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Jesus: ontem, hoje e sempre
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E-book266 páginas4 horas

Jesus: ontem, hoje e sempre

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Sobre este e-book

Em Jesus: ontem, hoje e sempre,o renomado teólogo N.T. Wright retoma o debate sobre o Jesus histórico e suas implicações no contexto da pós-modernidade. O autor mostra que a correta compreensão da integridade histórica de Jesus confere ainda mais relevância aos Evangelhos por favorecer o desenvolvimento de um discipulado cristocêntrico, agindo, assim, como uma espécie de antídoto contra uma figura de Jesus que reflete tão somente as características daquele que crê, e não daquele em quem se deve crer.
N.T. Wright também apresenta os importantes reflexos da ação missionária da igreja, à medida que nos contagiamos com a figura do Cristo no dia a dia. 
Jesus: ontem, hoje e sempre  é ideal para quem está iniciando os estudos acadêmicos e para quem deseja aprofundar sua cristologia e a compreensão da pessoa e da obra de Cristo. 
IdiomaPortuguês
Data de lançamento17 de out. de 2022
ISBN9786559881550
Jesus: ontem, hoje e sempre

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    Jesus - N. T. Wright

    Prefácio à segunda edição

    Jesus continua a desafiar todos nós de diversas maneiras. Quando escrevi as primeiras preleções nas quais este livro se baseou, com certa pressa para o congresso em janeiro de 1999, não fazia ideia das reviravoltas que ocorreriam no mundo acadêmico, no mundo cristão em geral e no mundo mais amplo do perigoso século 21 que estava prestes a começar. Permita-me comentar algo a respeito de cada um deles. Permaneço convicto de que o retrato que esbocei de Jesus e do desafio que ele apresenta para seus seguidores no mundo de hoje é histórica, teológica e praticamente coerente. Ainda assim, tivemos novos acontecimentos.

    No meio acadêmico, as coisas não ficaram estacionadas. Embora hoje eu trabalhe em outras áreas, na vida da igreja e no estudo do apóstolo Paulo, três áreas de discussão em andamento chamaram minha atenção.

    A primeira se refere ao templo. Quando comecei a pesquisar, poucas pessoas na academia ou no âmbito popular falavam sobre a relação entre Jesus e o templo. Geza Vermes, em sua conhecida obra Jesus, o judeu, não considerou que a ação de Jesus no templo fosse digna de muita atenção. Ed Sanders mudou esse conceito em sua obra Jesus and Judaism [Jesus e o judaísmo], tornando fundamental o mesmo incidente; mas, ao que parece, nem o próprio Sanders percebe o quanto as asserções que Jesus fez foram verdadeiramente extraordinárias. Afinal, o templo era, supostamente, o lugar em que céu e terra se encontravam e realizavam suas transações. Para muitos cristãos modernos, o templo se figura apenas como uma estrutura magnífica, semelhante a uma igreja: um lugar de adoração, mas não o microcosmo, o pequeno mundo em que céu e terra estavam contidos em ínfimo espaço. Uma vez que essa é a linguagem que os cristãos costumam usar para a encarnação, talvez devamos prestar mais atenção em como Jesus interagiu com o templo, e em sua afirmação implícita, ao falar de si próprio, de que o superaria, ou mesmo o substituiria. Claro que os cristãos primitivos continuaram a se reunir no templo de Jerusalém e prestar culto ali. Não foi, por assim dizer, uma troca direta. Na época de Paulo, contudo, os cristãos já enxergavam seu novo movimento (semelhante a Qumran, que os antecedeu) como um novo templo em algum sentido.

    O segundo tema que continuo a explorar é associado de modo próximo ao primeiro. Em Jesus and the Victory of God [Jesus e a vitória de Deus] e depois sucintamente no presente livro, propus que uma forma de compreender o entendimento que Jesus tinha de si mesmo era a crença judaica de que yhwh, o Deus de Israel, havia prometido, de longa data, voltar em presença gloriosa a Jerusalém e ao templo. Em nenhum lugar na literatura do segundo templo encontramos alguém que afirme que isso havia ocorrido. No entanto, os Evangelhos estruturam sua narrativa de Jesus exatamente dessa forma. Marcos começa com citações de Malaquias e Isaías que tratam explicitamente da preparação para a volta de yhwh. O prólogo de João chega ao ápice com um versículo que repercute a vinda da glória divina ao tabernáculo em Êxodo 40, ao templo de Salomão em 1Reis 8 e ao novo templo profetizado em Ezequiel 43. Quanto mais estudo esse tema, mais o considero fundamental para a maior parte da (senão toda a) cristologia do Novo Testamento. E creio que foi fundamental para o entendimento de Jesus de si mesmo.

