pesquisa: Laboratório de Estudos em Políticas Linguísticas, Interação e Desenvolvimento Humano (Lidah), Grupo de Pesquisa em Linguagens, Culturas e Ambientes (Glicam), Grupo de Pesquisas e Práticas em Gênero, Diversidade e Sexualidade (Gedisex), liderados pelas Professoras Doutoras Gabriela Belo da Silva, Ionã Carqueijo Scarante e Quezia dos Santos Lima, respectivamente.
A todos aqueles que, como um rizoma, teceram os fios da vida aos nichos teóricos, aos que possibilitaram, por meio da apresentação de seus textos, nesta obra, a manifestação do interser, estabelecendo alianças teóricas e praxiológicas, simplesmente alianças, como nos ilumina Deleuze e Guattari¹. Por serem capazes de, assim como as águas de um rio, terem forças suficientes para trazer à vida as raízes do verbo ser manifestos como resultados de pesquisas-vida.
Dois enunciados distantes um do outro, tanto no tempo quanto no espaço, que nada sabem um sobre o outro, no confronto dos sentidos revelam relações dialógicas se entre eles há ao menos alguma convergência de sentidos (ainda que seja uma identidade particular do tema, do ponto de vista, etc.).
(BAKHTIN, 2003, p. 331)
¹ DELEUZE, G.; GUATTARRI, F. Mil platôs. Tradução de Ana Lúcia de Oliveria, Aurélio Guerra Neto e Célia Pinto Costa. São Paulo: Editora 34, 2011.
Dois enunciados distantes um do outro, tanto no tempo quanto no espaço, que nada sabem um sobre o outro, no confronto dos sentidos revelam relações dialógicas se entre eles há ao menos alguma convergência de sentidos (ainda que seja uma identidade particular do tema, do ponto de vista, etc.).
(BAKHTIN, 2003, p. 331)
Sumário
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO 1
REPERTÓRIO E TRANSPOSIÇÃO DIDÁTICA DO GÊNERO CRÔNICA: NAS TRILHAS DA LIDA NO LIDAH
Gabriela Belo-Silva
Fabiane de Jesus Caldas Brito
Gisely Nogueira Barreto
CAPÍTULO 2
ALFABETIZAÇÃO DE PESCADORES E MARISQUEIRAS DO DISTRITO DO GUAIBIM: REFLEXÕES SOBRE UM PROJETO DE EXTEN1SÃO
Jamille Arnaut Brito Moraes
CAPÍTULO 3
LIBRAS COMO SEGUNDA LÍNGUA (L2): POSSIBILIDADES DE INTERAÇÃO ENTRE CRIANÇAS SURDAS E OUVINTES DE UMA SALA DE AULA INCLUSIVA DO MUNICÍPIO DE VALENÇA (BA)
Danielle Matos Correia Ribeiro
Jamille Arnaut Brito Moraes
Airan Silva Souza Nascimento
CAPÍTULO 4
UM SOLUÇO ABAFADO: INTRODUÇÃO À LÍRICA DE INNOCENCIO GALVÃO DE QUEIROZ
Gilson Antunes da Silva
Ana Beatriz dos Santos Conceição
Carlos Abraão Negrão Silva
CAPÍTULO 5
MEMÓRIAS E HISTÓRIAS DA FORTALEZA DO MORRO DE SÃO PAULO: O PATRIMÔNIO MATERIAL E IMATERIAL PELO OLHAR DOS GUARDIÕES DA MEMÓRIA LOCAL
Dislene Cardoso de Brito
Rita do Desterro da Silva Rocha
CAPÍTULO 6
ONDE ESTÃO AS ESCRITORAS NEGRAS DO BAIXO SUL DA BAHIA? DO SILENCIAMENTO À RESISTÊNCIA NAS PUBLICAÇÕES LITERÁRIAS
Mirelly Santos Valentim
Quezia dos Santos Lima
CAPÍTULO 7
ENTRE A POESIA ATRAVESSADA PELA DOR, A CRÔNICA JORNALÍSTICA E A CRÍTICA LITERÁRIA: OS ITINERÁRIOS DO ESCRITOR JOSÉ LEONE (1907-1983)
Ionã Carqueijo Scarante
Marina Santos Argolo
CAPÍTULO 8
EXAMES EM LARGA ESCALA ENQUANTO DISPOSITIVOS E MECANISMOS DE POLÍTICAS LINGUÍSTICAS
Gabriela Belo-Silva
José Luis Monteiro da Conceição
CAPÍTULO 9
O TRABALHO PRESCRITO E O REAL DO TRABALHO: UMA ANÁLISE DO TRABALHO DOCENTE NOS CURSOS PREPARATÓRIOS PARA O ENEM
Gabriela Belo-Silva
Alessandra Rosário Miranda
Letícia Vitória Santos Mendes
CAPÍTULO 10
GÊNERO E RESISTÊNCIA NA OBRA O CABORONGO, DE ISA DE OLIVEIRA: UMA ANÁLISE DISCURSIVA
Quezia dos Santos Lima
CAPÍTULO 11
CABELO CRESPO E DISCURSIVIDADES SOBRE TRANÇA AFRO: A RESISTÊNCIA NEGRA PARA ALÉM DA ESTÉTICA
Zenaide Jesus dos Santos
Quezia dos Santos Lima
CAPÍTULO 12
MULHERES NEGRAS E MATERNIDADE: TESSITURAS DISCURSIVAS DE RESISTÊNCIA NO CONTO QUANTOS FILHOS NATALINA TEVE?
