terça-feira, setembro 08, 2015
terça-feira, junho 12, 2012
Ama, do verbo amar
Não era grande, aquela casa, mas chegava para todos nós: eu, os meus pais, o mainato e a Umbelina, a minha ama. E, ao longo do dia, todos aqueles que lá entravam, por uma das duas portas, sempre abertas, ligadas pelo corredor de cimento polido que – tão fresquinho! – eu corria a gatinhar.
Torrava, o sol. Eu e os meninos sentavamo-nos no alpendre, fraldas a roçar o chão, muito atentos ao carreiro de formigas-de-asa que passava encostadinho ao degrau. E, tendo aprendido uns com os outros, cada qual de nós lançava os deditos aos insectos que, um a um, íamos pondo à boca, saboreando o curioso condimento.
Às vezes os pais chegavam e eu estava ali. Outras vezes não, por isso iam a procurar pela menina. E então o mainato quase dava um pulo e, muito aflito, dizia: - Xi, patrão, ela tava agora lá! E tudo entrava num estranho rebuliço, feito de passos apressados de um lado para outro e de palavras que deviam ser para me chamar. Eu cá não queria largar o conforto daquele cantinho, sob a cama dos papás, onde me entretinha a roer chinelas ou as botas da tropa. Mas a Bina lá me encontrava.
Por vezes não havia sol, mas chuva. Tanta chuva, que parecia fumo. Uma chuva forte, rápida, pesada, que atirava para cima do telhado quase todos os frutos da grande mangueira que se erguia sobre a casa. Chuva que surgia e logo se ia embora, deixando um travo a terra molhada que nos desentupia as entranhas.
Lembro-me de não ter medo, porque me diziam para não ter. E de o sono não chegar até que a Bina me embalasse com uma canção em bantu.
É... “Ama” é palavra que passa a verbo se conjugada com amor!
A Bina era o colinho. E as papas, e as ternuras. E o olhar que eu olhava, e a melodia do coração no peito onde eu dormia. Achavam graça quando ela, passeando-me à cintura, ajeitava a capulana, levantava um pouco a minha fralda e revelava as nossas ancas como que exibindo troféus: a minha mancha mongólica – sombra tingindo a pele clara - e a sua - escura, na pele escura - em tudo o mais iguaizinhas, como duas luas cheias perfeitas... Ou como que uma só.
É a razão porque nos lembro ao olhar o firmamento: uma pequena lua branca crescendo ao colo de um céu infinitamente negro. E é quando quase (quase, quase...) escuto aquela primeiríssima canção de amor...
Esta noite, da janela deste meu mundo branco-manicomial, procurei-nos. E depois saltei. E corri muito...
E lá longe, bem no coração do mundo, numa aurora austral que ligava a terra aos céus, creio que gritei pela primeira vez ao ser parida. E senti o eco sob os pés sujos de terra. E os pássaros voaram num repente belo. E a gazela paralizou o passo até chegar o riso das crianças, correndo na planície rumo a donde vinha o cheiro a pão de mandioca.
Bina, se tu soubesses!... A savana enfeitiça-nos de vida para todo o sempre até à morte. Como um feitiço da lua... Magia branca da terra negra da gente.
Não sei de ti. Quantas vezes não sei de mim. E hoje não sei de nada, que ainda agora nasci, e as palavras são tão inocentes quanto a canção que me embala.
quarta-feira, abril 25, 2012
Queridos, mudei de casa!
Etiquetas: (E hoje faz seis anos que')
terça-feira, março 06, 2012
Bute mas é dar à soleta!
A taxa de desemprego prepara-se para atingir os 15%;
Um quarto da população portuguesa vive em situação de pobreza;
100 mil pessoas vêem os seus ordenados penhorados;
19 mil imigrantes recebem subsídio de desemprego;
18 mil indivíduos vivem em barracas (viva o estilo rústico!);
A dívida ao estado custa 21 mil euros a cada português;
Os pedidos de ajuda por particulares em situação de falência não cessam de chegar à Deco;
Os mais jovens não arranjam emprego, os menos jovens perdem o seu e as reformas são anedotas de mau gosto;
Aumenta o número de pessoas que já pouco saem de casa, com medo dos assaltos, cada vez mais violentos;
A criminalidade dispara, mas as polícias estão pobres, as penas são leves, as prisões estão cheias e a reabilitação é zero;
Saúde, educação e segurança são palavras sem sentido, sem dó e sem esperança;
A boa notícia é que a depressão não é um luxo dos ricos, mas um bem de livre acesso. Vá lá!
Etiquetas: Ando assim, contestatária...
Irra!
Aproveito para fazer um alerta para os jornalistas do Correio da Manhã, recordando de que há jornais que irritam os leitores por causa de darem tantos erros!