    Cabem aqui duas observações. Em primeiro lugar, ainda deparamos com o velho comentário depreciativo de que Jesus falava de Deus, mas a igreja falava de Jesus, como se, de algum modo, isso significasse que Jesus teria ficado horrorizado de ouvir as coisas estranhas que seus seguidores diriam a seu respeito mais adiante. No entanto, essa é uma ideia equivocada. Jesus falava com frequência a respeito de Deus, a respeito do Pai, a respeito do reino de Deus, justamente para explicar suas ações e o motivo delas. Ele acreditava, verdadeiramente, que estava dando início ao tão esperado reino de Deus na terra como no céu. E ele acreditava, verdadeiramente, que lhe custaria a vida.

    Segundo, porém, essa observação não me faz cair na ideia oposta com a qual também ainda deparamos de que Jesus simplesmente andava por aí consciente de que era divino. Se existe perigo de uma perspectiva ebionita moderna, de que Jesus foi apenas um ser humano muitíssimo bom, também existe perigo de um docetismo moderno, em que Jesus era tão divino que apenas parecia humano, embora não o fosse de fato. Evidentemente, temos de ser cautelosos ao tratar dessa questão. Creio, e proponho neste livro, que Jesus agiu e falou como o fez porque de fato acreditava que era sua vocação corporificar a chegada do tão aguardado Deus de Israel, que traz cura, salvação, julgamento, vida e sabedoria. O que desejo explorar é o tipo de conhecimento que ele parecia ter. As cenas no Getsêmani e na cruz — sem falar da tentação depois do batismo e de sua perigosa repetição por Pedro em Cesareia de Filipe — mostram que a consciência de Jesus de sua vocação era exatamente isso: consciência pela fé, suscetível a provação, desafio e até mesmo dúvida. Isso não significa que não fosse real, ou que não fosse verdadeira.

    Talvez eu deva dizer que tenho um conceito elevado da consciência, pela fé, da vocação. Tive o privilégio de trabalhar com várias pessoas que tiveram dificuldade com o chamado de Deus em sua vida. Muitas vezes, dizem: "Creio que Deus me chamou". Cabe à igreja, então, receber seu ministério, declarar que o povo de Deus reconhece e tem consciência da veracidade dessa vocação. Claro que essa é apenas uma analogia parcial, mas espero que seja útil. A presente discussão deve, no mínimo, nos lembrar de que, de acordo com o próprio Novo Testamento, só sabemos com absoluta clareza quem Deus é quando olhamos para Jesus. Em muitas ocasiões, a igreja pressupôs que soubesse exatamente quem Deus é (talvez a divindade exaltada e indiferente do deísmo?) e, então, projetou sobre Jesus uma ideia de como deus seria caso se tornasse encarnado. De acordo com o Novo Testamento, descobrimos Deus ao olhar para Jesus, e não vice-versa.

    Um dos problemas do conceito tradicional ou ortodoxo (segundo o qual o mais importante a respeito de Jesus era sua consciência de sua divindade e seu desejo de comunicar e revelar esse fato a outros) consiste, como vim a perceber, na facilidade com que pode obscurecer aquilo que esse Deus-de-Israel encarnado tinha vindo fazer. É possível olharmos para Jesus e dizer: Sim, ele é divino e imaginar que essas palavras nos fazem parecer cristãos, de prontidão e na expectativa de ir para o céu. Contudo, a questão central da divindade de Jesus na verdade é que Jesus estava dando início ao reino de Deus na terra como no céu. Vim a entender o seguinte: a divindade de Jesus é a escala em que a música é escrita, mas não é a melodia tocada. A melodia é o reino de Deus.

    Essa ideia também foi abordada por dois ângulos, o que me leva ao terceiro ponto a respeito dos meios acadêmicos. Em que sentido o reino veio na carreira pública de Jesus e, depois, de modo supremo, por meio de sua crucificação e ressurreição? Muitos levantaram objeções a minha exposição do reino nos ensinamentos de Jesus, insistindo que ele verdadeiramente esperava que o mundo acabasse, ou algo do gênero, em poucos anos. Pronunciei-me repetidamente contra essa ideia, com base na maneira que a linguagem apocalíptica opera tanto no mundo judaico quanto nos escritos do cristianismo primitivo. Entra em cena a divisão: de acordo com alguns, Jesus prometeu o fim do mundo e se equivocou; de acordo com outros, Jesus disse que o reino viria em breve, mas estava se referindo à Transfiguração, ou a algo semelhante. Estes últimos afirmam, ainda, que o reino só virá de modo devido e pleno quando Jesus voltar. A meu ver, essa proposta parece desconsiderar aquilo que os quatro Evangelistas dizem, cada um à sua maneira, a saber, que a crucificação foi, na realidade, a entronização de Jesus como Rei dos judeus e que, quando o Jesus ressurreto declara em Mateus: "toda a autoridade […] no céu e na terra", essa verdade se aplica ao entendimento do reino por toda a igreja primitiva e pelo próprio Jesus. Sem dúvida, essa discussão prosseguirá.