, DE CONCEIÇÃO EVARISTO
Imaíra Pinheiro de Almeida da Silva
Gabriel Vidinha-Corrêa
CAPÍTULO 13
QUANDO O LAR TRANSFORMAR-SE EM CAOS: PAISAGENS DO MEDO EM UMA CASA NA ESCURIDÃO, DE JOSÉ LUÍS PEIXOTO
Gabriel Vidinha-Corrêa
CAPÍTULO 14
NARRATIVAS DE ENCONTRO COM ARTESÃOS E ARTESÃS DE MARAGOGIPINHO
Joseane Costa Santana
CAPÍTULO 15
LITERATURA, CRÍTICA PSICANALÍTICA E ENSINO: POR UMA FORMAÇÃO HUMANIZADORA DO LEITOR
Gilson Antunes da Silva
CAPÍTULO 16
AGONIAS DO SERTÃO: O MUNDO FEITO DE RUÍNAS EM O JAGUNÇO VELHO, DE ARAKEN VAZ GALVÃO
Gilson Antunes da Silva
Juscimare Silva de Souza
CAPÍTULO 17
NOTAS DE SI NA OBRA CRÔNICAS DAS PRISÕES E DO EXÍLIO: MEMÓRIAS E HISTÓRIAS DA DITADURA MILITAR NA PRODUÇÃO LITERÁRIA DE ARAKEN VAZ GALVÃO
Dislene Cardoso de Brito
Luciano Silva Oliveira
CAPÍTULO 18
LEITURAS, PARTILHAS E METAMORFOSES — A CONSTRUÇÃO COLETIVA DO LIVRO MÃOS QUE INSPIRAM POESIA: A ARTE DE MARAGOGIPINHO TRADUZIDA EM VERSOS E ILUSTRAÇÕES
Ionã Carqueijo Scarante
Joseane Costa Santana
CAPÍTULO 19
UMA ESPLENDOROSA ESTRELA FAISCANTE: A PRODUÇÃO LITERÁRIA DA ESCRITORA BAIANA MADY CRUSOÉ (1913-1997)
Ionã Carqueijo Scarante
CAPÍTULO 20
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO TERRITÓRIO DO BAIXO SUL BAIANO: O CENÁRIO DE 2020 PELO OLHAR DOS ESTUDANTES DO MUNICÍPIO PRESIDENTE TANCREDO NEVES, BA
Dislene Cardoso de Brito
Islany Jesus dos Santos Alves
SOBRE OS AUTORES
INTRODUÇÃO
Um rizoma não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo. A árvore é filiação, mas o rizoma é aliança, unicamente aliança. A árvore impõe o verbo ser
, mas o rizoma tem como tecido a conjunção e... e... e...
. Há nesta conjunção força suficiente para sacudir e desenraizar o verbo ser.
(DELEUZE; GUATTARI, 2019)
Talvez o ideal de uma apresentação fosse expor toda a coisa sobre cada um dos capítulos em uma única página, sob uma mesma paragem: autores, temas, ideias, justificativas, aparato teórico-metodológico e as conclusões, apenas conclusões. Todavia, foi impossível a nós, organizadoras, não construirmos um texto de abertura que comportasse a palavra (BAKHTIN; VOLOCHINOV, 1995), mediada por essas pesquisas-vida, com base em um encadeamento de afetos (DELEUZE; GUATTARI, 2019).
As investigações científicas que compõem a obra Práticas (Trans)Formativas em Linguagens (v. 2) conduzirão você, leitor, a um mergulho nas ações pedagógicas e nas pesquisas que foram e são desenvolvidas no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano), campus Valença. Os textos apresentados nesta coletânea são fruto da produção acadêmica de pesquisadores do IF Baiano, campus Valença, e de distintas instituições do Nordeste brasileiro — Universidade Federal do Ceará (UFC), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (Ifba), Universidade Federal do Sergipe (UFS), Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Universidade Federal da Bahia (Ufba), Universidade do Estado da Bahia (Uneb) e Universidade Federal do Maranhão (Ufma) —, o que confere a esta obra o status de uma produção científica relevante e inovadora, pois congrega resultados de pesquisas realizadas, no Baixo Sul da Bahia, em um movimento de interface com diversos grupos de pesquisa e instituições públicas brasileiras.
Ademais, os capítulos apresentados resultam de projetos de pesquisa e/ou extensão contemplados em editais de agências de fomento: do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic) para o ensino médio; da Pró-Reitoria de Extensão/Coordenação Geral de Difusão Técnico-Científico e Cultural/Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Baiano (Proex); e da Pró-Reitoria de Pesquisa e Inovação (Propes) e/ou com cadastro interno no campus Valença.
Tais projetos foram desenvolvidos em parceria com o Laboratório de Estudos em Políticas Linguísticas, Interação e Desenvolvimento Humano (Lidah); o Grupo de Pesquisa em Linguagens, Culturas e Ambientes (Glicam); o Grupo de Pesquisas e Práticas em Gênero, Diversidade e Sexualidade (Gedisex), cadastrados no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); com estudantes do curso de Pós-Graduação em Leitura e Ensino Aplicadas à EJA (Poslet/IF Baiano); com discentes do curso Técnico de Agroecologia Integrado; e com os alunos egressos do IF Baiano, campus Valença. Uma rede de ações acadêmicas, e sobretudo humanas, que ocorrem dentro da instituição e para além de suas fronteiras, demonstrando na prática que é possível e necessário realizar pesquisas que tenham como pilares o ensino, a pesquisa, a extensão e a verticalização nos estudos científicos, com foco na busca por intervir em problemáticas locais.
Ao longo de cada capítulo, por um olhar interativo e/ou exotópico, aqueles que lançarem um olhar-leitor (PÊCHEUX, 1990) sobre os textos compilados neste livro terão a possibilidade de caminhar por distintas linhas de pesquisa, pois trata-se de uma obra que foi organizada como uma grande orquestra, haja vista que há em sua composição uma verdadeira polifonia (BAKHTIN, 1997).
Nesta obra, as pesquisas apresentadas não se configuram apenas como estruturas linguísticas, pois cada uma delas é dotada de magia, e seus limites são traçados por sua essência-de-linguagem, e não pelos seus conteúdos verbais (BENJAMIN, 2020). Nesse ínterim, a todo momento o material linguístico é atravessado pelo universo essencialmente humano, seja por meio de estudos sobre a língua em interação, seja mediante a história, a memória, a práxis ou a literatura.