Etiquetas: Ando assim, contestatária...
terça-feira, janeiro 17, 2012
Não se usa
Etiquetas: Ando assim, contestatária...
terça-feira, janeiro 10, 2012
Uma forma simples de felicidade
Etiquetas: Ando assim, contestatária...
domingo, janeiro 08, 2012
Andante, andante..
sexta-feira, dezembro 02, 2011
Acreditar
"Portugal Voluntário: o mundo com olhar de criança" é o título da entrevista da TSF à Acreditar, e publicá-la-ei assim que for disponibilizada no site da rádio.
No entretanto, a versão resumida (audio-visual) poderá ser vista aqui.
Festa de Natal dos Sem-Abrigo
A comunidade Vida e Paz é uma organização que apoia as pessoas sem-abrigo, com o principal objectivo de as reinserir como cidadãos participativos na sociedade. É uma IPSS tutelada pelo Patriarcado de Lisboa e com sede em Alvalade.
Distribui comida (28 800 sandes e 1920 litros de leite por mês) e roupa por cerca de 450 pessoas desabrigadas em Lisboa todas as noites do ano, como forma de construir uma relação com elas que permita conhecer-se a sua situação e ajudá-las ou encorajá-las a entrar no programa de recuperação.
VOLTAS DA NOITE
Cada noite, 4 equipas (em média com 9 elementos) percorrem várias zonas da cidade. Várias empresas e benfeitores contribuem para o conteúdo das ceias (duas sandes, um bolo, uma peça de fruta e leite) e algumas também com voluntários. Aqui, a reportagem da TSF sobre as voltas.
QUINTAS PEDAGÓGICAS
A Comunidade Vida e Paz (CVP) dispõe de um Espaço aberto ao Diálogo, onde uma equipa técnica acolhe e motiva as pessoas sem-abrigo, organizando o respectivo processo de encaminhamento para uma unidade de desabituação, dois centros de recuperação terapêutica, duas comunidades de inserção, dois apartamentos de inserção, uma unidade de vida autónoma, uma empresa de inserção social e acompamento pós-alta.
A CVP já ajudou mais de 1600 pessoas a encontrar um rumo para a sua vida, livre de dependências e na esperança por dias sucessivamente melhores e de uma melhoria contínua.
A FESTA DE NATAL (imagens da edição de 2011)
A Festa de Natal é o evento mais emblemático da Comunidade Vida e Paz. Também o mais mediatizado. Entende-se que proporcionando comida quente, roupa, higiene e convívio é possível lembrar as essas pessoas que uma vida melhor está à distância de uma decisão.
Na minha opinião, é uma oportunidade para as fazer pensar em como seria bom se todos os dias pudessem ser assim: com abrigo, alimentação e companhia, inseridos na sociedade, de igual para igual com todos.
Este ano, tal como habitualmente, a 23ª edição terá lugar no antigo refeitório da reitoria da Universidade de Lisboa (UL). O evento conta com uma equipa de cerca de 1000 voluntários e recebe mais de 2500 convidados ao longo de três dias (16, 17 e 18 de Dezembro), proporcionando o conforto físico e emocional de que se encontram habitualmente privados, bem como o respeito que merecem enquanto pessoas.
1) Atendimento
Cabe aos voluntários dar as boas-vindas aos convidados (sem-abrigo e outra população carenciada), procedendo ao seu registo num formulário, recebendo e guardando os seus bens nos bengaleiros e encaminhando-os.
2) Roupa
Cabe aos voluntários não apenas a tarefa de distribuir pelos convidados, mas de a organizar previamente.
3) Banhos
Os voluntários encaminham e/ou acompanham os convidados até à área de duches (210 duches).
4) Cabeleireiro
São 130 os profissionais que doam o seu trabalho como cabeleireiros, manicuras e maquilhadores aos convidados desta festa.
5) Cozinha
Não se trata de confeccionar a comida, mas de racionar e preparar as porções quentes que serão servidas à mesa. O Exército é o principal senhor deste tasco, e trabalha que dá gosto ver!
6) Sandes
A preparação das sandes e sua inclusão em kits para distribuição posterior (com sumos de frutas, bolachas e doces) é outra das actividades extremamente exigentes do ponto do ritmo que se impõe.
7) Mesas
Distribuição das refeições pelos convidados, gestão da lotação, reposição de alimentos, evitamento de desperdícios, sinalização de conflitos, impedimento ao uso de substâncias ilícitas.
8) Animação
Consiste, sobretudo, em integrar os convidados na festa, dando-lhes todas as informações de que necessitem e acompanhando-os aos espaços da sua preferência (zona de convívio, sala de dança, espaço de leitura, cabeleireiro, banca da Loja do Cidadão, etc.).
9) Espectáculos
Esta será a primeira das áreas (de acordo com a ordem pela qual as arrolei) que dispensa, à partida, voluntários inscritos, sendo assegurada por vários artistas da nossa praça.
