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Dois garotos de onze anos que tinham tudo para se tornarem bons amigos mas acabam deixando o rancor e a raiva tomar conta deles em meio a uma paisagem desolada em um jogo de poder e egos para ver quem tem o controle da situação parece estranho, certo? Principalmente quando a manipulação e outras atitudes nada gentis são mostradas de forma tão crua. Não estamos acostumados a ver crianças em situações aversivas como essas, onde são genuinamente maldosas, então a narrativa e trama incômoda e bem escritas são o suficiente para deixar o leitor arrepiado.
"Ele gostava de ficar sozinho pois estava acostumado, sentia-se seguro em sua própria companhia. Os outros eram imprevisíveis."
A forma como os personagens foram construídos pela Susan Hill foi bem interessante. A autora não passou tempo demais com narrativas do passado e quando volta no tempo, os flashbacks são bem curtinhos. Ela entrega ao leitor o suficiente durante a narrativa sem precisar se apoiar do uso excessivo de flashbacks para justificar comportamentos e traumas, ainda assim, todos os personagens são profundos, com as suas camadas de experiências e vivências — ou não. Edmund Hooper, um dos protagonistas, por exemplo, é simplesmente um garoto de onze anos com tendências psicopatas que não teve um passado traumático nem nada do tipo que justificasse as suas ações. Ele perdera a mãe cedo mas nem ao menos possui memórias dela. É apenas mimado e controlador. Já Charlie Kingshaw é um menino da mesma idade de Edmund que é solitário e quer simplesmente paz. A autora entrega um pouco mais do passado dele do que do outro, o que ajuda a justificar seu jeito mais introvertido.
Outros personagens importantes são Joseph Hooper e Helena Kingshaw, os pais dos garotos. Ambos viúvos, era bem óbvio que a animosidade entre eles se desenvolveria para um romance mas a forma como, principalmente por parte de Helena, estavam desesperados para reconstruírem suas vidas e suas felicidades fez com que fechassem os olhos para o que acontecia na casa. Desdenhavam das palavras de Charlie e escolhiam suposições e afirmar o tempo inteiro que eles eram ambos amigos, apenas crianças mas que estava tudo bem, que em breve seriam oficialmente uma família feliz, que estavam se adaptando.
"Hooper ficou em silêncio, só esboçando um sorrisinho. Kingshaw queria descer a mão nele, e se assustou com as sensações que Hooper lhe provocava, destruindo todo e qualqeur pensamento razoável. Sua cabeça fervilhava quando Hooper ficava assim, diante dele, e ele só se debatia feito um doido, sem acertar o alvo, incapaz de se conter e falando igual a um bebezinho."
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Há alguns anos, li em um livro que já não me recordo o nome, que uma criança não possui muito o filtro necessário para saber do que é certo e errado, por isso pode acabar passando dos limites enquanto acha que é tudo uma grande e indolor brincadeira. Em Eu sou o rei do castelo, a autora deixa bem claro que aquelas crianças sabem sim do que estão fazendo e da dor psicológica que causam. É um livro de horror psicológico, que incomoda e perturba sem fazer uso de cenas gores ou de violência explícita. Assim que Charlie e sua mãe chegam na casa dos Hooper, a atitude hostil de Edmund com o novo morador é óbvia e em sua necessidade de ficar afirmando o poder sobre o outro, acaba transformando a vida de Charlie em um grande inferno apenas para se sentir poderoso e para preencher seu tédio.
HORROR
Eu sou o rei do castelo é um suspense psicológico com toques de horror que trabalha isso de uma forma incrível. Não é um livro com muitos plot-twists que te farão arfar de susto ou surpresa. Na verdade, ouso dizer que quase na metade do livro eu já fazia ideia do que esperar do final mas ainda assim, fiquei surpresa pela audácia e tristeza de seu desfecho. Todo o horror e manipulação psicológicas vindas de Edmund eram surpreendentes, já que ambos os protagonistas tem seus onze anos mas mentalidades tão diferentes. Dizer que fiquei morrendo de raiva com a forma da qual Edmund se divertia em infernizar Charlie é pouco, seguindo-o como uma sombra perturbadora para destruir qualquer fio de felicidade que encontrasse.
CENÁRIOS
A história inteira se passa em dois lugares: a mansão velha da família Hooper que outrora talvez tenha visto beleza em sua fachada e a floresta assustadora nas proximidades da propriedade. Acho que a ideia de dois locais tão similares era para fazer alguma alusão aos próprios meninos em si. Enquanto Charlie se sentia deslocado na mansão repleta de animais empalhados (graças ao hobby do falecido avô de Edmund que estudava e colecionava animais empalhados, principalmente insetos coletados) e se assustava com toda aquela "morte", ele se sentia livre em meio a floresta e mesmo que os animais dali lhe dessem medo, ainda assim, o local era um refúgio.
Já Edmund era o contrário, se sentia extremamente a vontade na mansão e em dizer que o local — mesmo que velho e feio — lhe pertencia, em sentir os animais mortos em suas mãos e o poder que tinha sobre tais criaturas já sem vida mas quando adentra a floresta, se torna uma criança medrosa e chorona.
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E aí, gostam de livros ou filmes com crianças malvadas?
2 Comentários
Oi, Larissa! Parece ótimo este livro, né? Particularmente curto bastante obras com crianças malvadas. Que bom que curtiu. Que o ano de 2024 traga-lhe boas leituras. Feliz 2024. Um abraço!
ResponderExcluirBaita resenha!!!
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