Apesar de contemplarem diversos nichos de pesquisa, os capítulos possuem um ponto em comum, pois contribuem para o fortalecimento da identidade institucional, da língua, da linguagem e do acesso à educação como forma de inclusão social e de formação continuada de professores, assim como para a fortuna crítica de autores contemplados nas investigações no território do Baixo Sul. Ademais, tem-se a valorização da história e da cultura de povos que foram marginalizados, articulada ao debate das questões étnico-raciais e representações sobre as mulheres negras no Baixo Sul.
No Capítulo 1, intitulado Repertório e transposição didática do gênero crônica: nas trilhas da lida no Lidah
, as autoras Gabriela Belo-Silva, Fabiane de Jesus Caldas Brito e Gisely Nogueira Barreto apresentam resultados de investigações realizadas com base no projeto de extensão I Workshop Lidah
, organizado pelo Laboratório de Estudos em Políticas Linguísticas, Interação e Desenvolvimento Humano (Lidah). Por ser uma pesquisa qualitativa que tem como objetivo compreender o desenvolvimento da escrita criativa por meio do processo de transposição didática do gênero textual crônica, a fundamentação teórica ancorou-se nos pressupostos da Linguística Aplicada e da Didática de Línguas em interface com os estudos da Linguística Textual. Enquanto percurso metodológico, as autoras utilizaram a planificação do gênero crônica, de seus elementos composicionais e da textualidade, a organização da sequência didática utilizada nas oficinas e uma análise interpretativa. Em resultados, fica evidente que a utilização da sequência didática, com base no desenvolvimento de oficinas para a produção escrita, oferece a possibilidade de aperfeiçoamento das capacidades de linguagem e de habilidades previamente consolidadas.
No Capítulo 2, Alfabetização de pescadores e marisqueiras do distrito do Guaibim: reflexões sobre um projeto de extensão
, produzido por Jamille Arnaut Brito Moraes, tem-se a apresentação do desenvolvimento do projeto de extensão Na rede das letras: alfabetização de pescadores e marisqueiras do distrito do Guaibim, do IF Baiano, câmpus Valença
. É por meio do resgate das ações pedagógicas desenvolvidas que a autora reflete sobre a conceituação da alfabetização e do letramento, já que, na história da alfabetização no Brasil, eles são, por vezes, retratados de forma imbrincada. Como objetivo principal desta produção científica, tem-se a ampliação das práticas sociais de leitura e escrita no cotidiano dos sujeitos envolvidos. Quanto à metodologia utilizada, a autora optou por desenvolver a pesquisa-ação, construindo um olhar interpretativo sobre as atividades pedagógicas desenvolvidas. Por fim, a culminância da pesquisa resultou na elaboração de um livreto, no qual foram narradas as atividades realizadas no projeto e a produção de textos autobiográficos elaborados pelos participantes.
No Capítulo 3, Libras como segunda língua (L2): possibilidades de interação entre crianças surdas e ouvintes de uma sala de aula inclusiva do município de Valença (BA)
, elaborado por Danielle Matos Correia Ribeiro, Jamille Arnaut Brito Moraes e Airan Silva Souza Nascimento, têm-se os resultados da execução do projeto de extensão O ensino da Libras para crianças surdas e ouvintes em salas de aula inclusivas
, desenvolvido na Escola Municipalizada Dr. Elísio Pimentel Marques, em Valença. O projeto buscou atenuar as barreiras comunicacionais entre crianças surdas e ouvintes, envolvidas em um mesmo contexto de aprendizagem, além de fomentar o conhecimento da cultura surda e da Língua Brasileira de Sinais (Libras) como segunda língua (L2). A metodologia utilizada foi a pesquisa-ação; e, como atividade de culminância, foi apresentada pelas crianças uma música e uma dramatização teatral em Libras.
No Capítulo 4, "Um soluço abafado: introdução à lírica de Innocencio Galvão de Queiroz, os autores Gilson Antunes da Silva, Ana Beatriz dos Santos Conceição e Carlos Abraão Negrão Silva trazem os resultados do projeto de pesquisa
Entre a memória, a salvaguarda e o texto: Innocencio Galvão de Queiroz e sua dispersa produção ficcional", desenvolvido no IF Baiano, campus Valença, entre os anos de 2019 e 2020. Neste projeto, amparados pela Filologia e fundamentados na Teoria Literária e na Psicanálise, os autores realizam edições interpretativas de textos do autor Innocencio Galvão de Queiroz os quais estavam espalhados em diferentes suportes e arquivos, reunindo-os para salvaguardá-los do esquecimento e da destruição do tempo. Foi com base em um trabalho bibliográfico e uma compilação de 50 poemas que os pesquisadores realizaram um estudo a fim de evidenciar as principais linhas de força presentes em sua lírica.
No Capítulo 5, Memórias e histórias da Fortaleza do Morro de São Paulo: o patrimônio material e imaterial pelo olhar dos guardiões da memória local
, as autoras Dislene Cardoso de Brito e Rita do Desterro da Silva Rocha abordam histórias e memórias do Morro de São Paulo (Cairu, BA). O trabalho teve como objetivo investigar as narrativas da Fortaleza do Morro de São Paulo, por meio de relatos de estudantes e entrevistas com moradores e turistas, para contribuir com o processo de valorização da identidade local. O resgate destas histórias intenta fortalecer a cultura local nas escolas da comunidade, por meio do acesso a este patrimônio cultural e material, de modo a favorecer o sentimento de pertencimento e conhecimento da cultura a que pertencem. A fundamentação teórica que sustenta esta pesquisa é estruturada por textos teóricos sobre patrimônio material e autores que estudam memórias e as histórias contadas sobre Tinharé e sobre a Fortaleza do Morro de São Paulo.