    Contudo, foi esse tema do reino de Deus que exerceu efeito surpreendente (a meu ver) no nível menos acadêmico da vida da igreja. Naturalmente, é motivo de grande prazer ver que muitos líderes e professores de tradições diferentes da minha têm usado meu trabalho. Fui convidado para falar em igrejas do movimento Vineyard, em igrejas emergentes, em diversos encontros pós-modernos de cristãos que não têm outro rótulo além da insatisfação com o que encontraram nas igrejas de sua infância. Expressei, com frequência, divertida surpresa: como é possível essas pessoas se reunirem em torno de um bispo anglicano de meia-idade? A resposta parece ser que o ensino de Jesus a respeito do reino de Deus, que apresentei em Jesus and the Victory of God e também no presente livro, tem sido, para muitos, como água fresca em um dia quente. É aquilo pelo que esperavam, mas não sabiam. Repetidamente, ouço: Minha igreja nunca ensinou esse tema, nem pregou sobre ele, mas é a coisa mais relevante que já ouvi. O reino é um livro fechado para muitos, e eu, de forma inteiramente acidental, por assim dizer, pareço tê-lo aberto um pouquinho.

    Diante disso, duas perguntas vêm à mente de imediato: o que o reino significava na igreja primitiva e o que significa em nossos dias. Quanto à igreja primitiva, um teste decisivo consiste em considerar o que Jesus quis dizer quando respondeu à pergunta dos discípulos em Atos 1.6: Senhor, será esse o momento em que restaurará o reino a Israel?. Na opinião de muitos cristãos, a resposta de Jesus (Não compete a vocês saber o tempo ou as datas […] mas receberão poder quando o Espírito Santo descer sobre vocês, e serão minhas testemunhas, v. 7, NVI) é, basicamente: Não, mas… Não, o reino ainda não virá, mas, entrementes, vocês têm um trabalho a fazer. A meu ver, porém, a resposta é: Sim, mas… Sim, o reino já se iniciou, mas o trabalho que vocês têm a fazer não é de nobres cortesãos assentados à minha direita e à minha esquerda, organizando o reino no sentido habitual. O trabalho que vocês têm a fazer, no poder do Espírito, é de sair e dar testemunho. Como as Bem-aventuranças do Sermão do Monte deixam claro, quando Deus deseja colocar o mundo em ordem ele não envia tanques de guerra. Ele envia os mansos, os quebrantados, os que têm fome de justiça, os pacificadores, os de coração puro, e assim por diante. Leia Atos e veja essa verdade em ação. Tenho convicção de que era isso que Jesus tinha em mente desde o começo. Ele acreditava que estivesse dando início ao reino de Deus na terra, mas, assim como ele redefiniu radicalmente a forma que a batalha decisiva seria vencida (a cruz), também redefiniu radicalmente a forma que essa vitória seria implementada (na vocação para o serviço). É disso que trata Marcos 10.35-45. A igreja costuma interpretar essa mensagem equivocadamente; procura apenas a expiação (o Filho do Homem veio para dar a vida em resgate por muitos) e não enxerga a redefinição de poder dentro da qual essa declaração fundamental se encontra (os governantes da presente era fazem as coisas de uma forma; nós, porém, a faremos de outra). Hoje, vejo esse fato mais claramente que quinze anos atrás. Talvez a experiência, ainda que superficial, com os círculos de poder da sociedade inglesa tenha me alertado, mais do que percebi na época, para a redefinição de poder conforme o evangelho.

