Preocupações Para Hoje“A Letra Mata, mas o Espírito Vivifica” (2 Cor 3, 6)Alguns leitores têm expressado o desejo de que eu lhes dê uma ideia do que seria uma posição política aceitável nos dias de hoje. Sabendo-me militante contra todas as formas políticas existentes em Portugal, questionam-me sobre se existe algo que me faria defender uma qualquer força política.
Começo por dizer que a única razão por que não apoio nenhum partido se deve apenas à falta de mérito de qualquer deles. Ser contra os partidos como princípio é um erro. É um pouco como ser contra uma linguagem ou um material de construção, esquecendo que cada um deles será aquilo que deles se fizer. Se é evidente que algumas línguagens são mais evoluídas e que alguns materiais de construção são mais propícios a construções sólidas, aquele que se recusa a falar porque o código não é perfeito, ou aquele que não constroi porque só aceita a perfeição do mármore, peca por omissão.
A decisão de falar ou construir não é porém um imperativo. Há momentos em que qualquer homem demonstra mais dignidade ao não se envolver com qualquer proposta. É o caso do actual panorama partidário português, onde, para além de um eco ridículo (nenhum partido conhece uma linguagem que não seja a dos direitos, da responsabilidade estatal no bem-estar material dos cidadãos, da palavra Justiça encarada como resultado das vontades da massa), não há qualquer solução para as questões mais básicas da convivência humana.
Ao não serem definidos os princípios comunitários vivemos a pior das ditaduras. É só escolher... A eficácia, o poder, a propriedade, os portugueses, os trabalhadores... há um ditador para cada paladar, mas não existe ninguém que afirme a existência de um critério superior para que se escolha uma coisa em detrimento de outra. E sobre isto, qualquer dos partidos e propostas políticas de hoje, é estranhamente omisso. O que equivale a dizer que são sintomas e não causa ou cura, aceitando como dado a ideia do Estado como mero instrumento de obtenção de bens para a clientela da sua devoção.
O que hoje é preciso que se diga é que o elemento essencial de uma comunidade é, e sempre foi, o laço que está além de si próprio. Dessa relação com a Verdade surge toda a sua capacidade de viver de uma forma que não permite a arbitrariedade da relação política que ocorre sob o vácuo da suposta neutralidade moderna. Desse vácuo nasce a total incapacidade de compreender os princípios de qualquer coisa que seja justa em si e que se possa defender na ordem política como elemento de validade superior à dialética e às interacções entre os vários concorrentes pelo Poder.
Nasce desta incapacidade de relação com a Verdade, também, a incompreensão das nossas instituições civis, que são e serão sempre um reflexo dessa relação com a Verdade. Transformando ou matando a Verdade, ficam as palavras e mudam-se os sentidos, de forma a que o amor que a sociedade passa a defender se confunda com o ódio. De forma a que qualquer obrigação não seja mais do que um reflexo da vontade, a Palavra é destruída e com esta vem a destruição das esferas autonomizadas da família e da vida local.
Só existe um desígnio, uma coisa a ser feita: restaurar a primazia da Experiência Cristã.
O resto é pouco, ou quase nada.
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