No Capítulo 6, Onde estão as escritoras negras do Baixo Sul da Bahia? Do silenciamento à resistência nas publicações literárias
, elaborado pelas autoras Mirelly Santos Valentim e Quezia dos Santos Lima, é abordado o resultado de um projeto de pesquisa em curso. As investigações realizadas pelas autoras visam apresentar o mapeamento das escritoras negras do Território Baixo Sul da Bahia, a fim de analisar como se constituem os discursos de resistência em suas obras e dar visibilidade às vozes historicamente silenciadas numa sociedade estruturalmente racista. Este trabalho aborda as questões de gênero e raça, ao passo que denuncia a invisibilização da produção de registros por autoras negras. Como corpus, as pesquisadoras elegem as publicações literárias de autoras negras da região do Baixo Sul da Bahia, em redes sociais, jornais de entidades, materiais de divulgação de coletivos feministas, de organizações territoriais e em outras fontes em que as escritoras publicam. Foram analisadas as discursividades sobre relações étnico-raciais e de gênero emanadas dessas obras, à luz da Análise do Discurso materialista. Este estudo contribui para a constituição de um arquivo que reorganiza as narrativas e discursos em disputa.
No Capítulo 7, Entre a poesia atravessada pela dor, a crônica jornalística e a crítica literária: os itinerários do escritor José Leone (1907-1983)
, as autoras Ionã Carqueijo Scarante e Marina Santos Argolo relatam a pesquisa desenvolvida por meio do projeto intitulado Cantos de dor e solidão no Baixo Sul da Bahia: uma proposta de edição crítica da produção literária de José Leone (1907-1983)
, dispersa em jornais baianos. Neste texto, as autoras expõem uma leitura crítica dos poemas de José Leone (1907-1983) publicados em seus livros, e destacam o seu papel como cronista e crítico literário em periódicos que circularam no Baixo Sul e no Recôncavo da Bahia. Desse modo, suas bases teóricas foram os estudos filológicos para a salvaguarda do patrimônio escrito artístico e cultural, a conservação e edição de textos e os conceitos de cânone/clássico/obra-prima; e, por fim, trazem à baila a relevância da pesquisa em acervos.
No Capítulo 8, intitulado Exames em larga escala enquanto dispositivos e mecanismos de políticas linguísticas
, os autores Gabriela Belo-Silva e José Luis Monteiro da Conceição, situados no escopo da Linguística Aplicada, discorrem sobre os exames em larga escala que são realizados no Brasil, atualmente, na educação básica, com base nos resultados de um estudo bibliográfico. O objetivo desta investigação foi compreender a diferença entre exame em larga escala e avaliação formativa e como esses instrumentos avaliativos funcionam enquanto dispositivos e mecanismos de Políticas Linguísticas capazes de impactar a prática pedagógica desenvolvida no âmbito escolar. A construção da análise teve como principal aporte teórico e metodológico o Interacionismo Sociodiscursivo (ISD) e as contribuições advindas da Política Linguística.
No Capítulo 9, O trabalho prescrito e o real do trabalho: uma análise do trabalho docente nos cursos preparatórios para o Enem
, as autoras Gabriela Belo-Silva, Alessandra Rosário Miranda e Letícia Vitória Santos Mendes analisam a atividade docente fundamentadas na Clínica da Atividade e da Ergonomia à luz do ISD. O objetivo principal das reflexões empreendidas, com base nesta pesquisa qualitativa, foi analisar em que medida o que é normatizado nos documentos prescritivos se configura no trabalho realizado e no real da atividade docente. Para tanto, são analisadas as orientações da Matriz de Referência para a Redação do Enem, os planejamentos de aula de um professor que atua em um curso pré-Enem na cidade de Catalão (GO) e uma avaliação aplicada por esse docente. A análise é feita em três dimensões, considerando o que é prescrito, realizado e impossibilitado pelas condições de produção. As autoras concluem refletindo sobre as condições de produção, relacionando o que foi normatizado pelas instâncias governamentais e o trabalho real desenvolvido pelos professores.
No Capítulo 10, "Gênero e resistência na obra O Caborongo, de Isa de Oliveira: uma análise discursiva", Quezia dos Santos Lima analisa esse romance, que evidencia linguagens e culturas baianas representadas pelos moradores de Taperoá, onde nasceu Isa Maria Silva de Oliveira, a autora dessa narrativa que marca a produção literária do Baixo Sul da Bahia. O objetivo desta pesquisa foi analisar a circulação dos discursos sobre a mulher e as posições de sujeito sobre os gêneros, sob pressupostos da Análise de Discurso pecheutiana. A autora analisa ainda os ditos e os não ditos sobre os papéis sociais e o silenciamento feminino, e como se estabelece na narrativa a resistência da mulher aos padrões impostos na sociedade. O estudo do texto da autora Isa de Oliveira contribui para um novo olhar acerca da circulação de discursos sobre mulheres nas obras de escritoras do Baixo Sul da Bahia.
No Capítulo 11, Cabelo crespo e discursividades sobre trança afro: a resistência negra para além da estética
, as autoras Zenaide Jesus dos Santos e Quezia dos Santos Lima partem do pressuposto de que o corpo é também discursivo e que o cabelo crespo mobiliza diferentes posicionamentos de sujeitos, por isso o ato de trançar o cabelo crespo perpassa pelos caminhos da ancestralidade, não se limitando a um código estético ou tendência de moda. É por meio de uma abordagem qualitativa, e que tem como base teórica e metodológica a Análise do Discurso Materialista e os estudos sobre Relações Étnico-Raciais, que esta pesquisa busca revelar como essa prática mobiliza o fortalecimento da autoestima da mulher preta, bem como suas representações políticas e ideológicas na sociedade. Como corpus, têm-se as gravações e transcrições de conversas da pesquisadora (trançadora) com três mulheres, por meio da plataforma Google Meet, seguindo um roteiro.
No Capítulo 12, Mulheres negras e maternidade: tessituras discursivas de resistência no conto ‘Quantos filhos Natalina teve?’, de Conceição Evaristo
, produzido por Imaíra Pinheiro de Almeida da Silva e Gabriel Vidinha-Corrêa, é analisado de que modo ocorre a representação da relação mulheres negras e maternidade no conto Quantos filhos Natalina teve?