    E talvez isso explique minha perspectiva atual do novo século em que vivemos. Ninguém imaginou, em janeiro de 1999, o que aconteceria menos de três anos depois, quando aviões colidiram com prédios e o mundo mudou para sempre. O mundo ocidental e a igreja ocidental se mostraram vergonhosamente despreparados não apenas para os atos terríveis e perversos de 11 de setembro de 2001, mas também para os desafios de cosmovisão que esses acontecimentos trouxeram consigo. Por muito tempo, o cristianismo ocidental havia acreditado, pelo menos implicitamente, que religião e política eram coisas tão separadas que ninguém precisava se dar o trabalho de pensar como poderiam interagir uma com a outra. A reação à atrocidade foi, portanto, previsível: combater fogo com fogo. O resultado dessa abordagem, por sua vez, também foi previsível: há muito mais inquietação no Oriente Médio e há um número muito maior de terroristas hoje do que quinze anos atrás.

    Nesse sombrio e estranho mundo novo, precisamos urgentemente de uma nova luz. Jesus de Nazaré trouxe essa luz muito tempo atrás. O mundo e a igreja a consideraram resplandecente demais, e não temos poupado esforços para encobri-la ao falar incessantemente sobre espiritualidade pessoal no presente e salvação celestial no futuro. Mas, quando Jesus nos ensinou a pedir em oração que o reino de Deus viesse e a vontade de Deus fosse feita assim na terra como no céu, ele estava falando sério. Quando ele disse que toda a autoridade lhe foi dada na terra como no céu, também estava falando sério. Mal começamos a imaginar o que isso significa na prática. É minha esperança e minha oração, porém, que este pequeno livro seja, pelo menos para alguns, uma introdução para aquilo que Jesus quis dizer naquela ocasião e, portanto, que seja um convite para refletir a respeito do que ele quer dizer hoje e amanhã, ao continuar a nos chamar para ser suas testemunhas até os confins da terra.

    N. T. Wright

    Faculdade de Teologia de St. Mary,

    Universidade de St. Andrews, Escócia, 2015

    Prefácio à primeira edição

    Na presente obra, tenho três assuntos de interesse. O primeiro é a integridade histórica ao falar sobre Jesus. Para dizer a verdade, muitos cristãos se mostraram desleixados ao refletir e falar sobre Jesus e, portanto, infelizmente, ao orar e praticar o discipulado. Não podemos partir do pressuposto de que, ao dizer a palavra Jesus e, muito menos, a palavra Cristo, estamos automaticamente em contato com o verdadeiro Jesus que andou e falou na Palestina do primeiro século, o Jesus que, de acordo com a Carta aos Hebreus, é o mesmo ontem, hoje e para sempre. Não temos liberdade de criar um Jesus diferente. Também não podemos dizer que, pelo fato de termos os Evangelhos e o Novo Testamento, sabemos tudo o que precisamos a respeito de Jesus. Como o conteúdo apresentado aqui mostrará, e como meus textos mais longos revelam mais detalhadamente, as tradições cristãs muitas vezes entenderam de maneira extremamente equivocada a imagem de Jesus nesses Evangelhos, e é apenas por meio de árduo trabalho histórico que podemos nos mover em direção a uma compreensão mais plena daquilo que os Evangelhos procuram dizer.

    O segundo interesse é pelo discipulado cristão que professa seguir o verdadeiro Jesus. As disciplinas de oração e estudo da Bíblia precisam ser, repetidamente, arraigadas no próprio Jesus para que não se tornem idólatras e egocêntricas. Muitas vezes, calamos o rigoroso desafio de Jesus, reconstruímos Jesus à nossa imagem e depois nos perguntamos por que nossa espiritualidade pessoal deixou de ser empolgante e transformadora. Ao longo do texto a seguir, espero tratar dessa questão, pelo menos de forma implícita. Como alguém comentou comigo depois de uma palestra que dei em um congresso, o Jesus que descrevi é um ser humano empolgante e profundamente instigante, algo que nem sempre fica visível nos vitrais da figura de Cristo que ocupam boa parte da imaginação cristã, seja de tradição católica, protestante, ortodoxa ou evangélica.

    Terceiro, tenho interesse especial em colocar na mente, no coração e nas mãos da próxima geração de cristãos pensantes uma missão que siga o modelo de Jesus e a motivação para realizá-la, uma missão que transforme nosso mundo pelo poder do evangelho de Jesus. Aqueles que estudam nas universidades e atuam no mercado de trabalho de nosso mundo e desejam ser cristãos leais precisam voltar a refletir sobre o que a lealdade a Jesus significa na prática. Não basta fazer orações em casa, manter uma elevada moralidade pessoal e, depois, sair para trabalhar na reconstrução da torre de Babel. A substância e a estrutura dos diferentes aspectos de nosso mundo precisam ser questionadas à luz da realização singular de Jesus e de nossa comissão para ser para o mundo o que Jesus foi para o Israel de sua época.