10) Crianças
Uma vez que muitos convidados trazem crianças, compete aos voluntários conviver e brincar com elas, proporcionando-lhes um excelente momento e preenchendo a Ficha da Criança com o máximo de informação relevante possível.
11) Espaço de Leitura
Funcionando durante todo o ano no Espaço Aberto ao Diálogo da AVP, esta valência não é despicienda. Possibilita o contacto com os livros e a expressão plástica, mas também o por vezes necessário isolamento, dado tratar-se de uma zona mais silenciosa e intimista, sendo por isso o espaço ideal para os convidados encontrarem nos voluntários parceiros de diálogo realmente atentos e dedicados. Em 2010 contaram-se 80 visitantes deste espaço.
12) Saúde
Aqui se encontram áreas como a de medicina, medicina dentária e primeiros socorros, sendo possível aos convidados sairem já com receita médica de uma consulta gratuíta, graças à colaboração voluntária das Universidades de Medicina e Medicina Dentária.
13) Loja do Cidadão
Através desta parceria, é possível a um indivíduo sem abrigo obter ajuda relativamente à sua documentação, perceber melhor os seus direitos, tratar de subsídios e reformas, etc.
14) Espaço Aberto ao Diálogo (EAD)
Este é local onde mais directamente se tenta servir a verdadeira missão da Comunidade: iniciar o processo de reintegração dos indivíduos que assim o desejem, ou reencaminhá-los para os serviços mais adequados a situações críticas (como a doença mental severa).
15) Espiritualidade
Também conta com voluntários este espaço de religião e fé que durante a festa de natal tem lugar na capela da UL.
16) Presentes
É à saída da festa que cada convidado recebe, das mãos dos voluntários, um presente, previamente divididos e embrulhados por estes.
17) Decoração
A cargo de um grupo voluntário que se auto-designa “Caos de Coração”, consiste, comonão poderia deixar de ser, no decorar de todos os espaços que integrarão a festa de natal, bem como no transporte das embalagens com efeites.
18) Limpeza
Numa titude de humorada ironia, os coordenadores desta equipa de voluntários defendem que se trata da função mais “sexy” de todas. A ela compete a higienização de todo o recinto, assegurando a bem estar de todos os presentes (convidados e voluntários). Trata-se de uma tarefa que é levada a cabo numa união de esforços entre a CVP e a CML.
19) Apoio
Fundamentalmente versada para o controlo das zonas envolventes e acessos a fim de prevenir e conter eventuais focos de tensão, os voluntários que optam por esta função deverão apresentar flexibilidade no sentido de poderem oferecer uma ajuda transversal aos diversos sectores.
20) Logística
Esta é uma mega-área. Inclui a gestão do armazém, transportes, cargas e descargas, etc.
21) Manutenção e economato
Neste caso a CVP dispõe de uma equipa técnica própria, não recorrendo ao voluntariado.
22) Estatística
Cabe aos voluntários aplicar pequenos questionários aos convidados cujo principal intuito é o de permitir caracterizar a população carenciada e conhecer com maior rigor as suas problemáticas e necessidades, para que a CVP possa melhor responder a elas. Ao mesmo tempo, o exercício do diálogo é uma oportunidade de doar tempo, atenção e importância.
23) Comunicação
Providenciar uma maior visibilidade à instituição, seus eventos e causas é o objectivo da equipa interina responsável pelos contactos com os media, e/mas não dos voluntários.
24) Fotografia
De momento, a CVP conta com uma equipa de profissionais de reportagem e imagem que participam voluntariamente neste evento.
25) Secretariado
Já se sabe: o trabalho administrativo e burocrático é muito e tem de ser (bem) feito, ou compromete o sucesso de qualquer projecto. É um trabalho que se inicia muito tempo antes, prossegue até ao evento e continua depois dele. Nos “picos” aceita voluntários.
26) Voluntários
Haja quem os consiga gerir! Organizá-los de acordo com as áreas de acção, comunicar-lhes todas as informações necessárias, enviando e-mails, marcando reuniões, providenciar t-shirt para todos, etc. Antes e durante o evento, também eles carecem de orientação para que possam dar o seu melhor por este projecto.
27) Coordenação
É como que o “Posto de Comando” deste evento. Estamos a falar daqueles a quem compete solucionar todos os (grandes) problemas para que isto seja uma (grande) festa!
Como vêem, há muito que fazer! Não sei se todos tinham esta ideia, ou não... Mas é uma boa ideia! :-) E, mais visível ou menos visível que seja a tarefa de cada qual, o resultado é sempre um trabalho de todos.
Este ano as inscrições já terminaram, assim como as sessões de esclarecimento e de formação. Mas para o ano haverá mais!