, que compõe o livro Olhos D’Água (2016), de autoria de Conceição Evaristo. Como escopo teórico, os autores utilizaram os estudos de gênero e das relações de poder. À luz dessa teoria, lançam um necessário olhar sobre os estereótipos da mulher negra no Brasil, por um viés histórico, bem como das interseccionalidades entre marcas de diferença, em destaque: gênero, raça, classe social e a possibilidade de gestar e cuidar, que configuram e assolam o corpo desses sujeitos. Com isso, faz-se levantamento das categorias que problematizam os contextos nos quais se inserem mulheres, mulheres negras e mulheres negras mães como algo distinto da noção sacra, intocável e sem rasuras geralmente presente no cânone literário. Tais evidências contribuem ao debate sobre a relação entre o tornar-se mulher negra e mãe, abalando a noção de mãe como algo biológico e concretiza a maternidade e fertilidade como algo autônomo e prática de resistência.
No Capítulo 13, "Quando o lar transformar-se em caos: paisagens do medo em Uma casa na escuridão, de José Luís Peixoto", Gabriel Vidinha-Corrêa analisa o romance pela percepção do espaço. O romance narra as experiências de um jovem escritor que intenta escrever o seu maior romance. Ao longo do capítulo, o enfoque recai sobre os momentos de figuração da privação da liberdade e do suplício dos corpos. A casa que simboliza o maior estado de segurança se torna um cárcere àqueles que, antes, nela vivam em paz; ademais, tudo nesse lugar caracteriza uma paisagem do medo: invasões, doenças, conflitos e ansiedade dos personagens. Tais questões foram analisadas à luz da Geografia Humanista Cultural, de base fenomenológica, com ênfase nos sentimentos e sensações postulados no lugar, quais sejam: topofobia, espaciosidade, apinhamento, medo e lar.
No Capítulo 14, Narrativas de encontro com artesãos e artesãs de Maragogipinho
, Joseane Costa Santana tem como objeto de estudo os artesãos e as artesãs da comunidade tradicional de Maragogipinho, distrito de Aratuípe, Bahia, e a relevância de cartografar e registrar fragmentos da memória narrativa deles. A autora discute sobre as relações entre artesanato, repetição-recriação e ensino, por meio de registro das escrevivências obtidas em encontros mantidos com esses sujeitos. Os registros e as reflexões aqui contidos foram cultivados dentro de uma rede de diálogo: leitura de material bibliográfico, estudo teórico e experiências corporais-relacionais. Desse modo, trata-se de um estudo na modalidade de cartografia narrativa, com percurso na pedagogia artesã, realizada no diálogo com essa comunidade. Como resultado da pesquisa empreendida, teve-se a produção colaborativa de um livro-aulas feito de memórias compartilhadas, de trajetórias culturais, escrevivências da autora, em colaboração com esses mestres e essas mestras para ser utilizado nas escolas da comunidade.
No Capítulo 15, Literatura, crítica psicanalítica e ensino: por uma formação humanizadora do leitor
, o autor, Gilson Antunes da Silva, tematiza o ensino de literatura realizado sob a crítica psicanalítica, a fim de auxiliar no processo de humanização do leitor. Uma das funções da arte literária consiste em desenvolver no indivíduo uma cota de humanidade, tornando-o mais aberto à compreensão do mundo e, principalmente, à leitura de si mesmo. A crítica psicanalítica auxilia o sujeito na percepção dos problemas subjetivos entranhados na linguagem literária e oferece-lhe recursos para que possa compreender o homem em suas dimensões mais íntimas e profundas. O objetivo desta pesquisa foi discutir como o ensino de literatura, feito com auxílio dos pressupostos teóricos da crítica psicanalítica, favorece a humanização do sujeito, para, com isso, propor caminhos metodológicos de ensino voltados para a hermenêutica do sujeito leitor. Trata-se de um trabalho de natureza bibliográfica que tem como inspiração teórica pressupostos advindos da Teoria Literária e da Crítica Psicanalítica. Ao longo do texto, o autor desvela como a literatura e a crítica psicanalítica potencializam no indivíduo mecanismos hermenêuticos e transformações subjetivas. Em meio à crise por que passa o ensino dessa disciplina, aproximá-la da vida e fazer com que o aluno se implique no que lê pode ajudar a amenizar esse mal-estar instalado no campo dos estudos literários e auxiliar no crescimento e aperfeiçoamento desse leitor.
No Capítulo 16, "Agonias do sertão: o mundo feito de ruínas em O jagunço velho, de Araken Vaz Galvão", de Gilson Antunes da Silva e Juscimare Silva de Souza, os autores apresentam a análise da obra O Jagunço Velho (2016). Araken Vaz Galvão retoma, sob a figura de Quelé, um personagem que marcou as histórias do Brasil e da literatura brasileira. O jagunço, em várias obras, encarna imagens associadas à violência, à coragem, à selvageria, à resistência, à frieza diante da morte, à astúcia e à sagacidade. Na perspectiva de Queiroz, o jagunço aparece sob o signo da decadência. Quelé é sujeito velho, solitário, sem linguagem, destituído de falo e vigor, a ruminar — machadianamente — um remorso que o corrói. Assim, os autores evidenciam como são representadas a culpa e a decadência. A análise teve como aportes teóricos a Psicanálise e a Teoria literária, pelo viés de uma leitura de natureza comparatista.
No Capítulo 17, "Notas de si na obra Crônicas das prisões e do exílio: memórias e histórias da ditadura militar na produção literária de Araken Vaz Galvão", dos autores Dislene Cardoso de Brito e Luciano Silva Oliveira, é apresentada uma proposta de pesquisa bibliográfica baseada em textos da literatura valenciana e tomando como foco de análise a obra Crônica das Prisões e do Exílio (2014), do escritor Araken Vaz Galvão. Ao longo do texto, os autores analisam as histórias e as memórias da ditadura militar do Brasil presentes nas crônicas narradas na obra, à luz da teoria da autobiografia, observando como se dá o processo de construção memorialístico do escritor na narrativa. O principal objetivo desta investigação é dar visibilidade à produção literária de Araken Vaz Galvão, divulgando a produção valenciana, de modo a incentivar as práticas educativas com textos da literatura local nas escolas do território do Baixo Sul baiano.