    Esse tema final explica por que, especialmente nos dois últimos capítulos, fiz todo o possível para tratar, ainda que de forma sucinta, do clima cultural de hoje no mundo ocidental. O rótulo informal e, por vezes, enganoso de pós-modernidade aponta para muitos aspectos incômodos e, ao mesmo tempo, desafiadores de nossa cultura. Alguns cristãos consideram esses elementos extremamente ameaçadores. Creio que a mensagem de Jesus Cristo nos permite olhar para eles de forma direta, reconhecendo em que aspectos a pós-modernidade tem a dizer algo que não podemos nos dar o luxo de ignorar, mas afirmando categoricamente que temos de atravessar isso tudo e nos lançar a novas tarefas e possibilidades. Assim como a integridade exige que reflitamos com clareza e rigor a respeito de Jesus, também exige que reflitamos com clareza e rigor a respeito do mundo em que o seguimos hoje, o mundo que somos chamados a moldar com a mensagem de amor e transformação do evangelho.

    1

    O desafio de estudar Jesus

    Introdução

    Um amigo meu, que estava lecionando em uma faculdade de teologia no Quênia, apresentou para seus alunos A busca do Jesus histórico. Explicou-lhes que esse foi um movimento de pensamento e de estudos acadêmicos que, em suas formas iniciais, se desenvolveu principalmente na Alemanha nos séculos 18 e 19. Não tinha avançado muito na explicação sobre essa busca por Jesus quando um dos alunos o interrompeu. Mestre, ele disse (Assim que ele me chamou de ‘mestre’, eu soube que estava em apuros, meu amigo comentou), se os alemães perderam Jesus, é problema deles. Nós não o perdemos. Nós o conhecemos e o amamos.

    A pesquisa sobre Jesus é, de longa data, controversa, especialmente entre cristãos devotos. Muitos no mundo cristão mais amplo se perguntam se há algo de novo a dizer sobre Jesus e se a tentativa de dizer algo novo não é uma negação dos ensinamentos da igreja ou da suficiência das Escrituras. Quero me embrenhar nesse espinheiro logo no início e explicar por que considero não apenas permissível, mas também primordialmente necessário, que voltemos a tratar de quem Jesus era e, portanto, de quem ele é. Ao fazê-lo, não tenho, de maneira nenhuma, a intenção de negar ou solapar o conhecimento de Jesus ao qual o aluno queniano se referiu, a experiência em comum na igreja através dos séculos e em culturas amplamente distintas. Antes, considero o trabalho histórico parte da atividade apropriada de conhecimento e amor, de conhecer ainda melhor aquele que dizemos conhecer e seguir. Se até mesmo em um relacionamento humano de conhecimento e amor podem ocorrer mal-entendidos, impressões falsas e pressuposições equivocadas que precisam ser trazidas à luz e tratadas, quanto mais quando aquele com quem nos relacionamos é Jesus.

    Aliás, creio que a busca histórica por Jesus é um aspecto essencial e não negociável do discipulado cristão e que, em nossa geração, temos a oportunidade de ser renovados em discipulado e missão exatamente por meio dessa busca. Quero explicar e justificar essas crenças logo no início. A busca é acompanhada, contudo, de grandes problemas e até de perigos, como seria de esperar de qualquer coisa repleta de potencial para o reino de Deus, e também precisarei tratar deles sucintamente.

    Existem riscos bastante conhecidos associados até à simples discussão desse tema, e é melhor sermos claros a respeito desses perigos. É extremamente fácil, quando estamos entre amigos que pensam como nós, tornar-nos complacentes. Ouvimos falar de novas teorias absurdas sobre Jesus. A cada um ou dois meses, uma editora apresenta um sucesso de vendas dizendo que Jesus foi um guru da Nova Era, um maçom egípcio ou um revolucionário hippie. A cada um ou dois anos, um estudioso ou um grupo de estudiosos lança um livro novo, cheio de notas de rodapé impressionantes, para dizer que Jesus era um camponês que fazia parte do movimento filosófico cínico, um grande orador itinerante ou um pregador de valores liberais que nasceu na época errada. No dia em que estava revisando o primeiro capítulo deste livro para publicação, vi um artigo de jornal sobre uma nova controvérsia, iniciada por ativistas de direitos dos animais, a respeito da dieta de Jesus, procurando identificar se ele era vegetariano.

    É possível que nossa reação diante de coisas desse tipo seja dizer que não passam de perda de tempo, que sabemos todo o necessário a respeito de Jesus e que

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