No Capítulo 18, "Leituras, partilhas e metamorfoses — a construção coletiva do livro Mãos que inspiram poesia: a arte de Maragogipinho traduzida em versos e ilustrações, de Ionã Carqueijo Scarante e Joseane Costa Santana, são apresentados os resultados do projeto de extensão
Semana de linguagens". Foi dos momentos vivenciados em Maragogipinho que as autoras, com os alunos, elaboraram a obra Mãos que Inspiram. A experiência pedagógica descrita no texto configura uma prática pedagógica que se apresenta como um exemplo de pesquisa-ensino-criação. A discussão teórica empreendida, em sala de aula, fundamenta-se no uso dos gêneros textuais, perpassando pelo universo da pedagogia artesã, que preserva e ressignifica culturas e comunidades. Este trabalho culminou na elaboração coletiva do livro Mãos que Inspiram Poesia: a arte de Maragogipinho traduzida em versos e ilustrações (2019).
No Capítulo 19, Uma esplendorosa estrela faiscante: a produção literária da escritora baiana Mady Crusoé (1913-1997)
, a autora Ionã Carqueijo Scarante apresenta a escritora baiana, da cidade de Nazaré, Maria Madalena Ferreira Crusoé (1913-1997). Mady Crusoé (como ficou conhecida) iniciou sua incursão literária escrevendo poemas, ainda na adolescência, mas foi ao gênero crônica que se dedicou, publicando seus textos em periódicos baianos. Nesta pesquisa, a autora agiu como intérprete da voz silenciada de Mady Crusoé, apresentando uma leitura dos caminhos percorridos por esta, desvelados em suas narrativas publicadas na imprensa baiana no século XX. Seu objetivo foi dar visibilidade e atenuar a ausência da escritora Mady Crusoé nos estudos da nova historiografia literária brasileira.
No Capítulo 20, Educação de jovens e adultos no território do Baixo Sul baiano: o cenário de 2020 pelo olhar dos estudantes do município Presidente Tancredo Neves
, as autoras Dislene Cardoso de Brito e Islany Jesus dos Santos Alves trazem estudos sobre a Educação de Jovens e Adultos (EJA) nos municípios de Valença e Presidente Tancredo Neves, tendo como objetivo mapear essa modalidade, a fim de compreender o contexto da EJA, identificando seus avanços e entraves, com base em informações obtidas nas comunidades. Trata-se de uma pesquisa de campo, fundamentada por documentos legais da EJA, sustentada por uma pesquisa bibliográfica com estudiosos da modalidade visando contribuir para o cenário educacional do território, além de promover espaço de debates sobre a EJA, buscando garantir a todos os jovens, adultos e idosos uma educação de qualidade e que reverbere os anseios desses sujeitos.
Por fim, este convite à leitura vem acompanhado pelo anseio de que esta coletânea promova reflexões, novos caminhos e perspectivas teóricas voltadas para o fortalecimento de uma educação de qualidade, engajada com a realidade social e cultural na qual se insere, de forma contextualizada e conectada com a vida das pessoas que são diretamente afetadas pelas escolhas políticas educacionais que fazemos. Desejamos que o livro inspire o deleite que encontramos em nossa travessia por ele, trajetória essa que certamente será particular e diferente para cada leitor; e que desperte o interesse sobre o estudo da linguagem, seja porque ela não é neutra e ressoa discursividades, seja porque ela constitui a nossa existência.
Gabriela Belo-Silva
Jamille Arnaut Brito Moraes
Outono de 2022
Referências
BAKHTIN, M. M. Estética da criação verbal. Tradução de Maria Ermantina Galvão Pereira. 2. ed. São Paulo: Martins Fonte, 1997.
BAKHTIN, M. M.; VOLOCHINOV, V. N. Marxismo e filosofia da linguagem. Tradução de Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. 7. ed. São Paulo: Hucitec, 1995. v. 1.
BENJAMIN, W. Linguagem, tradução, literatura (filosofia, teoria e crítica). Tradução de João Barrento. 1. reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2020, p. 12.
DELEUZE, G.; GUATTARI, F. Mil platôs. Capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Editora 34, 2019, p. 25.
EVARISTO, C. Quantos filhos Natalina teve? In: EVARISTO, C. Olhos d’água. [S. l.]: Pallas Editora, 2016.
GALVÃO, A. V. Crônicas das prisões e do exílio. Salvador: Assembleia Legislativa, 2014.
GALVÃO, A. V. O jagunço velho: romance. Salvador: Fast Design, 2016.
PÊCHEUX, M. A propósito da análise automática do discurso. In: GADET, F; HAK (org.). Por uma análise automática do discurso. Tradução de B. Mariani et al. Campinas: Editora da Unicamp, 1990.
PEIXOTO, J. L. Uma casa na escuridão. Rio de Janeiro: Record, 2009.
SCARANTE, I. C.; SANTANA, Joseane Costa. Mãos que inspiram poesia: a arte de Maragogipinho traduzida em versos e ilustrações. 2. ed. Salvador: Editora Mente Aberta, 2020.
Capítulo 1
Repertório e transposição didática do gênero crônica: nas trilhas da lida no Lidah²
Gabriela Belo-Silva
Fabiane de Jesus Caldas Brito
Gisely Nogueira Barreto
Transmitir, nessa ótica, é, então, sempre desejar que o outro continue, não para que nossa própria vida se prolongue nele ou nela, em seus feitos e gestos, ou simplesmente em sua memória, mesmo que faça parte, é claro, mas porque a tragédia seria estar preso ao seu próprio tempo, sem saída alguma em direção a outra vida além da sua. Desejar, contar, explicar, demonstrar ou ainda escutar e se fazer escutar é, sobretudo, experimentar em si a força do que não nos pertence, que nos excede e que, por razão, precisa ser transmitido aos outros.
(CHARTIER, 2008, p. 215)
Considerações iniciais
Ler o mundo e mergulhar no universo das palavras, das semioses, significar e ser ressignificado por elas. Observar, ouvir, interpretar o que nos é exterior e interior em uma disritmia. É por meio dessa percepção ativa e da arte de contar que experimentamos uma força que não nos pertence e que, por isso mesmo, precisa ser transmitida para nós, por nós, para além de nós, rompendo as fissuras do tempo-espaço. Nesse movimento retilíneo e nunca uniforme, a palavra é quase tudo na vida humana
(BELO-SILVA, 2018, p. 20).
Nessa perspectiva, uma palavra que não seja fruto do pensamento não expressa a vida em suas múltiplas possibilidades, assim como um pensamento que não se materializa por meio das palavras permanece como uma sombra
obscura, na nebulosa que flutua entre a consciência e o inconsciente (VIGOTSKI, 2008, p. 190).
Apesar de as palavras serem produzidas em contextos específicos, e seus significados construídos de acordo com os atores que participam da ação de linguagem e dos elementos disponíveis no cenário comunicativo (interação social), elas, por si sós, podem fabricar seus próprios contextos, a ponto de modificarem a forma de as pessoas pensarem e agirem no/sobre o mundo (BAKHTIN, 2011).
É considerando essa linha de raciocínio que Cicurel (2020) define o ato de ensinar como a arte de criar soluções, inventar, descobrir caminhos por meio de práticas interativas em sala de aula e de modo a possibilitar o desenvolvimento dos alunos. Para essa autora, exercer a docência constitui uma profissão cujo principal instrumento de realização é a linguagem em interação.
Dessa forma, no exercício da docência, o agir professoral manifesta-se por meio das interações linguageiras que se estabelecem no contexto da sala de aula. Transmitir saberes requer dos docentes atos complexos, os quais se inscrevem em uma cadeia que não pode ser rompida, pois abarca uma multidimensionalidade de práticas, repertórios e a cultura educativa que envolve esses espaços de interação.
Nesse ínterim, o ambiente educacional, seja ele presencial, seja virtual, torna-se um campo fértil para o aprimoramento de competências comunicativas (BRONCKART; DOLZ, 1999), uma vez que elas possibilitam desenvolver nos alunos um plano de ação de linguagem em que o desenvolvimento de habilidades seja analisado e difundido enquanto um processo que se relaciona às exigências críticas necessárias a vida real (SILVA; MUSSI, 2017).
Sob esses pressupostos, neste capítulo, esta produção científica constitui-se no resultado das ações de pesquisa e extensão desenvolvidas no Laboratório de Estudos em Políticas Linguísticas, Interação e Desenvolvimento Humano (Lidah), vinculado ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ao longo do ano de 2021. Assim, esta é uma pesquisa qualitativa e de cunho interpretativista a qual tem como objetivo apresentar um produto educacional intitulado Práticas de leitura e escrita de crônicas: tecendo narrativas e planificando o gênero textual
, desenvolvido para ser apresentado em duas oficinas e tendo como enfoque a crônica.
Escolheu-se esse gênero porque se trata de um texto construído com base em uma narrativa curta e que, segundo Antonio Candido (1992, p. 14), em lugar de oferecer um cenário excelso, numa revoada de adjetivos e períodos candentes, pega o miúdo e mostra nele uma grandeza, uma beleza ou uma singularidade insuspeitadas
. Desse modo, a crônica possui a função de ajudar a estabelecer ou ainda reestabelecer, valendo-se de situações/acontecimentos cotidianos, a dimensão das coisas e das pessoas.
Foi com vistas a contribuir com o aperfeiçoamento das práticas didáticas e pedagógicas no contexto das atividades extensionistas desenvolvidas na região do Baixo Sul, assim como colaborar para fomentar o desenvolvimento de práticas de leitura e escrita tendo como baliza norteadora a expressividade, a criatividade e o desenvolvimento de traços de autoria, que nos propusemos compilar esta organização didática.
Para alcançar nosso propósito, fundamentamo-nos nos princípios genebrinos — sequência didática à luz de Dolz e Schneuwly (2004) —, em interface com os pressupostos teórico-metodológicos do Interacionismo Sociodiscurso (ISD), de Bronckart (2006, 2009) — uma vez que, para essa teoria, a linguagem em interação possibilita o desenvolvimento humano, por isso o enfoque, nesta investigação, recai sobre a categoria contexto de produção.
Dessarte, este capítulo está organizado em cinco tópicos, a saber: i) Considerações iniciais
, em que contextualizamos a pesquisa, apresentamos os objetivos geral e específicos que norteiam nossa investigação, assim como a justificativa e o encaminhamento teórico-metodológico; ii) Um passeio pelo contexto de produção: nas trilhas da lida no Lidah
, em que apresentamos o contexto de produção da oficina desenvolvida; iii) Nas teias da teoria: percurso metodológico
, com a apresentação dos passos que constituíram a investigação; e iv) Construindo um sequenciamento didático: apresentação de um procedimento
, tópico em que apresentamos uma proposta de intervenção didática para o ensino de crônica.
Um passeio pelo contexto de produção: nas trilhas da lida no Lidah
Criado em setembro de 2020 e liderado pela doutora Gabriela Belo-Silva, o grupo Lidah congrega alunos e pesquisadores de diversos Institutos Federais e Universidades no Brasil, além da Universidade do Porto, em Portugal. As linhas de pesquisa do Lidah compreendem: investigações sobre o contexto de ensino e aprendizagem aplicados ao texto; Libras; língua estrangeira; relações de gênero, linguagem e identidade; semântica e pragmática; letramento; processos de didatização; análise de materiais didáticos; produção de sequências didáticas e metodológicas de ensino.
Os trabalhos desenvolvidos no grupo objetivam, em geral, a realização de pesquisas no campo da Linguística Aplicada (LA) cujas investigações buscam refletir o trabalho docente à luz dos estudos de Políticas Linguísticas em Interface com o Interacionismo Sociodiscursivo. De base essencialmente interacionista, as ações desenvolvidas pelo grupo compreendem as reuniões para discussões teóricas, a participação em eventos, a produção de material didático e a submissão de artigos científicos, assim como a organização de ações extensionistas, as quais têm como enfoque a formação continuada dos docentes pré e em formação, bem como o trabalho com a produção dos gêneros textuais com alunos que fazem parte dos cursos integrado, graduação e especialização lato sensu.
Dentre as ações de pesquisa e extensão desenvolvidas pelo grupo, destacamos o I Workshop Lidah
, o qual foi realizado entre março e outubro de 2021. Organizado com base em oficinas que aconteceram em dois dias, com carga horária total de seis horas, os workshops dividiram-se em dois momentos: exposição teórica e atividades práticas. Entre os cursos que foram ofertados, é possível citar:
Repertórios didáticos e transposição didática
— curso que teve como propósito desenvolver oficinas sobre repertórios didáticos, produção e transposição de sequências didáticas com professores da rede pública e particular de ensino que atuam na educação básica e com estudantes do curso de especialização lato sensu em Leitura e Produção Textual Aplicadas à EJA³ (Poslet), no IF Baiano. O objetivo do curso foi possibilitar aos participantes um conhecimento superior sobre o agir docente e o aperfeiçoamento da prática profissional.
Ensino de Libras como segunda língua: tradução, imagem e infância
— oficina que buscou refletir sobre o fenômeno do ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras) enquanto segunda língua (L2) na sua relação com a prática da tradução do texto literário. Nessa aproximação, a imagem foi trabalhada como essência da experiência visual ao ensino da língua, configurando essa relação na função de elemento fundamental para imersão na L2. O enfoque nos dois encontros recaiu sobre os contos O menino de água
(MÃE, 2018) e A menina do mar
(ANDERSEN, 2017), cujos respectivos enredos e tessitura estão repletos de simbologias e imagens, o que torna a literatura uma experiência vivida em múltiplas semioses.
Enveredando pelas metáforas conceptuais: análise de gêneros discursivos na perspectiva dos Modelos Cognitivos Idealizados (MCIs metafóricos)
— constituiu uma oficina que discutiu sobre o fenômeno da metáfora conceptual como um aparato cognitivo que reflete na maneira de pensarmos e agirmos no nosso dia a dia. Nesta oficina, abordou-se sobre sistema metafórico da moralidade na perspectiva dos estudos empreendidos por Lakoff (1995) e Lakoff e Johnson (1999), objetivando discutir sobre como esse fenômeno é problematizado em alguns gêneros discursivos, com base em pesquisas já realizadas e em andamento, vislumbrando novas possibilidades de desdobramentos.
Estatística na pesquisa quali-quantitativa: análise de dados através da ferramenta computacional R
— foi uma oficina que se propôs a apresentar conhecimentos essenciais para o exercício da pesquisa científica, aliando conteúdos básicos de Estatística e o sistema computacional R. Ao longo dos encontros, os participantes puderam entrar em contato com a teoria e o exercício prático que envolveu temas que abordaram os seguintes tópicos: como realizar a análise de dados quantitativos ou de pesquisas quali-quantitativas, como planejar um experimento, distribuição de frequências; elaboração de tabelas e gráficos, medidas de tendência central e dispersão, estatística paramétrica, tabulação e construção de gráficos para auxiliar na interpretação dos resultados obtidos.
As relações de gênero na produção acadêmica:experiências, debates e (in)conclusões
— constituiu momentos de discussões que tiveram como enfoque a partilha de conhecimentos de práticas de pesquisa realizada por profissionais que atuam na área do Direito, mas que desenvolvem suas investigações acadêmicas sob o tripé:relações de gênero, linguagem e identidade.Todavia, o enfoque recai sobre o Direito e sua relação com os estudos feministas, a teoria queer. As oficinas, pautando-se em motivações teóricas e políticas, trouxe à baila discussões que fazem parte dos estudos de gênero, tais como: a multidisciplinaridade, a pluralidade metodológica e o afastamento da neutralidade, assim como a imparcialidade na prática de pesquisa.
Práticas de leitura e escrita de crônicas: tecendo narrativas e planificando o gênero textual
— objeto de nossa investigação.
Realizado entre 19 e 26 de junho de 2021, o Workshop Práticas de leitura e escrita de crônicas: tecendo narrativas e planificando o gênero textual
teve como principal propósito trabalhar técnicas de leitura e escrita para que os participantes pudessem apreender os efeitos de sentido que se encontram tanto na superfície textual quanto nas relações contextuais presentes no processo interativo-comunicativo do gênero crônica. Dessa maneira, nas interações didáticas estabelecidas nas oficinas, o texto foi trabalhado como um evento comunicativo (ADAM, 2019).
Participaram dos encontros alunos do IF Baiano e da comunidade externa, cuja formação, em sua maioria, centrou-se nos anos finais da educação básica, porém alguns docentes que atuam nesse mesmo nível de ensino também integraram o grupo; do mesmo modo que os alunos do curso de especialização Poslet.
O gênero crônica foi escolhido para centralizar as atividades desenvolvidas nos dois encontros da oficina, pois ela possui uma função comunicativa e cognitiva capaz de enlaçar o leitor pelo humor ou pela forma jocosa de escrever, de provocar o riso de si mesmo ou de ironizar determinado fato, pela conversa despretensiosa de tratar de temas relevantes ou ainda pela proximidade com os relatos cotidianos, visto que a busca do pitoresco permite ao cronista captar o lado engraçado das coisas, fazendo do riso um jeito ameno de examinar determinadas contradições da sociedade
(SÁ, 2005, p. 23).
Nesse sentido, o